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ESPIONAGEM NA INGLATERRA E UM LIVRO MUITO PERIGOSO
Acabo de ler que um dos serviços de contra espionagem inglês possui um comunicado onde se lê: " Qualquer pessoa que for vista com o livro 1984 de Orwell, ou obras de Joseph Conrad, Tolkien, CS Lewis será considerada uma perigosa extremista de direita. Livros que pregam a contra revolução não podem ser tolerados. " Pasmado? Eu não. Esse movimento não é novo e durante a pandemia foi bastante solidificado. Na crise do vírus, governos perceberam que a população é hoje facilmente comandada. Quem foi e é crítico será sempre chamado de extremista. E de direita, porque quem não aceita a "união pelo bem " só pode ser um egoísta e todo egoísta é direitista. ---------------- Um técnico mostra na NET, com imagens, que a AI, a inteligência artificial que começa a ser dada agora para uso geral, já está ideologizada. Se voce pede para o cérebro eletrônico criar um poema sobre Bolsonaro, ele responde não poder criar nada que seja sobre política. Mas se voce pede um sobre Lula, ele te dá um longo poema sobre o heroi. ---------------- Eu não fico surpreso e nem alarmado. O bom senso prevalecerá. A incompetência da esquerda destroi a ela mesma. Aliás, acabo de reler mais um livro de Evelyn Waugh, e ele não entra na lista da Inglaterra porque ninguém mais o lê. MALÍCIA NEGRA foi escrito em um tempo em que as pessoas discutiam, não cancelavam e fingiam ignorar. Seria interessante ver um lacrador de 2023, um típico comedor de ostras da Vila Madalena lendo este livro. Como um nazista, ele provavelmente o queimaria na calçada. A sátira demolidora de Waugh fala de um imaginário país africano onde a crueldade e a corrupção impera. O presidente só se preocupa em parecer chique e fino, gasta fortunas em decoração e palácios, seus aliados o traem por qualquer quantia, o exército é antigo e sem disciplina, os estrangeiros brancos vivem em ócio impotente e loucos para fugir do lugar, cenas e mais cenas de assassinatos, roubos, fugas, troca de favores. Fome e miséria para o povo, uma nova limusine para o líder. Waugh jamais pensa estar sendo racista, ele simplesmente cria uma ficção que espelha a realidade. A África dos anos 60 era exatamente aquilo e escrever sobre o que se via não era ofensivo ou proibido. Não era coisa de chato de direita. Era a época de Idi Amin comendo a carne de seus rivais e de guerrilhas dizimando quem não lutasse por elas. Não houve um só país da Africa negra que não fosse vítima de líderes metidos à besta. Waugh nos faz sentir nojo e rir amargo. Sim, o livro é uma comédia. -------------------- Estou surpreso por ainda não terem se metido a criticar Jung por sua fé na INDIVIDUAÇÃO. Talvez porque Jung foi tomado por charlatâes que só percebem nele aquilo que desejam ver. Já Eliot, assumidamente conservador, é complicado demais para um militante censor e por isso ainda não foi atacado. Toda censura é burra e ao mirar em Orwell ou Tolkien eles esquecem do muito mais perigoso, para eles, Nietzsche, o homem que pregava o indivíduo sobre tudo o mais. Literatura de valor é sempre anti grupal e aqueles que tentaram ou foram fortemente socialistas envelheceram rapidamente: Gorki, Brecht, Shaw. Neruda só é lido na América do Sul, continente que nunca irá sair de 1968, e Saramago já começa a exibir teias de aranha em sebos. Mesmo autores "de esquerda branda", quando lidos com isenção, revelam, se são muito bons, um individualismo imenso, um descompromisso com revoluções, uma desconfiança às promessas de união pelo bem. Os ingleses vão ter de queimar mais livros que os nazis queimaram em 38.
OS CINCO PONTOS DO MODERNISMO EM ELIOT
1- A SOLIDÃO DO HOMEM. Separado do que e por que...
2- A INEXPLICÁVEL ESTRANHEZA DO NASCIMENTO E DA MORTE. Estranheza pressupõe algo de mais natural. O que seria esse natural...
3- A IMENSIDÃO DO UNIVERSO. Se é imenso e silencioso é insignificante. O vazio do universo serve apenas para cenário de novelas tipo HG Wells.
4- O HOMEM E O TEMPO. O tempo só tem significado se houver alguma missão ou trabalho a ser realizado. Se a vida é absurda e portanto sem objetivo, então o tempo não tem relação ou importância nenhuma.
5- A ENORMIDADE DA IGNORANCIA HUMANA. Falta de saber em relação a que. Se o homem nada sabe é de se supor que exista algo a ser sabido. O que seria isso ninguém diz. Se cobramos esse saber é porque alguém deve saber, deter esse conhecimento. Onde e quando...
Na verdade essas proposições são apenas sintomas e não perguntas ou dúvidas reais.
2- A INEXPLICÁVEL ESTRANHEZA DO NASCIMENTO E DA MORTE. Estranheza pressupõe algo de mais natural. O que seria esse natural...
3- A IMENSIDÃO DO UNIVERSO. Se é imenso e silencioso é insignificante. O vazio do universo serve apenas para cenário de novelas tipo HG Wells.
4- O HOMEM E O TEMPO. O tempo só tem significado se houver alguma missão ou trabalho a ser realizado. Se a vida é absurda e portanto sem objetivo, então o tempo não tem relação ou importância nenhuma.
5- A ENORMIDADE DA IGNORANCIA HUMANA. Falta de saber em relação a que. Se o homem nada sabe é de se supor que exista algo a ser sabido. O que seria isso ninguém diz. Se cobramos esse saber é porque alguém deve saber, deter esse conhecimento. Onde e quando...
Na verdade essas proposições são apenas sintomas e não perguntas ou dúvidas reais.
O USO DA POESIA E O USO DA CRÍTICA - T.S. ELIOT
Este livro nos apresenta um série de palestras feitas por Eliot em Harvard, entre 1932-1933. Dryden é o primeiro poeta-crítico de quem ele fala. O que Eliot procura é investigar as definições e as utilidades antes dadas ao que seja poesia. No fim, a conclusão é de que não pode haver homogeneidade no que seja escrever ou ler poesia, mas se pode retirar alguns mitos, e é aí que mora o melhor do texto.
