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DERRUBAR ÁRVORES - THOMAS BERNHARD. A ARTE MORRE SEM A CORAGEM.
Causa nojo, ódio, vergonha, asco, ver um monte de artistas, mortos sem o saber, lambendo os pés, puxando o saco, sorrindo para um chefe de estado que lhe dá um dinheirinho para montar sua peça ou publicar seu livrinho. Não existe arte sem coragem, sem a coragem de não ser dependente de ninguém e esses mortos não sabem que fedem a cadáveres. Venderam sua alma, o talento, que talvez tenham tido um dia, foi destruído pelos sorrisos de prostituta barata dados ao deputado, ao industrial que premia os melhores, ao ministro que na verdade os odeia e ri deles em casa. Artistas que babam quando percebem um bolso cheio disposto a investir em sua alma podre. ---------------- Neste livro Thomas Bernhard solta seus cachorros sobre um grupo de pessoas em um jantar feito em honra a um ator famoso. Por mais de 250 páginas tudo o que acontece é um incessante ataque aos convidados desse jantar. Mas porque ele aceitou ir ao tal jantar? Porque um dia ele foi um deles e após 30 anos uma amiga em comum se matou. O enterro foi pela manhã e no cemitério ele não teve como dizer não. E foi. ---------------- A falsidade vaidosa de todos explode, os beija mão, os elogios sem fim que são derramados aos colegas, a falta de fibra, de caráter, de honra, de verdade. O texto, que não dá trégua, é um pesadelo que mistura rostos feios com cenas de morte, palavras falsas e agressividade mal disfarçada, hipocrisia e talento castrado. ------------ Para quem é do Brasil esse livro cai como uma luva pois não há país com uma arte mais impotente que este. Um Thomas Bernhard brasileiro é impossível pois toda nossa arte ( Okay, 95% ) puxa o saco de todo político que lhes dê dinheiro e lambe o pé da realeza baiana estabelecida. A arte do Brasil é um feudo. ------------- " Todos os artistas austríacos se deixam comprar pelo estado e assim, com o peito cheio de condecorações, jamais atingem o topo de sua arte, pois sabem que são indignos da arte que um dia juraram servir." Frase de Bernhard. Coloque a carapuça em todo artista brasileiro. Fim.
MEUS PRÊMIOS - THOMAS BERNHARD
O melhor livro para começar a adentrar o mundo de Bernhard é este. Apenas 108 páginas onde ele narra pequenas histórias sobre as atribuições de seus prêmios. Tudo escrito naquele estilo fluido, de página sem parágrafos, onde ele escreve como pensa, frases e palavras se repetem, e tudo nos causa encanto e não, jamais aversão, causa encanto, não aversão. só encanto. ( Dei aí um pequeno exemplo de como se faz essa repetição que remete sempre ao humor essa repetição ). -------------------- Bernhard é terrível ao mesmo tempo! Ele odeia todo mundo e nesse pessimismo agressivo eu me lembro de Houllebecq. Mas, em que pese a lembrança, apesar de companheiros de negatividade, os espíritos são diferentes. O francês é mais....francês. Mais elaborado, verborrágico, e com alguma esperança. Bernhard é Bernhard, não há nele um caráter nacional, nada de alemão ou de austríaco, ele é um individualista radical. --------------- Fugindo de associações, aceitando os prêmios apenas por precisar do dinheiro, Bernhard é um desses, infelizmente, raros escritores realmente individualistas. Sua carte de desligamento da Academia é um exemplo de coragem e honestidade moral. Ele acusa os acadêmicos de futilidade, de serem mortos, de aceitarem dinheiro estatal para simplesmente tomarem chá e se auto elogiarem. O ESTADO NÃO DEVE DAR DINHEIRO A ARTE, JAMAIS! Cada artista que se vire como puder e que pague o ônus de seu trabalho, de sua escolha. -------------- A verdade é que Bernhard odeia escritores. Ele ama alguns poucos por serem realmente bons, mas no geral ele considera o meio um dos mais deploráveis do planeta. ---------------- Odiado por toda a ingteligência da Austria, percebo nele a coragem que aqui, no Brasil, país que se define pela cultura do puxa saquismo e do absoluto lambe cu, é impossível de existir. Temos uma linhagem de escritores embaixadores, funcionários públicos, quando não sustentados por bolsas estatais. É o modelo que cria uma arte preguiçosa, adulatória, pouco estimulante, pouco viril. Doce e boba. ------------------------- Algum acadêmico já se retirou por não concordar com algo que a academia fez? -------------------- Mais que tudo, ler Bernhard é uma dose enorme de fibra, de arrojo. O discurso de agradecimento que ele fez pelo Prêmio Literário da Academia de Bremen deveria ser matéria no curso de letras da USP. É uma das mais nobres e anarquistas e pessimistas peças já escritas. Página e meia ( seus discursos duravam 3 minutos ) que dá a radiografia do mundo de agora e de amanhã. Sem pudor. Sem um só palavrão. Indo, direto e sem enrolar, ao diagnóstico. O homem era grande.
