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FILMES

   Faz duas ou três décadas que o cinema, como arte relevante, morreu. Ainda se fazem bons filmes, alguns geniais, mas eles todos além de não repercutirem, possuem a tristeza de saber que seu mundo, o universo do cinema, é passado. Como o jazz, a ópera, o rádio ou mesmo o teatro, ir ao cinema é apenas um modo de digerir o jantar, passar duas horas com a namorada ou, pior de tudo, tentar dar sobrevida à um costume. Filmes de TV são apenas isso: Filmes de TV. São filmes, mas não é cinema. Podem ser bons programas para se ver na cama. Podem ser boas séries para se ver após o futebol, Mas por serem TV, já nascem sabendo que em duas décadas estarão completamente mortos. Ninguém assiste Os Sopranos hoje. Menos ainda assiste Friends.
   Um rápido comentário sobre o que assisti no último mês:
   PORTO, UMA HISTÓRIA DE AMOR de Gabe Klinger
Passado na cidade do Porto ( estrangeiros nunca acertam o nome da cidade! Ela se chama O Porto, nunca se diz Porto apenas. ), conta o encontro de um cara muito chato e uma moça muito triste. .
Voce já viu esse mesmo filme umas mil vezes. A cidade é exibida, claro, em seu lado mais soturno.
   OS AVENTUREIROS de Robert Enrico com Alain Delon, Lino Ventura e Joanna Shimkus.
O cenário é lindo mas a aventura é chata. Dois homens se envolvem na busca de um tesouro. Com eles vai uma mulher que eles partilham. É longo e tem a modernice de um filme de 1968. Ou seja, cansa. Mesmo com uma fotografia bonita, não vale a pena. E a trilha sonora é insuportável.
   ILHA DOS CACHORROS de Wes Anderson
Eu vejo várias qualidades em Wes Anderson. Mas ele está mergulhando em uma emboscada. Seu estilo virou maneirismo e aqui desce ao cliché. Ele precisa de uma dose de adrenalina e sair desse mundinho feito de vozes sem emoção, ações sem impetuosidade e humor fofo. Mesmo adorando cães, achei este filme bobo, vazio e incrivelmente feio. Não há porque se fazer uma coisa assim. Parece apenas um desenho da TV Cultura dos mais banais. ( Doug é melhor ).
   SOMENTE O MAR SABE de James Marsh com Colin Firth, Rachel Weisz
Baseado numa incrível história real. Em 1967, na Inglaterra, se estipula um prêmio para o homem que conseguir quebrar o recorde de navegação solitária. Um cara cheio de dívidas, que navega só em fins de semana, se lança ao mar. E enlouquece. Com uma história tão boa, este filme, chato, consegue naufragar. Ele é boring boring boring boring boring so boring.
   MISTER ROBERTS de Melvyn LeRoy e John Ford com Henry Fonda, William Powell, Jack Lemmon e James Cagney.
Foi uma peça de enorme sucesso e marca a estreia de Lemmon no cinema. E ele é a única coisa que presta aqui. É um filme longo, que deveria ser engraçado e heroico, mas que é apenas chato e aborrecido. Fala de um capitão que trata mal seus marujos. Fonda é o oficial que o enfrenta. Tudo em clima de farsa leve. Quer dizer, deveria ser leve, fica travado na verdade. Le Roy assumiu o filme depois que Ford perdeu o interesse. Ou foi o contrário?
   ATOS DE VIOLÊNCIA de who cares? com Bruce Willis, Cole Hauser, Mike Epps
Um bom filme de ação como aqueles que Willis fazia nos anos 90...não é o caso. Ele é um tira que procura um assassino sequestrador. Mas é lento, calmo, e dois irmãos assumem o controle da busca. Pois é.
   SURPRESAS DO CORAÇÃO de Lawrence Kasdan com Meg Ryan, Kevin Kline, Timothy Hutton
Kline está magnífico como um francês malandro que se envolve com uma americana que tem medo de voar. Se passa em Paris e na Riviera, e, óbvio, tenta resgatar a beleza charmosa dos filmes de Cary Grant e Audrey Hepburn. Fica a milhões de anos luz. Mas tem belas canções, bela imagem e não tem nada de burro ou forçado. E tem um casal que funciona bem.
  DESEJO DE MATAR de Eli Roth com Bruce Willis
E esse desejo se satisfaz. Ele mata um monte de gente. Bruce é um cidadão pacato que resolve ir à caça dos bandidos. O filme é ruim? Não. É bom? Não. Não é ruim por nunca ser chato. Não é bom por ser de uma tolice atroz. Bruce não parece muito interessado na coisa. Aliás, desde Pulp Fiction ele não parece muito a fim de trabalho.
  ANDREI RUBLEV de Andrei Tarkovski.
Sentiu a coisa? Eis a tal aura da arte, aquilo que Benjamin dizia que o mercado e a repetição destruía. Este filme de mais de 3 horas, fala da vida de um pintor de ícones do século XV. É um filme sobre pintura que não fala de pintura. Fala do momento em que a Russia nasce como nação. Mas vai além. É sobre a violência crua. Por isso ele é bem duro de se ver. As cenas de crueldade são cruas, rudes, e os atos de violência são vistos como ato banal. Claro que por ser Tarkovski, o filme é bem mais que isso. Há um conflito entre ideal e real, e em meio às loucuras dos homens paira sempre a calma beleza da natureza. A cena final justifica todo o filme. Ao lado de uma aldeia arrasada, dois cavalos namoram numa ilha fluvial. Tarkovski foi um gênio, um dos 5 ou 6 do cinema, e no documentário que vem com o filme vemos que ele parecia ser uma pessoa adorável.
 

