Mostrando postagens com marcador tom jones-tony richardson. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador tom jones-tony richardson. Mostrar todas as postagens

TOM JONES - HENRY FIELDING, O PAI DO ROMANCE

   Antes houve Robinson Crusoe, mas Defoe escreveu uma reportagem romanceada. É quase um manual de sobrevivência. E tem o estilo do jornal. Depois veio Richardson, mas a forma é ainda a da troca de cartas, da confidência sentimental, e creia, ele é hoje ilegível. Nesse ponto, na Inglaterra de 1740, um escritor já podia viver da pena. Incrível. Já existia um público leitor grande o bastante para enriquecer editores e livreiros. E para sustentar um autor. Henry Fielding surge como o primeiro verdadeiro romancista moderno. Ele cria histórias fictícias, e usa o formato que conhecemos até hoje como romance. Mais importante ainda, ele se vê e fala com o leitor como um escritor. Fielding nunca esquece e nos deixa esquecer deste fato: isto é ficção e eu sou o dono do que estou inventando.
  O livro é uma sátira aos costumes ingleses, à moral e ao próprio modo britânico de ser. E Fielding conversa conosco todo o tempo. Como depois faria Machado de Assis, que adorava este livro, Fielding comenta, explica, divaga, dá opiniões. Ler Tom Jones é como ouvir um amigo contar uma história enquanto se bebe um Porto e se fuma um cachimbo. É um desses raros livros amigo, companheiro. Sentimos o autor na sala. Ele vive ao nosso lado enquanto lemos.
  Há quem diga ser este o grande livro inglês da história. Penso que não. Ao contrário da França ou da Alemanha, literaturas que cresceram ao redor de duas ou três forças centrais, a escrita inglesa sempre negou o centro, sempre quis ser multifacetada, variada, desfocada. Talvez o surgimento de um grande mercado logo em seu começo tenha produzido essa variedade de produtos. De todo modo, se Tom Jones não pode ser a obra central numa cultura que nega ter uma obra central, é ele um dos pilares da história preciosa dessa literatura que é sempre realista mesmo quando pensa ser fantasiosa.
  Perfeitamente legível após 3 séculos.

KUROSAWA/ KEVIN KLINE/ STEVE MARTIN/ DORIS DAY/ TOM COURTNEY

A SOLIDÃO DE UMA CORRIDA SEM FIM de Tony Richardson com Tom Courtney e Michael Redgrave
Com seu lançamento em DVD, muito critico inglês passou a colocar este filme entre os dez mais da ilha. Feito em 1963, conta a saga de um teen pobre e desiludido. A mãe tem amantes, a casa é suja e cheia, as namoradas tolas. Ele rouba uma padaria e é preso. Na Febem inglesa ele se destaca como atleta. Mas as coisas nunca são fáceis. Richardson faria Tom Jones em seguida, e Redgrave faz o diretor da Febem. Tom Courtney tem um desempenho mágico. Sujo. O filme é magnifico. Nota 9.
UM FILME FALADO de Manoel de Oliveira
Uma enfadonha aula de historia. Melhora na interação final entre os atores. O sentido é óbvio, a Europa começou no mar de Portugal e termina na nova ordem atual. Bem...não deixa de ser bonito.
A ESPIÃ DAS CALCINHAS DE RENDA de Frank Tashlin com Doris Day e Rod Taylor.
O titulo ridículo não estraga o prazer de ver este tolo filme pop. Tashlin começou como cartunista do Pica Pau. Seus filmes têm sempre a leveza do humor visual. Doris é confundida com uma espiã. Ruy Castro, fã de Doris, não gosta do filme. Eu gosto.
MY BLUE HEAVEN de Herbert Ross com Steve Martin, Joan Fusão e Rick Moranis
Não gosto. Um dos piores filmes do grande Martin. Nem ele salva essa chatice sobre um delator de NY sendo protegido pelo tira do FBI Moranis. Fuja!
TEMPO DE RECOMECAR de Irwin Winkler com Kevin Kline, Hayden Christensen e Kristine Scott Thomas.
Um homem que fracassou como pai e marido descobre que vai morrer. E dá sentido a sua vida reformando sua casa. Kevin está excelente. Mas...em 1952 Kurosawa fez o mais triste dos filmes, Viver, onde Shimura faz uma praça antes de morrer. Impossível comparar.  O japonês é a obra de um deus.
SONHO DE AMOR de Charles Vidor Com Dirk Bogarde e CapucineHorrivel! É sobre Liszt… mas nada faz sentido.
AS AVENTURAS DO CAPITÃO GRANT de Robert Stevenson com Hayley Mills e Maurice Chevalier.
Bela adaptação de Verne. Ação na medida certa. Apesar dos efeitos ruins, tem boa direção, bom roteiro e produção Disney. Os atores são ótimos!
A MAIOR HISTORIA DE TODOS OS TEMPOS de George Stevens com Max Von Sydow
O diretor de Shane e de tantos grandes filmes faz a vida de Jesus sem emoção. O ator favorito de Bergman faz Jesus. Dura quatro horas e levou anos para ficar pronto.

