Mostrando postagens com marcador histórias em quadrinhos. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador histórias em quadrinhos. Mostrar todas as postagens

SUPERMAN, BROWN SUGAR, JAMES BOND E O ARTIGO

Theodore Dalrymple fala que o Politicamente Correto é o refúgio dos idiotas. O mentalmente inepto odeia pensar, pois para ele isso denota trabalho, e assim ele AMA frases feitas. A ordem, o slogan, o "é porque é" lhe dá a garantia de estar certo. O imbecil adere. Obedece. Sem jamais questionar. Falo isso porque nos shows dos Stones, sim, eles estão na estrada mais uma vez, BROWN SUGAR saiu da set list. É a primeira vez desde 1971. A letra fala da escravidão de uma forma "sem sofrimento", safada, e isso é inadmissível. Um branco só está autorizado a tocar no assunto se for para pedir perdão. Como carneirinhos bem alimentados, Jagger e Richards se submeteram. Dylan disse que os Stones são a última banda de rock ativa. Não são mais. Não me surpreenderia se Under My Thumb e Star Star fossem riscadas de vinis novos. ------------- A DC Comics aposentou Clark Kent e agora o Super Homem é seu filho. Um menino de 17 anos. Bissexual, claro. Problema nenhum nisso se não estivesse ocorrendo um fato muito perverso. Observo que minhas alunas de 11 e 12 anos já estão crescendo com a certeza de que "um ser humano normal" TEM de fazer sexo com homens e mulheres. Se voce não for bissexual voce não é normal. Ou seja, se repete agora o mesmo erro do século XIX, com sinal invertido. Se antes um jovem gay era anormal, agora um hetero-hetero "não pode ser real". Então eu vejo meninas ficando com meninas porque isso é o certo. É uma forma de opressão, claro, se seu impulso íntimo não for esse. --------------------- James Bond será agora uma mulher negra. Não haveria problema algum em se criar uma espiã negra. Mas emascular James Bond faz parte da coisa. Na verdade é se aproveitar de uma marca de sucesso, mas eles não irão admitir seu interesse financeiro, então "faz de conta" que é uma evolução. Penso que a "Jamie Bond" não irá matar negros ou chineses. Os vilões serão todos brancos e heteros. ---------------- Farei um ato revolucionário: Irei assistir Goldfinger com Tom e Jerry. -------------------- Há um novo filme inglês onde a rainha Ana é negra. O mundo virou uma brincadeira de kids mimados. No futuro acharão que a água que a gente bebia tinha LSD. ------ Uma mestra em linguística diz o óbvio: em português não existe gênero, nunca houve. Só imbecis acham que o final em A revela palavra feminina e em O masculina. O que define é o ARTIGO. A couve. O tomate. Mas isso é pedir demais para os Kids. ------------- Para uma coisa o BOZO serviu: escancarou que 80% dos artistinhas brasileiros viviam do meu e do seu imposto. Eu não ligo de financiar uma sinfônica ou um museu, a herança cultural não vive sem ajuda, ela morre, mas eu abomino ter de dar dinheiro, na marra, para filmes da Globo ou o novo show do Zeca Baleiro. Não há relatividade aqui. Arte popular vive do público que tem. Se Zeca Baleiro arrecada apenas 100 reais que faça um show de 100 reais. Isso explica a existência abastada de nulidades como....bem....voce sabe quem. ----------------- Galvão Bueno tinha um salário de 5 milhões de reais. Se voce não acha isso ofensivo, em país que mata gente na fila de hospitiais, então voce é uma besta.

LOGAN. UM FILME QUE DÓI.

   Há um momento em Logan, filme de James Mangold, mesmo diretor da bio de Johnny Cash e da refilmagem de Yuma, em que o professor Xavier assiste Shane na TV. É uma longa sequência. Shane ( OS BRUTOS TAMBÉM AMAM ),  fala de um homem da paz que é obrigado a usar a violência para salvar uma família. Logan é um reviver desse filme.
   Wolverine é um semimorto. Ele bebe e se droga, cuida de Xavier, mas nega todo seu passado. Logan não aceita ser o que ele é. Uma menina entra em sua vida. Uma mutante de 12 anos de idade. E essa menina, que ele não aceita, é uma versão dele mesmo. Sua filha. Fogem todos, como em um bom western, pelo deserto dos USA. E o acerto final é belíssimo.
  Logan não é um filme fácil. Ele é feio, ele é triste, ele não tem uma gota de humor. Mas, ao contrário de Batman, é um filme que não faz da doença um tipo de gancho. Logan é contra a doença, contra o individualismo, contra o mal. Batman se tornou no cinema uma besta. Um homem fraco dominado pelo mal. Logan reafirma o herói. O Herói possível para 2017. O herói que morre.
  Hugh Jackman nasceu para fazer este filme. Sua atuação é magnífica. Não há outra palavra, magnífico. Ele recicla Gary Cooper, Clint Eastwood e Alan Ladd em seus grandes momentos. Ele é um cowboy perdido no planeta errado. Seu lugar não é aqui. E nem lá. Ele não tem lugar. Vendo o filme, que nada tem de western, lembrei de Rastros de Ódio. A relação da menina com o adulto, a busca por redenção, o herói que parece ruim e se revela bom.
  O fim do filme é sublime. A cruz de Cristo vira o X dos X Men. Sim, o filme, na figura do professor Xavier, defende a família, a união, o costume que leva ao bem. Ele é profundamente conservador. E jamais piegas.
  Passou da hora de se dar valor à James Mangold. E passou da hora de se considerar Hugh Jackman um grande ator.
  Voce não vai achar filme melhor para ver.

MANDRAKE...A DIVERSÃO POPULAR EM TEMPOS DE CRISE.