O poeta é influenciado pelo meio e pela memória, e talvez toda criação nasça da lembrança, da reelaboração de memórias soltas. Mas, para lermos e para entender poesia é preciso NÃO procurar encontrar o sentido o que se lê e não ler com o mapa da vida do poeta em mãos. Ler poesia é se jogar para dentro do texto e só levar em conta aquilo que está escrito, nada mais.
Uma das mais brilhantes teses é a que diz que POESIA NADA TEM A VER COM MISTICISMO OU RELIGIÃO. Claro, há poesia mística, mas a poesia não é uma substituta da experiência religiosa. Eliot diz que com a morte da igreja, sua crise, as pessoas tentam ter vivências religiosas FORA da religião.
Racine escrevia, como Shakespeare, para a diversão de boas e decentes pessoas. Hoje isso seria considerado banal. O poeta é visto como um tipo de guru ou de xamã, o que é um absurdo. Poetas, a maioria, escreve poesia conscientemente, como trabalho lento, e não como êxtases divinos.
Interessante observar que em 2016 cobramos experiências religiosas, sem religião, de shows de rock, psicólogos formais, filmes simbolistas, e até de encontros esportivos.
O poeta é influenciado pelo meio e pela memória, e talvez toda criação nasça da lembrança, da reelaboração de memórias soltas. Mas, para lermos e para entender poesia é preciso NÃO procurar encontrar o sentido o que se lê e não ler com o mapa da vida do poeta em mãos. Ler poesia é se jogar para dentro do texto e só levar em conta aquilo que está escrito, nada mais.
Uma das mais brilhantes teses é a que diz que POESIA NADA TEM A VER COM MISTICISMO OU RELIGIÃO. Claro, há poesia mística, mas a poesia não é uma substituta da experiência religiosa. Eliot diz que com a morte da igreja, sua crise, as pessoas tentam ter vivências religiosas FORA da religião.
Racine escrevia, como Shakespeare, para a diversão de boas e decentes pessoas. Hoje isso seria considerado banal. O poeta é visto como um tipo de guru ou de xamã, o que é um absurdo. Poetas, a maioria, escreve poesia conscientemente, como trabalho lento, e não como êxtases divinos.
Interessante observar que em 2016 cobramos experiências religiosas, sem religião, de shows de rock, psicólogos formais, filmes simbolistas, e até de encontros esportivos.
QUATRO QUARTETOS DANDO FRUTOS
Dormir e acordar em outro mundo.
Essa frase ecoa em mim, dentro de mim. Dormir e esquecer. Não esquecer, ainda saber o que se é e o que se teve. Dormir e acordar em outra praia. Mas não é o mar que conhecemos, é outro mar e outro céu.
Outro eu que ainda relembra o eu que sou. Em outro mundo de presente e sem futuro, um acordar que é somente rememorar.
No quintal com varal passa um avião fazendo barulho que assusta. É o mesmo varal e o mesmo avião e até o quintal se repete. Mas não é o mesmo momento, é outro e no entanto não é passado. Muito menos um futuro.
Dentro do porão uma aranha tece. Ela tece junto a janela quebrada cheia de pó que se acumula desde anos. O teto baixo pintado de branco e a porta que raspa no chão vermelho desbotado. Umidade. Tudo é conhecido e tudo tem a estranheza de uma primeira descoberta. O porão não guarda lembrança alguma, e nem pode ser considerado desconhecido. Ele é presente.
Dormir e acordar em outro mundo. Verde e cinza. Frio sem que o frio nos faça desconforto. Mundo de movimentos ensaiados para dentro. Mundo de onde nada pode cair e se perder e onde a destruição cessa e a construção esfria mais que aquece.
Nesse mundo de vácuo cheio de possibilidades o tempo se engole a si-mesmo. A areia sobe rumo ao presente. O presente é o destino. Volta.
Acordar é um futuro. Dormir é um futuro. Mundo outro que não espera. Pássaros de silêncio e folhas de rosas dormindo sobre o papel que crianças recortam e riem. Ao mesmo momento ecoa um recorte de lembrança.
A dança existe sem a dançarina. A música é cantada sem o tempo. E a cor respira no escuro. Silêncio. O sono era barulho e fúria. Acordar é silêncio.
Acordar em outro mundo sendo o mesmo e ao mesmo tempo sendo outro.
A poesia é pouca.
Escrevo isto após reler QUATRO QUARTETOS de Eliot.
Essas imagens saem de mim.
Essa ideia nasce em mim.
Faz sentido em mim.
Poesia é árvore, seiva da terra ao ar.
Um sim.
Essa frase ecoa em mim, dentro de mim. Dormir e esquecer. Não esquecer, ainda saber o que se é e o que se teve. Dormir e acordar em outra praia. Mas não é o mar que conhecemos, é outro mar e outro céu.
Outro eu que ainda relembra o eu que sou. Em outro mundo de presente e sem futuro, um acordar que é somente rememorar.
No quintal com varal passa um avião fazendo barulho que assusta. É o mesmo varal e o mesmo avião e até o quintal se repete. Mas não é o mesmo momento, é outro e no entanto não é passado. Muito menos um futuro.
Dentro do porão uma aranha tece. Ela tece junto a janela quebrada cheia de pó que se acumula desde anos. O teto baixo pintado de branco e a porta que raspa no chão vermelho desbotado. Umidade. Tudo é conhecido e tudo tem a estranheza de uma primeira descoberta. O porão não guarda lembrança alguma, e nem pode ser considerado desconhecido. Ele é presente.
Dormir e acordar em outro mundo. Verde e cinza. Frio sem que o frio nos faça desconforto. Mundo de movimentos ensaiados para dentro. Mundo de onde nada pode cair e se perder e onde a destruição cessa e a construção esfria mais que aquece.
