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SIGHT AND SOUND, NOVA LISTA DOS 50 MELHORES FILMES

   Um amigo me envia a nova lista da revista inglesa Sight and Sound, nela os 50 melhores filmes da história do cinema. Pela primeira vez Kane não é o primeiro ( é o segundo ). Tentativa de ser diferente? Não sei. Kane está longe de ser meu filme favorito, mas ainda é o mais influente. Porque? Porque em duas horas ele exibe TODOS os tipos de cinema, todos os estilos, tanto do passado, como daquilo que se faria desde então. É por esse motivo que Kane é o filme de quem conhece e compreende o cinema. Ele recapitula e antecipa o próprio cinema.
   Mas quem venceu desta vez? VERTIGO de Hitchcock. E já aviso, ele é um de meus mais amados filmes. Faz tempo que Vertigo vem crescendo em todas as listas. Ele se beneficia do dvd. As novas gerações se surpreendem ao vê-lo, o adoram. Ele toca nos temas que são mais relevantes em 2012: solidão, real e imaginário, compulsão sexual, fetichismo e sadismo. Tudo isso com a técnica perfeita do gênio inglês. Vertigo ser o number one não surpreende ninguém. Ele é magnífico.
   A lista, como já disse, é influenciada pela voga do dvd. Filmes que eram famosos como lenda, ao serem vistos em casa, confirmam ou não sua fama. Vendo a lista em seu todo, três diretores sobressaem como renascidos em revisão: Tarkovsky, Ozu e Dreyer. Três filmes de cada um deles se colocam entre os 50 e o russo tem muito destaque. Devo dizer que dos 50 só não assisti um, História do Cinema de Godard, aliás vivemos um tempo godardiano, sua obra é bem representada.
   A lista nada tem de Tarantino, Woody Allen, Joel Coen, Clint ou PT Anderson. Os diretores em atividade representados são Wong Kar Wai, Lynch, Bela Tarr, Scorsese e Kiarostami. Estão longe de serem meus favoritos.
   Mas é uma boa lista. Apesar de não dar o destaque a Bergman que eu daria ( temos Persona em 18 e só ), vemos Ozu em terceiro, Murnau em quinto e Rastros de Ódio de Ford num belo sétimo lugar. Fellini está em décimo e Os Sete Samurais de Kurosawa é o 17. É bacana ver Bresson e seu Balthazar entre os topo 20 e meu querido L'Atalante de Vigo em 12. 
   Listas nunca são como voce gostaria, mas esta não me causa revolta ou hilariedade. Sóbria, essa a palavra que a define.
   1 VERTIGO - HITCHCOCK
   2 KANE - WELLES
   3 TOKYO STORY - OZU
   4 A REGRA DO JOGO - RENOIR
   5 SUNRISE - MURNAU
   6 2001 - KUBRICK
   7 RASTROS DE ÓDIO - FORD
   8 CÂMERA - DZIGA VERTOV
   9 JOANA D'ARC - DREYER
   10 OITO E MEIO - FELLINI
   11 POTEMKIN - EISENSTEINE
   12 O ATALANTE - VIGO
   13 ACOSSADO - GODARD
   14 APOCALYPSE NOW - COPPOLLA
   15 LATE SPRING - OZU
   16 AU HAZARD DU BALTHAZAR - BRESSON
   17 OS SETE SAMURAIS - KUROSAWA
   18 PERSONA - BERGMAN
   19 O ESPELHO - TARKOVSKI
   20 CANTANDO NA CHUVA - DONEN
   21 L'AVVENTURA - ANTONIONI
   22 O DESPREZO - GODARD
   23 O PODEROSO CHEFÃO - COPPOLLA
   24 A PALAVRA - DREYER
   25 IN THE MOOD - WONG KAR WAI
   26 RASHOMON - KUROSAWA
   27 ANDREI RUBLOV - TARKOVSKI
   28 MULLHOLLNAD DRIVE - LYNCH
   29 STALKER - TARKOVSKI
   30 SHOAH - LANZMANN
   31 O CHEFÃO II - COPPOLLA
   32 TAXI DRIVER - SCORSESE
   33 LADRÕES DE BICICLETA - DE SICA
   34 A GENERAL - KEATON
   35 METROPOLIS - LANG
   36 PSYCHO - HITCHCOCK
   37 JEANNE DIELMAN - AKERMAN
   38 SANTANGO - BELA TARR
   39 OS INCOMPREENDIDOS - TRUFFAUT
   40 VIAGEM À ITÁLIA - ROSSELINI
   41 PATHER PANCHALI - SATYAJIT RAY
   42 SOME LIKE IT HOT - WILDER
   43 GERTRUD - DREYER
   44 PIERROT LE FOU - GODARD
   45 PLAY TIME - JACQUES TATI
   46 CLOSE UP - KIAROSTAMI
   47 A BATALHA DE ARGEL - PONTECORVO
   48 LUZES DA CIDADE - CHAPLIN
   49 CONTOS DA LUA VAGA - MIZOGUCHI
   50 HISTÓRIA DO CINEMA - GODARD
        Devemos lembrar que filmes recentes tendem a cair sempre de posição, assim que seu impacto vai se extinguindo. Dificilmente veremos Lynch em listas futuras. O tempo é sempre o melhor juiz de toda arte. Vencer a passagem do tempo é o grande mérito.
        Como vivemos em tempos pouco imaginativos, Bunuel fica de fora. Assim como a elegãncia de Visconti ou de Resnais. Não são bons anos para requinte ou para delicadeza.
        Destaquemos a definitiva consagração de Ozu e os vários criticos discípulos de Godard se fazendo notar. Toda escolha reflete o momento em que ela é feita. O modo de filmar godardiano é hoje muito valorizado. Esta lista confirma isso.

