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NOVO AEON - RAUL SEIXAS....SIM, É RAUL E É SEIXAS

Eu nunca ouvi Raul Seixas. Quer dizer, eu ouvi o que era obrigado a ouvir. Ele estava sempre na TV entre 1974-1977 e no rádio. Então eu ouvi muito dez ou doze canções dele que todo mundo ouvia. Mas eu não gostava dele. O achava sujo, feio, de mal gosto. Sim, sempre fui um esteta. Fresco até o umbigo. ------------------- Tenho uma amiga que tem um pai de 65 anos. Nascido no Ceará, pobre de doer, ele veio para São Paulo em 1980 e morou em barraco de tábuas. Passou fome. É do povão. Pois bem. Esse homem adora forró, música brega e Raul Seixas. Sabe tudo de Raul decorado. Canta Raul. ----------------- O rock brasileiro pós anos 80 sempre foi elitista. Salvo poucas excessões, era feito por jovens filhos da elite e escutado por jovens que se viam como elite. Nunca conseguiu atingir o povão. ( Mamonas Assassinas conseguiram e eles sempre me lembravam Raul Seixas em versão idiota ). Mas não é só isso. Cazuza, Renato Russo, os Titãs parecem terrivelmente pobres, em som e em letras, se os compararmos com este disco. Novo Aeon seria um disco perfeito se não fosse uma faixa muito ruim, Caminho II, mas mesmo assim é um disco que humilha Arnaldo Antunes ou Humberto Gessinger. É de uma riqueza de som e de verbo que somente um homem especial poderia atingir. Raul é o único gênio na história de nosso rock. E, esperto, atingiu o povão sem forçar nada. Sua arte era incrivelmente natural, portanto, brasileira. ------------------------ Fico espantado em imaginar que pessoas semi analfabetas escutassem algo tão belo e bem escrito como A Maçã, uma obra prima completa sobre a relação homem e mulher. Ou a anárquica mensagem de Fim de Mês, uma festa de rimas não óbvias em ritmo do nordeste do Brasil. Ele antecipa a mangue beat. Tente Outra Vez é heroico, Rock do Diabo é rock de primeira, Eu Sou Egoísta é grito de independência, e Tú És o MDC da Minha Vida tem uma letra que me deixou muito, muito surpreso: Caramba!!!!! O cara era bom!!!! O cara era muito muito bom!!!! --------------------- Descobrir Raul Seixas na idade em que estou, ver que uma faixa como Sunseed parece o indie dos anos 2000, faz de mim um provilegiado. Chegar aos 60 anos tendo a chance de ouvir a obra de Raul PELA PRIMEIRA VEZ não é pouca coisa. Portanto, TOCA RAUL! digo bem alto agora para quem estiver por aí.

TOMMY, NA VERSÃO PARA ORQUESTRA DE 1972

2021, o ano que passei ouvindo música erudita mudou meu modo de escutar os sons. Entenda, eu ouço Liszt ou Mozart desde os 15 anos, mas em 2021, a coisa chegou mais ao fundo. Tanto que após esse ano citado eu tenho imensa dificuldade em escutar música muito simples ou mal tocada. Bem...então vamos à Tommy. --------------- Voce conhece a versão original, de 1969, maravilhosamente semi acústica e com ataques de bateria vibrantes. Talvez conheça a trilha do cinema, no geral bem pior que a original, apesar de Sally Simpson e Sparks estarem melhoradas em 1975. Mas provavelmente voce desconheça a versão luxuosa, lançada em caixa com libreto de 1972. Saiba que ela atingiu o segundo posto nas paradas inglesas e a versão de I'M Free exitente aqui chegou a tocar no rádio do Brasil. ---------------------- Em 1972 o mega produtor Lou Reizner pegou a partitura de Tommy e convenceu Pete Townshend a autorizar a versão sinfônica da obra. LP e CDs são dificeis de achar, mas ontem o comprei e logo escutei. Eu esperava uma coisa divertida e brega e me deparo com uma obra divertida e maravilhosamente linda. ----------------- Primeiro o som. Logo de cara voce tem um choque. O disco foi gravado em quadrifonico e isso lhe deixou um ataque que mesmo em cd se mateve algum vestígio. A orquestra soa límpida, poderosa, imensa. Sim, quem conhece música erudita percebe a extrema simplicidade que a música POP tem. Numa peça clássica, qualquer uma, notamos que a orquestra é usada em sua totalidade, o ilimitado poder de seus sons é explorado. Não aqui. Como acontece com trilhas de cinema, a melodia é simples e a orquestra faz seu trabalho sem qualquer esforço. But....simples sim, porém belíssimo!!!!! Amazing Journey, Sparks, Welcome, têm aqui suas melhores versões. elas crescem e atingem uma riqueza magnífica. O elenco tem Ringo Starr fazendo o jogador, um John Entwistle assustador cantando uma versão de terror assustador de Fiddle About. Stevie Winwood, do Traffic, faz o padastro, e Rod Stewart, no auge da fama, canta Pinball Wizzard. Aliás, era para Rod fazer Tommy, mas Roger Daltrey, que não punha fé no projeto, voltou atrás e pegou Tommy, graças a Deus, Rod é ótimo mas Tommy é de Roger forever. --------------- Qual Wizzard é melhor? Elton no filme ou Rod com sinfônica? Empate. São tão diferentes uma da outra que é impossível comparar. ---------------- Maggie Bell, grande cantora da época faz a mãe e Marry Clayton, a cantora negra que em Let It Bleed cantou Gimme Shelter com Jagger, humilha Tina Turner. Acid Queen com Clayton é uma das coisas mais belas já gravadas. -------------- Eu tinha certeza que o desastre viria com a faixa Sally Simpson, minha música favorita na versão em filme 1975. Cantada por Pete e com guitarra de Clapton, ela é imbatível. Como transpor açgo tão rock para uma sinfônica? Seria ridículo!!!!! Mas...funciona!!!!!! Como? Pete canta a melodia exatamente como no original de 1969, mas o acompanhamento se faz uma outra coisa. A orquestra não tenta imitar uma banda de rock, ela teve um novo arranjo a seu dispor e o que ouvimos é soberbamente lindo. Eu postei a versão de 1975 e a orquestral. As duas são perfeitas. ---------------- Após ouvir este Tommy minha admiração por Pete é ainda maior. Quanto prazer em escutar isto!!!!!