OSCAR WILDE....LEE MARVIN...BERLIOZ...HITCHCOCK...FRY

   À QUEIMA ROUPA de John Boorman com Lee Marvin e Angie Dickinson.
Este filme, um original, começa bastante confuso. Isso porque Boorman mistura passado e presente, embaralha. Mas após 10 minutos as coisas começam a clarear. As pessoas falam que o filme tem influências da Nouvelle Vague, mas não, ele é puro Melville. Marvin, mais durão que nunca, é um bandido que foi traído. Procura vingança. Visual arrojado, trilha sonora invulgar, anguloso e estranhamente sexy. Tarantino ama esse filme. E faz tempo que Quentin não faz um filme tão bom quanto este. Obrigatório.
   SINFONIA FANTÁSTICA de Christian-Jaque com Barrault, Berry, St.Cyr e Blier.
Biografia de Berlioz. O filme é chavão, cliché, mas a gente ainda o assiste com prazer. Berlioz sofre pacas e fica famoso já velho. Mesmo assim, não é feliz. Barrault foi o maior ator do teatro francês. O Olivier de lá. Jaque foi o diretor mais odiado pela Nouvelle Vague. Ele era correto. Profissional.
   RETRATO DO ARTISTA QUANDO JOVEM de Joseph Strick
A adaptação do romance de Joyce até que funciona. Li o livro uns 20 anos atrás e detestei. O filme mostra toda a ira do jovem contra sua educação religiosa. Os padres são ruins pacas! Há um belo clima irlandês no filme e apesar de sua pobreza é um filme ok.
   OS 39 DEGRAUS de Hitchcock com Robert Donat e Madeleine Carroll.
Ao conhecer uma menina que é fã de Hitch, resolvo assistir mais uma vez este filme da fase inglesa do mestre. Devo já ter visto cinco vezes, e continua sendo um prazer. Trata do tema central de Hitch: culpa. Fuga. Injustiça. Clássico.
   OSCAR WILDE de Brian Gilbert com Stephen Fry e Jude Law.
Fry é Wilde. Nunca em um bio vi um ator tão adequado a um papel. Mas o filme, longe de ser ruim, não está à sua altura. Law é também perfeito como Bosie, o tolo amante mimado de Wilde. O clima de época é maravilhoso.
  TARKOVSKI
  O SACRIFÍCIO. No aniversário de um patriarca acontece a notícia do holocausto nuclear. É o mais assustador filme do russo. O cenário desaba em dor e em cenas quase incompreensíveis. Ele passa muito perto neste filme do absoluto fracasso, mas o filme acaba sendo salvo por algumas cenas inesquecíveis.
  NOSTALGIA. Este não. Ele passa do ponto, e aqui, em seu último filme, Tarkovski erra. O filme é chato, chato se recompensa. Não há como suportar cenas tão longas e tão sem por que. Falta a poesia que tudo redimia.
 

