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OS 10 PAÍSES MAIS INFLUENTES DA HISTÓRIA DO MUNDO

CEOWORLD MAGAZINE elegeu as dez nações mais influentes em toda história. Começo falando das duas surpresas: EUA e França não estão entre os 10. Weeellll....falemos dos EUA. Intelectuais americanos gostam de dizer que o jazz é o maior legado da cultura americana. Se for, então o país está mal. Sim, jazz é ótimo, eu adoro, mas é APENAS um estilo musical com 100 anos de vida, e que nesse tempo, mínimo em termos de cultura mundial, já entrou em decadência. O jazz usa instrumentos que não foram inventados nos EUA, improvisa sobre notações musicais e harmonias europeias e mesmo seus nomes mais hard ou hiper ousados têm como norte a música europeia de vanguarda. Se eu falar do rock a coisa é ainda mais gritante. O rock mudou a cultura de cinco décadas, mas cinco décadas significam o que, perante 5000 anos de cultura? Quanto à literatura, a americana deve quase tudo aos realistas russos. Ah sim, o cinema, essa invenção francesa que foi desenvolvida como arte na Alemanha e na França dos anos 20. Talvez o grande legado cultural dos EUA seja mesmo o jeans, porque mesmo a arte POP e a publicidade moderna são criações inglesas. -------------- A França é fato mais chocante não ter sido colocada entre os 10. Mas eu dou algumas razões: O iluminismo é inglês, o existencialismo nasceu no norte da Europa ( Dinamarca e Suécia ), o romantismo é alemão, e a pintura moderna foi feita por imigrantes que viviam em Paris. A arte francesa é rica mas não é criação gaulesa e se formos mais fundo, a França não descobriu países, não criou religiões, não organizou a cultura. Seu maior nome talvez seja Carlos Magno e ele foi um quase alemão que salvou o cristianismo mas não lhe deu novo rosto. Vamos falar então do número um, e se isso o surpreender será provado que voce anda meio fraco em cultura. Itália é o centro da nossa cultura planetária. É o número um. Precisa falar porque? Vamos lá.... Voce mora em um prédio? Concreto, cimento armado, arcos e colunas modernas, tudo foi criado lá. A ideia que fazemos de decoração também. A música que voce ouve, seja jazz, rock, funk ou eletro, começa na Itália. Foram eles que criaram a notação musical, a harmonia que entendemos, que codificaram a melodia, que inventaram 90% dos nossos instrumentos. Cantar acompanhado por instrumentos, algo que parece tão natural, é uma invenção da Italia. ( No oriente sempre se cantou com acompanhamento, mas ouça musica tradicional do Japão ou da China para voce entender de onde vem nosso gosto musical ). A Italia criou todo o nosso conceito de leis, de direito e de tribunal. A língua romana penetrou e formatou não só as línguas latinas como também deu ao inglês vocabulário e sintaxe. Mais, é na Italia que o cristianismo toma forma e se organiza e é lá também onde se criam os primeiros museus e as primeiras universidades. Nem preciso falar da renascença, movimento italiano que coloca o homem como centro do cosmos. Repare que apesar de não termos consciência disso, estamos cercados da cultura italiana. Por fim, nossa ideia de beleza nasce lá e sem a Italia a Europa jamais teria sido centro do planeta. ----------------- O segundo lugar é a Grécia e sim, somos pensadores gregos. Graças à eles, pensamos sobre a vida e sobre a morte sem colocar Deus no jogo, mesmo que creiamos Nele. Democracia é conceito grego e esportes também. Não falarei TUDO que devemos à Grécia porque voce conhece o assunto, gregos são louvados desde sempre. Provável voce ter pensado que eles eram o número um. A Italia é maior porque ela continua a influenciar por séculos e séculos enquanto os gregos param de ser relevantes após o século I. ------------- A Espanha é o terceiro país mais influente e basta pensar na descoberta da América e na consequente cultura espanhola espalhada do Chile ao Caribe, da California às Filipinas. É a Espanha ainda, quem nos dá o Barroquismo, o conceito de Don Juanismo, o fidalgo, que dará origem ao dandy inglês. Ela nos dá as ordens religiosas, a invenção do violão-guitarra, o estilo de vida dedicado ao sol. Mais importante, toda a cultura espanhola continua em crescimento, continua se desenvolvendo, espalhando sua influência em países que antes eram indiferentes à ela. -------------- India é o quarto lugar. Eu colocaria ela na frente da Espanha, mas acontece que a India não colonizou ninguém e colonizar é influenciar. A India criou nossos algarismos, inventou o conceito do zero. Tendemos a exagerar sua importância. Coisas como budismo ou a diversidade de castas são fatos restritos, não são mundiais. Há budistas no globo inteiro, mas apenas no Tibet são maioria. A India é estranhamente fechada em si mesma. ---------------- O próximo é a Thailandia e não serei leviano de comentar. Nada sei sobre essa civilização. Penso que esse lugar tão honroso se deva a sua cultura ter guiado todos os povos daquela região do planeta. ------------------ Falarei agora do sexto lugar. Surpreso e contente, vejo que Portugal, o pequeno país de 10 milhões de almas, ficou à frente de Inglaterra, Japão, China e Alemanha. Portugal meu caro, Portugal. Que honra! Mas por que? Eles criaram a navegação que possibilitou as descobertas. Foram os primeiros ocidentais vistos no Japão e os primeiros a criar embaixadas comerciais na India, na China, nas ilhas do mar Índico. Portugal expandiu o globo, meteu as caras no desconhecido, criou o conceito de DESBRAVADORES que hoje vive nos herois do espaço sideral. Deu língua e cultura ocidental a países da Africa e inventou o Brasil. Portugal tirou a Europa da Europa, expandiu o ocidente. Criou o comércio que faria a riqueza de Inglaterra e Holanda. Portugal inventou a ideia de globalismo. ---------------- Em seguida vem o Japão. A frente da China. Por que? Porque apesar de ter bebido a cultura da China, o Japão continua a crescer por séculos, a influenciar. É a gravura japonesa que influencia a arte moderna. É a tecnologia japonesa que muda a indústria. É o Japão quem cria o conceito de Zen e mesmo o budismo japonês é muito mais influente que o indiano. -------------- Agora a Inglaterra. Lá há o mesmo problema que há na França. Algumas coisas que pensamos ser inglesas não são. O comércio e a colonização é espanhola e portuguesa. A marinha é aperfeiçoamento de criações de Portugal. Na arte, o romantismo é alemão e o realismo é russo. As universidades são italianas, as leis idem. O gentleman nasce do cortesano italiano e do fidalgo espanhol. Então o que seria 100% contribuição inglesa? O iluminismo. A filosofia prática, que dá ao fazer preferência ao pensar. Pragmatismo. Essa a grande contribuição inglesa, pois mesmo a revolução industrial se acha espalhada, quase ao mesmo tempo, entre Belgica, Holanda e Inglaterra. Voce pode perguntar sobre o protestantismo, mas ele nasce na Suiça. Veja que interessante, tendemos a superficialmente pensar que muita coisa é herança inglesa, mas acabamos entendendo que o iluminismo e a consequente divisão entre coroa e parlamento são as grandes contribuições da Inglaterra. ------------------- O nono lugar é a China e o décimo a Alemanha. Alemães nos deram o romantismo, a super valorização do Eu. Como consequência disso, vieram o freudianismo e o marxismo. É na Alemanha que nasce a ideia do artista como ser livre, sem compromissos com a sociedade. Mas observe: O que significa isso diante de coisas como a descoberta da America ou a codificação de todas as nossas leis? Nada. Tendemos a pensar na importância de uma cultura olhando apenas aquilo que nos interessa. Então os EUA seriam imensos por terem criado a internet, mas esquecemos que para criar a net foi antes preciso criar o circuito integrado, a matemática mais moderna, a física quântica, o hardware. Pensamos que a culinária francesa é uma contribuição cultural imensa, mas esquecemos de quem inventou o queijo, o vinho ou o pão fermentado. Pensamos que a cirurgia plástica é um avanço magnífico, mas não pensamos que nosso ideal de beleza é grego e romano. Louvamos a Inglaterra por sua educação e seu modo de vida, mas não sabemos que essa educação e esse modo de ser foram implantados por reis que queriam viver em um país civilizado como era Veneza ou Milão. ----------------- Sem a cultura latina seríamos vassalos do mundo árabe ou vikings em rituais pagãos.