Nesse mundo de vácuo cheio de possibilidades o tempo se engole a si-mesmo. A areia sobe rumo ao presente. O presente é o destino. Volta.
Acordar é um futuro. Dormir é um futuro. Mundo outro que não espera. Pássaros de silêncio e folhas de rosas dormindo sobre o papel que crianças recortam e riem. Ao mesmo momento ecoa um recorte de lembrança.
A dança existe sem a dançarina. A música é cantada sem o tempo. E a cor respira no escuro. Silêncio. O sono era barulho e fúria. Acordar é silêncio.
Acordar em outro mundo sendo o mesmo e ao mesmo tempo sendo outro.
A poesia é pouca.
Escrevo isto após reler QUATRO QUARTETOS de Eliot.
Essas imagens saem de mim.
Essa ideia nasce em mim.
Faz sentido em mim.
Poesia é árvore, seiva da terra ao ar.
Um sim.
MORTE NA CATEDRAL- T.S. ELIOT
Talvez as pessoas tenham hoje vergonha de gostar de Eliot. Gostam, mas vem sempre um "porém..." Why?
Eliot dizia ser anglicano, monarquista e clássico. Ou seja, dizia crer em Deus, escolher a rainha e amar o período da arte clássica. Americano de St.Louis, como aconteceu antes com Henry James, Eliot foi mais inglês que qualquer inglês. Isso não é raro. Filhos de ex-colônias costumam ser mais metropolitanos que os naturais da metrópole. Além do que, Eliot era filho de uma familia rica dos USA. Seus antepassados podiam ser encontrados no navio que trouxe os peregrinos ingleses.
Ele começa como modernista radical e logo cedo lança o poema símbolo do século XX, THE WASTE LAND, imagem de niilismo absoluto. O mundo para Eliot é um monte de fragmentos sem sentido. Quando aos 40 anos ele se converte á religião, o mundo passa a lhe parecer conjunto de fragmentos com sentido oculto. Em que pese a fama de Waste Land, que eu venero, a crítica atual prefere sua fase tardia, aquela de 4 QUARTETOS. Em 1948 Eliot ganha seu Nobel, justo. Falece em 1965.
Mais que seu conservadorismo ( que não se reflete em sua arte sempre moderna ), o que irritou a crítica foram suas opiniões sobre poetas e romancistas. Eliot foi crítico muito lido e atacou Lawrence, Yeats, Wells e Shaw. Poeta, crítico, dramaturgo, conferencista. Eliot domina as letras inglesas entre 1922/1960.
CRIME NA CATEDRAL fala do assassinato de Thomas Beckett, bispo de Canterbury, em 1170. Thomas foi o grande amigo do rei, Henrique II, mas ao ser alçado pelo rei ao bispado, passou a levar a religião "MUITO A ´SERIO", obedecendo apenas a Deus. Logo o rei passa a tramar sua morte. Essa história foi usada num dos maiores filmes ingleses da história, BECKETT, que não se baseia nesta peça. O texto de Eliot, curto, litúrgico, tentativa de se fazer um novo Ésquilo em plena época de segunda guerra, tem uma beleza linguística genuína. Os poucos personagens ( Thomas, um coro, tentadores e soldados ), falam com poesia, declamam com precisão. Nada há de choroso, Thomas Beckett jamais pede nossa pena. E, de forma desconcertante, ao final os assassinos se explicam a nós. É uma peça fria, seca, ou seja, clássica.
É a melhor peça de Eliot.
Eliot dizia ser anglicano, monarquista e clássico. Ou seja, dizia crer em Deus, escolher a rainha e amar o período da arte clássica. Americano de St.Louis, como aconteceu antes com Henry James, Eliot foi mais inglês que qualquer inglês. Isso não é raro. Filhos de ex-colônias costumam ser mais metropolitanos que os naturais da metrópole. Além do que, Eliot era filho de uma familia rica dos USA. Seus antepassados podiam ser encontrados no navio que trouxe os peregrinos ingleses.
Ele começa como modernista radical e logo cedo lança o poema símbolo do século XX, THE WASTE LAND, imagem de niilismo absoluto. O mundo para Eliot é um monte de fragmentos sem sentido. Quando aos 40 anos ele se converte á religião, o mundo passa a lhe parecer conjunto de fragmentos com sentido oculto. Em que pese a fama de Waste Land, que eu venero, a crítica atual prefere sua fase tardia, aquela de 4 QUARTETOS. Em 1948 Eliot ganha seu Nobel, justo. Falece em 1965.
Mais que seu conservadorismo ( que não se reflete em sua arte sempre moderna ), o que irritou a crítica foram suas opiniões sobre poetas e romancistas. Eliot foi crítico muito lido e atacou Lawrence, Yeats, Wells e Shaw. Poeta, crítico, dramaturgo, conferencista. Eliot domina as letras inglesas entre 1922/1960.
CRIME NA CATEDRAL fala do assassinato de Thomas Beckett, bispo de Canterbury, em 1170. Thomas foi o grande amigo do rei, Henrique II, mas ao ser alçado pelo rei ao bispado, passou a levar a religião "MUITO A ´SERIO", obedecendo apenas a Deus. Logo o rei passa a tramar sua morte. Essa história foi usada num dos maiores filmes ingleses da história, BECKETT, que não se baseia nesta peça. O texto de Eliot, curto, litúrgico, tentativa de se fazer um novo Ésquilo em plena época de segunda guerra, tem uma beleza linguística genuína. Os poucos personagens ( Thomas, um coro, tentadores e soldados ), falam com poesia, declamam com precisão. Nada há de choroso, Thomas Beckett jamais pede nossa pena. E, de forma desconcertante, ao final os assassinos se explicam a nós. É uma peça fria, seca, ou seja, clássica.
É a melhor peça de Eliot.
ASH WEDNESDAY - TS ELIOT ( E ROXY'S MOTHER OF PEARL)
Aqui Eliot entra em sua terceira fase. Não mais o coloquialismo, não mais o modernismo. Agora ele tenta encontrar o sagrado na vida.
