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A EVOLUÇÃO CRIADORA - HENRI BERGSON

Este é o livro que deu o Nobel a Bergson. Se o século XIX foi aquele que endeusou a razão, a mecânica e o ateísmo, o começo do XX voltou seus olhos ao oculto. Henri Berson, filósofo francês, foi central nesse movimento. O que ele faz aqui, de modo sedutor, rigoroso, detalhista, é mostrar as falhas e limites na explicação da vida, na evolução darwinista e na própria definição do que seja vida. Ele explica o que é a inteligência, a diferença entre vegetal e animal e a importância da manutenção da memória para assim haver duração, sendo a duração o sentido do humano. ------------------------- O impulso que fez com que o não vivo se fizesse vida é uma das várias questões matreiramente evitadas pelos evolucionistas. Mas não só isso. Se um peixe sai da mar e se torna terrestre, movimento feito pela adaptação ou pela evolução, nada se fala sobre COMO ele entendeu que fora do mar haveria melhor vida. É o velho problema da ciência, ela lida com a morte e nunca com a vida. Para se estudar qualquer objeto, seja animal ou um mineral, é preciso o separar do TODO. A ciência estuda uma estrela ou uma galáxia, mas não o UNIVERSO inteiro. Isso corta toda linha vital, é estudado o coração mas não o corpo inteiro. A física estuda cada ponto percorrido pelo objeto, mas não a trajetória inteira em movimento. ----------------- Isso porque nossa inteligência entende apenas coisa a coisa e não tudo em conjunto. Isso se aplica até em relações humanas, haja visto que vemos um amigo como uma pessoa com características definidas, uma a uma, e não como um conjunto vivo de contradições sempre em mudança. --------------------- Para Bergson a vida é mais que movimento, ela é criação. Há um impulso criativo naquilo que é vivo, o impulso que cria guelras, asas, pés e olhos. A evolução é como uma explosão criativa, milhões de luzes que se dividem no céu ( como um fogo de artifício ). O simples cada vez mais complexo, e isso sem que jamais possamos tocar no segredo: de onde vem esse impulso vital. De onde o fogo que acendeu o pavio. E porque havia tal possibilidade de vida, quem fez o pavio. ------------------ Sim, pássaros de pernas longas caçam rãs em charcos. Mas ele formou uma perna longa enquanto tentava pegar rãs? Ou ele foi atrás das rãs por ter pernas longas? A criação das pernas longas nos é incompreensível, porque não explicamos os milhares de anos de ação para tal mudança ( me parece cômico uma ave ficar milênios tentando pegar rãs enquanto suas pernas se alongam. Seria mais lógico ela desenvolver um bico para pegar minhocas ). ------------------ Usamos um teclado que faz nossos dedos se alongarem ou temos dedos longos e por isso inventamos um teclado? A resposta é óbvia.

O ANIVERSÁRIO DO PRESENTE

O Natal, para muitos, é como um aniversário onde se celebra o presente que se dá ou se ganha, o feriado, mas se ignora o aniversariante. Obra do mundo moderno, uma pessoa típica de 2024 irá dizer que ela comemora o que quiser e que a verdade de um fato É AQUILO QUE ELA QUISER, PORQUE TUDO TEM MAIS DE UMA VERDADE. -------------------- Weeeeelllll....eis a imensa diferença entre o pensamento da direita e da esquerda. Diante de um fato histórico a direita diz, sim, é verdade. Já a esquerda dirá, não, tudo é relativo. Em extremo isso leva ao relativismo moral. Diante de um assassino a direita dirá, ele é culpado porque matou. A esquerda dirá, veja bem, nem sempre matar é um crime. Incesto, roubo, aborto aos 6 meses, a mentira, tudo pode ser relativizado, dependendo de quem o pratice e de quando o fez. ---------------- Isso leva á que? A destruição de qualquer possibilidade de convívio social. Se tudo pode ser discutido, então tudo deixa de ser seguro. A vida se torna um lodaçal onde nenhum passo é firme. ----------------- Antonio Gramsci percebeu que a revolução comunista não se faria mais pelas armas mas sim pela destruição interna da sociedade capitalista. Como? Tomando escolas e meios de comunicação e fazendo do relativismo uma nova lei. Uma lei cínica que tem por alvo aniquilar o convívio pacífico. No extremo, o único crime sem relativismo passa a ser CRER NA LEI. -------------- Roubar é sempre errado e matar é um crime em qualquer situação. Quando a polícia ou um soldado mata, isso é um ato terrível que tem, no caso da manutenção da lei, a permissão da sociedade se for uma morte sem escolha, para manter a saúde do todo. Dez milhões eliminam um para salvar a segurança do todo. É um ato de horror, mas é necessário. --------------------- Para a esquerda nada disso faz sentido. O homem que rouba e mata é tão justificável como o policial que o elimina. Não há lógica alguma nesse modo de pensar esquerdista, pelo simples fato de que se for levado em conta, nada mais irá funcionar numa cidade. Mas é esse o ponto. O objetivo é exatamente esse, destruir a velha sociedade e dos escombros construir o novo, o socialismo sem classes, portanto, sem crime. ( Na verdade haverão três classes, o povo, o burocrata e a classe dirigente, mas isso é ignorado na utopia ). ----------------- O Natal é símbolo dessa luta entre os dois grupos. A esquerda apaga da memória o nascimento do Cristo e a direita tenta manter essa verdade. A esquerda diz bobagens, inclusive erros absurdos como dizer que Jesus era muçulmano. ( O Islã foi criado 600 anos após Jesus nascer ). A mentira é usada quando é pela "boa causa" da destruição das certezas. ------------------- Eu disse certezas? Como é a mente de alguém que não tem certeza de nada a não ser da absolita infalibilidade de sua ideologia? ---------------- Ontem de noite eu tive uma epifania. Ao ver o rosto de Jesus numa tela algo disse em minha mente: é verdade, é verdade, é verdade. Imediatmante meu peito se aqueceu e minha pele se arrepiou. É verdade. È real. É tudo. Bom Natal para aqueles que lutam pela verdade no mundo.

CONVERSANDO COM ROGER SCRUTON - ROGER SCRUTON E MARK DOOLEY. ELE NÃO É NADA DO QUE PENSEI.

Mark Dooley encontra Scruton em sua fazenda na Inglaterra e conversa alguns dias com ele no seu escritório. Essa conversa se torna este livro e este livro vale como uma biografia de Scruton. ---------------- Roger Scruton, homem que mudou minha vida, não é aquilo que voce pensa. Seus pais eram opostos. A mãe, um tipo de ex aristocrata oprimida. Ele a adorava. O pai, um raivoso representante da velha classe trabalhadora de Manchester. Uma esquerda patriota, saudosista, irada, um tipo de esquerda que não existe mais. Scruton, sempre bom aluno, nunca pensou em ser filósofo. Ele queria ser poeta e romancista. E estudou ciências. Em Cambridge, ele entrou por mérito, descobriu um ambiente filosófico. Ao contrário dos outros, ele começou pela filosofia do século XX. Se apaixonou por Wittgeinstein. Depois Aristóteles, para ele o maior de todos e por fim, se deixou tomar por Kant e Hegel. ------------------ Eu disse que ele não é como voce pensa? Não, não é. Scruton morou na França nos anos 60 e principalmente em Roma. Leu Sartre, que ele admira, acha O Ser e O Nada uma obra prima, e foi boêmio. Em Roma ele descobriu ser um conservador, isso aos 25 anos. Até então ele pouco pensava em política, seu amor era a estética, a arte, a escrita. Lia muito Nietzsche. Mas em Roma ele conviveu com os radicais comunistas italianos de então e percebeu que nada tinha a ver com eles. O mesmo fato ocorreu comigo aos 18 anos, se aqueles caras eram de esquerda, bem, eu nada tinha e nada queria ter a ver com eles! Scruton fala uma coisa certeira sobre os hippies americanos que conheceu: " Gente de classe média que achava que se rebelar contra seus pais JUSTIFICAVA SUA VIDA" Toda a vida de um hippie era resumida a odiar seus pais. Scruton diz que tinha motivos de sobra para odiar seu pai, eles jamais se deram, mas não fez disso um projeto de vida e nem saiu pelo mundo se orgulhando disso. ----------------------------- Eu não terminei de ler o livro, mas estou gostando tanto que tive de escrever este pequeno texto. Estou na parte em que Roger volta para a Inglaterra e descobre que a educação inglesa, é 1980, se encontra tomada pela esquerda. O ensino passa a ser encher a cabeça dos jovens com frases revolucionárias que não fazem sentido nenhum. --------------- Depois conto mais.

DOGMA E RITUAL DA ALTA MAGIA - ELIPHAS LEVI

Não é um livro satânico. Editado no meio do século XIX, reeditado várias vezes, é provável ser este o mais sério e enciclopédico livro já escrito sobre o tema. Ele fala de todos os temas mágicos: fantasmas, adivinhações, maldições. Sua filosofia é esta: o poder é atingido pelo absoluto controle da mente, pela fé que é foco, pela certeza total e completa. Magia é vontade. E para se ter essa vontade irresistível é necessário dominar seus pensamentos, sentimentos, atitudes. O universo, cheio de almas, de seres, é comandado por quem detém essa força. Nada mais que isso. Por 500 páginas, ele destila exemplos, lendas, histórias, fatos. A imaginação é real, essa uma de suas frases que parecem tolas mas que revelam uma verdade. O que imaginamos já é real pelo fato de ser pensado, pois pensamentos fazem o mundo, assim como palavras modificam a realidade. É um livro inspirador, pois mesmo que voce despreze tudo que ele fala, há algo de tão vasto, tão grande, tão desafiador aqui, que voce se vê entrar numa outra onda, outro ponto de vista. Prove-o.

A NATUREZA HUMANA - ROGER SCRUTTON . E SOBRE UM TURCO.