   Federico Fellini era fã de Mandrake desde criança. E dizia, quando adulto, que desejava filmar o herói com Mastroianni como Mandrake. Não conseguiu. Nos tempos de Fellini filmar uma HQ não era coisa séria.
   Mandrake foi o herói mais popular do mundo. Ainda peguei o fim de seu reinado. Até o fim dos anos 70 ele era tão famoso quanto Superman e Batman, e muito mais conhecido que qualquer herói da Marvel. O gibi vendia como pão, e as crianças brincavam de Mandrake na rua. Um herói de fraque, cartola e bigode. Outro tempo.
  A Pixel lança uma edição de Mandrake com duas histórias, uma de 1936 e outra de 1942. Lee Falk criou o personagem nos anos 30 e criou também o único herói que podia rivalizar com ele em popularidade, O Fantasma. Nos tempos da depressão americana, as aventuras se passavam em lugares míticos, Arábia, África... Narda, a namorada de Mandrake, ainda era a típica moça americana dos anos 30: espevitada e levada da breca. O feminismo deve muito mais a esse tipo de moça que às Simones e Fridas do mundo. A segunda história da revista é de 1942, e é incrível como o mundo mudou em 6 anos! O realismo é maior e os traços do desenho de Phil Davies mais duros, menos sensuais.
  Li em algum lugar que quando o homem perde o amor pela vida ele começa a imaginar sagas em outros planetas. Aqui temos a aventura possível neste planeta. E mais que isso, a arte popular ainda se permite ser absolutamente ingênua. Mandrake é um herói infantil. Como todo herói é. De Ulysses até Wolverine, não existe herói adulto. O herói adulto seria um medico ou um pai de família. Eu falo aqui do herói mítico, do herói sobre-humano.
  Pena a edição ser em cores. A cor estraga as sombras e as linhas mais finas dos originais. Uma concessão a modernidade que mostra o gosto deturpado dos anos 2000.

X-MEN CS LEWIS ANTHONY HOPKINS MILES DAVIS DEPP JULIE CHRISTIE ROEG

   DON'T LOOK NOW ( INVERNO DE SANGUE EM VENEZA ) de Nicolas Roeg com Donald Sutherland e Julie Christie.
Terceira vez que vejo esse filme e quanto mais o revejo mais eu gosto. A revista Time Out o elegeu em 2012 o melhor filme inglês da história. Nos extras, fartos, temos Danny Boyle nos explicando porque ele é tão bom e confessando quanta coisa ele roubou desse filme. Os primeiros 10 minutos são uma obra-prima: numa montagem primorosa, vemos um pai adivinhar a morte de sua filha. Tudo está interligado nessa sequência que condensa tudo o que virá a seguir. Água, o elemento da alma compõe todo o filme. O casal, já dentro do luto, vai à Veneza. O que vemos lá é a luta entre a razão e a intuição. A esposa se entrega à intuição, o marido resiste e morre por isso. Julie Christie está sublime. Nunca ninguém sorriu na história do cinema como ela sorria. Donald dá uma interpretação que beira a possessão. Seu medo se torna nosso medo. O filme dá sempre a sensação de que algo muito grave está já acontecendo. Isso porque Roeg une tudo, cada imagem e cada objeto é uma pista do que virá a seguir e ao mesmo tempo; a memória do que aconteceu. Poucos filmes, segundo Boyle, são ´tão "cinema", no sentido de que poucos captam tão bem o que seja o tempo. Recebido como apenas mais um filme em sua época, ele tem hoje o status de viga mestra de um futuro. Um muito grande filme. E, acima de tudo, um prazer.
  ALICE ATRAVÉS DO ESPELHO de James Bobin com Johnny Depp, Helena Bonham Carter, Sacha Baron Cohen, Anne Hathaway.
Menos ruim que o Alice de Tim Burton ( Tim é apenas o produtor aqui ), este filme tem da obra de Lewis Carrol apenas os personagens. O livro maravilhoso de Carrol em nada se parece com isto. O roteiro trata de uma Alice feminista que tenta voltar no tempo para ajudar o Chapeleiro a recuperar sua alegria. Tem ação e belas imagens. É bobo.
  MILES AHEAD, A VIDA DE MILES DAVIS de Don Cheadle com Ewan McGregor.
Se ainda não viu, veja! Talvez seja a melhor bio de jazz já feita. Isso porque Don Cheadle nunca sente pena de Miles e nem tenta mostrar a vida do gênio. O que o filme conta é um período de cerca de duas semanas, no fim dos anos 70, quando Miles, recluso desde 1974, volta aos palcos e aos discos. ( Nos anos 70 ficar mais de dois anos sem gravar ou tocar era muito estranho ). O filme, brilhante, tem energia, ação, beleza e clima de jazz-funk, exatamente o som que Miles fazia na época. O cara era um ego imenso, era frio, era malandro e era violento. O filme nada esconde. Não faz dele um "gênio sofrido" e nem um "cafetão malandro". Ele é Miles, único. Don dá um show. Fisicamente ele nada tem a ver com Davis, mas a gente aceita. O cara merece. Ewan está muito legal também. Adorei o filme. E no fim tem um show com Herbie Hancock que é de matar.
  TERRA DAS SOMBRAS de Richard Attenborough com Anthony Hopkins e Debra Winger.
Se voce for fã de C.S. Lewis talvez goste. Se não for...Lançado em 1993, lembro que críticos brasileiros diziam que o filme seria ignorado aqui. Isso porque em 93 ninguém no país tupi lia Lewis. Ele era bem desconhecido. Hoje, em 2016, felizmente, as livrarias têm livros de Lewis em estoque e seu nome é conhecido até nesta esquina do mapa mundi. O filme mostra ele em Oxford, por volta de 1952, tempo em que ele conhece sua esposa, a americana Joy. Lewis foi o tipo de professor britânico que hoje não mais existe, ou seja, seu mundo era feito de chá, conversas, aulas, cachimbo e nada, nada de sexo. Ele se casa aos 50 e tantos anos, virgem, e logo sua esposa começa a decair, com um câncer muito doloroso. Attenborough filma como sempre: solene e frio. É seu estilo. Lewis não era uma pessoa fria, a coisa destoa. Hopkins está soberbo. Em um olhar ele mostra toda a complexidade do autor. Winger sempre foi uma atriz maravilhosa. Pena o roteiro ser tão...comum. Não é um filme ruim, apenas penso que o tema merecia muito, muito mais. Belas imagens de Oxford compensam todo erro.
  LOVE AFFAIR de Glenn Gordon Caron com Warren Beatty, Annette Bening e Kate Hepburn.
Warren é um atleta aposentado, famoso e mulherengo, Bening uma mulher casada, infeliz. Se conhecem num voo, se apaixonam... Esse filme é refilmagem de um excelente filme de 1957, com Cary Grant e Deborah Kerr. Este é bonito. Até que não é ruim, a gente vê com algum prazer. Annette tá bonita como nunca e Warren é sempre ok. E tem o último papel de Kate, a maior de todas, que eletriza a tela. Vemos de forma explícita, Warren e Annette intimidados pela grande dama. Vale ver. Com alguém ao lado.
  X-MEN APOCALIPSE de Bryan Singer com James MacAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence.
Se Mad Max foi o melhor de 2015, este é o melhor filme deste ano! Vamos deixar de ser idiotas! O cinema de ação é o melhor cinema que se faz agora. Só saudosistas radicais ou esnobes preconceituosos não reconhecerão nesta obra poderosa, a força do melhor cinema que pode ser feito. Ele tem ação que emociona e mensagens importantes  e sérias todo o tempo. A gente pode falar de Ford, Kurosawa, Huston, Hawks e até de Lang vendo este filme. Uma de suas sequências, aquela onde um dos heróis interrompe o tempo e salva vidas, é de uma genialidade, graça e leveza dignas do melhor Keaton. E não só isso. A complexidade das cenas de ação poderia fazer disto um tédio sem fim, mas Singer já provou a tempos ser um maestro, conseguir fazer de explosões, socos e correrias uma coisa harmoniosa, direcionada. É um grande diretor! Assisti este dvd a dois dias e já sinto vontade de rever. Esqueça seus dramas sérios sobre vidinhas medíocres, aqui voce tem o espetáculo, a grandiosidade, a coisa verdadeira, o cinema. E com muito, muito cérebro.