Escreverei sobre este poema sem citar uma só linha de seus versos. Basta saber que Eliot sempre escreve poesia sem poetasiar. É totalmente anti-Vinicius. Nada tem de poeta-das-menininhas. E também nada faz dele um "irmãos Campos". Eliot não faz experiências.
Sem rimas, seu segredo é o ritmo. Tudo que ele escreve é musical. As imagens e as palavras vêm e vão e se repetem como se fossem notas e arranjos. Sua escrita é um tornado.
Aqui ele fala do que?
Dos ossos. Dos leopardos que comeram sua carne. Da árvore seca. E de uma Dama de azul e branco. Deserto.
Mas o texto é otimista. Pois ele não mais tem medo. Eliot entendeu.
ASH WEDNESDAY, de 1930, me faz pensar. Em escolhas.
Escolhemos o dois mais dois como eternamente quatro. E agora pagamos o pato.
Optamos pelo olho e pelo ouvido. A mão e o osso. Enterramos ( no inconsciente? ) o não visível.
Religião virou igreja. Torre de pedra com ritos e mandamentos sem nenhum significado.
E arte se tornou cada vez mais a assinatura de uma vaidade.
Mas já falei tanto disso e me dá tanta preguiça..... Pois o que me motiva é a Dama de azul e branco, a rica simbologia dessa mulher que não se pode ter e jamais será conhecida. Essa imagem de religião verdadeira e de morte gloriosa. Esse sentimento que a arte superior tenta nos fazer rememorar.
Em 1300 a arte toma o lugar do sagrado ( já que a igreja se torna PODER ).
E passa a ser, quando verdadeira, a busca pelo invisível e pelo atemporal. Um sentido para uma vida que passa a negar toda transcendencia, que só crê no provado e comum. É na arte, poesia e música, depois teatro e prosa, que se ora.
Mas agora, de 1800 em diante, também a arte lentamente apodrece. Vai perdendo o dom de engrandecer e de sacralizar. Torna-se uma questão de refazer e de erguer egos.
O dois mais dois se torna a única realidade.
A grande obra hoje é sempre da ciência. O acelerador de partículas, o ônibus espacial, o micro. Nosso engenho está todo focado nisso e sómente nisso. O hiper talento humano não mora na arte, muito menos na religião. Ele é todo matemático, o que existe é o que pode ser medido, pesado e transformado em equação.
Todo o resto é poesia.
Mas é aí que a porca torce o rabo.
Pois não há satisfação nessa lousa e nesse chip. Continuamos os mesmos caras de 1300.
Queremos glória viril. Queremos ser lembrados. Queremos uma casa em paz e um campo de provas. A Dama de azul e branco. Êxtase e transcendência. Vinho e sono.
O dois mais dois nos oferece em troca glória virtual. Esquecimento. A morte da casa e o fim da busca pela sóbria paz. A não-concentração e relativização. Uma dama de preto e de vermelho, sem segredos e sem sacrifícios. Comodismo e eficiência. Pílulas e insônia.
Ouça.
Mother of Pearl, Roxy Music.
Tudo isto está lá. É como She Comes in Color do Love de Arthur Lee. Transcendência no pop. A chance de perfeição. Nosso espírito cantando.
Ouça.
Após Mother of Pearl vem Sunset.
Não há mais chance para nós?
Escreverei sobre este poema sem citar uma só linha de seus versos. Basta saber que Eliot sempre escreve poesia sem poetasiar. É totalmente anti-Vinicius. Nada tem de poeta-das-menininhas. E também nada faz dele um "irmãos Campos". Eliot não faz experiências.
Sem rimas, seu segredo é o ritmo. Tudo que ele escreve é musical. As imagens e as palavras vêm e vão e se repetem como se fossem notas e arranjos. Sua escrita é um tornado.
Aqui ele fala do que?
Dos ossos. Dos leopardos que comeram sua carne. Da árvore seca. E de uma Dama de azul e branco. Deserto.
Mas o texto é otimista. Pois ele não mais tem medo. Eliot entendeu.
ASH WEDNESDAY, de 1930, me faz pensar. Em escolhas.
Escolhemos o dois mais dois como eternamente quatro. E agora pagamos o pato.
Optamos pelo olho e pelo ouvido. A mão e o osso. Enterramos ( no inconsciente? ) o não visível.
Religião virou igreja. Torre de pedra com ritos e mandamentos sem nenhum significado.
E arte se tornou cada vez mais a assinatura de uma vaidade.
Mas já falei tanto disso e me dá tanta preguiça..... Pois o que me motiva é a Dama de azul e branco, a rica simbologia dessa mulher que não se pode ter e jamais será conhecida. Essa imagem de religião verdadeira e de morte gloriosa. Esse sentimento que a arte superior tenta nos fazer rememorar.
Em 1300 a arte toma o lugar do sagrado ( já que a igreja se torna PODER ).
E passa a ser, quando verdadeira, a busca pelo invisível e pelo atemporal. Um sentido para uma vida que passa a negar toda transcendencia, que só crê no provado e comum. É na arte, poesia e música, depois teatro e prosa, que se ora.
Mas agora, de 1800 em diante, também a arte lentamente apodrece. Vai perdendo o dom de engrandecer e de sacralizar. Torna-se uma questão de refazer e de erguer egos.
O dois mais dois se torna a única realidade.
A grande obra hoje é sempre da ciência. O acelerador de partículas, o ônibus espacial, o micro. Nosso engenho está todo focado nisso e sómente nisso. O hiper talento humano não mora na arte, muito menos na religião. Ele é todo matemático, o que existe é o que pode ser medido, pesado e transformado em equação.
Todo o resto é poesia.
Mas é aí que a porca torce o rabo.
Pois não há satisfação nessa lousa e nesse chip. Continuamos os mesmos caras de 1300.
Queremos glória viril. Queremos ser lembrados. Queremos uma casa em paz e um campo de provas. A Dama de azul e branco. Êxtase e transcendência. Vinho e sono.
O dois mais dois nos oferece em troca glória virtual. Esquecimento. A morte da casa e o fim da busca pela sóbria paz. A não-concentração e relativização. Uma dama de preto e de vermelho, sem segredos e sem sacrifícios. Comodismo e eficiência. Pílulas e insônia.