HORA DE REESCUTAR OS ROLLING STONES

Fazia bastante tempo que eu não ouvia os primeiros discos dos Stones. Aqueles gravados entre 1964-1965. Coisa velha né. Pra voce pensar: estamos a 59 anos desses discos. Seria como se em 1964 um fã dos Stones ouvisse um disco de 1905! Os Stones fazendo shows hoje, em 2023, é o equivalente a um show em 1965 de um artista que começara em 1905. Nascido em 1885. Consigo pensar apenas em Stravinsky ou Ravel. ------------- Como foi ouvir essas velharias outra vez? Um prazer. Mas algo mais. A constatação, mais uma vez, de que em 1964 não havia nada nem remotamente parecido com os Stones. Para voce comparar: nos EUA era tempo de Beach Boys, Ventures e o Dylan folk. Na Inglaterra era Beatles, Kinks e Animals. ------------- Os Beatles gritavam também tinham seus momentos e barulho. Idem os Kinks. E os Animals, como os Stones, também tinham fixação pelo blues e pelo soul. Mas não há como comparar. -------------- Como eram então os Rolling Stones em 1964?--------------- Faça um exercício. Vamos a tal essência de Schopenhauer. Abstraia tudo que voce ouve hoje. Volta ao início. Lá em 1964. Mundo de Hermans Hermits, Dave Clark Five, Tom Jones e Shadows. Então coloque pra ouvir I'M A KING BEE. Pronto. Mick Jagger com um sotaque cockney absurdo. Sempre cantando mal. Mas estranhamente funcionando. E porque funciona? Porque ele é diferente de tudo que havia então. Ele não canta, ele performa. E o que ele traz é sexo. Explícito. E isso, fora do gueto da música negra, entre brancos, era inédito. E era muito perigoso. ------------ Mas há mais. Keith e Brian não são guitarristas tão bons como Clapton ou Beck, mas eles eram mais selvagens. O modo como eles cutucam, fazem zumbidos, persistem, criam riffs, instigam os quadris, complementa a voz de Mick. Seria impossível haver a mesma magia se o cantor de Keith e Brian fosse Lennon, Van Morrison ou Eric Burdon. E saiba que todos esses três cantam melhor que Mick Jagger. Mas não são Jagger. ----------- E no fundo há a sessão ritmica. Charlie e Bill. Voodoo. --------------- Sim, os primeiros discos são uma banda querendo apenas homenagear seus ídolos e ter namoradas. Jamais eles imaginaram ser o que são. Uma banda imortal. Mas são. E não há banda na história que deu mais certo. 60 fucking anos!!!!! E ainda rola. Um milagre.

BUDDY RICH E A BATERIA NO JAZZ

Se voce for um cara acostumado a só ouvir rock, não precisa mentir, bateristas de jazz não te impressionam em nada. Isso porque a escola de rock de bateristas dá valor aquilo que jazzistas não dão. Explico citando 4 bateristas de rock. ------------------ Jimi Page, esperto ao extremos, construiu todo som do Led Zeppelin ao redor da bateria de John Bonham. Se voce ouve bandas de 1970 e depois ouve o Led irá notar que a grande diferença está na mixagem da bateria. O Led Zeppelin é a primeira banda a dar protagonismo absoluto à bateria. Isso lhe deu modernidade eterna. Todo rock moderno é um rock de percussão. Então temos aqui a primeira característica do rock que não existe no jazz: volume de bateria. Não esqueça, o jazz nasce e cresce como um som acústico, sem amplificação. Bateristas não podiam tocar alto, se o fizessem engoliriam baixo, piano, metais, vocais. Chegavam a colocar cobertores e travesseiros nos tambores para diminuir o som da percussão. Portanto, se voce acha que um bom baterista é aquele que toca alto, esqueça o jazz. -------------------- Keith Moon é outro grande batera do rock, famoso por variar o tempo e se jogar a improvisações que jamais terminam. Keith era fã de Gene Krupa, o primeiro batera do jazz que virou estrela. Realmente os dois se parecem mas Krupa fazia algo que Moon nunca fazia: mantinha o tempo. A lei central do batera de jazz é jamais sair do ritmo. Se é 4 por 4 ele será 4 por 4. Isso porque piano e metais irão solar e se a batera e o baixo não segurarem o ritmo tudo vira bagunça sem sentido. Moon não ligava pra isso, ele deixava o tempo para Entwistle e até mesmo Townshend, por isso a guitarra no The Who sola quase nunca. Pete tinha de segurar aquilo que Moon não segurava. ---------------- Quem ouve apenas rock valoriza essa doideira barulhenta tipo Moon. No jazz isso não existe. Outro batera que cito, e este é fã assumido de Buddy Rich: Neil Peart. Grande batera, ele faz viradas impossíveis, usa todos os duzentos pratos, tambores, caixas de seu kit e parece nunca se perder. Mas, ao contrário de Buddy Rich, Neil Peart não tem swingue e não há melhor maneira de ver isso que assistindo sua homenagem à Buddy Rich. Ele toca igual à Rich, mas é completamente diferente. Ouça. --------------------- Ginger Baker e Mitch Mitchell se achavam bateristas de jazz. E quase eram isso. Mas Mitchell tocava um pouco alto demais e Baker se perdia ás vezes em tempos errados. --------------- Entenda: eu adoro Bonham, Moon, Neil etc, mas eles são do rock, quando os ouço eu quero ataque, fúria, caixa no talo, velocidade. Então pergunto: ao ouvir Buddy Rich, considerado o maior batera que já existiu, o que procuro? Fluidez, ritmo, swingue, beat, tempo exato, sutileza, viradas sem perder o beat. Bateristas de jazz dão duzentas batidas na caixa por minuto e nós mal percebemos isso. Bateristas de jazz movem o pulso e não o braço. Os pratos são usados para manter o tempo e não como ataque. Os pedais são como relógios e não marcação marcial. Principalmente, um bom baterista de jazz ajuda os solistas, dá um rumo à eles, jamais os deixa sós. Buddy Rich fazia tudo isso e solava com hipnótica precisão. Veja.

VOCE CONHECE ROY BUCHANAN?

