Mostrando postagens com marcador cecilia meireles. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador cecilia meireles. Mostrar todas as postagens

CECILIA MEIRELES

    Cecilia Meireles é uma daquelas autoras que deveriam ser hoje muito lidas. Para nosso tempo é ela um antídoto. Não porque seja ela "antiga", mas sim porque ela se debate com nossos problemas e dá a eles escapes poéticos. Cecilia era um anjo, era linda e tinha uma vocação poética gigantesca. Ela olha as coisas com olhos de eternidade. Seu mundo, que é o meu, não é feito de homens e de História, é antes mundo de pedras, formigas, ventos e de solidão, uma solidão que não é sózinha pois habitada pelo amor às coisas. Sagrado.
   Este minúsculo livreto contém crônicas de Cecilia. Mas serão crônicas ou poemas? São peças de sentimentos de poesia, diário sem data de vida em olhares claros. E como ela sabe olhar! Vê a vidinha boa de um cão amigo num tempo em que o amor aos cães ainda era esquisito. Aliás ela antecipa todo o tempo a onda verde, ela chora matas perdidas e paisagens corrompidas.
   E ela olha albuns de fotografias, vê o valor nos trabalhadores braçais, se indaga sobre a vida dos peões, imagina a existência dos bichos. Fala dos brinquedos e dos Natais mudados. Cecilia nos anos 50 já lamenta o comercialismo do Natal e pede o resgate do simbolismo original. E fala ainda da morte dos lutos, do fogo na floresta, chora um gato morto por moleques e se espanta com a dor de ter visto um cachorro doente e abandonado na rua. O sentimento dela vem dessas coisas, pois ela mesma sabe, ela é o cachorro velho e abandonado, ela é o gato judiado, ela é a floresta que queima. E é também a criança do Natal, a alegria dos brinquedos, as fitas que enfeitam os vestidos.
   É doce ler Cecilia, é doce é triste. É lindo.

ANTOLOGIA POÉTICA- CECILIA MEIRELES- VOCAÇÃO PURA

Existem poetas que não são poesias. São aqueles escritores que parecem fazer poesia de fora. Eles conseguem mergulhar na poesia, mas nunca se parecem poesia. Escrevem sobre algo que não está neles. Desejam a poesia.
Eliot, Wallace Stevens, Pound são eruditos da palavra, são filósofos da vida, são poetas da existência e do tempo. Mas não são poesia. E o fato de serem sublimes ( considero Eliot o maior poeta dos últimos 200 anos ) mostra que não estou julgando talento, estou tentando explicar um estado de alma. Talvez os poetas que não são poesia sejam mais filosóficos.
Assim como Keats ou Rilke, Cecilia Meireles é pura poesia. Tudo em que ela emprega sua atenção se faz verso. Ela é encantadora.
Como elogiar o bastante esses versos que sinto serem perfeitos? Frases que me dão lágrimas e fazem com que brote vida no papel e na tinta. O que posso dizer?
Leia.
Leia Cecilia. Leia essa elegia que ela fez para a avó morta, uma sucessão de imagens belíssimas e de uma dor de verdade. de saudade, de solidão. Ela consegue ver a poesia ao redor de tudo, ela canta a dor de saber que os olhos não mais verão as coisas.
Mas há tanto mais. A poesia em que ela chora a morte de uma borboleta, aquela que louva uma cigarra, a amorosa canção para jumentos, para cães, para amigas.
Cecilia escreveu um poema sobre sua primeira infancia que é tudo aquilo que pode ser sentido sobre todas as infancias. E ela não se perde, ela avança em cor e em música, a gente lê com gosto, com emoção, com felicidade.
Maravilhosa Cecilia, me digam, quem foi essa mulher? Voces entendem agora? Ela não fazia poesia, ela não escrevia versos, ela é poesia. Cecilia me lembra árvore.
Há muito de Lorca nela. Luas, verdes, rios, galos. Mas ela é mulher. Ela é fértil. As coisas nascem nela, suas palavras fazem brotar vida.
Mas Cecilia fala muito de morte. E a morte em Cecilia é passagem, é despedida, é mistério. Transcende.
Eu adoraria citar versos e versos, transcrever sua obra, inteira. Ela não tem poema fraco, ela é sem erros. É incapaz de não fazer luz.
Como a borboleta ela é lagarta e voa, como o jumento ela é nobre, e como a água ela traz e leva embora. Lua grande em céu pequeno.
Eu amo Cecilia.