TARKOVSKI ....VALLÉE...RUSSELL CROWE...ROD STEIGER...NAOMI WATTS

   WATERLOO de Sergei Bondarchuk com Rod Steiger, Christopher Plummer eJack Hawkins.
Todas as falas de Napoleão são de rir. Toscas. Mas a batalha em si é soberba. O filme usou o exército vermelho como figuração nessa produção e o que vemos são milhares de soldados, gente de verdade, naquilo que teria sido a batalha que acabou com o doido general francês. Felizmente essa batalha dura mais que a metade do filme, o que quase o salva. A guerra, como vista em 1814, é uma festa de cores, movimento e gestos em grupo. Mas, claro, ao final o que vemos é sangue, dor e uma fealdade total. O filme é bastante tolo, o Napoleão de Steiger fala como um ator ruim ( Steiger foi um grande ator ).
  A CANÇÃO DO POR DO SOL de Terence Davies
Este é o novo filme desse importante diretor da Inglaterra que não é muito conhecido fora da ilha. Mas, que pena, é uma obra banal. Narra a vida de uma família rural no começo do século XX.
  PAIS E FILHAS de Gabrielle Muccino com Russell Crowe, Amanda Seyfried, Diana Kruger.
Incrivelmente ruim. Chega a parecer brincadeira! Tem o nível das piores novelas mexicanas. Crowe, mais choroso que nunca, é um pai com problemas que tenta manter a guarda de sua filha. Já adolescente, ela cria problemas... Os atores se perdem em cenas inconvincentes, mal escritas, bobas...Um desastre.
  OS SEGREDOS DE CHURCHILL  de Charles Sturridge com Michael Gambon e Romola Garai.
Mais um filme novo sobre gente doente...Sim, vemos Churchill sofrendo de Parkinson. E sua relação com a enfermeira que cuida dele. E é só isso.
  DEMOLIÇÃO de Jean-Marc Vallée com Jake Gyllenhaal e Naomi Watts.
Num acidente de carro um cara bem sucedido perde sua esposa. Ele nada sente, fica apático e passa então a demolir sua vida. Tem atitudes estranhas no trabalho e faz demolição de casas como hobby. Então conhece uma mulher e percebe que jamais amara sua esposa. Mais um filme de Vallée, esse canadense que começou a ser notado com o maravilhoso filme de 2005 Crazy.Este é um bom filme, longe de ser emocionante, mas ok.
  FILMES DE ANDREI TARKOVSKI
Assisti 4 filmes desse original diretor russo. Falecido ainda jovem, em 1986, O ROLO COMPRESSOR E O VIOLINISTA é seu primeiro filme, feito ainda na faculdade de cinema, em 1960. O filme, simples, puro, encantador, fala do relacionamento de um menino de 7 anos e um operário que trabalha no rolo compressor. Lembra os belos filmes de Ozu. A INFÂNCIA DE IVAN, de 1961, seria seu primeiro filme pra valer. Acompanha a vida de um órfão, que cheio de ódio, se torna espião na segunda guerra. Não pense num filme convencional. Tarkovski filma apenas a base onde os soldados estão, um mundo de lama, ruínas, escuridão, árvores, e cenas inesquecíveis. As cenas junto ao poço, o encontro com o velho, a cena final, são momentos que afirmam a beleza desse cinema único. Escrevi sobre STALKER abaixo. Voce carrega o filme dentro de voce depois que ele termina. É para ser revisto. Muito. O ESPELHO, feito em 1974, é talvez o mais difícil. Se Solaris foi o 2001 de Tarkovski, O Espelho é seu Amarcord. Mas é um Amarcord quase incompreensível. Tarkovski recorda cenas de sua infância, mas faz com que elas pareçam um sonho, pesadelo, terror e beleza. Jamais vi cenas tão lindas de ventanias, mudanças de clima, cabanas...De certo modo não é um filme, é um poema em colagem...rasgado.