Roy Buchanan era louco e sua música mostra isso. Americano do sul, ele era o guitarrista favorito do maior guitarrista do rock, Jeff Beck. Roy passou toda década de 60 e 70 tocando em singles obscuros, lançando discos que não venderam, fazendo shows em botecos. Quando nos anos 80 houve o leve modismo do blues, Roy não se beneficiou disso, seu som era áspero demais, não tinha a redondez de Steve Ray Vaughan e nem a comunicabilidade de Robert Cray ou de George Thorogood. Mas eu digo, Roy era melhor que todos eles. Bem melhor. --------------- Em 1988 ele foi encontrado morto numa cela de prisão, enforcado. Suicídio ou vingança de algum policial, ele morreu ainda desconhecido e hoje não é figura cult chique. Seu visual não ajuda, ele parece um caixa de banco de alguma cidade do sul do Arkansas. Mas ao escutarmos eu som....Roy é considerado o cara que tirou o som mais original da Fender e seu toque é inconfundível. Percebo algo de Jeff Beck nele, mas é diferente, Roy é mais difícil de ouvir, menos POP, mais metálico. Não há como o confundir com outro. ----------------- Guitarristas que se mantiveram no underground viveram sempre em perigo. Todos afundaram em alcool, heroina e crime. Rory Gallagher viveu isso. E Rory foi um monstro. Bandas em grandes excursões são cuidadas, mimadas, os promotores não podem perder seu investimento, mas o caras que tocam em boteco...esses vivem no olho do furacão. Roy Buchanan não sobreviveu para ter tempo de ser reconhecido. Fica seu som, poucos cds que passaram despercebidos. Descubra-o.

EXISTEM CANÇÕES QUE MUDAM O MUNDO. POUCAS FAZEM ISSO. ESTA FEZ.

Existem canções, poucas, raras, que podem mudar a vida de uma pessoa. Basta as escutar na idade e no momento certo. Elas nos fazem mudar nosso gosto musical, nossa maneira de ver o futuro, nosso comportamento. ARE FRIENDS ELECTRIC? do Tubeway Army, banda de Gary Numan, mudou toda a música inglesa em 1979. E aqui no Brasil, os poucos que a escutaram, enlouqueceram. Passamos a ter mania por robots, computadores, emoções sob controle, distanciamento. Era o romantismo dos anos 80 que se anunciava. Mais que Kraftwerk ou Bowie, Gary Numan anunciava que o futuro da canção era tecnológico. Seus shows, uma orgia de luzes cegantes e de presença robótica mudaram toda uma geração. -------------- Ele levou às massas aquilo que outras bandas e artistas solo não puderam levar. Sua obra antecipa o planeta sob controle e vigilância. Mas, como é seu som? -------------- É POP, mas não aquele POP eletro enjoativo que se faria moda com os Pet Shop Boys após 1985. Ao contrário dos músicos que usam synths para pareceram instrumentos "normais", Gary Numan sempre usou sintetizadores que soavam como sintetizadores. E é isso que eu amo. ---------------- Quando ouço música eletrônica eu quero que ela seja profundamente robótica, gelada, sem emoção, sem alma, desértica. E é isso que temos aqui. Nada lembra a emoção do blues ou do soul, nada parece rock como entendido em 1979. Por isso Gary Numan jamais penetrou nas paradas dos EUA. Lá ele foi considerado uma coisa sem sentido, fake. Já na Grâ Bretanha ele foi superstar. Número um em vendas entre 1979-1981. Sua nova atitude conquistou um povo que não tinha raízes soul e blues. ---------------------- Continuo amando. Ouço agora. Me amociona ( contradição não? Sua frieza é profundamente emocionante ). A bateria, real, tem ritmos simples, marciais, e a massa de teclados parece exalar gelo. A voz de Gary Numan é maldosa, mecânica, alienígena. Ele se colocava como um ET. Bowie em modo glacial. As promessas de LOW levadas ao fim. Para um moleque de 16 anos isto soou como um mantra. Quase uma ligação religiosa. Sim, se voce tem menos de 50 anos, tendo crescido em meio a tantos nomes eletro, isto pode parecer apenas curioso. Mas entenda, Gary Numan é de uma radicalidade chique abissal. Não a toa ele se viu logo num beco sem saída. E virou um aviador. Largou a música. ------------------------ A questão é: seus amigos são elétricos? Sim, são. Estão numa tela 24 horas por dia. E falam comigo por sinais matemáticos codificados. Não me importa se aquilo que vejo é real. É eletricidade. E meus olhos são hoje leitores de luz. ----------------- Existem canções que mudam o mundo e entram nele como se fossem uma invasão marciana. Ouça o modo como essa canção começa. NÃO É MÚSICA. É UM EXÉRCITO ALIEN ATERRISANDO. No primeiro acorde do teclado, um tiro de laser, uma luz feito onda sonora, voce se entrega. Genial. ------------- PS: Gary deu o passo que nós queríamos que Bowie e Ferry dessem. Em 1980 achávamos que Bowie e o Roxy Music partiriam para esse som, cada vez mais eletro e frio. Mas não. Então Gary Numan, assim como tantos outros, deu o passo.

CORE - STONE TEMPLE PILOTS, BOM PRA CACETE

Para quem amava rock, não houve tempo melhor que o começo dos anos 90. Sim, melhor que 1968 ou 1972 ou 1980. Isso porque em 1992 lançaram tudo de 68, 72 e 80 em cd. E havia uma novidade: gente com menos de 25 anos usando cabelo comprido. ------------------ Não dava mais pra aguentar o rock minimalista dos anos 80. Era preciso retomar o rock hedonista, grande, de arena dos anos 70. Minha alegria, imensa, eu vivi os anos 90 com prazer vingativo, foi ver bandas desprezadas em 1984 voltarem a dar as cartas: Black Sabbath, Led Zeppelin e também Thin Lizzy, Humble Pie e Free. De repente ouvir Alice Cooper não era mais vergonha. E a maior banda da hIstória se tornou, enfim e para sempre, o Led Zeppelin ( sim querido, todo ano conheço alunos e alunas de 14 ou 15 anos que amam o Led Zeppelin ). ------------------ MTV: Alice in Chains, Soundgarden, Pearl Jam, Nirvana, mas também Porno for Pyros, Faith No More, Sonic Youth, Primal Scream, Happy Mondays, Smashing Pumpkins e imenso etc. O POP era de George Michael, Madonna, Prince, Lenny Kravitz e fofuras como Betty Boo, Deee Lite, Right Said Fred ou o grande Seal. No RAP, em auge de audácia, Public Enemy, NWA, De La Soul, Ice T, Beastie Boys, Tone Loc, Young MC, Cypress Hill, House of Pain ------------------- Mas o que eu ouvia, sem parar, era Core, do Stone Temple Pilots. Uma mistura perfeita da sonoridade metálica com charme à The Doors. Robert De Leo era um guitarrista brilhante, riffs pesados à vontade e o irmão, Dean De Leo, tinha pegada de trator, no contrabaixo discreto. Eric Kretz é talvez o melhor baterista da safra 1990. Toca alto, vira com precisão, mantém o pedal ecoando. E Scott Welland seria o Jagger de sua geração se as drogas não tivessem feito dele um zumbi. Scott tinha beleza, era sexy, perigoso e sabia usar a voz, uma voz feita para o rock pesado. -------------- Core é puro rocknroll, não tem descanso, não cessa, não diminui, é trilha sonora daqueles anos mágicos em que o rock parecia ser o centro do mundo mais uma vez. Os críticos, chatos como sempre, preferiam muitas outras bandas, mas pra mim os STP eram perfeitos. Traziam algo da energia soturna dos Sabbath com a sem vergonhice tipo "olha! somos o máximo!!!" do Zeppelin de chumbo. Eles não tinham problema algum em fazerem um som que se afirmava como POP e pesado, viril e nem aí pra nada, real sem ser babaca. Puro rock porra! ------------------- Durou nada, durou muito pouco. Os 3 primeiros cds são do grande cacete. Ouvindo hoje, de novo, nada mudou. É bom, é puro, é como whisky sem gelo. Venceu o tempo, 30 anos já. Que eles sintam orgulho do que fizeram. Eu tenho de os ouvir, Pra sempre. ---------------- PS: Plush é um hino.