Quando vemos uma pessoa temos a imediata certeza de que somos um EU e que ela é um VOCE. Mas ao mesmo tempo, sabemos que ela nos vê como um VOCE e que ela é um EU. Mais que desejar, travamos contato com o interior dessa pessoa, o exterior após um primeiro momento se torna aquilo que ele é, uma persona. Mais que a razão, o que define um Humano é essa certeza de ser um Eu e de estar vivendo em meio a VOCES. E assim, saber que há dentro deles a mesma realidade que há dentro do meu EU pois eles são seus próprios EUS. Este é o livro mais curto de Scrutton, e ao mesmo tempo seu texto mais difícil. Psicologia é o que norteia seu pensamento, e ele cita Wittgeinstein e Husserl, Descartes e Schoppenhauer. ------------ No mundo deste século há um movimento, proposital, de se quebrar essa corrente humana. A redução de todo fenômeno humano a simples hábitos evolutivos, faz com que a interioridade se reduza à um composto de genes e a subjetividade se torne mera evolução. O humano é aquele que ansia por ser livre e ao mesmo tempo participante de grupo, é o que se submete à lei por vontade própria e o que deseja aquilo que se esconde. Reduzir tudo isso à mera adaptação ao meio é matar aquilo que nos faz imensos. ---------------- Repare que tudo na modernidade tenta nos diminuir. Desde uma frase como " Diante do cosmos somos nada", até " Eis onde termina toda ambição", não há slogan que não procure incutir a certeza de nossa insignificância. Pior ainda, movimentos organizados como o que coloca um boxeador homem, que se acha mulher, em um ringue com uma mulher nascida mulher, reduz tudo à aparência, um tipo de brincadeira onde se ele se maquiar e usar roupas de mulher, será magicamente uma mulher. Não há modo mais eficiente de matar nossa interioridade que repetir incessantemente que a cor da pele me diferencia de voce, que o modo como me visto me faz diferente do que sou por nascimento, que posso ser me produzindo por fora hoje e agora. ----------------- Nessa absurda olimpíada, um atirador turco ganhou uma medalha de prata, e estranhamente ninguém fala do vencedor, mas apenas do turco. Dikec Yusuf. Isso porque ele competiu de chinelos, sem óculos e mira especiais ultra modernas, fuma durante a prova, tem barriga, e começou a atirar para ter o que fazer com seus filhos. Esse homem nada mais é que um macho de 1980 e por isso causa impressão ( Messi antes de conhecer Neymar era também um cara típico de 1980 e isso causava impressão ). Há nas pessoas uma saudade não assumida do pai típico, do chefe, do líder despretensioso. Mais que isso, da simplicidade sem afetação. Dikec parece adorável porque a imagem dele, um VOCE que vive dentro de nós, tem encontrado poucos Dikec por aí. Ele fumou um cigarro, tossiu e fez seu trabalho. Sem discurso, sem parecer inumano, sem representar grupo nenhum.

A INTERPRETAÇÃO DOS SONHOS - SIGMUND FREUD. A SAUDADE DA ÉPOCA DA RAINHA VITÓRIA

A popularidade de Freud se deve a um fato muito simples, é divertido ler seu livro. Ele tem tudo aquilo que fazia e faz o sucesso de um volume, tem suspense, sexo, mistério e algum horror. E parece moderno. É uma leitura voluptuosa. Como é a leitura de seu contemporâneo Sherlock Holmes. Freud é o Holmes da alma e como tal deve ser lido. Ele vai ao local do crime, recolhe pistas e soluciona o mistério. Por ser o autor do livro, é claro que ele sempre consegue resolver o problema. Freud, como dizia Bloom, é um romancista. A psicanálise, longe de ser uma ciência, é tentativa de transformar romance em vida real. Ela é aquilo que Freud dizia ser a religião, um consolo para a dor. E como tal, tem sua validade, pois às vezes ela alivia. Mesmo que para isso devamos crer naquilo que o autor narra. ----------------------- Meu amor pela psicologia foi conscientizada na noite em que vi, aos 15 anos, o filme Freud de John Huston pela primeira vez. O que me atraiu no filme foi sua ambientação tão vitoriana ( não conheço filme mais Europa 1890 que esse ), seu clima de filme de Sherlock Holmes e o heroísmo destemido de Freud. Ele parece um heroi. O heroi feito sob medida para um pensador, um heroi que age pela palavra. -------------------- Dizer que um sonho é SEMPRE a realização de um desejo é tão arbitrário quanto dizer que um sonho é a materialização de lembranças de outra vida. Não, não ria. Eu posso dizer que essas lembranças foram transformadas e censuradas e que surgem, em sua verdade, apenas com a ajuda de um xamã. É isso que incomoda em Freud. Tudo o que ele diz nos seduz, e algumas coisas eu julgo muito verdadeiras ( o ódio entre irmãos, a rivalidade entre machos, a criança capeta ), mas são verdades conhecidas desde sempre, Freud apenas as sexualizou. Ele poderia ter dito que uma criança tem um instinto de duende, ou de bicho selvagem, o resultado seria o mesmo que dizer que ela já tem desejo sexual. A criança se apega ao seio da mãe porque é macio e doce, não necessariamente porque ela tem desejos incestuosos. Assim como mostra o pênis como ato que faz os adultos reagirem à ela. Claro, essa é apenas minha visão. Mas o que lemos é também apenas a visão de um homem, Freud. A diferença é que ele é um gênio da escrita, e eu não. --------------------- Freud cria um mundo onde tudo faz sentido. Como Conan Doyle ou Henry James, as coisas se encaixam e aquilo que não se encaixaria é jogado fora. Se a doença mental é a perda da capacidade de fazer sentido, entrar no mundo de Freud pode ser curativo. Ele te dará um sentido. Ou não. Depende de sua disposição a crer nele. Há um momento em que ele fala de que Édipo fora interpretado erroneamente como uma parábola que descreve o poder do destino sobre os homens...well...qual a prova de que a visão de Freud seja a correta? ----------------- Jung perto de Freud é incomparavelmente pior autor. Nada há nele de romancista. E nem de cientista ( nenhum dos dois faz ciência ). Mas eu me acostumei a ver cada dado dito por Jung ser exaustivamente demonstrado por N relatos buscados na mitologia, religião, antropologia e filosofia. Jung é tão chato por isso, ele não narra nada, apenas enfileira suposições. Freud é totalmente o oposto. Ele pesquisa casos, encontra pistas e ilumina soluções. É o heroi de seu livro. ---------------- Não pense que estou, como fazem Nabokov ou Scrutton, condenando a arte do psicanalista. Eles são extremamente uteis e fiz terapia por anos. Admiro muito aqueles que são corretos. Um bom profissional traz consolo, sentido, faz com que o kaos mental se organize rumo a um objetivo. Não importa se Freud descreveu nossa mente como aquilo que ela é de fato. O que interessa é saber que ele inaugura algo que tem ajudado muita gente. ------------------- Se lido como uma interessante peça de arte da escrita, este é um grande livro. Lido como a verdade revelada, não faz muito sentido.

RETRATOS DE MEMÓRIA E OUTROS ENSAIOS - BERTRAND RUSSELL

Encontro um livro da Companhia Editora Nacional, publicado em 1958. Primeira surpresa, vejo que a editora tem 22 livros de Russell em catálogo. Outros tempos... ----------------- Russell nasceu em 1872 numa família de longa linhagem aristocrata. Estudou matemática e filosofia em Cambridge e ao longo de quase 100 anos, ele viveu até 1970!!!!, lúcido e produtivo, Bertrand Russell foi o intelectual central na cultura da Inglaterra. É famoso por sua obra, mas tembém por sua defesa da liberdade, da paz, da civilização. Estes textos, escitoe por ele aos 80 anos de idade, versam não só sobre fatos de sua vida, como também sobre política, educação, psicologia, filosofia e lógica. Ele fala também sobre pessoas que conheceu, seu avô que nasceu na época da queda da Bastilha e foi ministro, e gente como John Stuart Mill, Hegel, Lawrence, Shaw, Orwell, Wells. ------------- É pedagógico ler Russell porque ele escreve usando algo que atualmente não se usa: a lógica. Em estilo simples e conciso, ele nunca joga frases sem sentido, tudo tem de possuir um sentido claro e único. Quando ele fala de Liberdade, por exemplo, ele explica que liberdade é essa. ( No caso, a possibilidade de ter, fazer, falar e se mudar ). Socialista Fabiana, ou seja, não marxista, Russell faz ataques demolidores contra o comunismo. " Não posso aceitar nenhuma linha de pensamento que nasce no ódio. E tudo no comunismo é movido pelo ódio. Eles têm por objetivo a destruição e nunca apresentam nenhuma ideia sobre como construir. Não têm amor pelos pobres, mas antes um imenso desejo de destruir a riqueza". Depois dessa, nada mais há se falar sobre a coisa. -------------------- Russell não concorda com Hegel, que acha obscuro e metafísico, nem com Kant, que faz mero jogo de palavras. E talvez o melhor texto seja sobre Descartes. De uma maneira lógica ele demonstra que a frase " Penso, logo existo", não faz qualquer sentido. Russell demonstra, de modo sempre elegante, como se define o pensamento em um mundo pós quântico. -------------- Ele defende o tempo, antes da Primeira Guerra, em que se acreditava que o mundo evoluiria de modo lento, gradual e ordenado. Tempos felizes, otimistas, em que se acreditava que o destino do mundo era se tornar todo um tipo de Inglaterra, nações de parlamentos liberais. Russell diz que para ele é difícil aceitar um mundo tão diferente de sua juventude ( ele foi jovem em 1890-1910 ), um mundo, em 1958, que sofria a ameaça da Bomba, do totalitarismo, da falta de liberdade. ------------------ Várias vezes Russell fala de horrores de 1958 que são realidades ainda mais horrorosas hoje. Já na época ele percebia que " quanto mais organizada uma sociedade, mais pergio corre a liberdade, pois a vigilância aumenta, alimentada por burocratas que vivem dessa organização". Mas Russell é um otimista e diz que a vitória final é sempre do bem, isso porque o mal necessita de opressão e o homem só atinge alguma felicidade quando livre. Ele foi um grande, grande homem. PS: Socialismo Fabianista é uma corrente econômica que almeja e distribuição do bem estar sem a destruição da classe média. É um tipo de distribuição de lucros. Os socialistas marxismos os acham ingênuos. Os fabianistas achavam os marxistas utópicos e maldosos.

