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titi nun ce lascia' - Riusciranno i nostri eroi...

O CARADURA DE DINO RISI E PERDIDOS NA ÁFRICA DE ETTORE SCOLA, DOIS FILMES SOBRE O ESTRANGEIRO

Dois filmes italianos, dois filmes sobre viagens. No primeiro, de Dino Risi, Vittorio Gassman, brilhante como sempre, é um produtor de cinema. Ele leva suas atrizes e seu roteirista para o Festival de cinema de Mar Del Plata, na Argentina, onde seu novo filme irá concorrer. Falido, ele pensa em encontrar um amigo seu que emigrou para Buenos Aires e ficou milionário. O filme parece, no início, um banal veículo para enaltecer a Argentina, é 1964 e o país vive seu último período de fartura. Lá, Gassman encontra um italiano, Amedeo Nazzari, dono de terras e gado. Absurdamente rico, ele trata os italianos que ainda vivem na Italia como deuses. Mima-os, enaltece-os, fica a seus pés. Começamos então a perceber o objetivo do roteiro de Age e Scarpelli ( existe dupla de roteiristas com mais filmes que essa? ), a emigração, os italianos que foram e não voltaram, o modo como eles hiper valorizam seu país de origem e por isso não conseguem retornar. O filme é leve, alegre, cheio de piadas, mas há um fundo trágico, duro, sombrio, o milionário enaltece Gassman mas ao mesmo tempo finge não perceber seus pedidos de ajuda. Na parte final do filme ele se torna belíssimo. É quando Gassman finalmente encontra o amigo "rico", papel curto e forte de Nino Manfredi. Vemos logo que Nino é terrivelmente pobre, sua vida de imigrante foi um fiasco e mesmo assim ele tenta fingir riqueza. Até que, num momento raro em filmes, tipo do momento que nenhum cinema conseguia fazer melhor que os italianos, surge a verdade: Manfredi abre o jogo no meio de uma frase, se revela, Gassman faz o mesmo, e de repente estão os dois, rindo de suas desgraças e amigos como nunca. O produtor falido levará o amigo pobre numa festa de milionários para tentar descolar um emprego para o amigo, os milionários irão oferecer entrevistas de emprego, mas Nino sabe a verdade, imigrantes ricos têm vergonha daqueles que não deram certo. Tanto na Italia como na Argentina não há lugar para ele entre seus conterrâneos. Quando ele recusa o taxi e parte sozinho rumo à sua vida de proletário, sabemos estar diante de um grande momento em filme. Mas o show continua! Gassman vence o prêmio e continua falido. O avião decola rumo à Italia, os pobres amigos de Manfredi acenam e sabemos que nada mudou. Em outro avião, que desce, chega o cantor Celentano, e vemos o milionário Nazzari correr para o homenagear. O filme revela vícios e charmes da alma da Italia como poucos. ---------------- Preciso enaltecer Vittorio Gassman, ator de teatro, shakespeareano, talvez o maior do país, que via o cinema apenas como exercício e que por isso brincava enquanto interpretava. Há nele uma sabedoria, um domínio da arte que nos faz sentir prazer 100% do tempo. É genial. Sempre, em qualquer filme. Famoso, ele fez filmes nos EUA nos anos 50, e ao fim da vida, nos anos 80-90, chegou a filmar com Altman e Woody Allen. -------------------- No segundo filme que vi, de Ettore Scola, feito em 1968, também se fala de outro país, no caso Angola. É a Angola portuguesa, e é cômico para nós vermos os extras falando minha língua. Alberto Sordi é um industrial em crise existencial que vai à Africa procurar um parente que desapareceu por lá. No começo ele se comporta como um turista rico, fotografa animais, pessoas, se coloca superior. Mas com o tempo ele muda, muda muito, e se envolve numa aventura absurda e com ares de pesadelo ( embora o filme jamais deixe de ser uma comédia ele toca em coisas muito sérias ). É uma aventura maravilhosa! Um dos filmes menos conhecidos de Scola, é meu favorito. Sim, é quase uma obra prima. Vemos no filme influências que vão de Huston à Joseph Conrad, dá pra dizer que nesta saga de um homem à procura de um desparecido, o Apocalypse Now de Coppolla fica vários pontos para trás. Este é muito, muito melhor! Selva, desertos, um português maluco e malandro ( portugueses na Italia têm a fama de malandros, eu não sabia disso ), nativos passivos, uma pobreza absoluta, um casal racista, nesse caldo de gente e lugares, Sordi e seu contador, Blier, ambos brilhantes, nos fazem entrar dentro de Angola, dentro deles mesmos. O desaparecido, que foi padre, ladrão, traficante de armas, um mistério eterno, afinal surge no meio de uma aldeia no fim do nada: é um guru místico. Ou não, pois quando eles conversam vemos que ele é nada mais que um maconheiro viajante mentiroso. Nino Manfredi faz esse guru e sua atuação nos faz apaixonar por ele. É um homem que fugiu e nada achou, ou achou tudo, talvez. Eles fogem da aldeia e entram em navio luso, rumo à Europa. Mas Nino olha os nativos na praia que o chamam....as mulheres negras....--------------- Obra prima completa, longo e que vemos o tempo todo com prazer, é uma saga cômica do tipo que Voltaire escrevia. O homem que se dá mal e aprende então um segredo. Filme tão bom que dá vontade de ver de novo. ---------------- Entre 1945-1970 não houve cinema como o italiano. E nunca mais haverá. Foi uma conjunção, uma sorte, que uniu um país em momento de enriquecimento e mudança moral, roteiristas revolucionários, atores brilhantes e diretores ousados. E ainda, de brinde, algumas das atrizes mais belas da história. Termos a chance de usufruir desses filmes é um privilégio. Sem preço. Dê um presente a si mesmo e veja esses dois grandes filmes.