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THIS IS HARDCORE - PULP

Pulp é, em meio a onda do Britpop, a mais adulta entre seus pares. E isso faz com que Pulp seja, sim, sem dúvida alguma, muito melhor que Oasis, Blur, Suede ou Stone Roses. Jarvis Cocker é um intelectual refinado se colocado ao lado de Noel, Damon, Ian ou Brett. This Is Hardcore, de 1998, é seu último grande disco e como ser inteligente que é, Cocker percebeu sua maturação e fala por toda a obra de finais, despedidas, desvanecimentos, apagamentos e sumiços. A banda, mega competente, que sempre foi witty ( esperta e alegre ), é aqui melancólica. Mas sem jamais perder a elegância. ---------------- Cocker sempre teve uma queda pelo POP francês e esse é seu diferencial. Faz anos que ele vive em Paris e já lançou disco solo com canções francesas. Isso tempera sua alma. Enquanto os Gallagher sonhavam com Lennon, e Albarn pensava em Marc Bolan, Jarvis seguia Serge Gainsbourg e Jacques Dutronc. Para um inglês, isso faz toda diferença. Como Yeats e Shelley, há nele um forte cheiro de vinho e de Camembert. Neste disco, belíssimo, ele derrama todo seu romantismo sem pieguice, um romantismo irônico, inteligente, que mais que Bowie, remete à Bryan Ferry e John Cale. Vejo que o album teve a produção de Chris Thomas, o cara que produziu os melhores discos do Roxy Music e de Pretenders. Entenda...não falo que Pulp lembre Roxy, não lembra, mas é o mesmo espírito. Voce ouve este disco do mesmo modo como ouve Siren ou For Your Pleasure: com uma taça de champagne e uma lembrança diáfana na cabeça. ------------------------ Há no Oasis uma vulgaridade de operários de Manchester que às vezes enjoa. Há no Blur uma sombra juvenil que não cessa. O Stone Roses é, para mim, uma banda comum hiper valorizada. E o Suede escorre vaidade insuportável em cada acorde copiado do pior do glam rock. O Pulp, ao lado deles, parece maduro, chique, consciente, no tom exato. Tem suas influências, mas as usa com sabedoria. Junta tudo mas deixa, acima de todo som, a voz de Cocker brilhar, uma voz que casa perfeitamente com aquilo que se diz. Os arranjos são ricos, quase sinfônicos. A impressão geral é de estarmos diante de algo invulgar: um desses discos que ficam, que permancecem. Passados 25 anos ele ainda impressiona. Muito. Ouça. E não esqueça de suas feridas.

UM GRANDE DISCO: PARKLIFE - BLUR

   Lançado em 1994, no auge do britpop, este terceiro disco do Blur é melhor que o mais famoso What's The Story dos rivais plebeus do Oasis. Não que o disco do irmãos desunidos seja fraco, ele é histórico. Mas Parklife é muito mais aventuroso.
  Muito se disse na época que a crítica inglesa, sempre sensacionalista, queria forçar um embate tipo Stones x Beatles, entre as bandas de Londres e de Manchester. Mas, assim como nunca houve uma rivalidade entre Jagger e Lennon, os rivais dos Beatles eram todos americanos, a rivalidade entre Blur e Oasis sempre soou artificial. Os rivais dos Gallagher eram eles mesmos. E a referência do Blur nunca foram os Stones, eram os Kinks, o Yardbirds na fase Jeff Beck e Bowie.
  Parklife começa com dance music muito boa e termina com colagens à la Lodger de David Bowie. Suas melhores faixas são comentários sociais carinhosos ao modo Ray Davies, e a obra-prima Village Green sempre paira no horizonte de Damon Albarn.
  Albarn é o mais esperto dos caras de sua geração, e seu gosto é sempre exemplar. Blur transpira informação, e em que pese sua voz ruim, a gente se acostuma até com ela e acaba aceitando. O disco, caleidoscópio vermelho e azul, jamais poderia ser aceito nos EUA. É inglês, tão chá com leite como The Fall ou Pulp. E os Kinks pós 1966.
  O britpop nunca existiu. Era apenas um rótulo feito para vender como novo algo que era continuação tradicionalista. Oasis, Pulp, Verve e que tais eram apenas a manutenção do bom e velho rock inglês guitarreiro. Um bando de garotos nascidos no auge do pop que, como eu, souberam endeusar a música feita durante sua estadia no berço. Depois, aos 14-16 anos, viram o segundo auge inglês entre 77-83, com Bowie, Clash e The Jam e o resto é o resto.
  Se voce quiser ter em sua coleção só cinco discos desse tal brit, Parklife deve ser o primeiro a ser comprado. Depois pegue o Oasis de praxe, um Pulp e complete com o primeiro do Elastica. Tá feito.
  PS: Não, Primal Scream não é britpop. Mas são os Stones da coisa.

