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ESPIONAGEM NA INGLATERRA E UM LIVRO MUITO PERIGOSO

Acabo de ler que um dos serviços de contra espionagem inglês possui um comunicado onde se lê: " Qualquer pessoa que for vista com o livro 1984 de Orwell, ou obras de Joseph Conrad, Tolkien, CS Lewis será considerada uma perigosa extremista de direita. Livros que pregam a contra revolução não podem ser tolerados. " Pasmado? Eu não. Esse movimento não é novo e durante a pandemia foi bastante solidificado. Na crise do vírus, governos perceberam que a população é hoje facilmente comandada. Quem foi e é crítico será sempre chamado de extremista. E de direita, porque quem não aceita a "união pelo bem " só pode ser um egoísta e todo egoísta é direitista. ---------------- Um técnico mostra na NET, com imagens, que a AI, a inteligência artificial que começa a ser dada agora para uso geral, já está ideologizada. Se voce pede para o cérebro eletrônico criar um poema sobre Bolsonaro, ele responde não poder criar nada que seja sobre política. Mas se voce pede um sobre Lula, ele te dá um longo poema sobre o heroi. ---------------- Eu não fico surpreso e nem alarmado. O bom senso prevalecerá. A incompetência da esquerda destroi a ela mesma. Aliás, acabo de reler mais um livro de Evelyn Waugh, e ele não entra na lista da Inglaterra porque ninguém mais o lê. MALÍCIA NEGRA foi escrito em um tempo em que as pessoas discutiam, não cancelavam e fingiam ignorar. Seria interessante ver um lacrador de 2023, um típico comedor de ostras da Vila Madalena lendo este livro. Como um nazista, ele provavelmente o queimaria na calçada. A sátira demolidora de Waugh fala de um imaginário país africano onde a crueldade e a corrupção impera. O presidente só se preocupa em parecer chique e fino, gasta fortunas em decoração e palácios, seus aliados o traem por qualquer quantia, o exército é antigo e sem disciplina, os estrangeiros brancos vivem em ócio impotente e loucos para fugir do lugar, cenas e mais cenas de assassinatos, roubos, fugas, troca de favores. Fome e miséria para o povo, uma nova limusine para o líder. Waugh jamais pensa estar sendo racista, ele simplesmente cria uma ficção que espelha a realidade. A África dos anos 60 era exatamente aquilo e escrever sobre o que se via não era ofensivo ou proibido. Não era coisa de chato de direita. Era a época de Idi Amin comendo a carne de seus rivais e de guerrilhas dizimando quem não lutasse por elas. Não houve um só país da Africa negra que não fosse vítima de líderes metidos à besta. Waugh nos faz sentir nojo e rir amargo. Sim, o livro é uma comédia. -------------------- Estou surpreso por ainda não terem se metido a criticar Jung por sua fé na INDIVIDUAÇÃO. Talvez porque Jung foi tomado por charlatâes que só percebem nele aquilo que desejam ver. Já Eliot, assumidamente conservador, é complicado demais para um militante censor e por isso ainda não foi atacado. Toda censura é burra e ao mirar em Orwell ou Tolkien eles esquecem do muito mais perigoso, para eles, Nietzsche, o homem que pregava o indivíduo sobre tudo o mais. Literatura de valor é sempre anti grupal e aqueles que tentaram ou foram fortemente socialistas envelheceram rapidamente: Gorki, Brecht, Shaw. Neruda só é lido na América do Sul, continente que nunca irá sair de 1968, e Saramago já começa a exibir teias de aranha em sebos. Mesmo autores "de esquerda branda", quando lidos com isenção, revelam, se são muito bons, um individualismo imenso, um descompromisso com revoluções, uma desconfiança às promessas de união pelo bem. Os ingleses vão ter de queimar mais livros que os nazis queimaram em 38.

ROVERANDOM - J.R.R. TOLKIEN

   Em férias na praia, com sua esposa e seus três filhos, Tolkien inventa para Michael, seu filho do meio, a história de um cachorro que é transformado em brinquedo por um feiticeiro vingativo. Tolkien cria essa história como consolo ao filho, que havia perdido seu cachorro de brinquedo. Era um cachorrinho de chumbo, pesado, pequeno, amado pelo menino que o carregava nas mãos para todo canto. Procuraram na praia por dois dias, mas o brinquedo nunca foi encontrado.
  Depois de narrar a história-consolo para o filho, Tolkien a escreveu mas nunca a publicou. Morto em 1973, a aventura do cachorro Rover vira livro em 1982. É um livro infantil, não procure nenhum simbolismo, nenhuma mensagem, é apenas uma história bem contada. E que alívio, que prazer poder ler linhas tão bem escritas!
  Rover é um cão de verdade que vira brinquedo. E esse brinquedo é perdido na praia. Um outro mago faz com que ele vá para a Lua e lá ele vive aventuras com o Homem da Lua e o Cachorro da Lua. Depois Rover vive um tempo no mar, como cachorro marinho e ao fim retorna a seu dono original, que não é o filho de Tolkien, mas sim o menino anterior à sua condição inanimada.
  A história se desenvolve em meio a cenários simples e maravilhosos, personagens que vão de dragões lunares à sereias e gaivotas que podem voar pelo espaço. É bonito, é fácil de ler e é divertido. Um inesquecível presente para uma criança de 10 anos, um ótimo conto para um adulto que ainda dê valor às coisas da imaginação.