STAR WARS- JEAN COCTEAU- PIERCE BROSNAN- DEADPOOL- MAGGIE SMITH

Voltei a ter tempo livre para ver alguns filmes. Então vamos lá...
   STAR WARS-O DESPERTAR DA FORÇA de J J Abrams
O diretor Abrams possui um dom que me agrada muito: ele faz com que os efeitos digitais não pareçam digitais e sim se pareçam com coisas naturais, os velhos efeitos com stunts. Melhor ainda, ele ama cenas de ação ensolaradas, cores claras, vivas, alegres. Há uma convenção, tola, de que toda cena de ação atualmente deva ser dark. Pois Abrams sempre vai contra isso. Seus filmes são mais felizes, leves que a média. Este é uma grande aventura com sabor de anos 50. Às vezes lembra Lawrence da Arábia ( que é de 1962, eu sei ), o deserto, o clima; depois vai às aventuras de pirata com Burt Lancaster e aos filmes de Ray Harryhausen. Bem legal. Harrison Ford volta e volta bem. Carrie Fisher volta melhor ainda. Tem até Max Von Sydow, o ator de O Sétimo Selo, do Bergman. A trilha sonora de John Willians é ótima e a fotografia é lindíssima. Nota 8.
   ENSINA-ME O AMOR de Tim Vaughan com Pierce Brosnan, Salma Hayek e Jessica Alba.
Sempre bom ver Pierce num filme. Ele sabe atuar e consegue parecer estiloso e real ao mesmo tempo. Aqui ele é um professor que se envolve com irmã da esposa. Malcolm McDowell aparece como o pai de Pierce. Tem poema de Yeats sendo recitado. O filme nada tem de especial, mas também nunca ofende. Nada de idiota, o que hoje já é um alivio. Salma continua uma beleza. Nota 5.
   DEADPOOL de Tim Miller com Ryan Reynolds
Um super-herói ruim...Nem tanto...talvez um super-herói demente...também não...é um filme estranho. Tem cenas de violência mas parece infantil, é um herói nada heroico. Sei lá! O filme é bem feito, engraçado às vezes, mas esquecemos dele depois de dois dias. Nota 5.
   ZOOLANDER 2
Ben Stiller e Owen Wilson voltam a atacar. Owen Wilson....como pode isso!!! O filme é tão bobo, tão sem graça, tão insuportável...Um lixo.
   A SENHORA DA VAN de Nicholas Hytner com Maggie Smith, Alex Jennings e Jim Broadbent.
Dizem ser uma história real. Nos anos 50 uma mulher atropela alguém dentro de uma van. Ela pira e passa a viver dentro dessa van. Nos anos 70 ela estaciona na rua de um escritor gay. E ele passa a cuidar dela. Maggie Smith está realmente suja! Faz um retrato exato de uma moradora de rua. A gente quase sente o cheiro. Alex Jennings, sutil e contido, lhe faz um par a altura. O autor real, Alan Bennet, aparece como ele mesmo ao final. O humor é bem negro e o drama quando vem é pesado. O retrato da sociedade inglesa é perfeito. Nota 6.
   O SANGUE DE UM POETA de Jean Cocteau
Feito em 1930, este é o primeiro filme de Cocteau, na época já um autor famoso. Não procure entender, são imagens de sonho, de passagem para o mundo da inconsciência.
   TESTAMENTO DE ORFEU de Jean Cocteau
E aqui, em 1959, seu último filme. Feito para a TV, é apenas um blá blá blá sobre sua obra surrealista. Tem momentos muito bons, outros bem chatos. Ele foi um grande diretor, mas aqui, já doente, vemos apenas isso, um testamento sendo lido e exibido. Picasso, Yul Brynner e Jean Marais aparecem no filme.