FESTAS, DROGAS E ROCK`N`ROLL, A SAGA DA CREATION E O FIM DO ROCK INDIE

   No começo dos anos 80 o mundo pedia por gravadoras indies. As grandes ( Sony, RCA, Polygram, EMI ) estavam fazendo a festa com MJ, Queen, Bowie, Police, Dire Straits e Bruce, dentre dezenas de outros. E o povo antenado consumia euforicamente os selos indies. Lembro que eu adorava o catálogo da Sire, mas havia a IRS, a Virgin, a Rough Trade, a Factory...e na Escócia um doido ruivo chamado Alan McGhee fundou uma das menores, a Creation.  Logo em seu segundo ano eles chamaram a atenção, Jesus and Mary Chain eram a ressurreição do Velvet Underground ( mais uma ), microfonia e doçura. Paralelamente veio o Primal Scream, que ainda não era o PS que voces conhecem.  O grupo de Bobby Gillespie era bem mais melódico.
  Conforme o fim da década foi chegando mais as indies se afirmavam. A Creation tinha meia dúzia de funcionários e todos eram completamente loucos. Sempre no vermelho, gastavam por conta dos lançamentos futuros. My Bloody Valentine era a bola da vez e Kevin Shields se tornou um ídolo na Inglaterra. Lembro que aqui no BR a revista BIZZ tinha um fanatismo pela Creation que me irritava. Na época eu adorava os californianos tipo Jane`s Addiction e Red Hot Chili Peppers, e nada menos "sol, esporte e go for it"que as melancólicas bandas de Glasgow. House of Love foi a primeira banda deles a chegar ao number one das ilhas...e então tudo mudou, para a Creation, para a GB e para mim.
  Se pensarmos friamente todo movimento dentro do rock se originou da droga da hora. Os Beatles se soltaram ao conhecer a maconha e o rock ficou viajandão com o LSD. A heroína deu o gas e o tema para Lou Reed e todos os que daí vieram. Álcool e anfetaminas criaram o rock de garagem e a cocaína deu aos anos 70 seu aspecto de ego inflado e "tudo é lindo".  Well...por volta de 1988 começou a cultura do ecstasy e a Creation é apresentada a nova droga em 89.  Alan McGhee mergulha fundo e leva as bandas do selo com ele. O estúdio, que sempre fora zona livre para gente junk, se transforma numa rave que nunca termina. Um disco muda tudo e para os ingleses se torna a coisa mais influente da época: Screamadelica do Primal Scream. Gillespie leva meses para terminar o disco, ele é todo gravado sob efeito de ecstasy. A mistura se faz: Creation plus dance= anos 90. Primal Scream é a primeira banda do selo a ir ao Top Of The Pops. Chapados. 
  Foi um dos melhores momentos da história do Pop inglês. Stone Roses, Happy Mondays, Blur, Charlatans. Nenhum deles era da Creation. Alan tinha o Super Furry Animals e lançaria em 94 o Oasis, a banda que segundo Alan, mataria o rock indie.
  Primeiro um adendo que muita gente aqui no BR ignora ( colonizado que somos por criticos pró-ingleses ), é muito, muito dificil um inglês fazer sucesso nos EUA. Todas essas bandas inglesas que citei aqui NUNCA estouraram nos EUA. O Oasis será a única. A coisa lá é muito dura. Quando em 64 os Beatles pegaram os EUA trouxeram com eles o Dave Clark Five, o Animals e os Hermann Hermits. Os Stones só estourariam em 65, os Kinks, que venderiam pacas na GB por toda a vida, só tiveram de hits nos EUA, You Really Got Me e Lola bem mais tarde. Yardbirds, Spencer Davies ou Hollies, necas. Em 68, com a segunda invasão britânica, Bee Gees e Cream seriam os únicos. Bandas que causavam histeria nas ilhas, como Small Faces ou Traffic, nada conseguiam nos EUA. Lendo a parada de 72 da Inglaterra vejo os nomes de T.Rex, Roxy Music, Slade, Sweet, Gary Glitter e Status Quo nos 6 primeiros lugares, uma parada maravilhosa, mas TODOS jamais fizeram sucesso nos EUA. O rock inglês dos anos 70 que era hit na América se resume a Elton John, Rod Stewart e Led Zeppelin. Bandas como Smiths, Jam, Ultravox, passaram em branco e mesmo David Bowie só estourou muito depois de Ziggy Stardust, em 75 com Fame.  O Queen fez sucesso nos EUA, assim como o Police, mas muuuuuito menos que na Inglaterra ( e que aqui, onde até o Clash sempre foi muito mais popular que nos EUA ). 
   Em 83 houve uma terceira invasão: Culture Club, Duran Duran, Human League pegaram os primeiros lugares... até surgir Prince e Madonna e levarem tudo de roldão. O U2 reinaria sózinho, única banda britânica a estourar na América pelos anos 80 inteiros. Até o Oasis. Alan McGhee foi ver os caras num bar e assinou na hora ( ele fala hoje que se soubesse que Noel era fã do U2 jamais teria aceitado ). O resto todo mundo recorda. Mas porque eles fizeram tão mal as indies? Por 3 motivos: Primeiro a Sony comprou a Creation, deixando Alan como mera peça de decoração, Segundo, todas as indies passaram a sofrer assédio das grandes gravadoras, e todas foram obrigadas a procurar e trabalhar "novos Oasis", Terceiro, o espaço para bandas como Primal Scream acabou. Seus discos começaram a ser muito mal trabalhados, e o Jesus and Mary Chain chegou a ser demitido. E chegamos então a situação de hoje, a pulverização da cena e a transformação do público em nichos que mal se tocam. 
   É um final melancólico e desde o Oasis ( que não tem culpa e sofreu com o processo ), apenas o Coldplay conseguiu entrar no mercado da América. A Inglaterra jogou fora N bandas que poderiam ter tido uma longa carreira e em troca ganhou o Coldplay.
   Chato né?