VOCE AINDA VAI TER SAUDADES DA REALIDADE...E NÃO HAVERÁ VOLTA

Recebi hoje um texto de um amigo e ele fala sobre a realidade, sobre o risco, sobre as relações reais. O que me inspirou a isto que agora escrevo. ----------------------------- Me relaciono com uma mulher muito, muito mais jovem que eu. Ela tem 26 anos. Ou seja, em 2008 ela tinha apenas 10. Falo 2008 porque foi quando entrei no orkut. Para ela, orkut é coisa da infancia, como era a TV para mim. ------------------- Pessoas com grande diferença de idade sempre enfrentam o choque de gerações. Mas entre eu e ela existe mais que um choque, nós somos de mundos tão diferentes que o choque nem acontece. Tento explicar o que acontece. -------------------- Mesmo a conhecendo tão bem, há algo nela que eu não consigo captar e nem mesmo dar um nome. Não brigamos e levamos tudo na razoável paz, mas falta alguma coisa. Nunca senti isso com mulher nenhuma. Já sofri, fui apaixonado, enganado, já me perdi, mas agora sinto algo vago, sem força, algo fantasmático. Como se uma sombra, mancha, algo que está mas não está. Me incomoda, mas não há como resolver com ela, pois ela nem percebe sua existência. ------------------- Então, ao ler o texto que me foi enviado, sinto algo. Algo que tem a ver não só com ela, como com todas as pessoas com menos de 30 anos com quem me relaciono. Eles têm POUCO CONTATO COM A REALIDADE. ----------------- Isso pode parecer tolice minha, afinal, é a geração que mais vê crimes ao vivo na rede, tragédias em tempo real, é a geração que mais fala da fome no mundo, da ecologia, dos direitos das minorias etc etc etc. Mas....isso tudo é informação, não é vivência. Mesmo que ela vá à guerra na Ucrânia, essa será uma experiência midiática, pois ela irá lá embuída de discursos já feitos e sentirá, e aí está a tragédia de sua geração, ela sentirá aquilo que ela ACHA QUE SE DEVE SENTIR. ------------------------ Mesmo sendo inteligente e tendo vindo da classe social mais sacrificada, eu sinto, e agora percebo, que ela vive com um pé SEMPRE fora da realidade. Ou melhor, uma perna fora. ---------------- Assim, quando vejo um por do sol, o que ela vê é a chance de uma foto. Quando servem um belo jantar, enquanto eu começo a comer, ela noticia nas redes o jantar. No meio de uma conversa séria, em que ela chora e o assunto é ela mesma, ela vê o que acabaram de mandar para ela, e então volta ao assunto do agora. É uma pessoa que nunca está aqui 100%, e pior, ela não sabe disso. Lendo sua mente espera saber o que está acontecendo lá longe, viajando ela pensa no que ficou aqui e aqui ela pensa no que vai ver além. Sua presença é leve como gás. Não há solidez, não há entrega absoluta ao momento, não há realidade. Desse modo, a sensação que tenho é que preciso, para estar com ela, jogar fora uma parte imensa de mim mesmo, e a falta que sinto é a falta disso, do mundo real, o mundo que acontece diante de meus olhos e não aquele intermediado por uma tela. ---------------- É irrecuperável. Pois assim como minha geração não tem consciência de sua pressa e do barulho em que vive e viveu sempre, eles não sabem que o mundo onde vivem nunca é o AGORA, mas sim o OUTRO LUGAR. ----------------------- Pior, aquele que vive ainda em uma razoável dose de realidade tende a irritar profundamente os FORA DO AGORA. Para eles, alguém como eu parece histérico, emocionado demais, sólido, pesado, uma presença que ameaça por parecer "violento", a violência do que vive aqui, na solidez sem fantasia. --------------------- No mundo real quando chove voce se molha e procura um abrigo. No mundo deles, quando chove voce se alegra pelas plantinhas, se preocupa com enchentes, pensa nas nuvens e na possível gripe. No meio de tanta coisa, voce não sente que está "apenas" molhado. O aqui da chuva e o agora da água fria. ------------------- O texto que li quase nada tem a ver com aquilo que falei aqui, mas ele catalizou esta minha percepção. ------------------ Quanto ao sexo...bem...para ela o sexo é apenas um gozo. Para mim é a coisa mais misteriosa do universo. E estranhamente, ele é mais real para mim, por ter peso e custo, e é quase nada para ela, por significar apenas o mesmo que comer um hamburger ou ir ao cinema. ------------------- Termino dizendo que as gerações futuras sentirão uma estranha tristeza de alguma coisa que não saberão o que é. Assim como nós sentimos uma vaga tristeza sem nome, talvez saudade de Deus ou do mundo da caça, eles sentirão algo pior: saudades da realidade. Saudades de quando se vivia e não se via.

O NASCIMENTO DA TRAGÉDIA - NIETZSCHE

Puxar a longa gaveta de ferro e aspirar o cheiro das fichas velhas, cada uma com as informações e o código de cada livro. Entregar a ficha à bibliotecária e pegar então o livro, no caso um pequeno, velho e gordo livro de capa marrom, dura, onde se lia O NASCIMENTO DA TRAGÉDIA. eRA 1992, e eu saía da biblioteca da FIAM, minha faculdade, rumo ao quintal da minha casa, onde debaixo do sol pálido de maio, vento frio, eu leria o texto em duas tardes. ----------------- Releio hoje, tanto tempo depois e é claro que ele não causa o mesmo efeito que causou naquele jovem, eu, dos anos 90. Nietzsche é romântico, mesmo odiando o romantismo, e sua empolgação apaixonada não me atinge como então. Um filósofo que nunca parece frio, eis sua grande diferença. Quem procurar esse calor em outros filósofos ficará perdido. Pois o alemão é dionisíaco, ou procura ser, é aqui que ele faz a distinção entre arte de Dionísio e a de Apolo. Uma sendo solar, correta, ingênua, otimista, e a outra pessimista e do transe orgiástico. Os gregos teriam se tornado cultores do belo e da harmonia apenas após viver o mundo de Dionísio, e o teatro teria sido o instrumento a fazer esse percurso. --------------- A música, a mais dionisíaca das artes, é reflexo da condição espiritual de um povo e de uma nação. -------------- Basicamente é isso, mas tudo escrito na prosa, ainda não poética, de Nietzsche. É seu primeiro e mais acessível livro.

A PERCEPÇÃO À PORTA

Só ao homem e a nenhum outro ser é dado olhar e ver. No olho do animal é visto o que lhe dita o desejo de viver: comida, proteção e preservação. O amor de seu cão por voce é a certeza de ser cuidado. Mas o homem....sim, eu adoro meus cães mas não faço parte dessa baboseira de achar que somos menos que eles. Nós somos os olhos do universo meu amigo. Se somos um grão de pó em meio ao infinito, é este grão que observa e olha e anota e idolatra o cosmos. E mais ninguém. ----------------------- Olhamos e vemos pois apreciamos. E mais que isso. Huxley fala nas Portas da Percepção do olhar às coisas como elas são e não como as conceituamos. Pare agora e olhe esta tela. Se esforce, vamos lá. Luz que é irradiada. Pequenos pontos pretos. Toques de azul e de laranja. Olhe e veja. Lembre como se faz isso: ------------------------- Na minha mesa de centro há um boneco de um marinheiro. Eu o possuo desde 2002, mas nunca o vejo. Paro e olho: blusa branca com listras azuis. Calça folgada. Uma barba branca. Olho mais. Sapatos marrons. Cinto largo, preto. Quepe. Nunca o vi. Ele está em minha casa faz 22 anos, mas eu bato o olho nele, mas nunca o vi. ------------------ Um volume da coleção Ler e Saber, 1967. Tenho-o desde criança. Eu ficava horas com um deles nas mãos. Uma cena de guerra: soldados medievais subindo pelas paredes de um castelo. Os elmos, as espadas. O cenário ao fundo. Como reaprender a olhar? Eu, aos 10 anos, entrava naquele desenho. Respirava o ar que os soldados inalavam. Um prazer inclassificável. --------------- Mais profundo, vamos mais ao fundo, vamos a linguagem do espírito. Lá: uma teia de aranha na janela do porão. Eu olho a janela e a teia como quem encontra o mundo inteiro em um só olhar. Tudo que desejo ver na minha vida inteira está naquela teia. A luz que passa por entre os fios é a luz do mundo todo. E o vidro sujo, quebrado, da janela, é a aula de poesia perfeita. Tudo está lá: todo onde e todo quando. Não há tempo naquele olhar, ele dura. Não há mais o que ver além de lá, pois a teia é infinita. ---------------- Eis o PARAÍSO. --------------- A eternidade não é pensar : isto é eterno, pois o pensar destroi a eternidade. Para pensar criamos um agora e portanto um antes e um depois. Para provar a eternidade basta olhar eternamente. Como explicar? Não explico, voce que se permita intuir o que falo. ----------------- Havia um pântano ao fim do campo. Garoava e pássaros, grandes, voavam gritando. Então eu olhei tudo aquilo como se tudo aquilo fosse uma coisa só. Não havia mato-pássaro-céu-eu, havia aquilo tudo. Continuo olhando desde então. Ou desde antes do então. ------------------ As Portas são a própria percepção.

