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ACONTECE OUTRA VEZ: IN A SILENT WAY, MILES DAVIS

Gravado no dia 26 de fevereiro de 1969, sim, em um dia, IN A SILENT WAY é mais uma aterradora obra prima elétrica de Miles. Na época, puristas de jazz torceram o nariz, hoje ele é unaminidade, é um ponto alto da vida do gênio Miles Davis. Aos 42 anos de idade, cercado de jovens cheios de futuro, Miles nos dá o mais simples dos discos, composto de apenas 4 ou 5 riffs que se repetem em looping enquanto os músicos tecem breves e pacatos solos. Músicos? Se por volta de 1958 Miles lançava Coltrane, Cannonbal Adderley e Sonny Rollins, aqui estão presentes todos os nomes que farão o jazz dos anos 70: Chick Corea, Herbie Hancock, Wayne Shorter, Joe Zawinul, John McLaughlin, Tony Wilians. Cool, sempre extra cool, Miles deixa que os outros brilhem. John McLaughlin, guitarrista que Jeff Beck considerava o melhor da história, é o solista que mais se destaca. Vindo do blues inglês, muito jovem, meio desconhecido, ele começa sua carreira no jazz neste disco. Daqui ele iria para o estrelato na sua Mahavishnu Orchestra. -------------------- No futuro toda nossa música será feita de modo individual. Um programa de AI, com seus dados, irá compor música só para voce, ao seu gosto. Mas, caso ainda haja espaço para música "em geral", Miles Davis será o cara a ser estudado quando se falar em música do século XX. Em meio a Bartok, Cole Porter, Beatles, Hendrix ou Rap, Miles Davis é o centro irradiador do espírito da época. Irriquieto, fértil, suave e demoníaco. --------------- Neste disco, há um momento, breve, em que Tony Willians se solta. Estranhamente a bateria é contida por quase todo o tempo, ela marca o beat de modo discreto. Então ela quebra essa regra e bate mais forte. Imediatamente meus pelos do braço se erguem e minha cabeça começa a balançar. Como em Agharta o duende se faz presente. Miles conseguiu de novo, tudo preparado para esse momento: transe. -------------- São quatro temas desenvolvidos em grooves que usam riffs curtos e simples de baixo e bateria. Três teclados rodam transitando entre e dentro desses riffs e a guitarra sola dando beleza à coisa. Os sopros, Shorter e Miles solam pouco e quando solam criam paz e equilíbrio na coisa toda. É um quase funk, um tipo de soul jazzístico. É como uma miragem. A música surge incorpórea e se desfaz em sopro. Sim, é uma viagem, mas não é música doida ou psicodélica, há controle aqui, precisão, o som é limpo, refinado. O duende surge apenas quase ao final, no momento em que Tony Willians ergue as baquetas e bate mais forte. Sublme é a palavra. ----------------- Alguns meses atrás eu falei que Agharta é o maior disco já gravado em qualquer estilo de música. In a Silent Way chega muito perto disso. E talvez seja melhor.

“Chameleon” - HeadHunters live in Bremen, Germany @ Musikladen: November...

O DISCO MAIS VENDIDO NA HISTÓRIA DO JAZZ....HERBIE HANCOCK, HEADHUNTERS

No folheto do cd, Herbie Hancock diz que foi ouvindo Thank You de Sly Stone que nasceu este disco. Após 13 anos tocando com seu sexteto, e com Miles Davis também, Herbie eletrifica seu som e lança, em 1973, este disco de jazz-funk. E claro que seus fãs puristas nunca o perdoaram por isso. ---------------- Interessante observar que 2022, a época da história que mais fala de diversidade, tem uma das trilhas sonoras menos diversificadas de todas. Claro que se voce for atrás voce achará músicas diversas. Basta procurar música do Qatar, da Etiópia, do México ou do Egito. Mas falo do mainstream, daquilo que vende, daquilo que será lembrado como o som de 2022. Sem preconceito, tudo soa parecido, quando não, igual. Basta assistir uma hora de MTV. Ou ouvir uma hora de rádio. Refrões que se parecem. Vozes que são idênticas. Batidas repetidas ao infinito. No mundo da diversidade, a música que vende nunca foi tão igual. ------------------- Ok, sou velho e falo como velho. So what? Em 1973, entre os 20 mais da Billboard havia hard rock, progressivo, funk, soul music, música POP hiper soft melosa, a pré disco da Philadelphia, country music, música de cinema, erudito, POP tradicional e esse tal de jazz-rock, que de rock nada tinha, era na verdade jazz-funk ou jazz elétrico. --------------- Jazz rock nasceu em 1970, com Bitches Brew de Miles Davis, disco gravado sob impacto do som de Jimi Hendrix. Depois veio Sly Stone e então a coisa pegou mais funky, mais groove. A lista de nomes é longa, John McLauglin, Jean-Luc Ponty, Jaco Pastorius, Jan Hammer, Spyro Gyra, Chick Corea, Stanley Clark, George Duke... a coisa veio pro Brasil: Sergio Mendes, Wagner Tiso, Azimuth, Hermeto... -------------- O que o diferencia do jazz é a amplificação. O som tem peso. O baixo tem muito maid destaque e a bateria é o centro do som. Todo bom disco de jazz rock tem um grande batera. É um dos estilos sonoros que mais marcaram sua época ( 1972-1979 ). O cinema usou muito. Não há filme cool que não tenha uma trilha sonora de jazz rock, geralmente de Lalo Schifrin ou de Quincy Jones. Aliás, até hoje filmes cool imitam esse som. A gente vê um cara planejando um roubo e já pensa num groove de jazz rock. David Holmes usa isso como nenhum outro. É um estilo que pega a elegância fria do jazz, mais soma à isso a malandragem do funk e a coisa teen do rock. Somando tudo dá um Steve McQueen ou um George Clooney. ------------------ Headhunters abre com Chameleon, um som hiper mega conhecido. Foi usado em centenas de comerciais ( Top Time...a loja do shopping Iguatemi que vende relógios ). Hoje seria uma trilha perfeita para filme de malandragem. Sempre será. Harvey Mason leva a batida na batera e Paul Jackson comanda no baixo. Bernie Maupin é o sax quase free. E Hebie usa piano elétrico, Moog, Oberheim, e tudo mais que tem teclas. Eu ouvi sábado passado numa loja. Comecei a balançar o quadril. Não tem como não balançar. Só se voce já morreu. Mas o resto do disco, são só 4 longas faixas, é tão bom quanto. Groove puro, é um dos discos mais influentes da história. ------------- Tem muita coisa chata no jazz rock. Ele propiciou que os egos perdessem freio. Solos sem sentido, chatos, repetitivos. Não é o caso aqui. Se voce quer conhecer o estilo ouça dois discos: este e Blow By Blow, de Jeff Beck. Não precisa mais nada.