Ouça.
Mother of Pearl, Roxy Music.
Tudo isto está lá. É como She Comes in Color do Love de Arthur Lee. Transcendência no pop. A chance de perfeição. Nosso espírito cantando.
Ouça.
Após Mother of Pearl vem Sunset.
Não há mais chance para nós?
QUATRO QUARTETOS- T.S. ELIOT
Os poetas sentem antes aquilo que será sentimento comum no futuro. Conheço um cara que aos 16, nos anos desbundados ( 1979 ) teve uma crise, rara na época, de " não sentido". Nada lhe interessava e a vida lhe parecia já vivida. Sentia-se velho, no fim da picada. Esse mesmo ser, aos 23, em plenos efervescentes anos 80, adquiriu uma sindrome de pânico, num tempo em que ela era confundida com frescura-aguda. Ele não é um poeta, mas tem um espírito meio poético, meio vago, meio meio... Imagine então o que não deve captar a antena de um verdadeiro poeta !
Conheço hoje um garoto de 19 anos. Ele tem dinheiro, mora num belo lugar. Está sempre rindo e fala com qualquer um. Cheio de amigas, vai pegar onda, e está na faculdade que escolheu. Ele vive atualmente uma crise e toma anti-deprê. Diz que nada mais o interessa na vida. Não, não vou falar da falência de nosso tempo. Este mundo não nos oferece nada mais que pareça verdadeiro/ belo e eterno. Vivemos o falso/ desequilibrado e fugaz. Bom...
Eliot foi maior que Wallace Stevens. E ser maior que Stevens é ser quase um deus. Quatro Quartetos se divide em quatro poemas. Eis...
BURNT NORTON é o primeiro.
O TEMPO PRESENTE E O TEMPO PASSADO
ESTÃO AMBOS TALVEZ PRESENTES NO TEMPO FUTURO
E O TEMPO FUTURO CONTIDO NO TEMPO PASSADO.
SE TODO O TEMPO É ETERNAMENTE PRESENTE
TODO TEMPO É IRREDIMÍVEL.
O QUE PODERIA TER SIDO É UMA ABSTRAÇÃO
QUE PERMANECE PERPÉTUA POSSIBILIDADE,
NESSE MUNDO DE ESPECULAÇÃO.
Eliot nasceu americano. Seus ancestrais vieram da costa inglesa, três séculos antes. A vida de Eliot foi a procura dessa origem. Não por acaso, ele começa sua carreira poética como um modernista, e a encerra como, em suas palavras : " Católico, monarquista e conservador ". É mais um dos americanos que se fez inglês.
Os Quatro Quartetos são sua última grande obra. The Waste Land é melhor. É em Waste Land que Eliot antecipa ( 1922 ) aquilo que hoje nos é cotidiano. Mas estes dias ando relendo os Quartetos. ( 1946 ).
SOBRE FACES TENSAS REPUXADAS PELO TEMPO
DISTRAÍDAS PELA DISTRAÇÃO DA DISTRAÇÃO
CHEIAS DE FANTASMAGORIAS E ERMAS DE SENTIDO
TÚMIDA APATIA SEM CONCENTRAÇÃO
Ele quase consegue sair do tempo. Você lê Eliot e sente que o sentido final de tudo está lá, que falta um passo, uma frase, um segundo... Mas a expectativa não se resolve. Eliot é o poeta de nosso tempo por ser o poeta da irresolução.
Mais um trecho.
O AMOR É EM SI MESMO IMÓVEL
APENAS CAUSA E FIM DO MOVIMENTO
SEM TEMPO E SEM DESEJO
EXCETO EM SUA MÁSCARA DE TEMPO
CAPTURADO SOB FORMA DE LIMITAÇÃO
ENTRE O SER E O NÃO-SER.
Parte dois : EAST COKER
EM MEU PRINCÍPIO ESTÁ MEU FIM.
UMAS APÓS OUTRAS AS CASAS SE LEVANTAM, TOMBAM, DESMORONAM, SÃO AMPLIADAS, REMOVIDAS, DESTRUÍDAS, RESTAURADAS, OU EM SEU LUGAR
IRROMPE UM CAMPO ABERTO, UMA USINA OU UM ATALHO....
... TERRA AGORA FEITA CARNE, FEZES E PELE...
Eliot procura mostrar o tempo como abstração. Nada daquilo que percebemos como antes e depois pode existir. A vida é fora do tempo. Mas acreditamos nesse passar de tempo...
DESPONTA A AURORA E UM NOVO DIA
PARA O SILÊNCIO E O CALOR SE APRESTA. O VENTO DA AURORA
DESLIZA E ONDULA NO MARALTO. ESTOU AQUI,
OU ALÍ, OU MAIS ALÉM. EM MEU PRINCÍPIO.
QUE VALOR PODE TER A CALMA TÃO LONGAMENTE ESPERADA
COM TANTO ARDOR DESEJADA, A SERENIDADE OUTONAL
E A SABEDORIA DA VELHICE ? TERIAM ELES NOS LOGRADO
OU LOGRARAM-SE A SI PRÓPRIOS, OS MAIS VELHOS DE FALA COMEDIDA,
QUE NOS LEGARAM APENAS O RECIBO DE UMA FRAUDE ?
A SERENIDADE NÃO PASSA DE EMBRUTECIMENTO VOLUNTÁRIO
A SABEDORIA ENCERRA APENAS O CONHECIMENTO DE SEGREDOS MORTOS,
Sim, Eliot não nos dá o que gostaríamos de obter. Consolo. Quando ele beira o místico, dizendo que o tempo é ilusão, ele também ataca a facilidade do consolo. Não existe sabedoria ou experiência. Pois o tempo é de cada um, individual, e conhecimento profundo não pode ser dividido. Eu vivo em meu tempo, voce vive seu tempo; e estamos sós nesse nosso particular universo.