O MACACO MUTANTE

   Ando lendo algumas coisas sobre a origem do homem. Como tudo que se propõe a ser científico, nenhuma conclusão é tirada, e observo que todas as descobertas podem ser ficções, meros desejos transformados em pistas. Mas, se tratados como boa ficção, as tais descobertas são inspiradoras. E é para isso que leio ciência, e tenho lido muito, para aumentar minha criatividade. Essas descobertas, que são na verdade criações, aumentam a percepção de nossa própria invenção. Foi assim com Freud em 1900, é assim com a física quântica hoje; eles abrem possibilidades de novos modos de narrar. E isso, ao contrário do que deseja a ciência, nada tem a ver com a "verdade". São "verdades", outras verdades.
  O símio que viria a ser o homem teria se originado de uma única tribo africana. O que faria de nós todos um tipo de família. As uniões entre irmãos, primos e afins fez com que muitas mutações dessem em nada, mas algumas foram uteis e passaram a ser encorajadas. Essa tribo migrou para onde hoje é a Europa, e na região da atual Hungria, teve um salto evolutivo súbito. A linguagem simbólica passa a ser utilizada. Logo surge a palavra. E com ela o que conhecemos como modo humano de pensar. Essa tribo africana, que agora é europeia, convive com os neandertais, mais toscos, e que desaparecem a seguir. Os homo sapiens se espalham pela Asia, e o resto todos sabem.
  Muito bacana né. Mas porque houve a escolha ninguém explica. Como mutações foram encorajadas se símios mal sabem o que seja "escolher". O que provocou esse súbito salto que fez com que de repente os ainda amacacados passassem a pensar em termos de futuro, passado, escolhas, representações simbólicas, vida e morte, religião e arte... E, o mais perturbador, por que essa coisa de se colocar a Europa como centro do salto simbólico...
  Na realidade acho tudo mera aposta, apenas isso. O que me atrai é entrar dentro da ficção e como se tudo isso fosse um romance, aceitar esse mundo e passar a lidar com ele. Então vamos lá:
  Dentro dessa tribo, não mais que 500 macacos, um nasceu por acaso com forte propensão ao isolamento, outro era hiper agressivo, e uma tinha as mãos deformadas. Desses mutantes sobreviventes se originaram aquilo que chamaríamos de artistas, filósofos e inventores. A história humana se confunde então com algo não muito mais sofisticado que os X Men ou os bruxos de Harry Potter. Legal isso né não...
  Um Ser criador, que fabricou um ser original que deu origem ao homem, e que por seu erro nos fez piores do que poderíamos ter sido, me parece algo bem mais sofisticado ou no mínimo tão crível quanto a tribo mutante africana. Mas se eu endossar esse Ser serei chamado por meus colegas de mais um "mero crente", enquanto que se eu endossar a hipótese do macaco mutante ou do ET emigrante serei muito mais estimulado. Coisas do século XXI, o século sem vergonha onde tudo pode ser levado a sério desde que pareça NOVO.
   Mas é uma bela e estimulante ficção essa coisa do X Monkey!

BROTHER, FILMES FOFOS E PEANUTS

   Não falo com meu irmão desde 1984. Tempo pacas! Mas como fomos muito próximos por toda a infância e adolescência ( a biológica, a mental nunca termina ), ele acertou na mosca com os presentes que me trouxe dos EUA. Botas de alpinista, um livro sobre cinema e este que agora comento.
   Sempre percebi que Charlie Brown foi o primeiro Woody Allen, e o primeiro Catcher in The Rye tambe'm. O modo como ele fala com a gente e se relaciona com o mundo foi o molde onde se ajustou o estilo de toda uma generation de moleques-adultos mal ajustados. Ao contrario dos filhos de Dylan, os filhos de Charlie Brown eram muito mais timidos, melancolicos e pateticos. ( Sem acentos, tem um defeito nesta maquina maldita que uso para ESCREVER).
   Snoopy era amado pelos hippies, mas hippies nada tem de Snoopy. Os caras de SanFran fizeram uma patetada e acharam que Snoopy viajava de LSD quando pensava ser o Red Baron ou um legionario. Snoopy na verdade faz o papel da sanidade, da criatividade.
   E chegamos a 2014. E depois de ver o novo filme de Spike Jonze noto que TODOS os caras e mocinhas melancolicos dos filmes de Sofia, Spike e vasto etc descendem de Linus e seu cobertor. Desamparados, profundamente inseguros e muito fofos. Esperimente ler qualquer tira de Linus escutando qualquer musiquinha de qualquer filme triste de hoje. Bingo!
   Peanuts foi criado por um genio chamado Charles M. Schulz. Eles mudaram o mundo para sempre. A industria cultural via jornais e depois cinema moldaram tudo aquilo que entendemos por mentalidade contemporanea. Livros ou teatro foram postos de lado. Snoopy era lido em todo o mundo por 4 decadas. E mais TV e cinema. Botou pra fora a melancolia sublime que vive na infancia. Se leitores de romances ingleses sabiam disso desde sempre, o brasileiro do Rio ou o caipira de Iowa descobriu isso com Schulz. A neurose woodyalleniana de Charlie Brown, a fofura de Linus ou os delirios de Snoopy entraram no nosso pensamento, em nossos gostos e se fizeram muito intimos de todos.
   Este livro, imensa coletanea de tiras de 1958 a 1969 deve ser tratado como aquilo que deve ser: uma das vigas do seculo XX.
   