PELAS TRILHAS DE COMPOSTELA, O RELATO DE UMA VIAGEM LAICA - JEAN-CHRISTOPH RUFIN

   Rufin é diplomata e membro da academia francesa. Relata aqui sua primeira viagem à Santiago de Compostela, a pé, partindo da fronteira francesa e cruzando o país Basco, a Cantábria, Astúrias e por fim a Galizia. Rufin não é religioso, é francês, tenta ser objetivo. Começa a viagem falando de sujeira, frio, paisagens e fome. Com o tempo e os quilômetros, se torna humilde, se sente pobre, para de pensar demais, e tem quase uma experiência religiosa. Oviedo é a cidade que mais o impressiona e é lá que ele quase tem uma epifania. Mas ele a evita. Chama tudo de "budismo"... ( É engraçado como ateus fogem com nojo do cristianismo, mas aceitam alegremente o budismo ).
  Bem...o livro poderia ter sido bom, mas Rufin fica em cima do muro. Faz uma quase defesa do medievalismo, critica a modernidade, mas evita a igreja. O Caminho se torna assim uma busca pelo vazio budista. Penso ser o máximo a que um francês respeitável pode aspirar hoje.
  PS: Bela sacada dele! O pagão temia a mata e o deserto, reinos de deuses perigosos. O cristão, ao levar Deus consigo, se torna uma viajante sem medo.

