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MOBY DICK E A FRAUDE
Não pense que o excesso de filmes de HQ, biografias ou "baseados em fatos reais" seja um acaso. O mundo nunca foi tão covarde e produzir algo que já tem um nome, uma grife, já é conhecido, já existe, é muito mais seguro. Um projeto sobre o cantor X ou sobre a tragédia Z, traz em si uma garantia de repercussão que um roteiro totalmente original não traz. Fazer um filme baseado em título literário famoso também garante alguma repercussão. -------------------- Grandes livros não dão grandes filmes. É uma verdade que tem várias excessões mas que mantém média alta. Os grandes romances da história não dão grandes filmes, e muitas vezes nem mesmo filmes bons ou passáveis. Cervantes, Stendhal, Hugo, Balzac, Proust, Joyce, Thomas Mann, Faulkner, Heminguay, Flaubert, nenhum desses autores tem um filme que lhe faça justiça. Alguns são desastres absolutos, DOM QUIXOTE, outros deram filmes até que interessantes, mas completamente infieis ao livro. Penso em Heminguay cujo ILHAS DA CORRENTE é um bom filme, mas bastante distante do romance. ------------------- Mesmo autores contemporâneos sofrem no cinema. Bellow, Updike, Roth, jamais tiveram um filme digno de sua obra e Tom Wolfe teve a sorte de ver OS ELEITOS-the right stuff, ser um muito, muito grande filme. Chegamos pois às excessões. TOM JONES é um filme digno do livro e que capta algo de sua verve. Shakespeare tem alguns filmes que souberam usar sua obra e que não passam vergonha quando comparados ao original. ( Porém há uma reparação: teatro é mais adaptável ao cinema que o romance ). Dois nomes se destacam: Jane Austen, que se dá muito bem em fimes e Henry James, o que é uma incrível surpresa, haja visto que sua obra é tão interiorizada. Penso que Austen se adapta bem por ter algo que o cinema ama: bom enredo, e James foi um caso de sorte, os filmes que deram certo foram escritos por gente que realmente o entendia. ------------------------ Chegamos ao tema: MOBY DICK. Há uma versão de John Huston que luta por ser fiel e não consegue ser. Huston tem como último filme de sua obra o filme OS MORTOS, um milagre de filmagem baseda em conto superlativo de James Joyce. Mas MOBY DICK não pode ser filmado. Quem o leu sabe disso, o romance de Herman Melville é um pesadelo feito de escuridão e de linguagem bíblica. Tudo nele parece uma acusação e não há modo mais perfeito de se entender a raiz da civilização americana que esse livro. Transpor MOBY DICK para a tela é impossível. Em imagens a riqueza verbal se torna um tipode cliché gótico. Eu gosto do filme de Huston, mas é uma falha que entretém, sempre uma falha. ---------------- Ontem vi outra versão do livro, um filme que era muito raro mas que o DVD nos trouxe de volta. Feito pela RKO em 1930, dirigido por Lloyd Bacon, o filme traz John Barrymore como Ahab e ver Barrymore é sempre um prazer gigantesco. Mas o filme, como é? ------------ Se voce leu o livro irá rir agora. Ahab é o atlético capitão de um navio, beberrão e mulherengo ( ou seja, é Barrymore ), que se apaixona por linda moça do porto de New Bedford. Ela corresponde e tudo parece bem. Mas a baleia arranca sua perna e ele se torna amargo. Sim meus queridos, MOBY DICK se torna uma hsitória de amor trágico. Mas!!!!!! Eu não posso atacar o filme e não devo. Porque ele é bom, é divertido e tem um saboroso gosto gótico. Os cenários são perfeitos, têm neblina, parecem sujos, escuros, úmidos. O filme cheira a bar de porto, a rum, a maresia. E mesmo a baleia é feita com surpreendente convencimento. Os efeitos são bons para sua época. O filme, malandro, usa o nome famoso e nobre: MOBY DICK, para atrair seu público, mas de MOBY DICK nada tem. Nada mesmo!!! Ou melhor, tem uma baleia e um cara chamado Ahab. Fazem o mesmo hoje com filmes que usam nomes como NICK FURY, FAUSTO, ROMEU E JULIETA, MILES DAVIS, OSCAR WILDE e que nada têm a ver com seu título. --------------------- Por falar em Oscar, vi Dorian Gray, a versão de 1946 e devo dizer, um belo filme de suspense, mas é tão Oscar Wilde quanto ZORBA O GREGO é Kazantzakis. Nada. Oscar Wilde sem artificialismo e fortes tintas gays é tão vazio como fazer biografia de ídolo do rock sem paixão por música e longas cenas musicais. Opa! É o que se faz.