SE VOCE NUNCA OUVIU THE X VOCE É UM BOBO

Se voce nunca ouviu The X voce é um bobo. Por que? ------------------- Porque é rock n roll em estado puro. Porque é o meio termo perfeito entre a alegria colorida dos B'52s e o punk rock dos Ramones. Mas não é bem isso! É adrenalina mas é também cérebro. É produzido por Ray Manzareck. Mas é mais. É o som dos skates de Venice Beach nos alegres anos de 1980, o consumo lá em cima e a molecada na rua fazendo festa. Mas é mais: John Doe tem a guitarra mais simples do mundo , mas não é minimalista. E que coisa: lembra Jefferson Airplane por causa dos vocais em duo de John e de Pauline E. Mas é mais ainda: é perigos e é sexy pra caramba. ------------------------ Se voce é bobo voce não ouviu The X e nem vai ouvir. Entre 1980 - 1984 eles foram centrais no underground made in USA. E acima de tudo eram fun. Muito fun.

FREAK OUT THE MOTHERS OF INVENTION

Uma simples explicação sobre o porque de entre 1965 e 1972 a música POP ter sofrido tão imenso ataque de originalidades e ousadias e genialidades e tentativas fracassadas e esquisitices e singelas explosões: GRANA EM ABUNDÂNCIA, EDUCAÇÃO EM NÍVEL AINDA ELEVADO, LIBERAÇÃO SEXUAL COMO NOVIDADE AINDA EXCITANTE, PROGRAMAÇÃO ERUDITA NAS RÁDIOS, BOA COMIDA ( YES ), ESPAÇO AINDA NÃO TOMADO POR CORPORAÇÕES IMPESSOAIS ( AS GRAVADORAS ERAM DOMINADAS POR GENTE QUE AMAVA MÚSICA ), UM PÚBLICO ÁVIDO POR NOVIDADES INCESSANTES. Este disco, de 1966, pasmem, 1966, tem as rugas de sua época e por isso hoje parece velho-datado, mas! Essas rugas são motivo de orgulho baby. ------------------- Não é o Zappa jazzistico ou de longas narrativas que às vezes parecem tão chatas... É uma banda pequena onde Captain Beefheart manda tanto quanto Frank. E assim, é um assustador disco ousadamente livre, ou seja, Freak Out! ---------------- Tem rock, vaudeville, música concreta e um rock ao estilo Dylan que antecipa o Velvet Underground em 6 meses. E cara, creia, 6 meses em 1966 é um tempo muito longo. TROUBLE EVERY DAY é um tributo a Highway 61 e é um dos melhores rocks que já ouvi. -------------------- Frank Zappa gravou tanto, registrou tantas ideias que é impossível não haver muito lixo nessa produção. E há. Mas nela existem, às dúzias, joias como este disco e a canção citada em particular. Ter vivido em 1966, ter 15 anos em 1966, deve ter sido um privilégio. Hey! Monster Magnet tem a batida de 90% das músicas de rave!!!!! Fantástico!

The Return Of The Son Of Monster Magnet

1977 : 46 ANOS DE ATRASO, CHEAP TRICK, O PRIMEIRO DISCO

Em 77 eu tinha 15 anos e era obediente, lia e seguia todas as dicas dos críticos de rock. E eles ignoravam tudo que era americano. Então, quando o Cheap Trick lançou seu primeiro disco, óbvio, eles nem se deram ao trabalho de ouvir. Pareciam americanos demais. Quando em 1979 a banda estourou com seu disco ao vivo, óbvio, eles trataram a banda como se fossem tão inofensivos como Kiss ou Meat Loaf, eram americanos não é? Eu, sempre uma ovelha da palavra impressa, disse amém. ---------------------- Além do que eu odiava o visual deles. ------------------- Só agora, 46 anos depois, quase meio século passado, eu ouço o primeiro disco. E caramba! É simplesmente um disco perfeito. Lamento muito não ter o escutado em todos esses anos. Como descrever seu som? New Wave apocalíptica? Hard Rock esquzóide? Grunge feito 15 anos antes do tempo? Uma festa sem limites? É tudo isso e é bem mais. Além de tudo citado acima, eles têm elementos de glam rock, de punk rock, de power pop, e até de indie. Fossem ingleses e tivessem o visual certo teriam sido incensados aqui no Brasil. São bem melhores que Jam ou Gang of Four por exemplo. E o mais impressionante: não envelheceram um só dia. ------------------------- Elo Kiddies abre a coisa e é absoluta obra prima. Mas qual faixa não é perfeita? Taxman mr Thief, The Ballad of TV violence, Cry Cry.... difícil escolher uma. E o cd ainda tem como extra mais 5 músicas inéditas sublimes. É energia alta todo tempo, é surpresa sobre surpresa, voce acha que a música vai para um lado X e ela segue para Z. Lookout é absurda de tão boa. ------------------------ A bateria, Bun E. Carlos, um cara com rosto de contador bêbado, é volumosa, ofensiva, ritmica, rocker no talo, como toda bateria deve ser. O guitarra se chama Rick Nielsen, uma figura ridícula com roupas ridículas ( era proposital ). Ele toca punk e toca hard rock. Ele é o tipo do guitarrista que até hoje toda banda nova sonha em ter. O cantor, Robin Zander, o cantor, é quase um milagre. Ele soa como Scott Weilland e depois como John Lennon. Então parece Steven Tyler para em seguida lembrar Ray Davies. É uma voz encantadoramente desafiante, mal educada, desesperada, triunfante e afinada. ------------------------- Este disco de estreia é hoje considerado uma obra prima e eu assino isso. No novo Punk Rock americano de 1998, o Cheap Trick era chamado de pioneiro. Mas eles são melhores que isso. É uma grande, grande, grande banda de rock. ------------------- Antes tarde do que nunca bb.