POEMA DO CID, EM FORMA DE PROSA POR MARIA DO SOCORRO ALMEIDA

   Escrito em 1140, o poema do Cid é o primeiro texto conhecido da península Ibérica. Então, em letras, pode-se dizer ser nosso mais antigo testemunho. Antes dele houve A Canção de Rolando na França, e o mais revelador é dizer as diferenças entre um e outro, já que ambos são sagas sobre cavaleiros medievais. Heróis fundadores de uma nação.
  Rolando é nobre. E em toda a canção só há lugar para nobres. O sangue azul manda. E o rei, Carlos Magno é Deus na Terra. Nas aventuras tudo pode acontecer. Magia acontece, donzelas morrem de amor e na verdade Rolando deseja morrer. Nada de real ou de cotidianamente vulgar acontece. Como nobre, nunca se fala em dinheiro, luta-se por honra. O inimigo é ruim, incrivelmente ruim. E o mais importante, o tempo nunca passa, na canção todos terminam como começaram. No mundo de Rolando o bom morre bom, o mal morre mal, nada muda, nada pode mudar.
  Vamos ao Cid. Ele não é nobre. Ele é um pequeno burguês que almeja ser rico. Caído em desgraça diante de seu rei, ele luta contra os inimigos para readquirir sua honra perdida. No Cid há de tudo: nobres, gente comum, judeus, árabes, reis. Inexiste a magia, magos não há. As lutas são ganhas por estratégia e por força, e o mais incrível: o Cid luta para ganhar bens, dinheiro e ouro. Ele divide os ganhos com seus soldados, todos lutando por isso, para enriquecer. O inimigo não é de todo ruim, ele pode se tornar aliado. E o tempo passa, as pessoas mudam, os lugares são descritos, o Cid envelhece, se cansa, e até mentir ele mente. A saga da Espanha é real, a francesa é nobre. A espanhola admite tudo do homem, os erros, e nunca conta com a magia. A de Rolando é irreal ao extremo. A magia salva o bem, ninguém muda jamais e um herói é perfeito. 
  Há como fazer analogias com aquilo que os dois países são hoje? Não, ambos mudaram demais em quase 10 séculos de história e de misturas. Mas algo ficou. A França continua se vendo como reino da nobreza, de finura e de perfeição. Dogmática, empedernida, protegida pelos deuses.
  Na Espanha ficou essa consciência do possível. Do relativismo, do caldo de interesses e do dinheiro como motivo central de tudo. Deus atende a quem se sacrifica. E para vencer é preciso lutar, sofrer e se precaver. Vale tudo, pois nada o ajudará. Para o espanhol o mundo é de pedra. Para a França o bem vence sempre. O corajoso, o inteligente, o belo, vencerá. O mal, irredutível, tentará, mas a França vencerá. Sempre. Para o francês o mundo é ideia.