O AMOR É SEMPRE MENTIROSO-VERTIGO

O melhor dos diretores ( aquele que fazia grande arte e comércio pop ao mesmo tempo ), dá em VERTIGO o mais devastador retrato sobre a ilusão do amor.
Não contarei sua história para não adiantar sua magia. Direi no entanto, que jamais uma cidade foi mais bonita que a SanFran do filme, com seus azuis e amarelos da primeira parte "sonhadora" e seus neuróticos verdes e cinzas da segunda parte. O filme, quase sem diálogos, é como um sonho-alucinógeno, e nos faz realmente sentir o que seu protagonista sente.
Pierre Boulez disse que a trilha sonora deste filme ( bernard herrman ) é a mais perfeita da história cinematográfica. Não sei se ela é, mas direi que ela é hipnótica, wagneriana, obsessiva, inesquecível.
James Stewart tem aqui aquela que é possivelmente a melhor atuação já vista. Ele passa, na hesitação de sua voz, no olhar ansioso, toda a carência, todo o amor do personagem. Sua sina, seu futuro vazio, o seu medo.
Como todo filme de Hitch, o crime é mero pretexto para sua profunda análise da doença humana, das taras e psicoses, das dores e mentiras do mundo. E tudo isso, que em outras mãos se transformaria em arte hermética e obscura, com Hitch se torna diversão simples, direta, nítida e nada pedante, porém, profunda.
Suas cenas recordam muito TAXI DRIVER, a personagem feminina mostra um desamparo tocante e é este o filme que deixa mais clara a afinidade que Bunuel sentia por Hitchcock.
Seu final, trágico-imperfeito-abrupto-louco e vazio, é dos mais cruéis já filmados e ficamos sentindo a mesma dor absurda de Stewart.
Inesquecível, ele nos faz pensar muito. Nas mentiras do amor, na ilusão que criamos para nós mesmos, na busca inutil pela perfeição, e na música irresistível dessa ilusão.
Um dos maiores filmes já feitos e sem dúvida é este o mais moderno e influente dos filmes.
Hitchcock é o cara.