HUNKY DORY - DAVID BOWIE. POR QUE ELE HOJE É CONSIDERADO SEU MELHOR DISCO?

Já aviso, Hunky Dory não é meu Bowie favorito. Prefiro muito mais Low, Diamond Dogs, Lodger, Young Americans e mesmo Station to Station me soa muito mais fascinante. -------------- Fazia, creia, uns 20 anos que eu não ouvia este disco. Então hoje o reouvi. Eu o escutava muito em 1989, 1990, época em que foram lançados seus discos em edição japonesa, depois parei. Ouvindo hoje algumas coisas me surpreendem: Primeiro: É basicamente um disco acústico. Segundo: a beleza do piano de Rick Wakeman ( pena não terem trabalhado juntos mais vezes ). A sequência das 6 primeira faixas é imbatível. Poucos, muito poucos discos, são tão superlativamente belos como aqui, nessas 6 faixas. Changes, Oh you pretty things, Eight line poem, Life on Mars, Kooks e Quicksand, minha favorita, são melancólicas, solitárias, belas, diáfanas. Bowie é um jovem inglês, em 1971, cantando em seu flat, violão, tentando se entender e entender o que o cerca. É um quase derrotado lançando sua última carta. Nunca mais ele cantou assim. E a preferência de 2023 por este disco reside nisso: nosso tempo se identifica com esse jovem isolado. O super artista ambicioso de Low nos incomoda. É um tipo anti 2023. Já o Bowie de Hunky Dory parece ser um cara de agora. Mas não é. Bowie é bem maior que qualquer artista POP que trabalha hoje por aqui. Ele é uma outra coisa. --------------------- O piano de Wakeman pontua todas essas músicas. Seu dedilhado delicado dá brilho e ângulos ousados às canções. É um acerto absoluto. O problema de Hunky Dory é que após o pico atingido em Quicksand ele cai demais. O cover de Newley, Fill your heart anuncia o que parece ser um outro disco. Um outro Bowie. Andy Warhol, uma homenagem em estilo Dylan, é apenas comum, Song for Bob Dylan é indigna do mestre ( e comete o erro de dizer que a voz de Dylan é sad and blue...ora David...ela é angry and hungry ). Bowie se torna aí um tipo de Ian Hunter, Mott The Hoople na veia. Depois vem a estupenda homenagem à Lou Reed, Queen Bitch, riff que cita Sweet Jane, a parceria Bowie Ronson dando as caras enfim. Bewlay Brothers é bem chatinha. -------------------- Quando ouvi este disco a primeira vez senti o mesmo que hoje: são dois discos enfiandos em um só. Durante seis faixas é David no quarto com o piano de Wakeman compondo milagres de beleza melancólica. Depois é Bowue homenageando seus ídolos em faixas não mais que médias ( fora Queen Bitch, que é brilhante ). Ziggy Stardust nasce nessa mescla. Ele seria a união dos dois lados, aquele de Quicksand e de Queen Bitch. ------------------- Belo tempo para se ter 15 anos em Londres. Após este disco, as lojas seriam invadidas por Lou Reed com Transformer, o primeiro do Roxy Music, T. Rex vendendo como Beatles e mais Gary Glitter, Mott The Hoople e Sweet. Uma festa. Nunca mais foi assim. Hunky Dory é um adeus dado no princípio. Triste como Bowie sabia ser.

THIS IS HARDCORE - PULP

Pulp é, em meio a onda do Britpop, a mais adulta entre seus pares. E isso faz com que Pulp seja, sim, sem dúvida alguma, muito melhor que Oasis, Blur, Suede ou Stone Roses. Jarvis Cocker é um intelectual refinado se colocado ao lado de Noel, Damon, Ian ou Brett. This Is Hardcore, de 1998, é seu último grande disco e como ser inteligente que é, Cocker percebeu sua maturação e fala por toda a obra de finais, despedidas, desvanecimentos, apagamentos e sumiços. A banda, mega competente, que sempre foi witty ( esperta e alegre ), é aqui melancólica. Mas sem jamais perder a elegância. ---------------- Cocker sempre teve uma queda pelo POP francês e esse é seu diferencial. Faz anos que ele vive em Paris e já lançou disco solo com canções francesas. Isso tempera sua alma. Enquanto os Gallagher sonhavam com Lennon, e Albarn pensava em Marc Bolan, Jarvis seguia Serge Gainsbourg e Jacques Dutronc. Para um inglês, isso faz toda diferença. Como Yeats e Shelley, há nele um forte cheiro de vinho e de Camembert. Neste disco, belíssimo, ele derrama todo seu romantismo sem pieguice, um romantismo irônico, inteligente, que mais que Bowie, remete à Bryan Ferry e John Cale. Vejo que o album teve a produção de Chris Thomas, o cara que produziu os melhores discos do Roxy Music e de Pretenders. Entenda...não falo que Pulp lembre Roxy, não lembra, mas é o mesmo espírito. Voce ouve este disco do mesmo modo como ouve Siren ou For Your Pleasure: com uma taça de champagne e uma lembrança diáfana na cabeça. ------------------------ Há no Oasis uma vulgaridade de operários de Manchester que às vezes enjoa. Há no Blur uma sombra juvenil que não cessa. O Stone Roses é, para mim, uma banda comum hiper valorizada. E o Suede escorre vaidade insuportável em cada acorde copiado do pior do glam rock. O Pulp, ao lado deles, parece maduro, chique, consciente, no tom exato. Tem suas influências, mas as usa com sabedoria. Junta tudo mas deixa, acima de todo som, a voz de Cocker brilhar, uma voz que casa perfeitamente com aquilo que se diz. Os arranjos são ricos, quase sinfônicos. A impressão geral é de estarmos diante de algo invulgar: um desses discos que ficam, que permancecem. Passados 25 anos ele ainda impressiona. Muito. Ouça. E não esqueça de suas feridas.