DO SENTIMENTO TRÁGICO DA VIDA- MIGUEL DE UNAMUNO

   O sentimento de tragédia nasce pelo fato de que a cabeça diz razão e a alma fala sentimento. Se a razão é cega para tudo o que não se mede, o sentimento precisa da razão para se expressar. Em termos, as maiores verdades não podem ser ditas, palavras não expressam sua força. O que sabemos mas não conseguimos sequer pensar, eis a maior das verdades.
  Este livro é árduo. Dificil. Unamuno assume o que todos sabem: a vida de mais sério tem a morte. Dois modos de viver: evitando pensar no fim. Ou crendo na vida eterna. No primeiro modo tudo perde relevância. Cada ato se faz futilidade pois não repercute, será imediatamente esquecido. Nada permanece, tudo é esquecimento. Unamuno diz que viver assim é impossível e que mesmo os que não acreditam na alma vivem como se tudo fosse continuar. Eis o consolo da história, dos filhos, da arte ou do conceito de clã. Houve uma sociedade assim: Roma dos césares, a mais materialista das sociedades. 
  No segundo modo tudo tem peso. Cada dia e cada ato irá ecoar por todo o sempre. Nada se perde, as coisas ficam, permanecem. A vida se torna grave, séria e trágica. Sentimentos, crises e nascimentos são eternos. 
  A razão reconhece o primeiro por ser ele calculável. O segundo a assusta por ser infinito.
  Talvez as mais belas páginas estejam no capítulo final. Unamuno defende a Espanha perante a Europa. A Europa, científica, apressada, fria e técnica contra a Espanha, que não é nem quer ser Europa, Espanha que é fascinada pela morte, que não reconhece o tempo, a pressa, o pragmatismo ou o trabalho. Espanha que salvou o catolicismo com a reforma, que descobriu continentes, que criou a figura do homem que crê e que faz da crença um mundo: o Quixote.
  Para Unamuno não importa se Deus existe. Importa querer que Ele exista. Viver na absoluta certeza é impossível. Todo crente duvida ou será apenas um fanático. Mas é preciso desejar Deus. Desejar que Ele seja possível.
  E com isso poder preservar aquilo que faz de nós seres à parte: a certeza da morte, a crença na alma e a ansia por eternidade. Pois o homem não se conforma com finais, com finitudes, com o ato em vão. Eis sua nobreza.
  Agir conforme essa crença, pesando consequências, eis sua moral.
É assim.

MIGUEL DE UNAMUNO. RAZÃO CONTRA CORAÇÃO. EIS A TRAGÉDIA DA VIDA.

   Reitor da Universidade de Salamanca, Unamuno é o intelectual central da Espanha entre 1900/1930. Com cultura enciclopédica, ele tinha como filosofia a dúvida. Escreveu poesia, teatro, romances e livros sobre filosofia. Seu ponto de partida é: O que é o homem? E nessa busca da realidade básica, ele mira o homem comum, o homem que é carne, instinto, desejo, vontade de ser, sonho. Aponta como erro da filosofia o fato de que ela parte do estudo da própria filosofia e não mais da vida. Miríades de elocubrações racionais que dispensam a experiência vivida, que negam o sentimento e a intuição. Unamuno aponta que existem duas vidas, aquela que é experimentada como ela de fato é, e a vida que tenta ser racional, que se afasta do coração e do instinto e pensa que a razão engloba tudo o que há. 
  Ora, quem me conhece sabe que essa é a minha maior fé. A razão conhece aquilo que lhe compete, criações racionais, ciência reducionista, tudo o que cabe dentro de seu raio de visão. Mas, eu, como Unamuno ( e tantos outros ), sabemos que a maior parte da realidade escapa a razão. Racionalistas fecham os olhos e querem não perceber esse limite da razão. Unamuno quer ver o que a razão deixa escapar.
  Somos trágicos porque vivemos o embate entre razão e coração. Não há a menor possibilidade de paz e nisso Unamuno é um pessimista radical. Crer na razão é desprezar o coração, crer no coração é desprezar a razão. Somos os dois. As vezes coração, muitas vezes razão. Em posts futuros falarei mais sobre este admirável pensador. Quero destacar aqui que ele tem logo no inicio da obra duas sacadas excelentes.
  Primeiro. Todo homem vive com a certeza de eternidade. Mesmo os ateus. Não fosse assim viver seria impossível. Não há como construir algo ( familia, amor, trabalho, arte ) sem a ideia de tempo que se estende. Quando alguém diz que a morte é o fim de tudo, em seu íntimo ele sente que essa morte está sempre distante. Assinar uma obra de arte, criar uma familia, tentar preservar a memória são formas sem religião de se imaginar um modo de se permanecer eterno. 
  Porque o assunto central da vida é a preservação da vida. É inimaginável ao homem algo como o nada, o absoluto vazio. E mesmo a ideia cristã de inferno nos é preferível ao simplesmente deixar de ser. Melhor viver queimando em dor que simplesmente deixar de existir. Passar pela vida sem deixar rastro, sem jamais ser relembrado, sem pensar em algo que justifique essa passagem, isso é o verdadeiro inferno. Todas as criações da razão, ideologias, ciência, arte, arquitetura, poder, diários, memórias, são tentativas de esquecer o vazio e o nada. 
  Pois dentro de nós há o imperial desejo de acreditar no sentido das coisas. A vida tem de ter um sentido e tem de se justificar na eternidade, na história. Sem isso ela não existe. Não será mais vida, será um tipo de doença febril sem porque. 
  Crer em Deus ou na alma é crer na vida então. Pois ao crer na eternidade nasce no homem a responsabilidade perante o eterno. Cada ato passa a ter o peso da memória sem fim. Observe, Unamuno não se preocupa se Deus e a alma existem ou não, o coração sempre dirá que sim, a razão sempre afirmará que não, o que importa é que ao pensar na eternidade, ao crer na consequencia de cada ato, o homem se torna dono e servo de uma ética e de uma moral. Sem essa fé, a humanidade perde seu prumo. Nada justificará o bem e tudo será relativo.
   Outro fato interessante nessas primeiras páginas é a constatação de que todo católico pensa apenas em si. A iluminação se dá na solidão da cela ou do horto. A salvação se dá a sós. Não chega a ser um egoísmo, pois não se dá a felicidade em detrimento do outro, mas é um egotismo, a salvação de cada um para o bem de todos.
  No protestantismo a salvação só é possível em grupo. A congregação, unida, se salva ou se perde. Um depende do outro. Pois bem, é esse tipo de visão histórica que falta aos ateus. Países protestantes têm sociedades ordenadas, limpas e de certo modo limitadas em impessoalidade. Católicos são mais anárquicos, desordeiros, individualistas, mas produzem personalidades mais brilhantes, geniais, sem regras. 
  Shakespeare só foi possível numa Inglaterra ainda papista. Como em seus países, Dante, Cervantes, Leonardo e Michelangelo. Gênios contidos, como Rembrandt, Ibsen ou Dickens são tipicamente protestantes. Não vamos esquecer que a Rússia assombrou o século XIX com Dostoievski e Tolstoi por ser ortodoxa. Hiper-católica de certo modo. 
  Unamuno pensa assim. Ele constata e não responde. Deus existe? Quem sabe? A vida é eterna? Aposte. Voce tem duas apostas: sim ou não. Qual a melhor aposta?