A ARTE MODERNA

Um homem coloca 8 baldes de plástico vermelho um sobre o outro. No chão há areia branca. Ele derruba os baldes e eles caem sobre a areia. O público aplaude. ---------------- Um homem, com uma pá, joga lama sobre um outro, que está de pé. É aplaudido. ------------------- Um senhor rabisca o chão com uma tora de carvão. ----------------- Isso é a arte de nossa civilização. O que ela significa? aquilo que o artista quiser. Ele é livre para dar o sentido que lhe aprouver. Basta ter cara de pau e saber mentir. -------------- O que realmente importa é: E o público? O que faz com que eles aceitem fazer parte numa farsa tão óbvia? ------------------ Danilo, é um nome aleatório, se arruma e vai à uma mostra de arte moderna. O fato dele ir à uma mostra de arte já faz com que seu ego se sinta superior e, melhor ainda, ele sente que sua noite foi cultural ( seja lá isso o que for ). Mais que arte, é arte moderna, e Danilo é sempre moderno, um cara à frente dos outros. Ele aprecia cada gesto do artista e aplaude, sentindo enquanto bate palmas o gozo por saber quem é Duchamp e Beuys e sua condição sensível, culta, refinada. Ele faz parte do clube, a congregação dos seres especiais que entendem o que é a arte moderna. Sua noite foi proveitosa, ele adquiriu cultura e sua alma se sente justificada. ---------------- Observe que tudo o que Danilo fez ou sentiu engloba o ego, a vaidade e o mundo social, seu mundo social. Tudo o que aconteceu foi superficial, ele foi porque é bom ir, ele gostou porque é certo gostar. Ele sacou tudo. Porque ele precisa sacar. ------------------- Postei abaixo a estátua de um menino sobre um cavalo. Ela é de Chipre e tem cerca de 2.200 anos. Foi feita com a intenção de ser exposta ao público, livremente. O que acontece com que a olha ou a olhou? Primeiro: Não há nada de esnobe nela ( aparentemente ). Todos a acharão bonita, porque ela é bonita de fato e a beleza é universal e indiscutível ( voce pode a questionar, mas sua opinião é apenas uma questão de provocação ). Há uma imensa habilidade ali e ninguém poderá dizer " Eu faria isso também". Quem fez a obra é um indivíduo habilidoso, ele estudou e trabalhou muito para chegar a tal resultado. Segundo: Ela não dá margem ao esnobismo fácil da arte dita moderna. Apreciar o cavalo e o menino não "parece" exigir nada além de saber olhar. O padeiro e o garçon a apreciarão. ----------------- Mas é então que surge a verdadeira sofisticação: Ela exige nada além de olhar e no mundo de hoje, olhar é muito difícil. ---------------- Fomos educados a olhar julgando, olhar criando conceitos, olhar procurando mensagens ocultas. A arte grega foi feita para olhar olhando, olhar vendo, olhar usando os olhos e deixando o espírito gozar. A experiência é sensual. ------------ Por mais que Danilo tente, essa sensação é para ele impossível, pois ao olhar o cavalo e o menino ele não vê a pedra trabalhada, ele pensa na idade da obra, na história cultural, na filosofia de então, em seu olhar analítico. Danilo jamais verá a beleza pura da obra prima que tem diante de si, pois Danilo foi amestrado a não olhar, e sim a "criar sentido". Por mais bela que seja a obra, e ela me deixa encantado, Danilo pensa no que significa o belo. ----------------- Somos horrivelmente velhos. As pessoas tendem a dizer que nosso mundo é infantil, ele não é. Infantil era o mundo grego, vitalista, puro, ingênuo. Somos velhos que pensam como velhos e procuram prazeres de velhos. Não gozamos mais com nosso sentidos simples, pensamos no gozo. Estamos sempre lá e nunca aqui. Estamos sempre antes ou além e jamais agora. A arte de Danilo é arte de quem perdeu a fé na vida. A alegria em criar. O dom de sentir sem pensar. A arte de Danilo é a arte do asilo.

AQUI E AGORA. A TEORIA DO BLOCO.

Nada do que Einstein disse foi desmentido na prática. Tenha isso em mente. ---------------- Trabalho na escola onde estudei. Estive lá entre 1972-1978. A escola está no mesmo local neste planeta. Os anos a modificaram. O pátio era todo de terra, hoje não. As paredes eram brancas e o chão de madeira. As árvores cresceram e eu, bem, sou um velho em 2024. Pois bem, tudo se modificou ao sofrer a ação do tempo senhor da vida. ------------------------ Imaginemos agora que um astronauta foi enviado a uma posição que fica a 50 anos luz da Terra. Ou que exista um ser nessa posição. Digamos que ele aponte uma lente para a escola onde estou em 2024. Digamos que seja o dia 20 de fevereiro de 2024. O que ele verá? --------------- A imagem leva 50 anos para chegar a 50 anos luz daqui e isso voce já sabe. Imagem é luz-energia e isso voce sabe. Então esse ser está vendo uma imagem de 1974 e nessa imagem ele me vê aos 12 anos de idade. Não só isso. Se mover a imagem ele irá ver meu pai vivo. Imagens. -------------- Vamos complicar isso? Vamos afastar nosso ponto de vista e nos posicionar num posto onde podemos ver AO MESMO TEMPO o menino de 1974, o cara de 62 em 2024 e o ser que observa a Terra a 50 anos luz. Esse ponto de vista OBSERVA TODOS OS 3 SERES AO MESMO TEMPO. Ou seja, em um ponto de vista distante, o menino de 12 anos não é apenas uma luz-energia que chega atrasada, é uma realidade que dura ao mesmo tempo que o eu que aqui escreve. ------------------------ Bergson já intuia isso e a palavra era DURAÇÃO. ------------------- O menino não seria uma luz como um dvd antigo, mas ele existiria em 2024, 2024 que aliás nada significa fora da Terra. -------------------- Complicado? Não. Ondas de rádio emitidas aqui viajam pelo cosmo para sempre, isso se sabe desde 1930. O que a Teoria do Bloco diz é que tudo aquilo que existe ou existiu existe para sempre. Presos ao tempo que nos empurra para frente, percebemos seu desaparecimento aparente no tempo, mas, e sei que isso é incrível, o evento continua a reverberar eternamente no local onde ocorreu. É tudo uma questão de ponto de vista. Desse modo, o cosmos seria um bloco onde tudo é um AGORA QUE NÃO PASSA pois passaria para onde? Não há uma lixeira, um ONDE em que tudo evento fosse eliminado do cosmos. O Cosmos é tudo e portanto tudo nele permanece. Cada ação, cada segundo, cada ser, tudo se repete em looping sem fim. ------------------ Podemos dar o próximo passo? Eu disse sem fim? Sim, sem fim. Mas se não pode haver fim, não há começo possível. E então, se o Cosmos é um bloco, o futuro faz parte disso, ou seja, dependendo do ponto de vista, o Futuro já acontece agora e acontece sempre. Eu sei que agora a coisa ficou confusa demais, mas não há como dizer que algo não tem fim sem admitir que não houve início. E se não houve início NADA começa agora, não pode haver começo. Portanto tudo existe desde sempre e cada evento, macro ou micro, acontece desde sempre e acontecerá infinitamente. --------------------- O menino de 12 anos e o homem de 62 existem no mesmo local e ao mesmo tempo ( tempo? que tempo? ). Os dois sentem, pensam, reagem e são contemporâneos. Não se comunicam porque não possuem a FERRAMENTA para tal. Presos na MUDANÇA ETERNA APARENTE, não podem ver nada que seja exterior a aparência. Sua máquina cerebral é Newtoniana. Uma coisa de cada vez, ação e reação, dia e noite, o fim depois do começo, tudo tem seu tempo etc etc etc. ----------------- Nada disso faz sentido quando nos afastamos deste sistema solar.

O TEMPO DEVE PARAR - ALDOUS HUXLEY, UMA OBRA PRIMA

Escrito durante a Segunda Guerra, este talvez seja o romance de Huxley que mais me agradou. Contraponto é uma obra prima, mas este também é. O tema lembra muito Henry James, mas sem o estilo de James, é um texto 100% Huxley. ---------------- Por que lembra James? Por falar sobre a sutileza. Huxley demonstra como atos que parecem insignificantes podem destruir vidas. Tema que é o de todas as obras do grande Henry James. ---------------- Sebastian, o personagem central, é um jovem de 17 anos muito belo, inteligente e rico. Aparentando ter 13 anos, ele sofre de uma imensa timidez. Escreve poesia e é oprimido pelo pai, um tirânico socialista que trabalha pela revolução. Sovina ao extremo, o pai o educa sem luxos. Mas esse não é o tema do livro, felizmente. ------------------- Esse pai tem um irmão que foi socialista, mas que hoje é um cínico hedonista. Óbvia que ele o odeia. Esse tio leva Sebastian para conhecer Firenze e lá se hospedam na mansão suntuosa de uma avó cega e muito esnobe. Nessa mansão ele se envolve com uma mulher, Lady Thwale, um personagem que mostra o quanto uma mulher bonita pode ser fria e manipuladora. Ela vai para a cama com Sebastian por esporte, por diversão, ele, felizmente, não se apaixona. ----------------- O tio hedonista vem a morrer e Sebastian se perde em mentiras ( não contarei o porque, mas é uma mentira tola provocada por timidez ). Essa mentira fará com que pessoas morram, uma criança seja injustiçada e um amigo vá para a prisão. Sebastian, covarde, medroso, passivo, terá de enfrentar sua consciência. ------------- Belo enredo não? Mas a magnífica qualidade do livro não está em seu enredo, embora eu sinta pena por Huxley não ter escrito mais livros sobra a dolescência, pois seu retrato de Sebastian é perfeito. -------------- Os temas são aqueles típicos de Huxley, mas aqui dados sem forçar a coerência, sem estragar o fluxo do romance. O que faz desta obra uma força arrasador são os diálogos, primeiro entre Sebastian e seu tio e depois entre Sebastian e Bruno. O tio duvida de tudo, não crê em nada e possui um genuíno amor por arte, literatura, comida e bebida. Ele ensina a Sebastian o caminho do auto amor, do ego como força central, da criação de beleza. Quando ele morre sentimos pena pelo livro, não aceitamos o fim de uma persoangem tão interessante no meio do romance. Mas Huxley tem coragem e descreve então a vida pós morte do tio. ---------------- Sim, ele está morto mas continua no texto. Na vida pós morte, sua alma, sem ego, sem entender nada do que acontece, penetra em universo de cores, sensações, não-linguagem ( Huxley sabe que o mundo não racional é um mundo sem palavras e sem pensamentos verbais ). Porém, ele é tomado pela memória e Huxley nos mostra que há uma sedução quase irresistível pela rememoração. O tio mergulha na vida como lembrança, na sedução das comidas que ele comeu, amores que ele viveu, a arte que ele amou. O azul, sedutor e vazio é sua outra opção, mas ele opta pela memória. ------------------- Huxley não diz, mas ao escolher a memória ele escolhe a vida física e provavelmente irá reencarnar. O azul vazio era a opção pelo fim do ego, pelo esquecimento e assim pela vida no paraíso. Uma escolha, sempre uma escolha. ---------------------- Huxley leu O LIVRO TIBETANO DOS MORTOS. -------------- É muito interessante ver como Huxley descreve uma sessão espírita convocada pela avó cega e milionária. O tio, convocado pela médium contratada pela avó, não compreende nada do que o tio diz e assim traduz tudo em frases banais, estou bem, estou aqui, sim eu sei. --------------------------- Na segunda parte do livro, Sebastian conhece Bruno, um amigo de seu tio. Pobre, esse católico, a princípio odiado pelo ateu Sebastian, irá mudar totalmente sua vida. A base do pensamento de Bruno é de que toda arte, toda política, toda religião e toda ciência são simples modos de se exaltar o ego. Agindo ou construindo uma obra, nós nos enamoramos cada vez mais de nosso ego e assim edificamos nossa profunda tristeza. Quanto mais ego mais dor, mais medo de perder coisas e de perder a razão e a vida, mais infelicidade. Bruno ensina que na raiz de tudo isso há o tempo. Viver na política por exemplo, é viver sempre no futuro, um futuro que jamais chegará mas que será sempre prometido ( Huxley fala da tolice comunista, mas não só ela ), viver no mundo da tecnologia é também viver no futuro, afirmar todo o tempo que a ciência caminha para o bem e JAMAIS A QUESTIONAR. Viver na arte é viver no passado, no estudo e no amor ao que foi feito e no desejo de não ser esquecido. Todas essas manifestações matam a única coisa que importa, O PRESENTE. ------------------- A felicidade é a abolição do tempo, o fim do futuro e do passado. Animais, felizes por viveram no presente eterno, conseguem isso por existirem em acordo com seu organismo. Eles comem ou caçam porque assim o corpo pedem. Copulam para procriar. Morrem como devem morrer. Já o homem luta contra seu corpo todo o tempo e mesmo quando pensa estar sendo livre ele na verdade está sendo subjugado pelo seu ego. ( Jogos sexuais, boa comida, apreciar a arte libertátia, tudo é anti natural, tudo é jogo tolo do ego em guerra feroz contra o corpo e aferrado ao tempo ). ----------------- Há uma página muito antecipadora de Huxley que fala claramente do 2023: Nada mais absurdo que uma pessoa velha apegada à sua juventude. Lutando para parecer eternamente ter 35 anos, ela nada evoluiu. Presa ao tempo passado e sempre com medo do futuro, escondida de si mesma em cremes, cirurgias e poses, ela não existe no presente e nega qualquer chance ao seu corpo. ----------------------- Uma pessoa escondida por detrás de piercings, tatuagens, botox, perucas, cílios, simplesmente não existe. Ela é um boneco do ego. Uma infelicidade que alimenta seus sintomas sem cessar. ------------------- Ao final, Sebastian se torna poeta. O livro, sublime, deve ser lido por todos que percebem a doença, profunda e feroz de nossa época.

