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SIGNO E SIGNIFICANTE= BLOW UP, UM FILME PARA A SIMBOLOGIA

Um grupo de clowns anda de Jeep pelas ruas desertas de Londres ( é 1966, Londres ainda é viva ). A balbúrdia desses jovens clowns ( hippies? ) nada significa. O fotógrafo está em meio aos sem-teto da cidade. Esses rostos de miseráveis dickensinianos parecem reais. Mas vemos então que o fotógrafo tem um Rolls Royce e que não é pobre. Ele fotografa uma famosa modelo ( Verushka. A primeira das anoréxicas ), ela está semi-nua, mas nada ali é sensual. Ele finge ter um orgasmo ao fotografá-la, mas assim que a sessão de fotos termina sua impassividade retorna. Groupies tentam ficar com ele ( Jane Birkin ), mas tanto elas como ele nada têm a dizer. Então ele visita um amigo pintor. Lá, a namorada desse artista ( Sarah Miles ) mostra nada sentir por seu companheiro, ela gosta do visitante. As pinturas são acidentes que esperam um significado ( são as palavras do pintor ). No studio do fotógrafo há um cofre que nada guarda, uma pedra rosa que nada tem de funcional. Ele vai a antiquário. Em meio a quinquilharias, ele compra uma "fantástica" hélice de madeira polida. Para que? Para decorar seu ambiente.....
Antonioni demonstra com maestria a dissociação do signo e do significado. Nada no filme, até então, está de acordo com a linguagem. Tudo parece ser, tudo nada é. As coisas e as pessoas estão fora de seu ambiente, perdem seu significado, tornam-se vazias. É como se a vida houvesse se tornado uma fotografia, um vídeo, a imagem de uma coisa simbolizando outra coisa. Virtualidade. O fotógrafo, que está sempre com a câmera à mão, mostra fotos artísticas para seu amigo escritor. Belas e significantes fotos de miseráveis. Ali poderia haver a comunhão de signo e significante, mas não, são fotos e ele não será jamais um deles. Fotos são fotos, não são a coisa.
Cena absolutamente perfeita em parque. ( O fotógrafo do filme é Carlo di Palma, Woody Allen que nunca foi bobo o usaria em seus melhores filmes ), verdes e mais verdes e o som do vento. Ele faz o que sabe fazer, tira fotos. Um casal se beija? ( Brian de Palma copiaria/homenagearia esta cena em Blow Out ), a moça ( Vanessa Redgrave, digna filha de Michael Redgrave ) tenta conseguir o negativo. Ela acaba o encontrando no studio. Famosa cena entre os dois. Ela pensa ter levado o negativo, ele amplia as fotos. Amplia as ampliações, busca algo naquela fotografia, acha um revólver, acha um corpo...Será???? Antonioni adorava Hitchcock, o clima de Blow Up é o mesmo de Vertigo. Impotência. O fotógrafo se agita, vai ao parque, frenesi. Há um corpo no gramado ( mas parece um manequim.... ) O fotógrafo procura o escritor, vai a show dos Yardbirds, pega guitarra quebrada e joga fora, no lixo ( o que significa um pedaço de guitarra? )encontra o amigo que está chapado de marijuana...
Afinal ele volta ao parque e não vê mais o corpo. Os clowns reaparecem com sua alegria fake e jogam partida de tênis em mímica. Ele se deixa ficar por lá, ASSISTE. A "bola" cai a seu lado, ele exita e a joga para os clowns. Se escuta então o som da bola quicando. FIM. O fotógrafo se entrega a virtualidade. Nada de simbolos nada de signos, tudo é mensagem sem valor.
Se a única forma de arte válida é aquela que pressupõe várias intepretações, este filme é ao lado de 2001 e Marienbad a mais complexa obra do cinema. ( E há quem diga que lhe falta ação!!!! ). Assito Blow Up com o raciocínio desperto, milhares de conexões vão se formando sem parar e nenhuma é COMPLETAMENTE VERDADEIRA. Eu jamais saberei o que Antonioni pretendia, e nem ele saberia dizer. Ele abre o filme e nos convida a entrar. Crise de significado? Pode ser. Tudo no filme é sem peso. Nada significa nada, a não ser aquilo que o fotógrafo pensa ter visto. Nesse momento ele encontra um sentido, mas esse sentido existe? Concretamente, houve um crime? ( Quem pensar em Deus como sentido/criação não está errado ).
Blow Up antecipa nossa época. Signos esvaziados de significação. Hélices fora de sua função, relações deslocadas, erotismo ensaiado, fetiches e tédio. Tudo parece arrumado, bonitinho, clean, e nada tem vida. David Hemmings, com suas roupas mod, é a imagem do que seria dali em diante cool. E é impressionante que quase 50 anos depois, o visual do filme ainda pareça fashion!!! Todos os que vemos nas ruas da Londres 1966 poderiam estar em editoriais de moda de qualquer revista bacana. O simulacro colocado como sentido. Significante se tornando signo.
Uma fofoca: Antonioni pediu a produção que convidasse a banda mais quente de Londres para uma cena. Chamaram os Yardbirds. Só na hora de filmar é que Antonioni pediu para eles quebrarem os instrumentos "como ele tinha visto na tv".... Antonioni havia visto o Who e esquecera o nome da banda. É por isso, que numa cena muuuito tola, Jeff Beck, constrangido, tem de quebrar sua guitarra. Penso no quanto seria fantástica a cena com o The Who.... ( apesar de que a banda mais quente de então era o Pink Floyd ).
O erro não foi só esse. Terence Stamp deveria ter sido o fotógrafo e seu rosto perverso acrescentaria muito ao papel. Mas por outro lado, o Who daria ao filme uma "verdade", um fogo que talvez desequilibrasse sua frieza, e Stamp traria maldade a um personagem que deve ser vazio. Dito isso.....
Quando vi Blow Up pela primeira vez, tv Manchete 1983, horário nobre, nada entendi. Mas gostei do visual fashion. Revi em 1999, e percebi que ele parecia um mistério que eu não queria/conseguia penetrar. Revisto ontem ele surge em toda sua magnifica complexidade. Um objeto de arte. Pedante, esnobe, para metidos a pensadores...e daí???? O filme é atemporal e um monumento a lógica. Divirta-se!!!!