POR QUEM OS SINOS DOBRAM- ERNEST HEMINGUAY ( ELES DOBRAM POR TI )

   Primeiro esqueça a Espanha. Muita gente falava que este livro tinha "sabor espanhol". Não tem. O que tem é um enjoativo sabor de mel. Sim, já fui um fã de Heminguay. Posso até dizer que ele foi o primeiro escritor a que chamei de ídolo. Mas isso foi muito tempo atrás. O que restou é meu amor a um único livro seu, O SOL TAMBÉM SE LEVANTA, de longe o melhor, e a decepção com este, que é seu mais famoso livro e que acabo de reler. Se em 1992 eu havia me decepcionado com ele, agora, vinte anos mais tarde, a decepção foi idêntica. O amor entre o casal vivendo a revolução na Espanha dos anos 30 é piegas.
   O tempo foi cruel com Heminguay. Nos anos 50, ainda vivo, ele já era infinitamente menos considerado que Faulkner ou Fitzgerald. Quando ganhou o Nobel já parecia velho. E pensar que nos anos 20/30 ele era o exemplo para todo novo escritor. Porque?
   Heminguay parecia viver. Ele não era um arrastador de canetas. Ele namorava, bebia, viajava, lutava boxe, ia às guerras, desafiava a vida. E escrevia de um modo moderno, ou seja, simples, sem julgar seus personagens, sem adjetivos, direto. E que belos personagens pulavam de seus primeiros contos e de O SOL TAMBÉM SE LEVANTA! Eram reais, bem delineados, e falavam coisas aparentemente irrelevantes, mas cheias de sentidos ocultos. Ele era bom. Muito bom. E escrevia diálogos como ninguém. Mas então ele inflou. Começou a crescer demais e se apaixonou pelo Heminguay folclórico. Deixou de ser um escritor e virou um persoangem. Um tipo de dono do terreiro, de galo de briga, de papa das letras. Difamava colegas ( só tinha respeito por Tolstoi e Faulkner ), chamava-os de maricas, de enganadores, de invejosos. Juro que não é um mero chavão, mas a fama matou o escritor. E entre 1929/1960, nenhum autor era mais famoso que ele, mais famoso que Sartre, Camus e Bernard Shaw, mais do que Paulo Coelho ou Garcia Marquez são hoje. Então, súbito, os novos escritores dos anos 60 acabaram com ele. Heminguay deixou de ser modelo e virou espantalho. Seu machismo, sua arrogãncia, sua paixão pela caça e pelas touradas viraram defeitos. Ele se foi.
   Hoje, com distanciamento, dá para pensar em Heminguay como ele é, nem modelo e nem espantalho. Muito melhor ( em seus bons momentos ) que Steinbeck ou John dos Passos, léguas atrás de Fitzgerald e Faulkner. Provávelmente irei reler um dia a O SOL...., mas este POR QUEM OS SINOS DOBRAM deve ser evitado.