STALKER, FILME DE ANDREI TARKOVSKI

   Stalker é um filme muito, muito chato. E ao mesmo tempo, e o tempo todo, é um filme muito, muito bom. Porque ele cria seu próprio tempo, e nos obriga a entrar nesse tempo, que é outro, diferente do nosso. E ao fim de suas duas horas e meia, que parecem mais de oito, sentimos que valeu à pena, valeu muito à pena.
   Os primeiros dez minutos são os piores. O filme começa num tipo de bar. Um Stalker, que é um guia, vai levar um escritor e um professor para a ZONA. A ZONA é um lugar que surgiu na Terra, um lugar que é agora proibido. O escritor não acredita em nada e quer ir até a zona para tentar reaver sua inspiração. O professor pouco fala. A zona realiza os desejos de quem adentra seu espaço. Isso é o que dizem...
  Passam por uma fábrica abandonada, uma mina e um trilho de trem. O primeiro ponto alto do filme surge aí: a viagem pelo trilho de trem. É uma longa sequência com trilha sonora belíssima ( ao estilo Brian Eno....o filme é de 1979 ). Bela e simples. O filme tem produção pequena e Tarkovski sempre escolhe ângulos de camera originais. Ele monta quadros, corta pouco, esquecemos da sua presença.
  Chegam à entrada da zona. Apenas um bosque banal com alguns postes caídos. O filme, que era feito num tipo de sépia escura se torna colorido. Verde. Muito verde. O Stalker os guia. Não podem voltar. Não podem levar armas. O mais belo momento do filme: água. Cruzam água, adormecem na água, peixes, lixo, pedras. Penso que o filme é uma entrada no inconsciente, Jung, pode ser... Um deles pensa em se matar. Medo. Prosseguem.....  Passam por esgoto, e enfim chegam ao túnel. Outro momento lindo: o escritor anda sozinho no túnel. Silêncio. Chegam enfim à SALA. Um belo espaço com areia. Um cão negro surge do nada. Testemunha os três que entram em conflito. O professor trouxe uma bomba, quer destruir a ZONA. O Stalker é surrado.
  Estão de volta ao bar. Trouxeram o cão preto. Em casa o Stalker sofre. Eles não acreditam mais. Ninguém acredita mais. As pessoas são más. E ele só quer que elas acreditem.
  Esse Stalker, ficamos sabendo no começo do filme, tem uma filha MUTANTE. Ela não tem pernas. E vem a última cena do filme: a filha, sozinha, com o rosto sobre a mesa, sonolenta, faz com que alguns copos caiam no chão, com a força de sua mente.
  Fim.
  Acho que não preciso dizer mais nada...mas digo: Jung, religião e ecologia. Escolha o que este filme é. Para mim ele é os três.