LIFES RICH PAGEANT - REM E O GÓTICO AMERICANO

Um europeu, isolado em imenso novo mundo, olha aquele espaço e vê nele espírito pagão. Ao redor, cobras, corvos, lobos, ursos, florestas sem fim, névoas. Esse o gótico americano de Hawthorne, Poe, Melville. O Brasil não teve um gótico, infelizmente, porque não havia ninguém aqui para ler nada. Éramos todos analfabetos. ------------- Na Georgia, terra dos REM, o gótico foi muito forte. E no século XX ainda se viam velhos casarões abandonados, cercados de mato, estátuas em ruínas, janelas com fantasmas à escuta. FABLES OF RECONSTRUCTION, o maior e melhor disco do REM, é um mergulho nesse mundo. Mergulho tão profundo, tão próximo da loucura, que a própria banda tentou o renegar depois. Foram para a Inglaterra e o gravaram lá, sob a produção de uma lenda, Joe Boyd, o homem que produziu o folk inglês mais alucinado ( Incredible String Band ). Em algum ano perdido, aqui, neste blog, eu escrevia sobre essa obra prima. Procure. Espero que meu texto seja minimamente digno do disco. -------------- Após FABLES OF RECONSTRUCTION, o REM chamou Don Gehman, produtor de John Mellencamp, um cara que fazia alguns dos discos mais quentes da época, e é incrível como nos anos 80 eu escutava tanta música, e gravam LIFES RICH PAGEANT, o mais viril LP da banda americana. Begin the Begine já dá o tom, o som é forte, alto, afirmativo, decidido. Bateria lá em cima, Michael Stipe cantando de modo duro, sem choro nenhum. É um muito grande disco, não ao nível mágico de FABLES, nem tão perfeito e poético como MURMUR, mas um muito ótimo disco de rocknroll. E o REM quando queria fazia rock como ninguém. Hyaena é uma canção sublime e rebelde, assim como Swan, Fall on Me e todas a outras. Feito em 1986, no ano mais difícil e belo da minha vida, é trilha sonora de uma geração, a minha. ---------------- Infelizmente, com o correr do tempo, o REM se tornou pai de uma multidão de bandas chorosas muito ruins. E o próprio Stipe se transformou numa espécie de guru chorão do politicamente correto. O cara tão elétrico, cheio de adrenalina de 1983-1987 sumiu para sempre. Fica a obra. Murmur é histórico, um dos maiores discos de estreia de qualquer banda em qualquer tempo. Fables é uma das cinco ou seis maiores obras primas melancólicas do rock e Lifes é uma ressureição. Document viria a seguir e depois o conformismo de bom moço. --------------- Como disse em outro post, uma boa banda tem no máximo 3 grandes anos. Uma banda ótima tem 5. O REM teve seus 5 grandes, grandes anos, quando dividia com Smiths o posto de maior banda indie do mundo. Foi bom enquanto teve gas. Fica o testemunho gravado.

LADY SOUL, SONGS IN THE KEY OF LIFE, OS DOIS MAIORES DISCOS DA HISTÓRIA? SERÁ?

Já aviso que prefiro Bootsy. O funk de Bootsy Collins é muito mais cheio de groove e bem menos artístico. É safado. Muito safado. Mas vou falar de dos discos de Aretha e de Stevie Wonder. --------------------------------- Em 1976 era uma delícia ligar o rádio e ser envolvido pela alegria de Isnt She Lovely. Sim, ela tocava de meia em meia hora, o disco de Wonder foi o mais vendido do ano, ano que foi um dos melhores da história ( não vou citar os discos de 1976, são muitos e em vários estilos ). Mas Songs, album apontado recentemente como o segundo melhor disco da história, desbancando Dylan e Beach Boys, tem muito mais. Stevie Wonder, no auge de seu poder, aos 26 anos, nos dá jazz-rock, soul, funk, blues, POP, latin soul, tudo embalado em letras políticas e amorosas. Sir Duke, Ordinary Pain, Wish, são faixas e faixas que se tornaram referência para a cultura black. O album saiu em dois vinis e mais um EP com 4 faixas, hora e meia de absoluta genialidade. Stevie levou os Grammys do ano, e sim, os anos 70 não foram anos "apenas" de Led Zeppelin, Elton John e Bowie, foi a década de Stevie Wonder, um cara que todo ano levava todos os prêmios dos USA. Eu não acho que Songs seja o segundo melhor disco já gravado, mas entendo que ele pode ser o melhor. Há aqui um profissionalismo, uma competência, criativdade, que assombra. ----------------- Há um momento na vida de um artista em que ele dá seu máximo. Uma obra onde ele diz tudo. E que anuncia o esgotamento de sua alma. No rock e no POP vimos isso em albuns como Abbey Road, Exile on Main Street, London Calling, Sex O The Times, Physicall Grafitti, todos são discos que mostraram o auge do artista e ao mesmo tempo, de certo modo, esgotaram sua criatividade. Songs é o grande momento de Wonder, e após esta obra, ele não mais subiu até um local tão elevado. Caiu. Teve momentos que lembravam que ele era o grande Wonder, mas eram apenas lembranças. ----------------- Lady Soul, de Aretha Franklyn, é considerado hoje o maior disco da história. Preciso dizer que muito disso acontece por ela ser negra e mulher. Aretha é um talento mágico, mas sua condição humana ajuda. Isso é óbvio. Como mulher e negra, suas concorrentes seriam Billie Holiday e Ella Fitzgerald, mas as duas são puro jazz, Roberta Flack e Whitney Houston não têm sua força. Lady Soul é um grande disco gravado com grandes músicos no esquema da velha Stax. Tem até Eric Clapton solando numa faixa blues. E acima de tudo tem a voz de Aretha, a melhor voz feminina do POP. É um belo disco, mas jamais o melhor da história. Como todo disco da Stax ( e da Motown pré anos 70 ), ele parece e é muito mais uma coletânea de singles que um album. São grandes músicas POP de 3 ou 3 minutos e meio, mas no geral nunca sentimos estar diante de um grande LP, uma grande obra, um album ambicioso ou coeso. O disco de Stevie Wonder é, sem dúvida, uma obra ambiciosa e plenamente realisada, enquanto o disco de Aretha é um disco POP, uma coletânea de canções maravilhosas, mas não um album. ---------------- Quanto aos antigos "melhores discos da história", Highway 61 ou Pet Sounds...bem....deixo que voce julgue o que é maior ou melhor. -------------------------- Eu vou ouvir Bootsy.