MOBY DICK, HERMAN MELVILLE
Meu nome é Ismael.
É desse modo que começa esse romance. Um dos 3 melhores começos de livro que já li. Moby Dick é vasto como um país, e assim como Whitman na poesia e Emerson no ensaio, Melville faz no romance o parto da América. Na busca febril de Ahab pela baleia se antecipa a busca de uma nação pelo controle do irracional, pelo poder sobre a natureza e da riqueza mítica.
A linguagem é a língua "americana", ou seja, a língua do púlpito. A leitura em voz alta seria ideal, mas se você ler silenciosamente, imagine sempre um leitor no alto de um estrado e vários ouvintes em bancos de madeira. Melville escreve não para o leitor, ele escreve para Deus, e esse Deus é vingativo, cruel, duro, como o mar.
Este livro parece escrito com lama, lodo, sangue e gordura de baleia. É desagradável, muitas vezes chato, fechado em seu mundo escuro, frio e tenebroso, violento. A luz custa a surgir e quando surge logo morre.
Moby Dick, como todo grande livro, é um universo completo, ele se basta e apesar de muito influente não deixa filhos. Único.
PS: Os outros inicios são os de Anna Karenina e de O Caminho de Swann.
É desse modo que começa esse romance. Um dos 3 melhores começos de livro que já li. Moby Dick é vasto como um país, e assim como Whitman na poesia e Emerson no ensaio, Melville faz no romance o parto da América. Na busca febril de Ahab pela baleia se antecipa a busca de uma nação pelo controle do irracional, pelo poder sobre a natureza e da riqueza mítica.
A linguagem é a língua "americana", ou seja, a língua do púlpito. A leitura em voz alta seria ideal, mas se você ler silenciosamente, imagine sempre um leitor no alto de um estrado e vários ouvintes em bancos de madeira. Melville escreve não para o leitor, ele escreve para Deus, e esse Deus é vingativo, cruel, duro, como o mar.
Este livro parece escrito com lama, lodo, sangue e gordura de baleia. É desagradável, muitas vezes chato, fechado em seu mundo escuro, frio e tenebroso, violento. A luz custa a surgir e quando surge logo morre.
Moby Dick, como todo grande livro, é um universo completo, ele se basta e apesar de muito influente não deixa filhos. Único.
PS: Os outros inicios são os de Anna Karenina e de O Caminho de Swann.
TAIPI, PARAÍSO DE CANIBAIS- HERMAN MELVILLE
Melville foi um jovem azarado. Familia empobrecida, ele não conseguia se destacar em nada, muito pelo contrário. Fez então aquilo que todo jovem de então fazia, quando queria ter nova chance na vida, se lançava ao mar, fosse marinha mercante ou militar. Decepcionado com a rotina dura e seu comando cruel, ele foge do navio onde servia. Se embrenha nas ilhas Marquezas durante uma parada e passa a viver por um mês em meio aos canibais. De volta a América, conta sua aventura a familia e amigos. As pessoas gostam tanto que ele a escreve. Tem problemas de censura para publicar, o livro sai em Londres e é um sucesso. Começa a carreira daquele que é para muitos o maior romancista dos EUA.