A VIDA É SONHO- CALDERON DE LA BARCA

O enredo: Um rei sabe através dos astros que seu futuro filho será um tirano. Assim que ele nasce, ele o deixa trancafiado em torre e sem saber quem seja. Mas, anos depois, esse rei sente dúvidas e resolve fazer um teste: narcotizar esse filho/prisioneiro e ver como ele se sai ao se tornar rei. Ele despertará e viverá como soberano por um dia. Se for um homem do mal, será novamente adormecido e ao acordar pensará ser tudo um sonho.
O que ocorre? Ele torna-se um rei sem limite, fazendo valer apenas seu desejo. Trancafiado outra vez, pensa que aquele dia foi um sonho, e com pesar, percebe não ter aproveitado aquele momento onírico. Sendo depois libertado por uma revolução popular, ele se tornará um monarca exemplar, pois agora tem a consciência de que "viver é um sonho, e cabe a nós viver o sonho com retidão, estar pronto para o despertar."
Calderon foi o grande dramaturgo espanhol do século XVII. Escreveu muito, teve imenso sucesso e como todo homem de seu tempo, viveu várias vidas ( soldado, poeta, padre ). Não fosse uma peça cheia de simbolismo, A Vida é Sonho tem ainda uma escrita admirável e uma fala que se tornou muito famosa:
Que é a vida? Um frenesí
Que é a vida? Uma ilusão
uma sombra, uma ficção;
O maior bem é tristonho
Porque toda a vida é sonho
e sonhos, sonhos são.

Ora, se a vida é sonho, então toda a ânsia por poder e por coisas transitórias nada vale. O que vale é a preparação para o despertar, levar consigo aquilo que é para sempre, que está além do sonho. Usufruir do sonho seria sonhar bem, e sonhar bem é ter consciência desse sonho onde se está. Século XVII... momento brilhante de nosso caminho rumo ao......

GUERRA!!!!!!!! ( TALVEZ ESTE SEJA MEU MELHOR TEXTO )

Frase de Thomas Mann: A Alemanha tem o direito de lutar por seus direitos de dominação e administração do planeta.
Frase de Freud: Eu dou toda a minha libido à Austria-Hungria!
Frase de Robert Musil: A guerra é bela e fraternal....

Alegremente, com sorriso no rosto e flores nas mãos ( dadas por belas moças ) soldados em 1914 foram fazer uma guerrinha logo alí. Pensavam que ainda era época napoleônica. Que se capturaria o general inimigo e se assinaria um pacto de não agressão. Quando abriram os olhos, após 4 anos de miséria, viram que dez milhões de jovens haviam morrido, e pior, que vinte milhões estavam destruídos para a vida, e pior ainda, que o mundo estava literalmente fodido.
Abriu-se uma chaga no psiquismo humano. O mundo ordenado de duques e condes, de burguesia que aspirava a ser "nobre" ruiu. O que veio foi a tomada de poder pelos revanchistas,´pelos radicais, pelos esquisitos. A Europa deixa de ser centro. Está esfacelada e dependente dos EUA. Fim.
Se o homem pode ser tão destrutivo e se a ciência pode ser tão danosa, se o bem que a era vitoriana anunciava era ilusório, e pior, se o europeu pode ser tão bárbaro quanto os povos dominados da África/Ásia; então tudo que nos resta é correr. Vamos beber, dançar, gozar agora, viver já, pois TUDO PODE SER DESTRUÍDO.
Pela primeira vez o homem vê o que significa DESTRUIÇÃO.

Arte e vida se tornam anúncio de destruição. Fé no homem, jamais outra vez.

Agora olho uma foto de outra guerra.
Nela, um grupo de judeus recèm libertos me olham. Livres de um lugar onde se matava industrialmente e com modos e motivos baseados na racionalidade. Eles me olham e mudos me acusam. A culpa não é dos nazis, nem dos alemães. Nazis e alemães são humanos como eu. A culpa é do mundo que construiu nazis e alemães. A culpa é do ocidente, da ciência, da filosofia, da arte, da América, de latinos e de nórdicos. A culpa é nossa.
Aniquilação final do psiquismo: o homem como monstro racional. A racionalidade como insensibilidade.
A segunda-guerra bateu forte demais. O mundo acabou alí. Hiroxima foi seu epitáfio.

Após o pesadelo o mundo acorda e nega esse sonho maldito.
Passado não mais. Eu e voce desistimos de pensar. Toda a velocidade à frente!!!!!
Se nós podemos construir uma máquina de matar e um matadouro humano, então só nos resta correr. NÃO SE APEGUE A NADA. NÃO ACREDITE EM NADA. TUDO É DO MAL.