BOD DYLAN, TIME OUT OF MIND

Este disco, histórico, foi produzido por Daniel Lanois, produtor associado de Brian Eno em Achtung Baby, o melhor disco do U2. Ou seja, Lanois é da escola que valoriza timbres e climas. E este disco é uma obra prima de timbres e de climas. Dizem que Dylan não gostou muito do resultado, que ele queria outro tipo de som, mas é um disco maravilhoso. Lanois deu ao instrumental um acabamento cheio de detalhes, o som vem como de outra dimensão, parece antigo e ao mesmo tempo é moderno. Quando a bateria ataca os pratos eles soam como fossem latas enferrujadas, mas ao mesmo tempo ecoam numa amplitude refinada, cuidada, que repercute e nos faz fixar todo o som. As guitarras tecem um labirinto de blues, country e fugas ciganas, enquanto o baixo conduz aquilo que poderia ser um kaos mas nunca é. Lanois deve ter tido um trabalho imenso em montar este trabalho, mas vamos falar agora de Dylan. ----------------- Este é seu melhor disco. E isto não deve te surpreender pois muita gente acha isso. Há quem chame do mais belo disco de despedida da vida da história. Voce sabe, ele não morreu em 1996, mas o disco é eterno. A mensagem fica e ela é belíssima. Dos grandes do rock, Dylan é, fora dos países de língua inglesa, o menos querido. Isso porque 80% de seu apelo moram nas letras, na palavra. Mas aqui temos um disco que é rico TAMBÉM em som, em música. É portanto o disco de Bob Dylan para ser ouvido por quem não gosta de Dylan. Longas, mas jamais enfadonhas, são 11 canções imensas. Variam entre tempos acelerados e tempos pensativos, mas ao contrário de seus outros discos, todas são musicalmente bem realizadas. As letras não estão sobre a melodia, estão casadas com a melodia. Cada faixa é como um conto magistral sobre um momento decisivo na vida de alguém e a música é digna do que se fala. Sim meu leitor, é um disco a prova de enjoo, vacinado contra o tédio, cheio da voz cavernosa do Dylan ancião. Ele fala da velhice, do cansaço, da proximidade do fim. Mas a música, ela anuncia a inspiração. ----------------- Todo grande artista tem um surto de produção na parte final da vida. Yeats é o exemplo maior desse fenômeno em literatura. Bob Dylan no rock. Desde este disco, 1996, ele produz sem parar. Canções de Natal, músicas de Sinatra, Cole Porter e Gershwin, novas composições. Ele não parou e esse final de vida já dura 27 anos. 27 ANOS!!!!!!!!! O homem é um titã. Ouça e entenda do que falo. -------------------Tenho uma queda imensa por seu disco de 1979 Slow Train Coming, disco que tem uma sonoridade exatamente oposta a desta obra. Slow é clean, limpo, cristalino, claro como o sol. Talvez seja, para mim, o mais querido LP de Bob Dylan. Mas eu sei, Time Out of Mind é melhor.

MY LIFE IN THE BUSH OF GHOSTS - ENO - BYRNE

Gravado entre 1979 e 1980, causa espanto saber que nesse período Brian Eno encontrou tempo para trabalhar em Lodger, de Bowie, Fear of Music dos Talking Heads, lançar seus discos de ambient music e ainda produzir o sublime Ultravox. Este trabalho, Eno e David Byrne sozinhos, eles compuseram, produziram e tocaram todos os intrumentos, é considerado um marco histórico: pela primeira vez um disco usava vozes sampleadas. Sampler feito em fita, editados e produzidos por Eno. Para isso, ele gravou vozes no rádio, um cantor do Líbano, um DJ de New Orleans, um pregador religioso e até mesmo uma sessão de exorcismo. As vozes são mixadas e colocadas sobre ritmos tribais, funkeados, world music. Algumas músicas chegam a dar medo, parecem fantasmas captados para sempre. Em 2023 percebemos que este trabalho repercute em tudo que foi feito em música eletrônica 10 anos mais tarde, entre 1989-1991. Lembre-se, em 1980 NINGUÈM gravava vozes para as samplear. Se hoje isso é banal, quem começou foram esses dois irriquietos. --------------------- Eu comprei o vinyl na época e o escutei apenas uma vez. Me pareceu então perturbador demais. Eu não entendia o porque daquelas vozes, o porque de as gravar e editar, o porque dos loopings sem fim. Mesmo sendo um ouvinte acostumado a Bowie, Kraftwerk, Gary Numan, este disco parecia radical demais, simples demais, estranho demais. A música não andava. Não havia introdução e nem refrão, não havia desenvolvimento. O som era como um flash fotográfico. Um momento sonoro paralisado no tempo. E com vozes fantasmagóricas. Era inclassificável. ------------------- Tudo que foi um dia moderno se torna velho em seguida. Ouvir este disco hoje, vale a pena? Sim, vale porque é belo. A sonoridade é fantástica, o som é rico, cheio de detalhes e muito dançável. E ao mesmo tempo parece soturno. Ouça e absorva.

BAD LUCK STREAK IN DANCING SCHOOL - WARREN ZEVON.

Sim, há uma fúria belíssima na voz de Zevon. Esse grande compositor americano que conheceu sucesso no fim dos anos 70 e começo dos 80, mas que depois, teimoso, se recolheu a sua condição de cult entre os mais cult. Sua voz, áspera sem ser rouca, é emissora da raiva de quem vive a vida daqueles que percebem as coisas e as descrevem. Acima de tudo ele é um contador de histórias, o mesmo tipo de histórias dos melhores contistas dos EUA. Ele fazia ( sim, fazia, Warren morreu nos anos 90 ), como dizia, ele fazia parte do rock da California de então, era amigo de Jackson Browne, Browne que era um tipo de líder da turma, a turma de Joni Mitchell, Eagles, Linda Ronstadt, uma turma que resvalava na chatice quase sempre, defeito que Warren Zevon nunca tem, isso porque ele nunca é chorão, piegas ou sem fibra, Zevon tem a raiva, a divina raiva que o redime. -------------- Neste disco de 1980, Zevon é acompanhado pela nata entre os músicos da California, gente como David Lindley, Joe Walsh, Leland Sklar e Rick Marotta. E ainda o incrível Waddy Wachtel, um guitar player que tocou com Bryan Ferry e Keith Richards. Em 81 Zevon estava no auge da fama pop, músicas gravadas por Linda Ronstadt e Bruce Springsteen ( há aqui uma faixa composta em dupla por Zevon e Bruce, uma das melhores coisas que Bruce compôs na vida, Jeannie Needs a Shooter ). Por falar nisso, Jeannie está tocando agora aqui e mais uma vez me emociona com a beleza viril dessa canção sobre a raiva. O refrão é fantástico e a letra é sublime. Mas o disco inteiro não deixa apagar esse fogo que ilumina e consome Zevon, em tudo um grande, grande rocker e autor. ----------------- Eu disse ser ele cult e sua herança se faz presente em vários nomes de 2023 que o citam, mas é uma pena, pois quando os ouvimos percebemos que eles são indignos dessa herança, pois não possuem o principal de Zevon, os colhões. Melancolizam Zevon, o que é uma traição, Zevon nunca é melancólico, ele é irado. Well....coisas deste tempo emasculado. -------------- Gorilla, You Are a Desperado é outro ponto muito alto de um disco de pontos altos. E pelo nome das músicas voce percebe qual a onda da coisa. São narrativas sobre gente e ações sui generis e ao mesmo tempo estranhamente comuns. É lindo man, é muito lindo.