NO CONHECIMENTO QUE DERIVA DA EXPERIÊNCIA
O CONHECIMENTO IMPÕE UM MODELO, E FALSIFICA,
PORQUE O MODELO É VÁRIO PARA CADA INSTANTE
E CADA INSTANTE UMA NOVA E PENOSA AVALIAÇÃO DE TUDO QUANTO FOMOS.
....
QUE NÃO FALEM DA SABEDORIA DOS VELHOS, MAS ANTES DE SEU DELIRIO.
DE SEU MEDO DO FRENESÍ, DO MEDO DE SEREM POSSUÍDOS
DE PERTENCEREM A UM OUTRO, OU A OUTROS OU A DEUS.
A ÚNICA SABEDORIA A QUE PODEMOS ASPIRAR
É A SABEDORIA DA HUMILDADE : A HUMILDADE É INFINITA.
TODAS AS CASAS SUBMERGIRAM NO MAR.
TODOS OS BAILARINOS SUBMERGIRAM NA COLINA.
PARA CHEGARES ONDE ESTÁS, PARA SAÍRES DE ONDE NÃO ESTÁS
DEVES SEGUIR POR UM CAMINHO EM QUE O ÊXTASE NÃO MEDRA.
PARA CHEGARES AO QUE NÃO SABES
DEVES SEGUIR PELO CAMINHO DA IGNORÂNCIA.
PARA POSSUIRES O QUE NÃO POSSUIS
DEVES SEGUIR O CAMINHO DO DESPOJAMENTO
PARA CHEGARES AO QUE NÃO ÉS
DEVES CRUZAR PELO CAMINHO EM QUE NÃO ÉS.
E O QUE NÃO SABES É APENAS O QUE SABES.
E O QUE POSSUIS É O QUE NÃO POSSUIS
ESTÁS ONDE NÃO ESTÁS.
Eliot amava sobretudo dois livros : A Comédia de Dante Alighieri e os Upanishads, da cultura hindú. Ele foi moderno sendo antigo, ou melhor, atemporal. Quando ele fala da tolice dos velhos ele fala daqueles sábios que se dizem mestres, dos conselheiros, dos doutores em sociologia, em filosofia, em psicologia, em física, em vida. Ser sábio é negar a vida, pois todo saber está preso ao tempo, cristalizado no momento em que foi emitido/criado, está morto.
O MUNDO INTEIRO SÓ NOS VALE DE HOSPITAL
ÚLTIMO BEM DO MILIONÁRIO ARRUINADO
E ONDE, SE TUDO CORRER BEM, PODEREMOS
MORRER DO ABSOLUTO E PATERNAL CUIDADO
QUE A CADA INSTANTE NOS AMPARA E TIRANIZA.
É SEMPRE UM NOVO COMEÇAR E UMA NOVA ESPÉCIE DE FRACASSO
POIS APENAS SE APRENDEU A ESCOLHER O MELHOR DAS PALAVRAS
PARA O QUE NÃO HÁ MAIS A DIZER.
EM MEU FIM ESTÁ MEU PRINCÍPIO.
Parte 3. The Dry Salvages. ( Todas as partes são nomes de lugares que marcaram a vida do poeta ).
Aqui Eliot diz uma coisa que me toca muito profundamente :
NÃO SEI MUITO ACERCA DE DEUSES, MAS CREIO QUE O RIO É UM DEUS PODEROSO DEUS CASTANHO- TACITURNO, INDÔMITO E INTRATÁVEL
PACIENTE ATÉ CERTO PONTO, A PRINCÍPIO RECONHECIDO COMO FRONTEIRA,
ÚTIL, CONFIDENTE, COMO UM CAIXEIRO-VIAJANTE.
DEPOIS APENAS UM PROBLEMA QUE AO CONSTRUTOR DE PONTES DESAFIA.
RESOLVIDO O PROBLEMA, O DEUS CASTANHO É QUASE ESQUECIDO PELOS MORADORES DA CIDADE-- SEMPRE CONTUDO, IMPLACÁVEL, FIEL ÀS SUAS IRAS E ÉPOCAS DE CHEIAS
RECORDANDO O QUE OS HOMENS PREFEREM ESQUECER.
DESPREZADO PELOS ADORADORES DA MÁQUINA, MAS ESPERANDO, ESPREITANDO.
SEU RITMO ESTAVA PRESENTE NO QUARTO DAS CRIANÇAS
NOS QUINTAIS DE ABRIL
NO AROMA DAS UVAS SOBRE A MESA OUTONAL
NO HALO DOS LAMPIÕES DE INVERNO.
O RIO FLUI DENTRO DE NÓS E O MAR NOS CERCA POR TODOS OS LADOS.
Como eu disse, poetas antecipam. O que Eliot escreve em 1946, hoje todos nós sentimos. Tememos. Vivemos.
São tantos os trechos maravilhosos que minha vontade é copiar tudo para dar de presente a quem me lê...
E TODA SUBIDA É UMA DESCIDA, TODO RETORNO UMA PARTIDA
NÃO O PODES ENCARAR FACE À FACE, MAS ISTO É O CERTO :
O TEMPO NADA CURA, E AQUI JÁ NÃO ESTÁ MAIS O PACIENTE.
...
NÃO SOIS OS MESMOS QUE DEIXARAM A ESTAÇÃO
BOA VIAJEM, NÃO !
MAS ADIANTE, VIAJANTES.
Parte 4. Little Gidding.
NÃO CESSAREMOS NUNCA DE EXPLORAR
E O FIM DE TODA EXPLORAÇÃO
SERÁ CHEGAR AO PONTO DE PARTIDA
E O LUGAR RECONHECER AINDA
COMO DA PRIMEIRA VEZ QUE O VIMOS.
PELA DESCONHECIDA/RELEMBRADA PORTA...
O tamanho de um artista é medido pelo tamanho da tarefa que ele se dá.
TS Eliot desejou transcender a vida.
Se ele conseguiu ? Claro que não. Mas o percurso que Eliot percorreu... a voz que ele nos fez ouvir... as palavras mortas que ele fez reviver...
Ler os Quartetos. Leia com muita calma, em momento fora do tempo. Não busque sabedoria ou beleza neles. Não procure sequer poesia.