A GAIA CIÊNCIA - NIETZSCHE

Nietzsche é um escritor ao estilo de Montaigne ou de Emerson. Portanto ele não é um filósofo, é um autor que filosofa. E nisso não há demérito algum. O pensamento de Nietzsche está tão presente em todo século XX ( mas não no XXI ), que falar daquilo que ele escreve se torna mesmo difícil. Tenho a sensação de que tudo aquilo que vou falar voce já sabe, já leu. --------------- A GAIA CIÊNCIA, talvez o livro mais acessível de Nietzsche, é como um dicionário do autor. Ele redige pensamentos sobre dados temas. Uma quase enciclopédia da mente do autor alemão até então. Vou a seguir falar de alguns temas que Nietzsche desenvolve no livro. -------------- Sobre a Miséria. Tempos sem grande sofrimento fazem com que as pessoas criem uma completa aversão a dor. Na modernidade mal suportamos a picada de um inseto. Por isso criamos arte infeliz, por isso sofremos na imaginação. Nosso espírito tem necessidade de enfrentar a dor, mas não sentimos ter mais força para isso, perdemos a confiança. Então exercitamos nossa alma atrávés da fantasia. Tempos duros criam uma arte feliz, forte, vitalista; tempos fáceis criam uma arte sem calor, sem força, infeliz. ------------- É preciso sofrer para se fazer grandes coisas, Jovens europeus, vivendo em mundo sem sofrimento, procuram algo que os faça sofrer, para assim se sentirem em ação, motivados. Esses jovens não sabem fazer nada de si próprios, não possuem vida e por isso vivem o sofriento dos outros. São gente à procura do sofrer. ( Se voce, jovem de 2023, pensou nesses suecos invadindo a Africa para salvar elefantes, franceses indo a Amazonia para salvar indios, sim, é exatamente isso. Vampirizar o sofirmento dos outros para tentar se sentir vivo. Incapaz de criar vida dentro de si mesmo, eles procuram com desespero viver a vida de outro ). ---------------- A ciência jamais poderá explicar o mundo porque ela humaniza tudo. Ela cria coisas que não existem: linhas, retas, tempo retilíneo, ou então imagina que os objetos lá fora se comportam como nós nos comportamos. A ciência é feita dentro do pensamento do homem e no ponto de vista do homem. É portanto impossível que ela possa conhecer a coisa em si, sem essa distorção. ---------------------- Durante a maior parte da história do homem, nada era mais terrível que ser isolado do meio. O progresso caminha para que estar isolado seja um privilégio de poucos. A história parte do grupo e termina na solidão absoluta. O bem, o belo, o bom era aquilo que o grupo elegia. Hoje esses valores se individulizam e portanto perdem o poder de nos guiar. Viver em solidão era inimaginável, a casa com tranca é uma invenção recente. --------------- Sempre que em um povo surge um imenso desprazer em viver, isso costuma se ligar a dieta. O budismo é a religião do arroz, nasce daí sua languidez e seu pessimismo. Todo vegetariano desconta sua avidez por proteínas em algum tipo de fanatismo, seja religioso ou seja político. A Europa mais vital sempre foi aquela da carne e do vinho. O que comemos tem uma importância central naquilo que sentimos. ( Pode-se dizer que vivemos a era do doce. Virá daí nossa terrível infantilidade? Nunca se comeu tanto açucar como em 2023. ) ----------------- O maior prazer é viver perigosamente. É essa a vida que vale a pena. Construa suas cidades sobre o Vesúvio. ---------------------- Vejo na Italia, nas ruas, nos prédios antigos, gente que viveu e que quis viver para sempre. Cada obra é o desejo imperioso de viver, de durar. É portanto uma civilização que amou tanto a vida que desejou viver a eternidade. Por isso tudo é feito para suportar o tempo. Já no resto da Europa vejo casas e prédios feitos para durarem poucos anos e serem logo destruídos. Não há neles prazer em durar. ---------------------- Weeellll.... há muito mais e Nietzsche vai sempre nessa toada: Força-Dor-Fé em si mesmo. Prazer na vida e sofrer em vida, pois sofrer é viver. E se é viver, não deve ser evitado. O homem como indivíduo que se afirma na luta, na crise, no vencer o obstáculo. Tempos de facilidade criando seres moles, sem vontade, fracos, tempos duros dando vida a homens que usufruem da plenitude. ---------------------- Nietzsche tem uma vantagem imensa sobre os outros filósofos, ele escreve bem, é um poeta. Kant ou Hobbes não seduzem ninguém, antes convencem; Nietzsche é sedutor. Seu pensamento seria uma cura para nosso tempo emasculado. Nunca fomos tão preguiçosos, portanto, covardes. Incapazes de viver um luto, uma maldição, criamos mentalmente dores que podem até mesmo nos matar ( muitos se matam por assumir um papel trágico-imaginário ). --------------- Leia.

EM BUSCA DA SOLIDÃO

O movimento mais importante da história humana é aquele que nos levou à solidão. Essa frase é de Nietzsche e eu ando o lendo com um prazer sublime. Irei então desenvolver essa ideia. ------------------ Se voce observar, mesmo hoje, um adolescente, irá notar que estar só é para ele um tipo de vergonha. de constrangimento. Esse é, pois, um sentimento arcaico que ainda sobrevive dentro dele. Observe agora uma favela. Por falta de escolha, a vida lá é totalmente comunitária. Todos vivem unidos a todos, e mesmo que voce não queira, sua vida é invadida pelas vozes, sons e atos dos vizinhos. Se então voce for a lugares onde o passado é mais vivo, aldeias indígenas, cidades da India ou núcleos tibetanos, irá perceber que ser excluído da comunidade é o pior castigo possível. Mais que isso, ser só é inimaginável, pois aquilo que cada membro da comunidade deseja, faz e teme é aquilo que o grupo deseja, faz e teme. ---------------------- Por 99% da história do homem a solidão foi o mais temido dos infernos. Mais que temer a solidão, era inimaginável que alguém pudesse a desejar. Desse modo, podemos dizer, com certeza, que a filosofia e a arte como as conhecemos, nascem no momento em que o homem se INDIVIDUALIZA. Em certo momento ele começou a ler em voz baixa ( a leitura durante séculos era feita apenas em voz alta, lia-se para ser ouvido por alguém ), morar com portas fechadas, falar em segredo, querer comer algo diferente do vizinho, e então pensar por si próprio. Esse movimento rumo à solidão começa mais ou menos em 500 AC no Ocidente. Artistas e escritores passam a fazer algo impensável: assinam sua obra! Se individualizam. ---------------------- O movimento é irrefreável. Estamos caminhando rumo à solidão total. Para isso nos livramos da corte de reis, das ruas com portas abertas, da Igreja como rebanho de ovelhas, e vemos agora o fim na família e das nações. Quando o GLOBALISMO fala em criar um mundo UNO ele não percebe estar criando um mundo UNO de pessoas distantes umas das outras. Se voce não tem uma nação, uma fé que te una á seu vizinho, se até mesmo seu sexo biológico é só seu, NADA fará de voce membro de uma comunidade. --------------- É por isso que todo movimento comunitário moderno acaba em Kaos ou decepção: Hippies, punks, veganos, e até mesmo socilistas. São movimentos que nascem como UNIÃO E IRMANDADE e se vêm depois numa espécie de SOLIDÃO EM GRUPO CADA UM NA SUA. --------------- A Direita mundial perdeu muito terreno por pregar a volta à família, à igreja, às velhas comunidades, quando na verdade seu apelo, seu Charme deveria ser falar, sem medo, daquilo que ela tem REALMENTE, no DNA, a solidão do EU Individualizado. Cada um criando sua vida e seu destino, o mais distante possível de governos, sindicatos ou modismos. --------------------- A riqueza e o poder de uma pessoa hoje é medida pelo quanto ela pode ter de solidão. Gente pobre TEM de viver em grupo. Gente rica usufrui do silêncio e da distância. Basta voltar 200 anos para ver que em 1823 gente rica NUNCA estava só e gente pobre vivia como numa granja. -------------- Toda invenção da tecnologia nos leva à solidão. Preciso citar exemplos? E no futuro, breve, a vida se fará em células auto suficientes e mesmo o trabalho e o ensino serão exercidos a sós. Quem quiser escrever um livro de sci fi relevante, que narre um momento revolucionário do futuro, passado em 2.200, que fale de um homem que ousa falar com um outro homem. Cara a cara. Se hoje ler em voz alta parece absurdo, falar com alguém será visto do mesmo modo. ---------------------- Nietzsche de certo modo elogia essa individualização. ( E essa é mais uma prova do quanto ele nunca foi fascista ). Mas ele sonha com a mesma individualização de Jung, a consciência de que há em voce uma originalidade criativa que deve ser libertada. E para isso é preciso negar o grupo. Nietzsche, como Jung, é sempre um aristocrata. O que ele pede é um movimento de aristocratização das massas, embora nenhum dos dois admita isso. O problema é que poucas pessoas têm o dom ou o interesse em se aristocratizar. Então o que vemos é que essa solidão atual e futura é aquela do ser vulgar, não criativo, comum. Uma solidão feita de depressão, negação, sem consolo. Uma solidão obrigatória, dada pela história do mundo, nunca escolhida e usufruida. Pior, solidão negada, vendida como "grupo social", " escolha", modernidade. ----------------- Se a Direita pode se vender como ideia de individualização, a Esquerda terá de trair a si mesma e inventar um tipo de socialismo de indivíduos, ideia que na verdade eles já vinculam, ideia que nada tem de socialista e muito tem de mera propaganda. ---------------------- Vale à pena tentar lutar contra esse movimento? Não, não vale. As forças da história são irrefreáveis. Mas por instinto haverá sempre aqueles que defenderão a família, a igreja, a vida em comunidade. Deveriam então perceber que são famílias sem pai ou mãe, sem refeições em grupo, sem proteção. Igrejas sem sentimento de doação e pertencimento e comunidades sem vínculos de gerações. O que digo é que o que nos resta de "velhas comunidades" já foi comido por dentro e delas só há a aparência. -------------- Melhor educar cada um para ser um Homem Criativo, um ser que ergue sua chama e constroi uma solidão só sua. ---------------- É isso.....