ARTHUR BY THE KINKS, POR QUE TANTO ELOGIO?

A partir dos anos de 1980, os Kinks passaram a ser considerados a maior banda da história do rock inglês. Opinião essa, que entre os cults e cools, nunca mais foi contestada. Entre ingleses bacanas e americanos fashion, amar a banda de Ray Davies é lei inconteste. Dentre os motivos de tanta idolatria podemos contar desde as falta de sucesso nos EUA até o estilo extra britânico de compor. Assim como The Band seria inimaginável na Europa, os Kinks só poderiam ser ingleses. Eles abandonaram os blues já em 1964, country foi usado apenas como humor e temas como estradas, mulheres faceis e carros velozes não existem. Do The Jam à Blur, de James à Pulp, todo mundo bebeu na fonte de Ray Davies. E essa fonte moldou letras, cortes de cabelo, ironia e melodias. Ao lado dos Beatles, não há banda mais onipresente na ilha. -------------------- Arthur é uma opera rock. Lançada alguns meses antes de Tommy, do The Who, ela é hoje considerada bem superior a obra de Pete Townshend. Ela é? Wellll..... não é preciso tanto assim. Tommy não é grande coisa. Entenda, eu adoro The Who, mas Tommy tem um monte de momentos muito fracos. See Me Feel Me é dose pra elefante. E as letras são bobas, nada significam de fato. Tommy tem alguns momentos maravilhosos, Sally Simpson, Amazing Journey, Sparks, mas no geral é aborrecido. Já o disco dos Kinks, se nunca atinge a altura da abertura de Tommy, não tem um só momento chato. Usando o estilo "canção de vaudeville", especialidade de Davies, Arthur é uma homenagem a era da rainha Vitoria. What????? ------------- Sim meus queridos, no auge do hippie, da anarquia em rock, Ray Davies escreve sobre os bons velhos tempos. Chá, jardins, coletes de veludo, cricket, famílias jantando, de leste à oeste, tudo era Inglaterra. E para falar disso, ele compôe músicas que são o contrário da moda de 1969, ano do disco, ou seja, sem peso, sem solos, sem viagens espaciais. É uma coleção de canções ultra inglesas que falam de coisas inglesas para ingleses recordarem. Entendeu o porque de tanto amor pelo disco? ----------------- Se está parecendo que não gosto de Arthur voce se enganou. O disco é sublime. E eu amo os Kinks. São uma das 5 maiores bandas da história inglesa. Apenas penso que Village Green e Something Else são discos ainda melhores. Arthur é grande, mas não o maior. ----------------- Elegantes, cínicos, classudos, inteligentes, POP, os Kinks são tudo aquilo que todo rock star inglês quer e quis ser. Ray Davies é como um molde onde eles se medem. Não à toa foi ele quem abriu o show de encerramento das Olimpíadas de Londres. Ray criou aquilo que entendemos como "rock inglês". Ouça o que postei.

UM HOMEM DE LUZ, STAND! by SLY STONE

Sly e sua família Stone eram A BANDA, a coisa mais importante acontecendo no tempo de Beatles e Hendrix. Jimi logo percebeu isso e mudou seu som. Electric Ladyland traz o groove, o balanço sacolejante de Sly. Mas não foi só Jimi, outro génio, Miles Davis, virou fã. Unir seu jazz ao som de Sly. E como era esse som? ----------------- Era uma mensagem de paz e de alegria, que não poderia, óbvio, durar. Entre 1968-1970, Sly Stone era uma mensagem de união: pretos e brancos, mulheres e homens, juntos. Mas, voce sabe, este é um mundo imperfeito e o pó veio pegar Sly. Em 1971 THERES A RIOT GOING ON, a grande obra prima da música black, é um pesadelo de paranoia. Mas eu estou aqui pra falar do solar STAND!, o disco de Sly que mais vendeu. ---------------- Stand! Abre em festa. Nasce o funk, nasce o som do futuro. É um disco pra dançar, mas acima de tudo pra ouvir. Larry Graham e Greg Errico impressionam, a batera e o baixo são protagonistas, mas há mais: Sly usa o estúdio, efeitos sonoros, timbres originais, sons que não sabemos como foram conseguidos. Dont Call me Nigger marca presença, é forte. Todo mundo conhece I want Take You Higher. Aqui nasce Prince e todo pop dos anos 80. Somebody s watching you mais Sing a Simple Song: Sons jorram de Sly com facilidade. Como acontecia com Paul MacCartney, Stevie Wonder, Ray Davies, elas não param de nascer. Ele está prenhe de música. Everyday People é mais uma obra prima em album que é coleção de pontos altos. Sex Machine: uma jam quase jazz, instrumental, a faixa que enlouqueceu Miles. São 13 minutos que deveriam ser 60. Por fim, You Can Make it if you Try. Não, não vou dizer que é um disco sexy, não é, sexy é RIOT, sexy é FRESH, disco de 1973. Este é alma, soul, espírito. Juntos, a Família Stone deu ao mundo alguns dos momentos POP mais esfuziantes, alegres, vibrantes da história. Era um emaranhado de guitarras em acordes distorcidos, teclados com efeitos de eco e de timbres absurdos, metais incisivos e vozes que convocavam todos a festejar. Festejar o que? As novidades, o novo mundo, a realidade que se renovava. ------- ---------------------- Um ano mais tarde viria a confusão: a construção do maior momento da música black, THERES A RIOT GOING ON, um pesadelo de cocaína, mortes, noites de voodoo e teclados do inferno com vozes em uivos que reverberam para sempre. Mas aqui não, Sly está feliz, está são e celebra as pessoas. E convida voce.