Você encontrará tudo isso neles. Mas não procure. Dispense.
Há um maravilhoso momento nesses poemas em que ele diz que podemos escolher entre ser e não ser. Mas que na verdade podemos ter uma terceira opção : alhear. Ficar alheio ao tempo, a vida.
Leia distante da leitura. Talvez dê pra entender. Talvez o segredo se faça transponível.
Leia o rio também. O desprezado rio. Eliot é um rio assim como Yeats é uma nuvem que chove nesse rio. Feliz tempo o tempo de água.
Conheço hoje um garoto de 19 anos. Ele tem dinheiro, mora num belo lugar. Está sempre rindo e fala com qualquer um. Cheio de amigas, vai pegar onda, e está na faculdade que escolheu. Ele vive atualmente uma crise e toma anti-deprê. Diz que nada mais o interessa na vida. Não, não vou falar da falência de nosso tempo. Este mundo não nos oferece nada mais que pareça verdadeiro/ belo e eterno. Vivemos o falso/ desequilibrado e fugaz. Bom...
Eliot foi maior que Wallace Stevens. E ser maior que Stevens é ser quase um deus. Quatro Quartetos se divide em quatro poemas. Eis...
BURNT NORTON é o primeiro.
O TEMPO PRESENTE E O TEMPO PASSADO
ESTÃO AMBOS TALVEZ PRESENTES NO TEMPO FUTURO
E O TEMPO FUTURO CONTIDO NO TEMPO PASSADO.
SE TODO O TEMPO É ETERNAMENTE PRESENTE
TODO TEMPO É IRREDIMÍVEL.
O QUE PODERIA TER SIDO É UMA ABSTRAÇÃO
QUE PERMANECE PERPÉTUA POSSIBILIDADE,
NESSE MUNDO DE ESPECULAÇÃO.
Eliot nasceu americano. Seus ancestrais vieram da costa inglesa, três séculos antes. A vida de Eliot foi a procura dessa origem. Não por acaso, ele começa sua carreira poética como um modernista, e a encerra como, em suas palavras : " Católico, monarquista e conservador ". É mais um dos americanos que se fez inglês.
Os Quatro Quartetos são sua última grande obra. The Waste Land é melhor. É em Waste Land que Eliot antecipa ( 1922 ) aquilo que hoje nos é cotidiano. Mas estes dias ando relendo os Quartetos. ( 1946 ).
SOBRE FACES TENSAS REPUXADAS PELO TEMPO
DISTRAÍDAS PELA DISTRAÇÃO DA DISTRAÇÃO
CHEIAS DE FANTASMAGORIAS E ERMAS DE SENTIDO
TÚMIDA APATIA SEM CONCENTRAÇÃO
Ele quase consegue sair do tempo. Você lê Eliot e sente que o sentido final de tudo está lá, que falta um passo, uma frase, um segundo... Mas a expectativa não se resolve. Eliot é o poeta de nosso tempo por ser o poeta da irresolução.
Mais um trecho.
O AMOR É EM SI MESMO IMÓVEL
APENAS CAUSA E FIM DO MOVIMENTO
SEM TEMPO E SEM DESEJO
EXCETO EM SUA MÁSCARA DE TEMPO
CAPTURADO SOB FORMA DE LIMITAÇÃO
ENTRE O SER E O NÃO-SER.
Parte dois : EAST COKER
EM MEU PRINCÍPIO ESTÁ MEU FIM.
UMAS APÓS OUTRAS AS CASAS SE LEVANTAM, TOMBAM, DESMORONAM, SÃO AMPLIADAS, REMOVIDAS, DESTRUÍDAS, RESTAURADAS, OU EM SEU LUGAR
IRROMPE UM CAMPO ABERTO, UMA USINA OU UM ATALHO....
... TERRA AGORA FEITA CARNE, FEZES E PELE...
Eliot procura mostrar o tempo como abstração. Nada daquilo que percebemos como antes e depois pode existir. A vida é fora do tempo. Mas acreditamos nesse passar de tempo...
DESPONTA A AURORA E UM NOVO DIA
PARA O SILÊNCIO E O CALOR SE APRESTA. O VENTO DA AURORA
DESLIZA E ONDULA NO MARALTO. ESTOU AQUI,
OU ALÍ, OU MAIS ALÉM. EM MEU PRINCÍPIO.
QUE VALOR PODE TER A CALMA TÃO LONGAMENTE ESPERADA
COM TANTO ARDOR DESEJADA, A SERENIDADE OUTONAL
E A SABEDORIA DA VELHICE ? TERIAM ELES NOS LOGRADO
OU LOGRARAM-SE A SI PRÓPRIOS, OS MAIS VELHOS DE FALA COMEDIDA,
QUE NOS LEGARAM APENAS O RECIBO DE UMA FRAUDE ?
A SERENIDADE NÃO PASSA DE EMBRUTECIMENTO VOLUNTÁRIO
A SABEDORIA ENCERRA APENAS O CONHECIMENTO DE SEGREDOS MORTOS,
Sim, Eliot não nos dá o que gostaríamos de obter. Consolo. Quando ele beira o místico, dizendo que o tempo é ilusão, ele também ataca a facilidade do consolo. Não existe sabedoria ou experiência. Pois o tempo é de cada um, individual, e conhecimento profundo não pode ser dividido. Eu vivo em meu tempo, voce vive seu tempo; e estamos sós nesse nosso particular universo.
NO CONHECIMENTO QUE DERIVA DA EXPERIÊNCIA
O CONHECIMENTO IMPÕE UM MODELO, E FALSIFICA,
PORQUE O MODELO É VÁRIO PARA CADA INSTANTE
E CADA INSTANTE UMA NOVA E PENOSA AVALIAÇÃO DE TUDO QUANTO FOMOS.
....
QUE NÃO FALEM DA SABEDORIA DOS VELHOS, MAS ANTES DE SEU DELIRIO.
DE SEU MEDO DO FRENESÍ, DO MEDO DE SEREM POSSUÍDOS
DE PERTENCEREM A UM OUTRO, OU A OUTROS OU A DEUS.