A HISTÓRIA DAS AVENTURAS DE JOSEPH ANDREWS E SEU AMIGO O SENHOR ABRAHAM ADAMS - HENRY FIELDING

   Momento do nascimento do romance, a Inglaterra de 1750 via em meio a revolução industrial, o surgimento da classe média. Povo que era alfabetizado e que com algum tempo livre adquiria o hábito da leitura. Se hoje tememos que os livros se tornem passado, é aqui que eles surgem como objeto cotidiano. Mas o que é o romance?
   Romance é o relato que narra a evolução de um ser, e ele se faz exatamente na Inglaterra por ser ela a nação de Locke. A filosofia do papel em branco, do homem não como ser predestinado, mas sim como ente em formação. Ou seja, o homem como personagem daquilo que seria um romance. Lendo o romance o leitor lê a vida de outro que poderia ou pode vir a ser sua vida também. Esses livros se tornam febre e Fielding é um dos grandes. Um profissional, pois também é aqui que nasce o autor como profissão.
   Tom Jones é o grande livro de Fielding e este Joseph Andrews surge antes. Mas é um tipo de ensaio de Tom, ensaio que homenageia o Quixote de Cervantes e ataca com humor os livros lacrimosos de Richardson. Sempre um humorista, aqui são narradas as aventuras de Andrews, jovem muito belo, que ao ser assediado sexualmente por senhoras ricas, foge para salvar sua castidade e leva consigo sua amada Fanny e seu amigo, o pastor Adams. Adams se torna então o centro do livro. Um ingênuo.
   Estalagens, estradas campestres, brigas, cerveja, duelos, o livro tem o clima britânico de então. Mas atente, nada de psicologismos. Os personagens de Fielding são tipos, nunca pretendem a profundidade. O autor fala pelos personagens, não cria gente real, exibe ação.
   Bela edição de luxo, ilustrada, da editora Ateliê Editorial, digna da importância do livro.