MASTROIANNI/ SOPHIA/ 1941/ JOSH BROLIN/ ANTHONY QUINN/ DEANNA DURBIN

   GI JOE, RETALIAÇÃO de Jon M Chu com Channing Tatum e Dwayne Johnson
A equipe é traída pelo governo. Aquelas coisas, voce disfarça a patriotada com alguns politicos "do mal". O enredo é primário, mas a ação é bem ok. Dá pra ver sem se irritar. Depois de dois minutos terminado voce não lembra de mais nada. Não é exatamente isso que o povo quer? Nota 3.
   O PREÇO DE UM COVARDE de Andrew V. McLaglen com James Stewart, Dean Martin, Raquel Welch e George Kennedy
Martin é um ladrão. Pego pelo xerife é salvo da forca pelo irmão, Stewart. O xerife, que é um puritano, os persegue pelo deserto. Os bandidos levam Welch com eles, como refém. Stewart e Martin formam um boa dupla. Um já velho e bom moço, o outro amargo e rebelde. Concordo com Tarantino, Dean Martin foi um ator subestimado. O filme é legal e de todos os westerns de McLaglen que vi, diretor que erra muito, é o melhor. Bela diversão! Nota 7.
   1941 de Steven Spielberg com Dan Akroyd, John Belushi, Toshiro Mifune
É o filme que quase destruiu a carreira de Spielberg. Caríssimo, foi um hiper fracasso de bilheteria e de crítica. É um comédia histérica e muito sem graça. O humor parece aquele de meninos de 11 anos. Mais que grosseiro, ele é bobo. Bons atores são desperdiçados e atores ruins ganham papéis grandes. Após os sucesso de Jaws e de Close Encounters, Spielberg se dava mal. ET seria sua salvação na sequência. Fuja!
   UM RAIO DE SOL de Henry Koster com Deanna Durbin, Charles Laughton e Robert Cummings
O maravilhoso ator inglês Charles Laughton faz um milionário que está morrendo. Seu filho apresenta uma desconhecida como sua noiva ( ele não encontra a noiva verdadeira que está fazendo compras ). O velho se apaixona pela falsa noiva. O filho precisa manter a farsa. Henry Koster, o diretor do sublime Harvey, faz aqui aquilo que fazia melhor, filmes para se sentir bem. Tudo é artificial, falso, ingênuo? Que bom! Porque não podemos crer em nossa própria ingenuidade? Durbin foi a atriz que salvou a Universal da falência nos anos 30. Aqui, adulta, ela exibe sua leveza etérea de sempre. O filme é uma delicia. Nota 7.
   A 25# HORA de Henri Verneuil com Anthony Quinn e Virna Lisi
Quinn faz mais uma vez Zorba. Impressionante! Não conheço caso de ator que ficou mais preso a um grande papel. Após 1964, quando fez Zorba, Quinn passou trinta anos fazendo variações sobre Zorba. Aqui ele é um romeno que na segunda guerra é confundido com um judeu. Vai preso. Depois o confundirão com várias "raças" até que ao final vai a julgamento como um nazista!!! O filme é tão improvável, tão absurdo que se torna até cômico. Uma bobagem gigantesca. Ah! No começo Quinn dança! Como Zorba, claro! Nota 4.
   SOLARIS de Andrei Tarkovski
Poucos filmes mexeram tanto comigo. Ele me deixou muito introspectivo, triste, me sentindo isolado. A verdade é que me identifiquei com o personagem central. O filme fala das coisas que mais me absorvem: tempo, memória, amor e imaginação. É um filme chato, preciso dizer isso. Mas que consegue nos dar alguns momentos de beleza sublime. Romântico então, verdadeiramente romântico. Nota 9.
   CAÇA AOS GANGSTERS de Ruben Fleischer com Josh Brolin, Ryan Gosling, Sean Penn e Nick Nolte
Pessoas que nada entendem de filmes falaram que este era um film noir. Onde? É um filme de gangster! O filme noir tem um homem sózinho, confuso, tentando desvendar um mistério. O filme de gangster, que foi criado em 1930 com Scarface e Public Enemy, fala de grupo de tiras lutando contra uma organização criminosa. É este o caso. E devo falar que é um bom filme. O roteiro é bastante fraco mas ele é salvo pela direção cheia de ritmo e sem frescuras de Ruben. Josh Brolin é perfeito. Tem voz e rosto de homem, passa a sensação de verdade. Já Ryan está no filme errado. Parece um menino vestido com o terno do pai e fumando escondido. Sean Penn imita De Niro em seus piores dias. Parece Dustin Hoffman em Dick Tracy. Mesmo assim este filme, de visual lindo, diverte e nunca cansa. Um adendo: Que época é esta em que vivemos? Cenas de violência são mostradas em detalhes pornô e cenas de sexo são feitas com lingerie e puritanismo. Why? Porque sexo só pode existir em filme "doentio"? Sempre vindo em embalagem de mal, de distúrbio e de doença? Porque seios, bundas e pênis nunca surgem em filmes alegres, leves e pop? Mas corpos dilacerados e sangue jorrando podem? Welll....Dito isto, este filme vale um 6.
   UM DIA MUITO ESPECIAL de Ettore Scola com Sophia Loren e Marcello Mastroianni
Quase um milagre. Scola consegue fazer um filme tristíssimo que não entristece. Um filme hiper dificil que nunca aborrece. Um filme tipo teatro que não parece sufocar. Ele se passa em dois apartamentos e a trilha sonora é feita pelos sons do dia em que Hitler veio visitar a Itália de Mussolini. Sophia é mãe de filhos fascistas e tem um marido do partido. Marcello é um homossexual que foi expulso do trabalho por não ser " marido, pai e soldado". Os dois se conhecem e uma mudança acontece nela. Ou não? Scola dirige com uma delicadeza exuberante. Toda cena é suave, dolorida, desbotada. Nos assustamos com um fato: Como pode aquilo ocorrer? Todos, alegremente fascistas, comentando a beleza de Hitler, a sabedoria do Duce. Bem, falo agora dos dois atores. Sophia é uma grande atriz. Nas cenas finais ela comove em sua derrota. Ela está vencida, presa, humilhada. Mas é Marcello que atinge o sublime. Nunca assisti um retrato tão perfeito de um homossexual. Em cada movimento de suas mãos, de seus olhos, percebemos sua homossexualidade, sem caricatura, sem exagero, sem nada de ofensivo, natural. Quanta melancolia naquele homem, quanta raiva muda. Lembro que em 1977 ele concorreu ao Oscar e o perdeu para Richard Dreyfuss em The Goodbye Girl. Dreyfuss estava ótimo, mas isso aqui é histórico! Um belo filme. Nota 8.