OS VINGADORES/ MAHLER/ KEVIN KLINE/ DIANE KEATON/ PECK/

    OS VINGADORES de Joss Whelan
Nick Fury fuma um enorme charuto. É sexy ao nível Clooney de ser e é  musculoso. Está na meia-idade e tem um humor ácido, desencantado. Isso nas HQ, porque aqui ele é Samuel L. Jackson....eu adoro Nick Fury, o filme me fez odiar Jackson. Tem mais. Me fez pensar nos grandes sucessos de bilheteria da história. Todos são escapistas, e isso nada tem de ruim. Mas depende do tipo de escapismo. Se ...E O vento Levou era a afirmação da saga individualista americana, se A Noviça Rebelde era a propaganda de bons sentimentos em época de más noticias, e Star Wars era nostalgia travestida de saga futurista,  Os Vingadores é puro militarismo triunfante. Oitenta por cento do filme é propaganda de armamanto. Computadores militares, tiros e explosões, aviões, soldados. A história nada mais é que o enquadramento do incontrolável Hulk, a dessacralização de Thor e conscientização do Iron Man como soldado obediente. Não é por acaso que todos têm rancor contra Thor, afinal ele é um semi-deus. E o pobre Hulk é apenas uma besta que deve ser disciplinado. Destruição como fetiche ( após Star Wars todos os big hits têm a destruição como gozo, desde um navio que afunda até a perseguição de uma raça ). Nos extras o diretor desta coisa fala que se trata de um filme "so sexy"....
   MAHLER de Ken Russell
Tchaikovski era tão exagerado, pomposo e falso como este. O problema aqui é que Russell esqueceu daquilo que salvava o seu filme anterior: a beleza. Tchaikovski é um filme lindo, Mahler é ridiculo. Quando surgem as cenas nazistas começamos a achar que Ken tomou a droga errada. Foi este o filme que começou a destruir sua carreira. Se ele surpreendera o mundo com belas adaptações de Lawrence e filme cheios de imagens originais, aqui ele se perde em puro sensacionalismo. Nota 2.
   A CONQUISTA DO ESPAÇO de Byron Haskin
O que é isto? Deveria ser um pop e divertido filme B dos anos 50. Mas o que vemos? Um grupo viaja à Marte e seu lider enlouquece. O filho desse lider acabará por matá-lo. Em Marte há um clima de culpa, de medo e de consciência da inutilidade daquilo tudo. Simples? É um dos filmes mais doentios que já vi. Tudo nele é classe B, os atores ruins, os efeitos mediocres, os cenários pobres. Mas o roteiro é incrivelmente profundo trazendo antecipações de 2001 e até Solaris.
   MATANDO SEM COMPAIXÃO de Ted Kotcheff com Gregory Peck
Western dos anos 70, ou seja, ppouca ação e muito clima de fim de mundo. Peck é um ladrão barato, que foge em deserto de xerife "do mal". Um mestiço é o amigo de Peck e o filme, claro, fala de racismo. Não é um bom filme. Ele jamais emociona e fica sem saber onde ir com seus personagens. Peck, um ator imponente, não tem muito o que fazer. Nota 4.
   MEU QUERIDO COMPANHEIRO de Lawrence Kasdan com Kevin Kline, Diane Keaton, Dianne Wiest e Richard Jenkins
Kasdan foi um dia um dos grandes. Roteirista da turma de Spielberg, despontou a trinta anos com o marcante e icônico O Reencontro. Este é seu novo filme, recém lançado, e se está longe de ser ruim, nada tem de novo. Uma mulher, a sempre ótima Keaton, esposa de um médico, o sempre excelente Kline, acha um vira-lata na rua. O abriga. Depois de dois anos, em viagem ao Colorado, o cão some e isso expõe as dores da familia. Na busca pelo cão o que vemos é uma sessão de terapia dos personagens. O filme mantém o interesse, as pessoas são reais e os cenários deslumbram. Fácil de ver, falta ao filme um momento grande, um centro de catarse. Ele acaba sendo discreto demais, simples demais, comum demais. Mas pelo menos Kasdan não tenta fazer "arte". Ninguém é bem louco ou perigoso, a câmera nunca treme ou alça vôo. Nota 6.
   FANTASIA de Walt Disney
Grande orgulho de Disney, fracasso em seu tempo, reabilitado vinte anos mais tarde com os hippies. Vamos por partes. Porque orgulho de Disney? Porque ele trata de "grande arte". Afinal, é um looooongo desenho que cria clipes para músicas de Beethoven, Tchaikovsky e até Stravinsky. Típica jequice, achar que usar Dukas ou que falar da criação do mundo faz de um desenho "arte". Pinóquio era Arte sem nada de pedante. Os hippies descobriram que assistir Fantasia com LSD dava uma viagem ótima. Visto agora, tem seus bons momentos, mas seu espirito de "grande arte" faz dele o mais antipático dos desenhos. Nota 4.

PEANUTS COMPLETO ( DEVE SER DIFICIL CRESCER NO MEIO-OESTE )