SCHOPENHAUER

O que é uma Nuvem? Quando voce a olha ela pode ser cinza, branca, laranja, rosa. Ela pode ter milhares de formatos. Mas a Nuvem será sempre a mesma: conjunto de gotículas no céu. Sua cor e sua forma são apenas momentos no tempo e no espaço. A nuvem, todas as nuvens, são sempre a mesma. O que importa, sua ESSÊNCIA, não muda. O que a Nuvem é, ela é para sempre. Eis a explicação que faz Schopenhauer para o Mundo das Ideias de Platão. As ideias são o mundo essencial e se abstrairmos o tempo e o espaço podemos entender o que são as realidades eternas. --------------- O mesmo vale para um rio, uma Montanha, e uma Pessoa. Elimine o tempo e o espaço de Antonio. O que ele será? Um Homem. Como eu e como voce. Essencialmente. Sua essência humana é imutável, constante, eterna. Podemos então dizer que o homem de 1.200 DC ou o homem de 2023 são idênticos. Retire coisas temporais como modo de falar, de vestir, retire o lugar, e voce terá o mesmo ser em sua essência. E esse nunca mudou e nem irá mudar um dia. Continua sendo uma pessoa que come, dorme, sonha, tem medo, reage ao medo, ataca, mata, deseja, faz sexo, ama, sente ciumes, inveja, tem filhos, mente. Tem um pai e uma mãe, crê ou descrê de Deus. Inventa. Faz guerra e paz. Defeca. Xinga. Anda em grupos. Foge das feras. Fica doente e morre. Tudo isso pode ser feito num castelo ou em frente a um computador, vestido com uma toga ou como drag queen, não importa nada esse momento no tempo e no espaço, em essência nada mudou, é o mesmo Ser nas mesmas condições. ------------- O vento muda a forma da nuvem, mas ela é ainda uma nuvem. O espaço faz o rio virar cachoeira ou inundar, mas é ainda e sempre um rio. ------------------- Demorou muito para que eu lesse Schopenhauer. Isso porque ele é um filósofo tão fora de moda neste século como é Nietzsche ( ser fora de moda em tempos medíocres é na verdade um ótimo sinal ). Se Nietzsche é fora de moda por advogar o individualismo radical, Schopenhauer é deixado de lado hoje por dizer que a tal mutabilidade da vida é uma ilusão. E em tempo que adora se sentir dono de seu corpo e de sua alma, dizer que nada muda é irritar profundamente os deslumbrados do querer é poder. -------------- Ah sim, Schopenhauer dizia que a Vontade é a única coisa que move a vida, que faz ela acontecer e existir. Mas não se deslumbre, essa vontade é impessoal. Vontade inconsciente, irrefreável, irracional. Persistimos na vida. Por que? Não importa. A Vontade move as estrelas. Por mais que Desejemos ser saudáveis, bons ou belos, a Vontade faz de nós aquilo que somos: Humanos. Era por isso que Freud tanto amava Schopenhauer. Substitua Vontade por Libido ou Desejo e voce terá a base de todo Freud. Somos todos dominados pela Vontade. Nietzsche chamaria de Vontade de Poder. ------------------------ Faça um exercício. Olhe para algo. Digamos uma mesa ou um livro. Elimine de seu olhar a consciência da utilidade desse objeto. Esqueça sua história. E principalmente abstraia a Relação que voce tem com ele. Voce não gosta ou desgosta daquilo. Não o conhece. Não sabe para quê ele serve. Pois sua utilidade, sua relação com voce é apenas uma contingência no tempo. Abstraindo tudo isso o que voce vê naquele Livro ou naquela Mesa? Sua essência. Um livro. Uma mesa. Como todos e todas são. Pois aparências mudam, mas não muda aquilo que aquilo é. -------------- Vamos mais ao fundo? Eu estou na escola que estudei em 1974. Mas hoje é 2023. Quase 50 anos mais tarde. Em 1974 eu tinha 12 anos. E as meninas não falavam palavrão. Usavam saia xadrez. Meias brancas. Hoje, 2023, elas falam palavrão e eu sou um velho. Elas usam calças rasgadas e chinelos. Perdem a virgindade aos 12 anos. Mas se eu olhar para elas e abstrair o que sinto, esquecer a minha história de vida, seus movimentos no tempo, sua superficialidade espacial, o que verei? Irei perceber que a Luana de 2023 é a Marcia de 1974. O mesmo medo. A mesma vaidade. O olhar e o tom da voz. A presença e o andar. A Essência. Mudou a gíria, roupa, o costume social, mas não aquilo que elas são: Humanas. Humanos jovens. Elas crescem. Comem muito. Sentem curiosidade. Não querem e querem ser adultos. Brincam. Riem. Pulam. E sentem desejo pelos meninos. ---------------------- Sendo mais radical. Se eu olhar para a mulher que hoje amo, e abstrair dela nossa história, a relação que tenho com ela, chegarei a essência dessa mulher. E entenderei que ela é a mesma que amei aos 20 anos, quando ela nem mesmo havia nascido. Em toda mulher que amei havia a mesma essência: o feminino que ansio possuir. Quem amei foi a mulher. --------------------- Há um momento em que Schopenhauer tem um insight magnífico. É quando ele explica o porque de nossas lembranças sempre parecerem tão boas e o passado se revestir de cores agradáveis para 99% das pessoas. Principalmente a infancia. Diz o filósofo: Na memória conseguimos sem esforço ver as coisas fora de tempo e sem relação conosco. Ao recordar uma tarde do passado, quando tínhamos 12 anos, não pensamos na utilidade daquela tarde, não queremos obter nada dela, o que vemos é uma tarde, voce nela, e um ato que nela aconteceu. Conseguimos então observar aquela cena, aquele passado, em sua essência, pois por ser passado nada queremos lá fazer ou mudar. Sentimos que o passado era melhor porque abstraimos o tempo e o espaço dele e podemos viver a essência daquilo que lembramos. E viver na essência é ter paz. ------------------------ Mudando de tema, saiba que Schopenhauer foi o primeiro filósofo a considerar a Música como a maior das artes. E ele explica o porque: Se a vida é Vontade, viver é estar sempre preso a um ciclo onde queremos-obtemos-queremos de novo-obtemos e queremos mais uma vez...sem fim. Se conseguimos sair desse ciclo sentimos tédio e do tédio vem o desespero. Se não saímos do ciclo, e quase ninguém sai, sentimos a eterna insatisfação. Pois bem, a Música é a única arte que nos alivia desse ciclo. Pois sua construção é o próprio ciclo. A música é COMO A VONTADE. E então, no texto, Schopenhauer passa a descrever como se escreve e se desenvolve uma peça musical. A construção de um desejo, a satisfação desse desejo, a repetição, a satisfação. O ciclo musical refletindo a condição essencial da vida de todos nós. Ela cria um caminho, um desejo, o resolve e então faz com que ele retorne. A música está tão inserida em nossa essência que é a única arte que pode ser usufruida diariamente sem com isso se desgastar. Queremos ouvir a mesma canção milhares de vezes, todo dia, ação que não acontece com um livro ou uma escultura. A música não nos cansa. Isso porque ela caminha ao nosso lado. Há nela o desvelar do que é superfluo e a revelação da verdade. ( óbvio que ele falava de Beethoven, e eu não sei se um funk de 2023 fala algo que não seja temporal e espacial ). ------------------- Schopenhauer amava a filosofia hindu e na sua ideia de essencia há muito de budismo. Tendo vivido no tempo de Goethe e de Beethoven, o filósofo encontrou fama apenas nos últimos dez anos de sua vida. Ele abriu caminho para a segunda onda do romantismo e deu espaço para a hiper valorização do músico como artista maior ( após sua morte teríamos o advento de Wagner e de Liszt ). Para encerrar, se voce pensa em ler Schopenhauer, aviso que como a maioria dos filódofos, sua escrita não é artística, portanto não agradável. Mas vale à pena. O fato de 2023 evitar sua leitura mostra o quanto este nosso tempo procura viver na aparência e jamais na essência.