O século XIX foi pródigo em livros sobre o mar e suas aventuras. Vindo lá de Defoe, ainda no século anterior, Stevenson, Conrad, London, escrevem século adentro e irrompem até os anos de 1900 com seus relatos. Livros que li desde sempre, livros de piratas, de tempestades e ilhas desertas, de noites sem fim, de provas cruéis. Nos primeiros capítulos desta aventura há todo esse clima de mar e de mistério. Mas são poucos esses capítulos, 3/4 do volume fala da impressionante caminhada através da ilha e depois de seu convívio entre os "selvagens". O herói central e seu companheiro de fuga cruzam montanhas, cachoeiras, rios. Passam fome, se acidentam, chuvas torrenciais. E o medo constante dos canibais.
Acabam seduzidos pela vida desses homens. A visão de Melville é radicalmente à Rousseau. Os aborígenes são felizes. Melville exalta a beleza das nativas, a nudez, o sexo livre. A preguiça, os objetos que nunca são cobiçados, o nada ter e nada querer. Risonhos e livres, Melville os contrasta não só com os europeus e americanos, como com os nativos do Hawaii, esses já decadentes, sujos, doentes pelo contato com os missionários e colonos. Melville não deixa de sentir a melancolia por saber que aquela vida, bela, é condenada.
Como nem o paraíso pode ser perfeito, o narrador tem um grande medo em meio a tanto prazer: o canibalismo. Ele nunca presencia atos de canibalismo, mas tem medo de que sua acolhida faça parte de um tipo de preparação, de ritual. Passam-se 4 meses e ele acaba por fugir. Jamais será o mesmo.
Melville nunca atinge aqui as alturas dificeis de Moby Dick, livro que ele escreveria seis anos mais tarde. Mas é uma delicia ler suas descrições de corpos, festas, familias, chefes e cantos. Melville já valoriza aqui, em 1844, a higiene dos nativos, a beleza da morenice, a inocência que pode haver no sexo livre, a alegria de um mundo sem dinheiro. Ele chega a testemunhar sexo a três, e causa diversão vermos hoje, em 2013, que aquilo que mais o revolta são as centenas de tatuagens tribais. E também o peixe crú.
Divertido, documental e irado, um belo livro.
O século XIX foi pródigo em livros sobre o mar e suas aventuras. Vindo lá de Defoe, ainda no século anterior, Stevenson, Conrad, London, escrevem século adentro e irrompem até os anos de 1900 com seus relatos. Livros que li desde sempre, livros de piratas, de tempestades e ilhas desertas, de noites sem fim, de provas cruéis. Nos primeiros capítulos desta aventura há todo esse clima de mar e de mistério. Mas são poucos esses capítulos, 3/4 do volume fala da impressionante caminhada através da ilha e depois de seu convívio entre os "selvagens". O herói central e seu companheiro de fuga cruzam montanhas, cachoeiras, rios. Passam fome, se acidentam, chuvas torrenciais. E o medo constante dos canibais.
Acabam seduzidos pela vida desses homens. A visão de Melville é radicalmente à Rousseau. Os aborígenes são felizes. Melville exalta a beleza das nativas, a nudez, o sexo livre. A preguiça, os objetos que nunca são cobiçados, o nada ter e nada querer. Risonhos e livres, Melville os contrasta não só com os europeus e americanos, como com os nativos do Hawaii, esses já decadentes, sujos, doentes pelo contato com os missionários e colonos. Melville não deixa de sentir a melancolia por saber que aquela vida, bela, é condenada.
Como nem o paraíso pode ser perfeito, o narrador tem um grande medo em meio a tanto prazer: o canibalismo. Ele nunca presencia atos de canibalismo, mas tem medo de que sua acolhida faça parte de um tipo de preparação, de ritual. Passam-se 4 meses e ele acaba por fugir. Jamais será o mesmo.
Melville nunca atinge aqui as alturas dificeis de Moby Dick, livro que ele escreveria seis anos mais tarde. Mas é uma delicia ler suas descrições de corpos, festas, familias, chefes e cantos. Melville já valoriza aqui, em 1844, a higiene dos nativos, a beleza da morenice, a inocência que pode haver no sexo livre, a alegria de um mundo sem dinheiro. Ele chega a testemunhar sexo a três, e causa diversão vermos hoje, em 2013, que aquilo que mais o revolta são as centenas de tatuagens tribais. E também o peixe crú.
Divertido, documental e irado, um belo livro.
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