   Vale muito a pena gastar 300 reais na edição da LPM das tiras de Peanuts. São livros em edição de luxo, capa dura, dignos da obra de um dos caras mais influentes do século. Quanto mais eu leio sobre Charles M. Schulz mais eu o admiro. O livro 1 tem uma bio dele e melhor, uma longa entrevista feita em 1987. Apesar da melancolia que sempre o acompanhou, Schulz teve uma vida abençoada.
    Schulz cresceu na era da depressão, em St.Paul, naquele tipo de cenário com muita neve e muito gelo. O pai era um barbeiro, e os pais, que ele sempre adorou, estudaram apenas até a terceira série primária. Schulz cresceu muito inseguro. Sentia-se amado em casa, mas desamparado na escola. Achava-se feio, desajeitado e pouco inteligente. Mas tinha algum jeito em esportes com bola e desenhava bem. Foi office-boy e entregador. Tinha a fama de ser "pouco viril" na rua. Filho único. Então veio a grande tragédia, a mãe, ainda jovem, teve um câncer e ao mesmo tempo ele foi convocado para a segunda guerra. Na véspera do dia em que ele deveria partir, a mãe se despediu dele "para sempre". Schulz embarcou para o front logo após o enterro da mãe.
   O garoto "pouco viril" se destacou na guerra e se fez sargento. Chegou a liderar um pelotão de metralhadoras. Quando voltou aos EUA pensou: - "Se isso não é ser um homem não sei o que será". Publicou sua primeira tira num jornal local, foi despedido!!!! e conseguiu na sequencia ser aceito em New York!!! Chegamos ao trabalho de Schulz....
   Quem gosta superficialmente de quadrinhos não tem a menor ideia da importância de Peanuts ( nome que Schulz detesta ). Ele criou, sózinho, tudo o que se entende por tira de quadrinho moderna. É o primeiro a lidar com crianças como seres complexos, o primeiro a ser desenvolvido e criado em progresso, o primeiro a exibir neuroses, o primeiro a não ter o menor traço de heroísmo ou humor chulo... e poderia ficar até amanhã enumerando as ousadias modestas de Schulz. Mas talvez a principal criação seja a depuração, a extrema simplicidade do traço de Schulz. Todo grande artista almeja a pureza, o refinamento final, a simplicidade que diz tudo. Charles M. Schulz chegou nessa depuração, estágio a que só os grandes conseguem ir. E tudo sem grandes malabarismos intelectuais, Schulz chegou a sua arte pela intuição, pelo faro, fazendo apenas aquilo que desejou sempre fazer.
   Ao contrário de vários mercenários dos cartoons, Schulz nunca permitiu que Charlie Brown crescesse, mudasse ou seguisse os ventos da moda. Sempre fez questão de desenhar todos os cartoons ( Schulz trabalhava só, sem assistentes ), e nos desenhos de TV, exigiu a técnica de semi-animação, o que deixava os personagens iguais aos cartoons ( Charlie Brown se movendo hiper-animado é impensável ). Já bastante doente, em 2000, Schulz continuou desenhando seus cartoons todo dia. Menos em sua última noite. Pela primeira vez em 50 anos ele não conseguiu fazer Peanuts e foi deitar. No dia seguinte, sua última tira, feita um dia antes, foi publicada. Ao mesmo tempo em que essa tira, que ninguém sabia ser a última, estava nos jornais, Charles M. Schulz morria. Era o fim, para sempre, de novas tiras dos Peanuts.
   Recordo de um amigo na faculdade me avisar da morte de Schulz. Fui pra casa e li a matéria no jornal. Lembro com clareza que me surpreendi. Eu imaginava que Schulz ia viver para sempre. Chorei.
   Ele era o tipo de americano, filho de imigrantes, que fez a fortuna da América. Era econômico, idealista, modesto porém muito teimoso, trabalhador incansável ( ele nunca tirou férias em toda a vida ). Ia a igreja, agradecia a Deus por sua sorte, amava os filmes de John Ford e as aventuras passadas em desertos ou em selvas. Ouvia música country e lia Tolstoi.
   Charlie Brown em 1950 é muito diferente daquilo que veio a ser. Linus, Lucy e Schroeder ainda não existiam. Snoopy era magrinho e não pensava. E Charlie tinha um lado violento, adorava tirar uma da cara dos outros. Mas já tinha momentos de total deprê e era um zero nos esportes. Duas frases que eram muito repetidas em 1950 acabaram por ser abandonadas: ele era chamado pelas pessoas de "o bom e velho Charlie Brown", e "Eu também dou minhas risadas", que Charlie falava ao aprontar uma pegadinha com alguém. Nessas tiras uma das inovações de Schulz fica bem nítida, os personagens evoluem, não são figuras acabadas e prontas.
   Eis a primeria tira:
   Shermy e Patty estão na rua. Charlie Brown vem andando. Shermy diz: Lá vem o bom e velho Charlie Brown! No quandrinho seguinte ele repete: Sim senhor! O bom e velho Charlie Brown! No terceiro quadro ele fala novamente: O bom e velho Charlie Brown! E no último quadro, com Charlie já ido, Shermy diz: Como eu odeio ele!
   Falsidade, agressividade, isolamento, ingenuidade, pronto, eis a apresntação de Charlie Brown.
   Na terceira tira nasce Snoopy. Ele anda pela rua com uma flor na cabeça. Patty rega essa flor. Ela murcha. Apenas isso. Ainda não é O Snoopy, o cão que de todos os personagens é o único criativo, o único personagem que imagina saídas, que colore com fantasia seu mundo cinza; mas já é um Snoopy extra-cool, na dele, que tem sua vida de observador reservado das tolices dos outros.
   Em novembro de 1950 vejo a primeira tira que revela todo o gênio de Schulz. Nela, Shermy e Charlie Brown estão sentados na calçada. Nada é dito, eles olham pro chão. Por três quadros ninguém se mexe e ninguém fala nada. No fim, Shermy diz: "É...então....é assim que as coisas são!"   O que mais se pode dizer? Está tudo aí, em oito palavras, em duas figuras paradas. O máximo de concisão, de depuração, a simplicidade sendo atingida no alvo.
   As tiras logo foram adotadas pelos beatnicks, pelos hippies, pelos defensores dos direitos civis. Filósofos começaram a ver milhares de significados em Peanuts, artistas divagavam sobre mensagens ocultas. Snoopy e Charlie Brown se tornaram as duas figuras mais pop do planeta e até à Lua foram enviados ( a Apolo 10 tinha um módulo Snoopy ).  E em meio a tudo isso, Schulz continuou o mesmo. Trabalhando todo dia, rindo dos sentidos que os filósofos davam a toda frase dita pelos cartoons, fazendo a única coisa que ele realmente amava: desenhar.
   Percebo agora, escrevendo isto, que Peanuts também antecipa a infantilização do mundo. É como se hoje o máximo de maturidade que pudéssemos ter fosse aquela de Charlie Brown e Linus. Nas tiras de Schulz jamais apareceu um adulto. E nelas, um cão era rei. Intuitivamente, Charles M. Schulz previu nosso pequeno mundo de crianças/adultos desamparados e neurotizados.
   O que mais alguém deve fazer pra ser chamado de gênio?