SWEDENBORG

O sueco Swedenborg nasceu em 1677 e morreu em 1772. Uma longa vida que na verdade foram duas. Na primeira vida ele foi um cientista. Bem sucedido. Na segunda parte ele foi um medium. Após uma vida dedicada à ciência, ele recebe a visita de espíritos e de anjos. Conversa com eles por mais de um ano e então escreve sua obra, obra que narra não só aquilo que eles lhe contaram como também aquilo que Swedenborg viu. Pois ele visitou o Outro Mundo. --------------- Primeiro entenda: Swedenborg era tão famoso em ciência que recebera até mesmo um título de nobreza. Segundo: o espiritismo na época dele não havia sido ainda divulgado por Allan Kardec. A "moda" espiritualista viria apenas no meio do século seguinte, cerca de 60 anos após a morte de Swedenborg. Mas... o que ele viu e ouviu? ------------------- Primeiro: não existe pecado original ou condenação ao céu ou inferno. A própria pessoa escolhe seu lugar no além vida. Há pessoas que se deixam seduzir pelo inferno, há pessoas que desejam o céu, e nisso se mostra o Livre Arbítrio. Deus não julga, a pessoa escolhe. ------------- Mas como? Então Swedenborg acha que o Genesis é uma mentira? Que não houve o Pecado de Adão e Eva? ------------- Não. Swedenborg crê na Bíblia mas ele diz que lemos a Bíblia de modo errado. Tudo nela é a narração do crescimento e da evolução da Alma. E sua obra é a "tradução", a exemplificação daquilo que a Bíblia diz por símbolos. Daí vem a imensa influência de Swedenborg sobre Jung. O psicólogo suiço usa, como Swedenborg, o símbolo. Jung vê na Bíblia e em toda religião uma mensagem simbólica sobre a evolução individual. Toda religião seria um código de evolução espiritual. --------------------- O livre arbítrio não termina com a morte. Após morrer, a alma sente mais afinidade com certas almas e segue então esse caminho, rumo ao céu ou ao inferno. Ela escolhe. O inferno, por ser essa alma ruim, guiada pelo mal, lhe parece apropriado. É um mundo sujo, decadente, cheio de intrigas, violência e escuridão. Não há castigo ou Demônio, Deus comanda o inferno assim como o Céu. Na eternidade infernal, a alma vive para sempre dentro do mal. Borges, que adorava Swedenborg, tem conto sobre o céu descrito pelo sueco. O que nos leva ao céu é a inteligência. Só pessoas evoluídas cognitivamente esclarecidas, amam o céu. Não é lugar de beleza ou de paz eternas, é como um local de discussão filosófica, de apreciação racional, um mundo frio, equlibrado, etéreo. --------------------- Na leitura da Bíblia, Swedenborg diz que existem 6 eras: a mais primitiva é a de Adão e Eva. A maioria das almas não consegue evoluir para além dessa era, mundo de escuridão onde a alma não percebe quase nada da Verdade e mal consegue usar a Inteligência. A terra é o recipiente do conhecimento, o lugar onde toda inteligência se concentra. O que ilumina a terra são a Fé e o Amor. Tudo que vem do homem é morto, tudo que vem de Deus é vida. O homem se comunica com o céu graças aos anjos que são mensageiros. Vem daí o conceito de intuição de Jung. Todo pensamento ou toda sensação de Bem, de Fé, de Amor vem do céu, de fora do homem, trazido pelos anjos. ------------------ Cercado por espíritos ruins, o homem celestial ouve apenas aquilo que os anjos lhe dão. Esse homem se torna a imagem do céu. A crença-fé no Divino fazem dele a mais perfeita das imagens. ----------------- Ao morrer, Swedenborg se tornou patrono de uma igreja que existe até hoje, predominantemente nos EUA. Ele previu com exatidão o dia e hora de sua morte e pouco se importou com ela, pois para ele esta passagem pela terra é apenas uma escolha a ser feita. O corpo nada significa e a alma é eterna. A vida é uma tentativa de renascer, de evoluir, de atingir o alto. Anjos não nos protegem de nada, eles apenas podem falar conosco. Tudo de bom e de melhor que há em nós não é nosso, é Deus em nós. Tudo se resume a tentar fazer o espírito falar, pois quando ele fala é Deus que fala em nós. ------------------------ Antes de terminar este texto falo agora de mim mesmo. Sim, houve momentos, raros e brilhantes, em minha vida, em que hiper inspirado, parecia ser Outra Pessoa que me guiava e que falava por mim. Mais que isso, nesses momentos houve uma felicidade calma, clara, nítida, que parecia resolver todo enigma. Esses momentos, se eu os tentar descrever, se caracterizam acima de tudo pela felicidade e pelo esquecimento de si mesmo. A inteligência fala e fala de um modo mais racional que a própria razão. O eu é surpreendido por si mesmo. Eu pareço ser mais sábio e melhor do que eu mesmo acreditava ser. ------------- Essas experiências, que vivi, se encaixam bem naquilo que Swedenborg disse, pois seria Deus falando em mim. Inspiração real. Nessa hora o corpo pouco importa e morrer não significaria nada. Esta vida, trevas que escondem símbolos, seria insignificante. Ou melhor, o que se esconde nela seria tudo. A morte de meu pai me deu essa clareza. Mas não só isso. ----------------- Por fim, devo dizer que o mundo de 2023, histérico, cheio de imagens, ordens, gritos, regras, pressão, dificulta cada vez mais qualquer chance de clareza. Um soldado numa trincheira poderia ter uma visão espiritual, mas um jovem envolto em modismos, falsos valores e confusão não tem como parar e perceber. O que digo com isso? Que nosso cotidiano, dito normal, é mais nocivo que uma guerra física real. Eu disse física porque estamos numa guerra espiritual feroz, terrível, decisiva. O mal predomina. Almas escolhem o inferno aos milhôes. ------------------------ Swedenborg estava certo?

NIETZSCHE, JUNG E A PERSEGUIÇÃO AOS FORTES

Uma amiga me envia um texto de Nietzsche. Fico assombrado com aquilo que Nietzsche diz. É exatamente tudo que acontece no Ocidente hoje. Eis alguns trechos: " Os doentios são o grande perigo do homem, não os maus, as aves de rapina....são eles, sao os mais fracos aqueles que corroem a vida entre os homens, os que mais perigosamente questionam e destroem nossa confiança na vida e no homem..... Neste solo de auto desprezo cresce toda erva ruim,e tudo tão pequeno, tão insincero, tão ADOCICADO...Aqui pululam os vermes da inveja e do rancor, aqui a simples visão do vencedor é odiada! E que habilidade para esconder esse ódio!...Representar o amor, monopolizam a virtude, a justiça, a sabedoria, mas tudo que os move é o ódio....Rondam entre nós com sua censura, com a palavra justiça, exibindo suas almas belas, atacando os felizes....É uma vergonha ser feliz em tanta miséria, eis seu mote, sua censura, sua justiça....Não pode haver erro maior que os felizes, os bem sucedidos, os fortes começarem a duvidar de seu direito a ser feliz...... POIS FORA COM ESSE MUNDO AO AVESSO! FORA COM OS FRACOS! FORA COM A DITADURA DOS RESSENTIDOS!"-------------------------- Escrito em 1889, eis a antecipação do mundo de 2023, a ditadura, absoluta, completa, dos fracos, dos invejosos e dos ressentidos. Mundo onde toda exibição de força ou de auto suficiência é vista como ofensiva, cruel ou irresponsável. ---------------- Começo pelo óbvio: Casa e família. Esse sempre foi o sonho de todo ser humano, ter uma casa só sua e fazer uma família. Pois hoje nada é tão atacado e ridicularizado que esse desejo. Casa pra quê? Voce se vira, voce é livre, pra que ter uma casa? Em último caso, o estado cuida de voce! E família? Pra que? Família é o mal do mundo, fonte de neuroses, pra que isso? Una-se à uma rede de amigos, de amores, tenha um cachorro, família não! ------------- Não se engane: uma pessoa com uma casa e uma família é uma pessoa forte. Ela lutará para defender o que é seu. Ela morrerá para salvar o que tem. Uma pessoa sem lar e sem filhos é um fugitivo. Ou um ser que diz: Tanto faz!, para tudo. Ele é nômade e nômades não lutam por nada, eles se mudam. ----------------- Pessoas fracas odeiam a alegria, odeiam a força e odeiam a independência. Seu ideal é uma população que não as ofenda, que não lhes recorde de sua covardia e de sua fraqueza. Na pandemia vimos isso ao extremo, qualquer um que ousasse não ter medo, não se apavorar era taxado de vilão. Ora, se voce tem um pingo de cultura sabe que em toda história do mundo, o heroi a ser seguido sempre foi aquele que não tinha medo. Os fracos seguiam o destemido. imitavam seu modo de ser. E o que fazia o heroi? Se expunha ao perigo e mostrava que o mal não era tão horrível. Em 2019 o heroi foi chamado de anti-ciência, vilão, idiota ou INDIVIDUALISTA. Guarde essa palavra, individualista. É aí que a tirania se revela. Nada é mais odioso à ditadura que um indivíduo. --------------- Eu nada tenho de heroico, sou um covarde, mas durante toda a pandemia me obriguei a não ter medo. Eu andava pelas ruas, sempre, e sem máscara, tive uma vida normal. Minha mãe não foi contaminada por mim e nunca se usou alcool em casa. Porque fiz isso? Para me exibir? Não, por fidelidade à minha filosofia de vida. Sou um individualista que cultua herois. Eu não me perdoaria se me deixasse ser apavorado pelo poder dos ressentidos. Ressentidos que amaram a pandemia e sentem saudades dela até hoje e para sempre. ------------------------ Não se engane. A arte que se faz hoje, seja POP ou erudita, é toda feita para humilhar os fortes e idolatrar a fraqueza e o medo. Não há um só dia em que não se ameace a vida com um cometa, o aquecimento global ou um vírus que virá ( todos são desejos dos fracos, eles amam ver os fortes sentirem medo ). Filmes lembram todo tempo da maldade do homem "egoísta", o inferno que é viver, o sofrimento do "sensível e bom", o vazio que há na vida. Sempre existiram filmes tristes, mas o trágico mostrava que havia uma coisa chamada "superação", que era preciso coragem, e que, como diz Jung, é preciso se individualizar para ser forte. O problema é que hoje ensinamos as crianças que ser fraco é ser bom e ser forte é um mal. A conta na farmácia vai subir cada vez mais, as indústrias químicas agradecem. ------------------------ O mesmo com a música POP. Sempre houve a música triste, mas hoje todo artista POP não é apenas triste, ele é um doente mental. Uma criança-velha que cultua sua fraqueza fofa. ---------------- Aliás nada é mais desejado hoje que ser uma criança. Se antes o alvo era ter uma casa e uma família, hoje a meta é ficar no quarto brincando. Amiguinhos na rede, sexo virtual, um pet pra amar e um trabalho "divertido". O Estado agradece. Dominar crianças é mais fácil que dominar adultos. Crianças querem ser cuidadas. -------------------- A depressão se faz comum à todos porque nossa alma pede por realização e ela só se dá na vida adulta. Seja espiritualmente ou biologicamente, todo ser precisa amadurecer, crescer, chegar ao seu apogeu. Quando a pessoa é mutilada por um meio que a impede de crescer, de ser ela mesma, de ser forte e livre, ela se frustra e se deprime. Lhe colocam uma máscara de "bondade feliz e amorosa" e essa máscara sufoca. Estamos matando uma geração. -------------------- Perversamente nunca se falou tanto em ser voce mesmo, escolha seu sexo, sua vida, seu estilo, mas observe, voce pode ser o que quiser, desde que seja FRACO. Desde que pense no GRUPO. Desde que não ofenda ou se imponha. Isso não é liberdade! Isso é um jogo de crianças incentivado por adultos perversos. É uma castração feita com drogas recreativas e sexo sem tesão. Uma imensa palhaçada. --------------------------- Esse povo, fraco, ressentido, invejoso, vai censurar e estigmatizar todo aquele que for adulto, forte e feliz. Olha ao seu redor que voce verá isso acontecer em cada esquina, na mídia e na arte. Pior, nas escolas, lugar onde desde cedo se ensina que o mundo é ruim e toda figura histórica foi um monstro. --------------- Nietzsche estava certo e Jung sabia qual a cura. Se invidualize. Siga os fortes e os independentes. Seja ousadamente feliz. E jamais obedeça oa grupo. --------------- Depois falo mais sobre isto.