Um amigo acabou de voltar da Europa.
Bacana, legal, aquele povo que festeja, consome e viaja por aí fazendo o bem em ongs.
Aquele insignificante povo, povo que sabe morar em lugar traumatizado, onde tudo é negação, onde se vive como bezerrinhos em boa manjedoura. Continente que morreu, sem futuro, onde tudo é um shopping de passado e um presente leve e irreal.
Que importância eles têm hoje?

O futuro se decide na América, na China, no Oriente.
Após a carnificina a Europa se tornou insignificante e irreal. Divaga em teorias, flerta com o nada, festeja a derrota. Moços e moças, tão bonitos, tão bonzinhos, tão sem destino, nada têm a acrescentar.
A terra de beethovens e de rembrandts é uma sala de azulejos e de aço: limpa, fria, onde se curam vícios, onde se dá um remédio.
A segunda-guerra nos aniquilou.
Europa é terra de impotências.

MAS.....
Há a taça de champagne bebida de manhã no campo francês. O sol nascendo e o cheiro das uvas no ar. Há para quem souber saber, o sabor do pão e da manteiga gordurosa.
Existe ainda um velho espanhol tomando sol na praça de Madrid. Ele ainda tosse e crê nos anarquistas. Mas esse velho fala entre ruínas. Quem passa é de pedra e de sal. Mas esse velho ainda fala e compra jámon na feira de rua. ( E como é linda a feira de rua ).
O Zé e o Luis ainda se jogam no rio Douro ( se fala Doiro ) na cidade que é um Porto. Ainda se pode fechar os olhos e ouvir as vozes que ecoam meus avós. "Ó Jórggge!", "Fala aí, ó Mánuel !!!"
Se voce souber ver existem migalhas de um mundo que já foi e ainda tenta o ser. ( Não consegue ).

Quando a primeira metralhadora disparou na Bélgica, não foram apenas vinte jovens franceses que morreram. Não foi apenas Jacques que deixou de beijar Marie, ou Ludovic que não mais escreveria à Isabelle. Aquela rajada fez com que eu não mais pudesse crer na bondade do homem, pudesse ter a certeza de que o mundo caminha para o bem e para a paz, e matou minha fé no cavalheirismo e na honra natural de todo bom cidadão.
Quando aquelas balas penetraram em Jacques e em Ludovic, penetraram em mim.

Que os olhares dos judeus me perdoem um dia.