brilhante, feliz, exultante: TOM JONES de Richardson

Sim meus meninos. Eu espero a trinta anos para poder assistir TOM JONES, este famoso e sumido filme de 1963, que venceu, mesmo sendo 100% inglês, os principais Oscars daquele ano ( filme, direção e roteiro ). Albert Finney infelizmente perdeu para Sidney Poitier, mas depois eu falo disso.
Você sabe que quando a gente espera tanto tempo por alguma coisa a chance de se decepcionar é enorme. Mas hoje tal coisa não aconteceu. Finalmente saiu o dvd e finalmente pude ver o tal filme. A única tristeza foi a de não ser uma versão restaurada. Mas vale!!!
Nesse tempo todo eu pude ler o livro de Henry Fielding. É de 1749 e é um dos livros chave do nascimento do romance moderno. Pois o romance precisou ser inventado, não pense que o homem sempre fez romances. Livro era coisa para religião, história, filosofia e poesia. Talvez DOM QUIXOTE já fosse um romance, mas isso é discutível. De qualquer modo, o livro é aquela coisa típica de seu tempo. É livre, picaresco, sensual, muito fantasioso, e crítico. Delicioso. E infilmável por sua abrangência.
Tony Richardson resolveu tentar. Ele era um jovem diretor da moda, no auge da fama, na Londres em seu último apogeu. Deixe eu dizer : deve ter sido super ter 20 anos na Londres de 63. Sabe como é... Beatles, Stones, Kinks, Who, Yardbirds, Them, Pretty Things, Small Faces, Mayall, Spencer Davis. As minissaias, Carnaby Street. Você tinha o melhor teatro do mundo, a melhor poesia, os pintores mais quentes, e os romancistas mais interessantes. Tudo estava em Londres!!!! E ainda ganharia a copa do mundo de futebol em 66 ! E no cinema você tinha acabado de criar o mais famoso herói do mundo ( Bond ), possuía os melhores atores e agora ( chorem franceses ! ) tinha diretores como Anderson, Reisz, Schlesinger e Boorman. E este Richardson, este jovem irado, que chamou então John Osborne para escrever o roteiro. Pra quem não sabe, Osborne era ao lado de Pinter, o grande nome do novo teatro. O roteiro deste filme é a tradução, moderna e bem-humorada, da Inglaterra de 1749, e da Grã-Bretanha de 63, a ilha que ainda tinha Jim Clark e George Best. ( Um escocês e um irlandês. Mas faziam parte da cena ).
O filme é uma ode à juventude. Ele brilha em exuberância, em alegria de viver. É profunda e absolutamente feliz. Seria impossível de ser feito hoje; tanta alegria ingênua nos ofende.
Há uma famosa cena de caçada que realmente merece toda sua fama. Nos sentimos dentro da caça e percebemos que os atores realmente se divertem com ela. Aliás, Richardson joga tudo para nos divertir. O filme tem uma profusão de cenas de brigas, duelos, namoros eróticos, correrias, fugas e bebedeiras. A câmera, às vezes trêmula, usada na mão ( achaste que fosse invenção recente ? ), às vezes voando em avião, outras correndo em trilho, em closes, em panorâmicas. Certas imagens são congeladas, e em outras os atores falam conosco. E tem uma maravilhosa cena em que Tom e uma mulher comem à mesa se seduzindo, porca e desajeitadamente, que vale seu Oscar. Aliás, esqueça os bonitinhos filmes de época, geralmente feitos com Kate Winslet ou Keira Knightley. Este filme se aproxima do que deve ter sido a vida em 1749. Ele é sujo, exagerado, desajeitado, obcecado por sexo e deliciosamente despudorado.
Tom é Albert Finney, ator da brilhante geração de Peter O'Toole, Terence Stamp, Sean Connery, Michael Caine, John Hurt, Alan Bates e Peter Finch. Formado na tradição teatral britânica ( muito jovem o ator já enfrentou de Shakespeare a Shaw, de Wilde a Beckett ), Finney passa uma coisa muito difícil para quem já tentou atuar : felicidade de se estar atuando. Ele flutua em cenas burlescas, passa todo o filme sendo chamado de "belo" e comendo todas as mulheres, mas nunca o vemos como vaidoso ou maldoso, Finney cria um personagem que é feito de jovialidade, alegria e fé em sí mesmo. Representa a jovem Inglaterra, ainda virgem do cinismo enfadonho de 1880.
Você, jovem imberbe, deve conhecer Finney do filme que deu o Oscar a Julia Roberts. Ele era o advogado que a ajuda. Esteve no policial de Lumet, aquele do ano passado. Fez o tio boa-vida de Russel Crowe no ruim filme de Ridley Scott. E principalmente : Albert Finney foi o pai, que nada mais é que um Tom Jones ancião, no Peixe Grande de Tim Burton. ( E agora eu percebo que Burton o chamou como homenagem a seu Tom. )
Mas o filme tem mais. Hugh Griffith como o chacareiro vizinho, sempre às voltas com suas caçadas, seus bichos e seus palavrões; tem a histórica Edith Evans, aquela que Olivier considerava a maior atriz da história, com cenas e frases de uma comicidade irresistível. Ninguém, jamais, pronunciou a língua inglesa como ela. Sua presença é solar. Mas há ainda Susannah York, a linda Susannah, atriz com quem eu queria casar aos 12 anos. Ela é tudo o que imaginamos que deva ser uma heroína de romance.
E então, após um milhão de voltas, de idas e de outras idas, o filme termina como deve terminar. E eu penso, após três décadas de espera, que se eu tivesse visto o filme aos 12 anos, ele teria sido meu filme favorito por muito tempo.
O que me resta é agradecer ao inventor do dvd.
Se você for assistir este filme já lhe aviso : não é arte. Guarde a arte para os artistas. É um filme para se divertir, para se admirar, para sorrir. Para gostar dele é preciso apenas uma coisa : um espírito leve e jovial. Eis um filme que se fosse gente eu chamaria de amigo. Prazer o conhecer.