MANDRAKE, LEE FALK E PHIL DAVIS ( A DÉCADA DA FANTASIA )

   Mandrake licença pra mim!!!! Três marcas de cigarro!!!! E eu, levando socos no ombro, balbuciava: Continental.... Minister....e....Arizona!!!! Bem... voce não tá entendendo nada, mas essa foi uma brincadeira que todo garoto da minha idade brincava. Voce via um cara na rua e gritava: -Mandrake!!!! Esse grito obrigava a que o garoto ficasse paralisado. Então voce chegava do lado dele e começava a socar seu ombro, perguntando ao mesmo tempo o nome de 3 jogadores de futebol ou 3 capitais, tinha de ser 3. Enquanto o cara não respondesse voce não parava de bater e a vitima não podia se mover. Após a resposta ele podia atacar e gritar antes de voce: - Mandrake!!! Mas, se voce tivesse se lembrado de dizer "Licença", pronto, voce estava imunizado por 24 horas. O legal é que em toda rua, quando se ouvia um grito de Mandrake, logo apareciam uns 10 moleques gritando também. Quando isso deixou de ser popular não sei, acho que foi no tempo em que a molecada saiu da rua e foi ver Xuxa na TV.
   Tudo isso pra contar que acabo de reler meu livro de luxo com duas histórias clássicas de Mandrake. Pra quem desconhece, Mandrake foi durante trinta anos um dos dois ou três personagens de HQ mais populares globalmente. Aqui no Brasil ele era O mais popular, batia o Fantasma, SuperHomem, Batman e Homem Aranha. Era editado pela RGE, que depois foi acoplada pela Globo. Engraçado mas tenho a impressão que ele foi sumindo junto com a brincadeira....
   Mandrake é um mágico, de cartola e fraque, que usa o poder da hipnose para vencer seus inimigos. Ao seu lado vai um tipo de guarda-costas, Lothar, um negro africano de dois metros ( é tempo de politicamente muito incorreto ). Narda é o nome de sua namorada, uma bela nobre da Europa Oriental. Mandrake é um retrato do mundo dos anos 30, tem a cara de William Powell ou Erroll Flynn e vive num planeta que ainda crê em continentes perdidos, reinos misteriosos e principes bandidos. Os desenhos de Davis são suntuosos, sexys, lembram muito Alex Raymond. Lee Falk, que também deu vida ao Fantasma, criou Mandrake. Um dos mais vaidosos artistas da história das HQ, Falk sabia dar às suas histórias um clima de filme de aventuras, de seriado de cinema. Delicia!
   A década de 30 foi a década das grandes fantasias. Flash Gordon, Tarzan, filmes de legião estrangeira, de uma India cheia de magos, de Amazônia com reinos perdidos. Wells, Orwell e marcianos. Depois viriam os campos de concentração e o mundo nunca mais poderia ser ingênuo assim. A fantasia desde então viria sempre com cinismo.
  Porque o bom de Mandrake, e dos HQ da época, é que ninguém tenta ser artista, filósofo ou muito louco. É simples diversão de teens, só isso, lixo bem feito. Lixo que na verdade se revelou ouro.
  Nesse livro que tenho há uma carta de Marcello Mastroianni. Uma carta que Marcello escreveu para Fellini. Nela ele implora para que Federico produza e dirija um filme de Mandrake. Com ele como o mágico e Claudia Cardinale como Narda. Lothar pode ser Oliver Reed pintado. Marcello recorda seus tempos de leitor de Mandrake, e diz que sonhava em ser esse herói tão elegante. Melhor que tudo, o livro tem fotos de Marcello vestido de Mandrake em ação, e uma de Claudia como Narda. Que pena Fellini não ter feito!

TINTIM- HERGÉ

   Spielberg está finalizando um filme sobre Tintim, o herói criado pelo belga Hergé, herói que é a décadas imensamente popular em todo o mundo. Mais que isso, é Hergé o homem que inaugura um tipo de quadrinho europeu, de aspecto mais realista ( mas não real ), e de composição mais "limpa", organizada. Qualquer página de Tintim que voce abrir ao acaso lhe dará uma impressão de ordem, de quadrinhos bem divididos, de traços harmoniosos.
   A primeira experiência que tive com esse herói não foi boa. Foi numa série de Tv, que era exibida pela Tv Bandeirantes, décadas atrás. Não é a mesma série canadense, boa, que depois foi exibida pela Cultura. Eram desenhos de muito blá blá blá, e além de tudo, Tintim com aquelas meias de lã e o topete esquisito me parecia um nerd dos mais enjoados. Coloquei-o de lado e só voltei a Tintim na idade adulta. Foi quando li "O Segredo do Licorne" e me peguei vibrando com o talento de Hergé. Comprei todos, livros de capa dura, ainda da editora Record.
   Hergé não viaja. É Tintim quem viaja. Hergé pesquisa em casa, com fichas onde anota tudo sobre os países onde se passam as aventuras. E desenha. Desenha de forma naturalista, com detalhes, de uma forma clara, simples, correta. Hergé nunca vai te pegar pela criatividade, ele te encanta pela correção. E Tintim, um menino sem segredos, tipo de repórter, com seu cão Milou, um schnauzer branco, vai ao Tibet, a India, aos EUA, a Lua até. Sempre correndo de lá pra cá, sempre com pressa. O capitão Haddock surge após alguns números. Capitão bêbado, que tem um jeito engraçado de blasfemar ( seus sicofantas, macrocéfalo, rocambole, canibal, ectoplasma, filoxera, flibusteiro.... ), Haddock que se torna personagem mais "colorido" que Tintim, capitão pessimista, sempre nervoso, que não pensa.
   Será que Spielberg vai conseguir tornar Tintim famoso também nos EUA? Em entrevistas ele diz que quando o descobriu se apaixonou na hora. Mas haverá em meio a tantos heróis barulhentos e ultra-violentos, poços de neuroses e de machismo simples, haverá lugar para um rapaz que parece tão... cálido? Espero que sim. Seria muito bom se Tintim se tornasse um grande sucesso de cinema.
   Releio então alguns números de Hergé. Ainda são bons. Não me pego mais "dentro" da aventura. Infelizmente o tempo fez com que se criasse uma parede entre eu e Tintim. Mas ainda há prazer, ainda admiro a beleza dos traços, das linhas puras e limpas, do colorido suave. Na verdade é um filme que desejo muito assistir. Vamos esperar e torcer...