OUTRAS VIAGENS SOBRE SOLARIS

   Não esgotado o assunto, volto a desenvolver pensamentos nascidos do filme de Tarkovski ( Sobre o filme especificamente falo abaixo ).
   Eu amei seus seios, sua boca e sua pele inteira. Amava seu tom de voz, os dentes tortos e o cheiro de sexo. Sua impulsividade, seu humor sincero e reto, seus sonhos simples. Amava suas canções e o modo como ela ria sem medo ou vergonha. Sua coragem. Mas há uma questão nisso tudo: Eu a conheci? Eu realmente sei quem ela é, foi, queria ser? Ela me conheceu?
   O que sei de sua história? O que ela sente ao acordar, ao menstruar, quando está só, quando pensa nos pais. De onde ela veio, o que fez, o que é. Eu a conhecia?
   Esse é um dos assuntos dificeis do filme. Outro é a identidade. Assunto que é o mais importante da filosofia e da neurologia hoje. Existe um eu? Há algo de particular em mim ou em voce? Não seríamos apenas um arquivo de memórias e de reações óbvias? Que eu sou? Quem ela é? Mais perturbador no filme é: Será possível ter contato com alguém? Ou nos iludimos pensando que aquela distãncia, aquele não-conhecer, aquele quase nada, seja um contato? A questão agora não é mais Quem eu sou e sim, O Que eu sou.
   O filme dá duas pistas.
   Amamos aquilo que perdemos ou que podemos perder. Não amamos aquilo que achamos ter para sempre. Desse modo, pouco ligamos para pais e mães, que nos parecem pra sempre, e amamos a vida, que sabemos perder um dia e aqueles que nos parecem mais distantes. Quem ama a Deus O ama por sua incerteza e não o contrário. Tarkovski diz isso e mais: Amaremos a Terra apenas quando ela estiver destruída.
   Segunda pista: Se ela que eu amo pode ser uma ideia virtual em minha cabeça, o que remete ao fato de que ela não existe e na verdade é substituível; lógico será que eu também seja uma virtualidade na cabeça dela. O filme vai nessa lógica até o limite ( e tentarei não descrever o final perturbador ). A vida como um oceano de memórias, um pai que tem um filho que será e é sempre uma ideia abstrata em sua mente criativa.
   Parece exotérico para voce? Eis o mais platônico dos filmes.