ESPANHA

Cruzei os Pireneus e era madrugada escura. Parado em estalagem me servem um sanduíche. Uma baguette de um braço de comprimento. Pão duro, seco, e dentro um recheio de omelete, jámon, queijo e azeitonas. Um sanduíche monstruoso para cada um de nós. Para beber não havia água ou suco de nada. Vinho apenas. Um galão de vinho incrivelmente ácido.
Então continuar o caminho. E ficar surpreso ao notar que em Bilbao às duas da manhã as crianças ainda jogam bola na rua e as mães estão sentadas à fresca para fofocar. Ninguém dorme no verão da Espanha. Entenda, não se trata de balada, é vida familiar na madrugada. E quando amanhece a paisagem é desértica. Planície sem fim. Sem árvores, sem estradas secundárias, um vazio. Poderia ser outro planeta. Poderia ser outra época. É a Espanha.
Na cidade, uma da tarde tudo fecha. Tudo mesmo! Lojas, cinemas, barbearias, supermercados. Volta a abrir às quatro. Falo dos anos oitenta. Não sei se a Espanha hoje se americanizou. Se já se instituiu o almoço de 45 minutos. Mas até 1989 havia a siesta. Voce ia trabalhar às 10 e parava às 13. Voltava às 16 e saía às 22hs. Um espanhol não podia trabalhar oito horas diretas sem o sagrado direito de ficar 3 horas à mesa. Pegos de surpresa, nós turistas, portas cerradas em nossa cara, íamos almoçar longamente. Ou puxar um ronco no hotel. Lá a vida começa às 23 horas.
Espanha... foi a mais selvagem das colônias romanas. Não se entregava nunca. E depois se tornou mais Roma que a Itália. Berço de imperadores. Foi califado muçulmano. E se fez mais árabe que a Arábia. E quando católica foi mais beata que o Vaticano. A Espanha tem honra. Se é para ser alguma coisa, ela é até a morte.
E então tinha de ser ela a criar a mais revolucionária das descobertas: a América. Para voce ter uma idéia: descobrir um mundo insuspeito seria o equivalente, hoje, a encontrar vida em outro planeta. A Espanha inventa coisas esquisitas como a Argentina, exóticas como Cuba e mortais como o México. E ainda faz do sul dos EUA o espírito da nação mais rica do século vinte. Com a riqueza das américas, os espanhóis fazem o que todo bom espanhol faz com dinheiro: gasta. Torram fortunas em luxo, em festas, em guerras ridículas ( da qual saem sempre perdedores, olé! ). Mas não perdem a pose. Enquanto ingleses e alemães desenvolvem educação e indústria, os fidalgos espanhóis fazem procissões, conquistam senõritas e duelam pela honra.
Espanhóis que são mais dandys que os ingleses, mais sexys que italianos, mais briguentos que franceses, mas que, estranhamente, não são idealistas como os alemães. Na Espanha a vida é a verdade. É real, é crua, é sangue e fogo. Não é abstração. Tourada.
Não seja hipócrita! Fosse eu um boi eu preferia morrer lutando em arena, sem anonimato, que ser trucidado entre azulejos e em fila indiana. Como boi eu prefiro ser touro. A Espanha escolheu isso.
País da guerra civil, momento decisivo do século vinte. Pois se é para ser o mais católico dos povos, é também em Espanha que vivem os mais anti-católicos dos seres. Lá, quem é contra os padres cospe em igrejas e seduz freiras. Se peca. E vem a revolução. Queimam-se igrejas. Padres enforcados. Amor livre. Todos devem comer todos. Vale tudo. E vem a reação: hiper-conservadores criam o paredão. Pai mata filho. Filho mata avô. Na Espanha se decide o futuro do mundo. Se os socialistas vencem, o mundo será anarquista. Se vencem os conservadores, o futuro será fascista. É uma guerra como nunca mais se verá. Americanos, alemães, ingleses, canadenses, todos se alistam como voluntários. Homens e mulheres do mundo querem pegar em armas e defender a liberdade. Os governos fecham os olhos. Governos não defendem a livre-Espanha. Steinbeck, Heminguay, Hammett, Orwell, Dos Passos, todos lutam com fuzil. Mas os nazistas defendem a ordem e é nas terras espanholas que se treinam soldados alemães para a conquista da Europa. Bombardeios. Morte de civis. Bem-vindo ao mundo moderno. Tinha de ser na Espanha.
Nasce o ditador general. Francisco Franco. Modelo de toda ditadura latino-americana. Todo general quer ser Franco. E quando vem a democracia, todo socialista sonha em ser Filipe Gonzalez. Franco morre e milagrosamente a Espanha faz a transição sem dor. Os socialistas criam um esquerdismo light, educado, elegante, e o rei Juan Carlos manda os generais calarem a boca. Em 1980 a história do mundo ainda não se estagnara. Foi hora de heróis. Aqui nos brasís e nas colombias não nasceu esse líder. Pena...
Espanha que tem o maior romance da história, o Quixote, e o mais perfeito pintor, Velazquez. Espanha que inventou o modernismo com Picasso e Grís. País sempre sexual, com seus encapuzados, suas viúvas de preto, sua inquisição ( se é pra fazer, vamos que vamos!!!! ). De Lorca, de Unamuno, de Ortega y Gasset ( como são nobres esses nomes!!!! ).
Então voltei ao Brasil e namorei uma catalã. Ela tinha o nariz fidalgo das verdadeiras espanholas. Poucos amigos e muitos admiradores. E um eterno noivo, nobre e de boa família, claro. Eu lhe dava rosas vermelhas e lhe escrevia poesias ( péssimas... ). Fiquei doente de espanholismo. Falava ( calado ) " Ai mamazita como estou a sofrer!!!!!!!! ", " Trago entre os dentes a faca que me matará!!!!!", " Estou morrendo de amor, ai mamazita, como sou infeliz!!!! " Olé! Ela me telefonava. Ou chorava de ódio, ou falava com tédio e superioridade. Ela era como uma princesa orgulhosa. Eu lia poesia e ouvia Carmem. E pintei meu quarto de vermelho e amarelo.
É um privilégio ser espanhol. Ter esse orgulho e esse fogo apaixonado. Ser o dono do duende, a encruzilhada de arábia e do cristianismo. A elegancia do primitivismo, a ferocidade do paganismo. As coisas se resolvem lá, nascem lá, se aquecem por lá e é lá que a coisa termina.
Enquanto o mundo valer a pena ainda haverá Andaluzia, Castela, Galizia, Catalonia e Aragão. Bascos e Navarra. Quixotes e Sanchos, Goyas e Mirós, Bunuel e De Falla. Enquanto houver sangue haverá olé!