O HOMEM ARANHA- STAN LEE, STEVE DITKO

Mais do que temos consciência, toda a minha geração foi afetada pelo Homem Aranha. Primeiro amamos o Super-Homem e o Batman. Mas ao travar contato com Peter Parker, Gwen Stacy e Mary Jane Watson tudo mudou. O Aranha de 70/76 ( que saiu aqui anos depois pela Ebal e pela RGE ) tocou em um nervo sensível. Garotos de 11/12 anos ficaram enredados.
Quando falo do Aranha, por favor, esqueça os filmes de Sam Raimi. Embora ele seja um fã fiel e real de Stan Lee, nada em nehum dos filmes faz justiça ao gibi. Primeiro porque Parker era um tímido forte. Ele era um cara forte que se sentia inibido. Papel para um jovem Robert Redford ou um jovem Brad Pitt. O ator que o faz daria um bom Osborn. E Mary Jane era uma pré-hippie alegre e ágil. Um tipo de Angelina Jolie.
Mas o principal, e aquilo que tanto nos marcou, é que o Aranha foi o primeiro contato com aquilo que pensávamos ser o tal "real mundo jovem". Peter vivendo em seu apartamento de solteiro, perdendo Gwen Stacy ( quem não amou e chorou com a morte de Gwen ? Aquele gibi foi histórico ), sendo paquerado por MJ e tendo problemas de emprego com JJ.... tudo aquilo nos encantava por ser real, de verdade. O que nos pegava não era a ação, era o cara por detrás da máscara. E eu me apaixonei por MJ. Como não amá-la?
De repente o Super-Homem parecia "coisa de criança". Mas, que chato, o Homem-Aranha não teve a sorte de encontrar no cinema seu Christopher Reeve. Reeve é o perfeito Clark Kent, misto de beleza e força, nobreza e timidez. Assim como Batman jamais achou seu Bruce Wayne ( na verdade achou. George Clooney nasceu para ser Batman, mas seu filme foi um desastre ). Bruce é misto de inteligência e raiva, um lord inglês com neurose. Keaton e o ator atual ( Bale sempre parece bronco ) não têm elegancia e jamais parecem ser inteligentes. Sorte do Homem de Ferro que achou seu ator ideal.
Esperar a chegada de novo número de Homem Aranha, com seu cheiro de tinta e seu formato grande era emoção de amor puro. Vejo hoje que eu não estava só. Para todos nós, antes dos livros de Dickens, dos filmes de Kurosawa ou dos discos de Dylan veio o Aranha de Stan Lee.

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

MURPHY ANDERSON, JOE KUBERT, GIL KANE, FRANK GIACOIA, CARY BATES, JULIUS SCHWARTZ, SAL BUSCEMA, JIM STERANKO... nos meus 12 e 13 anos eu tive apenas um único objetivo : comprar revistas da EBAL.
A Editora Brasil América. Ela lançava os heróis da National e da Marvel no Brasil. Toda segunda-feira era meu dia feliz. O dia de ir às sete da manhã na banca do "Negrito" para comprar três revistas. HOMEM-ARANHA, SUPERMAN, BATMAN, TARZAN, DEMOLIDOR, CAPITÃO AMÉRICA, KORAK, THOR, QUARTETO FANTÁSTICO... e da editora RGE eu pegava O FANTASMA e MANDRAKE.
Chegava em casa e sentia o cheiro doce de papel recém impresso, de tinta. Lia. O coração aos pulos. Eu realmente amava aquelas revistas. Quando erguia os olhos e via na prateleira da banca uma nova capa colorida, sentia um júbilo que raras vezes sentí novamente. Após ler essa nova revista eu a guardava em meu quarto e ia pra escola. De noite, na sala, eu iria lê-la mais uma vez e passaria dias admirando cada quadrinho e sua capa festiva. Era uma paixão.
Elas fizeram minha bronquite de toda noite desaparecer. Revelaram um mundo maior, um mundo de criação, de dor e de superação. Me sentia Peter Parker, mas também me sentia Matt Murdock e Steve Rogers. E amava, febrilmente, Sharon Carter, Karen Page, Gwen Stacy e acima de todas Mary Jane Watson. Ficava olhando seus rostos e tentando imaginar como seria o timbre de suas vozes.
Tudo começou com um amigo meu ( Juscelino ) que tinha uma pilha de HQs da EBAL e que trocou sua pilha pelas minhas revistas da Monica e do Mickey. De repente eu tinha umas cem revistas para ler. Lí tudo em quatro dias e fiquei viciado. Bendito Juscelino !!!!
Aos 14 anos, veio uma tempestade e eu troquei a paixão pelo Superman pela paixão pelo Led Zeppelin e descobri que amar uma menina de carne e osso doía mais. As revistas foram guardadas, eu ainda comprei bastante durante um tempo, mas já não vivia para elas.
O tempo as levou, vieram livros, veio gente, veio ferida e outros amores. Mas eu nunca gostei de nada de um modo tão "bobo", puro, febril e exaltado. Conseguia entrar nos desenhos, viver dentro deles, sonhar com tudo aquilo.
Às vezes penso que aquele menino ainda está indo à banca do Negrito.