SOLARIS- ANDREI TARKOVSKI.... FILMES DE ARTE PARA PESSOAS INTELIGENTES ( NÉ NÃO? )

   Todo filme que precisa de "bula" ou de manual de instruções é falho como cinema-puro. A linguagem do cinema não é verbal, ela é cinemática ( é terrivel ter de dizer algo que deveria ser tão óbvio ), mas nossa cultura é 100% verbal e então temos de transformar música, pintura, dança e cinema em discurso verbal. Deixa de ser bobo manézão! Filme muito falado, filme que só vale como narrativa verbal NÃO vale como cinema. Pode ser um bom conto, uma aula de filosofia, mas nunca um grande filme.
   Solaris dialoga com 2001 de Kubrick. Lançado 4 anos mais tarde é a versão russa da saga espacial-filosófica de Kubrick. O filme anglo-americano é mais cinemático, ele não precisa de palavras, é puro deleite visual. Solaris é literatura. Fico imaginando os orgasmos que Aronofski e Von Trier devem sentir com sua loooooonga chatice. Tarkovski faz tudo aquilo que eles ( e mais um monte de modernetes ) tentam fazer. Com uma diferença crucial: Andrei tem muito a dizer. E pensa com originalidade. Soderbergh refilmou esta saga em 2002 com George Clooney. Foi seu maior fracasso. Os fãs de Aronofski e que tais não suportam aquilo que seus guias adoram. Vamos ao filme...
   Um psicólogo é enviado ao planeta Solaris. Na estação orbital russa, um dos tripulantes morreu e dois outros ficaram doidos. Porque? Lá, o psicólogo descobre que o mar gelatinoso que é aquilo que compõe o planeta tem o poder de ler a memória das pessoas. Com esse conhecimento ele dá vida a essa memória. O psicólogo recebe então a visita de sua ex-esposa, morta a dez anos. Ela surge como ser de carne e osso, real para todos os outros, mas desmemoriada. Ela é sua esposa, mas ao mesmo tempo não é. O psicólogo se apaixona de novo...
   Realidade virtual. Muito mais sofisticado que Matrix e outros desse tipo, Tarkovski fala que a consciência é uma verdade ilusória. O que amamos? Amamos aquilo que amamos, mas o que é esse amor? Roger Ebert dizia que o filme demonstra que o amor é "amar a ideia que fazemos do amor", amamos aquilo que imaginamos sobre a pessoa amada, amamos aquilo que desejamos crer. O psicólogo do filme ama a réplica de sua esposa, réplica que não é a esposa mas que parece ser essa esposa. Esposa virtual, criada com as imagens da memória do marido, mas, ironicamente, desmemoriada, sem história, sem origem familiar. E essa réplica sofre por não ter história.
   O filme, lento ( Tarkovski é o diretor mais lento de toda a história ), solene, silencioso ( e com algumas poucas cenas com belíssima música eletrònica ), tem um apuro visual que beira o sublime. Por exemplo a primeira cena, das algas e da água, a poética e inesquecível cena dos amantes sem gravidade, flutuando, e a cena final, forte, surpreendente e misteriosa. Não descreverei essa cena, mas direi que ela muda toda a compreensão da obra.
   É um filme chato. Algumas cenas são exasperantes. Por outro lado é um filme que dá tempo a que pensemos sobre aquilo que vemos. Apreciamos uma cena, sempre longa, e depois podemos raciocinar sobre ela. Esse é o objetivo de Tarkovski. Um filme que é como uma instalação, cenas que formam um todo. Sublime? A teoria do sublime diz que a beleza-sublime nasce em meio ao medo, ao esforço, a vitória sobre uma força maior. Este filme nos dá beleza em meio a uma chatice quase insuportável. De seu modo é sublime. Seu mistério fica em nossa memória. É absolutamente original.