A ÚNICA SABEDORIA A QUE PODEMOS ASPIRAR
É A SABEDORIA DA HUMILDADE : A HUMILDADE É INFINITA.
TODAS AS CASAS SUBMERGIRAM NO MAR.
TODOS OS BAILARINOS SUBMERGIRAM NA COLINA.
PARA CHEGARES ONDE ESTÁS, PARA SAÍRES DE ONDE NÃO ESTÁS
DEVES SEGUIR POR UM CAMINHO EM QUE O ÊXTASE NÃO MEDRA.
PARA CHEGARES AO QUE NÃO SABES
DEVES SEGUIR PELO CAMINHO DA IGNORÂNCIA.
PARA POSSUIRES O QUE NÃO POSSUIS
DEVES SEGUIR O CAMINHO DO DESPOJAMENTO
PARA CHEGARES AO QUE NÃO ÉS
DEVES CRUZAR PELO CAMINHO EM QUE NÃO ÉS.
E O QUE NÃO SABES É APENAS O QUE SABES.
E O QUE POSSUIS É O QUE NÃO POSSUIS
ESTÁS ONDE NÃO ESTÁS.
Eliot amava sobretudo dois livros : A Comédia de Dante Alighieri e os Upanishads, da cultura hindú. Ele foi moderno sendo antigo, ou melhor, atemporal. Quando ele fala da tolice dos velhos ele fala daqueles sábios que se dizem mestres, dos conselheiros, dos doutores em sociologia, em filosofia, em psicologia, em física, em vida. Ser sábio é negar a vida, pois todo saber está preso ao tempo, cristalizado no momento em que foi emitido/criado, está morto.
O MUNDO INTEIRO SÓ NOS VALE DE HOSPITAL
ÚLTIMO BEM DO MILIONÁRIO ARRUINADO
E ONDE, SE TUDO CORRER BEM, PODEREMOS
MORRER DO ABSOLUTO E PATERNAL CUIDADO
QUE A CADA INSTANTE NOS AMPARA E TIRANIZA.
É SEMPRE UM NOVO COMEÇAR E UMA NOVA ESPÉCIE DE FRACASSO
POIS APENAS SE APRENDEU A ESCOLHER O MELHOR DAS PALAVRAS
PARA O QUE NÃO HÁ MAIS A DIZER.
EM MEU FIM ESTÁ MEU PRINCÍPIO.
Parte 3. The Dry Salvages. ( Todas as partes são nomes de lugares que marcaram a vida do poeta ).
Aqui Eliot diz uma coisa que me toca muito profundamente :
NÃO SEI MUITO ACERCA DE DEUSES, MAS CREIO QUE O RIO É UM DEUS PODEROSO DEUS CASTANHO- TACITURNO, INDÔMITO E INTRATÁVEL
PACIENTE ATÉ CERTO PONTO, A PRINCÍPIO RECONHECIDO COMO FRONTEIRA,
ÚTIL, CONFIDENTE, COMO UM CAIXEIRO-VIAJANTE.
DEPOIS APENAS UM PROBLEMA QUE AO CONSTRUTOR DE PONTES DESAFIA.
RESOLVIDO O PROBLEMA, O DEUS CASTANHO É QUASE ESQUECIDO PELOS MORADORES DA CIDADE-- SEMPRE CONTUDO, IMPLACÁVEL, FIEL ÀS SUAS IRAS E ÉPOCAS DE CHEIAS
RECORDANDO O QUE OS HOMENS PREFEREM ESQUECER.
DESPREZADO PELOS ADORADORES DA MÁQUINA, MAS ESPERANDO, ESPREITANDO.
SEU RITMO ESTAVA PRESENTE NO QUARTO DAS CRIANÇAS
NOS QUINTAIS DE ABRIL
NO AROMA DAS UVAS SOBRE A MESA OUTONAL
NO HALO DOS LAMPIÕES DE INVERNO.
O RIO FLUI DENTRO DE NÓS E O MAR NOS CERCA POR TODOS OS LADOS.
Como eu disse, poetas antecipam. O que Eliot escreve em 1946, hoje todos nós sentimos. Tememos. Vivemos.
São tantos os trechos maravilhosos que minha vontade é copiar tudo para dar de presente a quem me lê...
E TODA SUBIDA É UMA DESCIDA, TODO RETORNO UMA PARTIDA
NÃO O PODES ENCARAR FACE À FACE, MAS ISTO É O CERTO :
O TEMPO NADA CURA, E AQUI JÁ NÃO ESTÁ MAIS O PACIENTE.
...
NÃO SOIS OS MESMOS QUE DEIXARAM A ESTAÇÃO
BOA VIAJEM, NÃO !
MAS ADIANTE, VIAJANTES.
Parte 4. Little Gidding.
NÃO CESSAREMOS NUNCA DE EXPLORAR
E O FIM DE TODA EXPLORAÇÃO
SERÁ CHEGAR AO PONTO DE PARTIDA
E O LUGAR RECONHECER AINDA
COMO DA PRIMEIRA VEZ QUE O VIMOS.
PELA DESCONHECIDA/RELEMBRADA PORTA...
O tamanho de um artista é medido pelo tamanho da tarefa que ele se dá.
TS Eliot desejou transcender a vida.
Se ele conseguiu ? Claro que não. Mas o percurso que Eliot percorreu... a voz que ele nos fez ouvir... as palavras mortas que ele fez reviver...
Ler os Quartetos. Leia com muita calma, em momento fora do tempo. Não busque sabedoria ou beleza neles. Não procure sequer poesia.
Você encontrará tudo isso neles. Mas não procure. Dispense.
Há um maravilhoso momento nesses poemas em que ele diz que podemos escolher entre ser e não ser. Mas que na verdade podemos ter uma terceira opção : alhear. Ficar alheio ao tempo, a vida.
Leia distante da leitura. Talvez dê pra entender. Talvez o segredo se faça transponível.
Leia o rio também. O desprezado rio. Eliot é um rio assim como Yeats é uma nuvem que chove nesse rio. Feliz tempo o tempo de água.
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