THOMAS BERNHARD
Amigos, o fato de um leitor veterano como eu ainda ter escritores tão bons para ler, escritores ainda jamais lidos por mim, é maravilhoso! Vejam este caso: hoje comecei a ler Thomas Bernhard, e não consigo parar de o ler. ---------------- Bernhard era austríaco, e assim como o alemão Sebald, morreu inesperadamente e cedo demais, em 1989. Multi premiado, foi um anarquista. Ele criticava impiedosamente o estado, a Austria e a própria vida. E quando eu falo "criticava" não pense que são frases intelectuais bonitas e lógicas, não. Mas também não pense que são palavrões ou ofensas adolescentes, não. Bernhard fala o que se DEVE falar e assim preciso agora falar de seu estilo, que é aquilo que mais me impressionou. ------------------ Ele não usa parágrafo. A página é escrita inteira, sem uma pausa. Aí voce pensa: Pronto! É mais um chato como Henry James ( eu amo James ), ou um modernista como Proust ( eu amo Proust ). Pois eu te respondo: não é. Bernhard não usa a página sem pausa como "estilo", ele simplesmente escreve como pensa e ele pensa depressa, corrido. ------------- O texto é simples e é claro. ---------------- E ele repete frases inteiras e pasmem! É hilariante! Um autor considerado "terrível", " pessimista", é profundamente engraçado. É o riso de quem se dá mal, de quem está mal, de quem se ferra o tempo todo. Raramente eu dou risos lendo, mas me peguei rindo muito com ele. E, como o riso é a coisa que mais seduz uma pessoa, Bernhard ganhou um fã. ---------------- Ele não se parece com nada que li antes. É, como Sebald, um vento de esperança e uma luz de inspiração na literatura dos últimos 50 anos. Não, não vou dizer o que estou lendo, quando acabar escrevo outro post. Thomas Bernhard....vou ler tudo dele.
AS FOTOGRAFIAS
Thomas Bernhard não é fácil, seu pessimismo escorre. Há um texto dele, de 1986, que antecipa o que acontece hoje. Ele diz, sem dó ou tato, que as fotos, onde todos são felizes, bonitos, sorridentes, escondem a profunda miséria e tristeza dos tempos modernos. Sem querer e sem poder pensar, as pessoas exibem sua cara sorridente não só para enganar quem as vê, mas para crer ser ela aquela da fotografia. Quem a olha, a fotografia, finge também: esconde seu primeiro pensamento que é aquele que exclama: Esse não é voce! E assim, fotografado e observador, todos aprendem a ser hipócritas. -------------------- Caro Bernhard...em 2023 é bem pior! Porque se antes a gente fingia ocasionalmente, agora fingimos todo o tempo pois todo o tempo estamos aqui, on line, onde o que somos é nossa imagem fake. E onde aquele que olha também é um perfil filtrado e melhorado. Se em 1986 era uma foto que se olhava, agora é uma cotidianiedade compartilhada, ou seja, são 24 horas de fingimento. ----------------- Mas por que a felicidade falsa? Nas fotos de 1950, por exemplo, o que se tentava passar não era a tal felicidade. Era honradez. Seriedade. Força. Observe uma foto de seu avô e voce verá. A princípio alguém te dirá que a seriedade se deve a falta de costume com a lente, a timidez. Mas essa explicação é rasa. O fotógrafo profissional não pedia, jamais, que arreganhassemos os dentes. O que ele dizia era: Olha o Passarinho! ----------------- Mesmo atores de Hollywood, acostumado a posar todo o tempo, não faziam posas tolas de alegria eufórica. Era elegância fria. Distanciamento. Ou seriedade. ________________ A atitude era: Eu sou adulto. Agora ela é: Eu sou feliz. Feliz? Quem é feliz? ------------------- Se em 1950 se procurava em foto parecer sério, o motivo, provável, era que ninguém era muito sério e também ninguém era tão honrado assim. Então posso dizer que hoje ninguém é feliz, ou ninguém é tão feliz assim. Então se tenta ser, mesmo que numa foto. Tenta-se convencer a si mesmo: eu sou este. Não, voce não é. ---------------------- Não se engane, aquele seu bisavô carrancudo numa foto esmaecida está fingindo. Ele soltou uma gargalhada ao fim da foto. Do mesmo modo, seu amigo no insta não é aquele festeiro sorridente. Ele suspirou ao fim da foto. ---------------- Posso dizer, fotos são, em 90% dos casos, espelho invertido daquilo que ela mostra. ( Clarto que aqui não falo de fotos como aquelas de Doisneau com Matisse ou Picasso, fotos que mostram a alma de quem posa. Mas aí é outra história. )
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