MERLIN E O MUNDO DIVIDIDO

Foi nos primeiros anos do século XIX que os irmãos Schlegel lançaram sua versão da vida de Merlin, o mago. Para isso eles seguiram a versão medieval de Boron, mas tomaram certas liberdades do romantismo alemão. Leio essa obra, mais uma vez, e percebo que toda a narrativa está imersa na filosofia dos gnósticos. ---------------- Merlin nasce de uma virgem devota de Deus, e da intervenção Diabo, que cruza com a virgem enquanto ela dorme. Satã imaginou poder assim desafiar a Deus, mas seu plano dá apenas 50% certo. Merlin terá o poder do Demônio e de Deus em si mesmo. Sua mãe, após ser constatado permanecer virgem mesmo após o parto, irá para um convento e Merlin, que aos 4 anos já fala como adulto e tem o poder de um gênio, irá usar o dom de ver o futuro para assim se tornar poderoso. Ao final de sua vida, Merlin será vencido pelo Mal. ---------------- Está aí, exposta nessa popularíssima saga, o poder duplo que um homem pode alcançar. O espiritual e o racional através de Deus, e o poder temporal e corporal via forças do Mal. Merlin usa os dois sem nenhum pudor. ---------------- Recebo um texto gnóstico onde se fala que a Cobra simboliza, na história de Adão e Eva, o poder da razão. Ao se deixar tocar pela cobra, Eva abre os olhos da razão e se distingue dos animais. Nesse momento ela entende ser outra que não um bicho. Ela adquire a consciência do tempo e portanto da morte. A maldição que se abate sobre ela é a tristeza da finitude. --------------- Como se dá esse contato? Como a Cobra despertou Eva? Várias versões são ditas, desde o fruto proibido ( um figo ou uma maçã ), até o veneno inoculado por uma mordida. A mais simbólica diz que a serpente penetrou Eva, entrou dentro de seu corpo e se fez parte dela. Assim, Eva seduziria Adão e através do sexo lhe deu a razão de se saber humano, mas também a finitude. ------------------- Não nos esqueçamos que nossa consciência da finitude nasce geralmente na puberdade, com o despertar do sexo. É como se ao adquirir o pleno uso do corpo, seja para gerar uma vida, seja para o gozo, encontrássemos também a certeza do fim. Saímos do mundo puramente espiritual-mágico-criativo e adentramos a realidade deste mundo corpóreo. É uma história maravilhosa, a de Eva, onde ela desperta Adão após ser despertada pela cobra, um falo de certo modo. Saiba que todos nós somos Adão e Eva, mesmo aqueles que lutam para jamais sair do estágio infantil da vida, mas muitos poucos são Merlin. ------------------- Pois Merlin já nasce adulto, portanto um não-criança, com a plena consciência do bem e do mal e tendo a seu alcance tudo que os dois mundos podem nos dar. Ele cura e protege, mas ele também destroi e ambiciona. É sempre dúbio, parece optar pelo mal, mas percebemos então que toda sua vida foi uma trama para construção da Ordem e da Justiça. Traído, nunca os medievais se esquecem que este mundo é do mal, Merlin perde ao fim.

GNOSTICISMO

Já aviso que não sei se creio naquilo que aqui vou escrever. Não há como saber a verdade. Mas acho esse modo de pensar muito sedutor. Ele se encaixa naquilo que o mundo "parece" ser. Platão já falava no mundo como ilusão, sombra, e Pitágoras criou uma teoria inescrutável para tentar entender o que não se pode entender. --------------------- Vou direto ao ponto: Não se obtém sucesso nesta vida sem o uso do Mal. E isso ocorre pelo fato de que este mundo e esta vida, a realidade física, sólida, visível, SER obra da maldade. Isso explica não só a existência da dor e da injustiça, como também o sucesso aparente e material da maldade. Para obter algum poder, para viver o que se pode viver no aqui e agora, é preciso conhecer o Mal e saber usa-lo. ----------------- Creio não ser preciso dar exemplos. Da política à guerra, da arte ao amor, o que observamos é a malícia, a mentira, o vício e a maldade absoluta tomarem o trono sempre. O Bem, quando surge, é facilmente destronado e tende a desaparecer. Estou sendo radical? Não, não estou. E explico melhor: nem toda pessoa com poder é absolutamente RUIM, mas todas sabem usar a maldade quando preciso for. Não é por acaso que toda pessoa BOA acaba se isolando da vida. Ou simplesmente desaparecendo. Olhe ao seu redor e observe. É duro constatar isso. Egoísmo-vaidade-cobiça e medo mandam neste mundo. ------------------- O BEM existe e dura mais que o MAL, mas ele não vence aqui e agora. A bondade vive na alma e nunca na carne. Ela observa o mal prevalecer e tenta, em dor, diminuir esse mal. A imagem medieval do anjo com uma espada, andando em meio às trevas, é o mais sublime resumo desta vida. O Inferno vive aqui, no tempo e no espaço. O Paraíso mora além. É atemporal. ------------------ Não se vence o mal com o bem, pois o mal ri do bem e é imune ao exemplo. A maldade ridiculariza o bem pois vê nele apenas fraqueza e ingenuidade. O mal compreende apenas a linguagem do corpo e sutilezas da alma lhe são invisíveis. Para vencer o Mal é preciso usar aquilo que todos nós temos: a própria Maldade. Por isso não se vence a injustiça com a paz, não se destroi o crime com a passividade, não se elimina o vício com o amor. A vitória, precária, do bem, precária mas precisa, se dá com o uso da força, da coragem, da astúcia, até mesmo com a mentira. Se for preciso uma bomba para vencer o MAL, que se use duas bombas. -------------- Falei que o bem é precário porque ele não pode ser dominante em mundo onde ele é estrangeiro. A maldade convencerá os fracos, seduzirá os cegos e eliminará os não aliados. Se alguns lutam contra o mal é porque nossa alma, feita pelo bem, não se conforma com esta prisão de tempo e carne. Anjos caídos e rancorosos construíram esta vida e este universo. Nossa alma intui isso e se ergue contra a realidade material. Ela sonha, cria, inventa, tenta se salvar. E perde. Sempre. Olha ao redor e vê a morte, a dor, o predador devorando a presa, o mal dominando a verdade. Como viver? Ir ao mosteiro e negar a vida? Ser um eunuco? Ou mergulhar no mal? -------------------- Volto à imagem do anjo com uma espada e se ela for muito distante de nós, pense em certos herois POP do século XX. O segredo é saber usar seu corpo e não ter pudor em ser um dos predadores. Se o corpo sou EU então ele é uma ferramenta para entrar e viver neste mundo e assim poder tomar parte do jogo da vida. A espada-falo, a armadura-carne. Salve sua alma e lute sua luta dentro da vida. Obtenha o poder que há nesta realidade AGORA e não tenha pudor em vencer o mal sendo mais astuto e maldoso que eles mesmos o são. Isso é imoral? Dúbio? Amoral? Sim, é. O mundo existe, voce existe e nunca negue isso. Se voce é seu corpo, satisfaça-o. Não o negue e não fuja da vida. Mate o mal e ao mesmo tempo devore a carne. Transe com a mulher e assuma todo seu desejo de homem ou de mulher. Beba o vinho e ambicione o poder. Mas preserve sua alma em meio a tudo isso. Esse o segredo do heroi. ---------------- Sim, uma vela para Deus e uma para o Diabo. Alma e carne. Assuma a dualidade. E saiba que as duas são inconciliáveis. Pois somos um campo de batalha. Por isso a inevitabilidade da guerra. ------------------- Basta! Se voce quer saber mais, breve outro post sobre isto. E nunca esqueça, talvez eu seja mau.