HOBBIT/REX HARRISON/ AL PACINO/ RAY/ SODERBERGH/ DORIS DAY

JUMBO de Charles Walters com Doris Day, Jimmy Durante, Martha Raye.
A vida no circo, onde Doris é a filha do dono, que por sua vez gasta tudo em jogo. O filme é simples, alegre, e entretém. O trio central brilha com sua simpatia. Nota 6.
O ENXAME de Irwin Allen com Michael Caine, Henry Fonda, Richard Widmark.
Abelhas africanas botam pra quebrar no Texas. Caine é um cientista. O filme tem uma direção inábil. Tão trash que fica até funny.
O ÚLTIMO ATO de Barry Levinson com Al Pacino
Birdman? Ator em crise tem ataque no palco. Fica preso do lado de fora, vai morar isolado, se envolve com gente doida... O filme é o mais árido da boa carreira de Levinson, e Pacino está interessado. Confuso, não é um bom filme, mas é interessante. Nota 4.
ADEUS À LINGUAGEM de Godard
Incompreensível. Cenas de um casal, muita nudez, frases inteligentes, imagens trêmulas, confusão. Godard aina é difícil, rebelde, ácido. Atira contra tudo e parece concluir que a linguagem se desfez, não faz mais sentido.
O HOBBIT, TODOS OS TRÊS. de Peter Jackson com Martin Freeman, Ian McKellen
Jackson tem coragem! Após os anéis ele arrisca os dedos. Volta à Tolkien e usa um livro muito mais pobre do autor. E o estica em quase nove horas de cinema. A parte um é boa, a segunda é ruim e a terceira é a melhor. Um erro está no elenco. Freeman é um hobbit ótimo, mas o líder dos anões é fraco. De todo modo, há uma beleza estética que não cansa. O maravilhamento dos anéis se perdeu, mas é boa diversão. Nota 6, 3 e 6.
FULL FRONTAL de Soderbergh com Julia Roberts, David Duchovny,Catherine Keener
Soderbergh e seu medíocre lado artístico. Ele brilha quando pop, mas, inseguro, acha que precisa provar ser arteiro, e faz suas besteiras metidas à Cassavetes ou Godard. Aqui é um filme dentro de um filme. Só what?
THE CHESS PLAYERS de Satyajit Ray
No século dezenove enquanto a Inglaterra se apossa da Índia, dois nobres se distraem jogando xadrez. O filme é chato e é forte. Ficamos entediados, mas depois que ele acaba não nos larga. Lembramos dele com admiração. Isso é arte. Nota 7.
ASFALTO de Joe May
Filme mudo alemão de um dos mais poderosos nomes da época. Um tenente de policia é seduzido por uma mulher fatal. O filme tem um belo clima sensual. Pode ser um bom começo para aqueles que desejam adentrar o mundo do cinema dos anos vinte. Nota 6.
ANNA E O REI DO SIÃO de John Cromwell com Irene Dunne e Rex Harrison.
Primeira versão da historia da professora que vai à Tailândia ensinar rei a ser moderno. Lindo, dramático, serio e muito bem interpretado. Rex consegue ser duro, frio, e frágil ao mesmo tempo. Envelheceu nada esta produção Fox. Nota 8.

UMA HABILIDADE PERDIDA...J.R.R.TOLKIEN, O SENHOR DA FANTASIA- MICHAEL WHITE. PORQUE GENTE COMO EU DETESTA O SENHOR DOS ANÉIS.

   Em 1997, numa eleição feita por uma rede de livrarias inglesa, O Senhor dos Anéis foi eleito o melhor livro do século XX. Com profunda indignação, autores modernos expressaram um profundo ódio pela coisa. Uma crítica feminista chegou a dizer:- Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus, meu Deus!!!! Onde chegamos!!!!!, um outro disse:- Tolkien? Não é aquele cara que escreve livros tolos para adultos mentalmente deficientes?
 Suspeitando de fraude, o jornal Daily Mail fez outra pesquisa. Mesmo resultado, com Ulysses em segundo lugar. No auge da raiva, uma associação de leitores cultos da Grã-Bretanha fez mais uma votação. Essa incluindo livros de todos os tempos. Por 120 votos de diferença, Tolkien venceu Jane Austen e deixou Dickens em terceiro. Well...
 O autor desta bio tem uma boa tese. Mais que boa, talvez seja um fato. No modernismo, começado com Flaubert e desenvolvido por Henry James, o estilo importa mais que o enredo. Voce pode escrever sobre qualquer coisa, voce pode escrever sobre nada, contanto que alí haja um estilo próprio, uma marca de autoria, um sinal de voz única. Esse movimento, muito interessante em seus começos, levou a um impasse, o fim do enredo e com ele a morte da habilidade em se narrar uma história. Mais que isso, a incapacidade de se criar personagens. Livros modernos passaram a falar apenas do eu e de mais nada. Para White, Tolkien foi e é tão odiado por jogar na cara de certos escritores sua incapacidade em escrever. Sim, em escrever. Não sabem narrar, não conseguem inventar uma história, não têm o dom de construir livros coerentes em si, ricos de invenção e de personagens, criativos e organizados. Sabem apenas falar de si-mesmos. São impotentes em criação e sobretudo em imaginação. 
  Não precisei ler este livro para aceitar essa tese. Tentei ser um romancista por toda a vida e desisti porque percebi que não sei escrever. Ou melhor, não consigo criar. Tudo o que escrevia eram confissões sobre coisas que vivi, presenciei ou sofri. Escrevo, portanto, aquilo que não gosto de ler. Por honestidade, desisti. Foi assim que me encantei por aquilo que não tenho, e que poucos hoje têm ( e quase ninguém confessa ), o dom de criar. Inventar uma boa história e saber contá-la, de forma clara, encantadora, rica e excitante. Alguns conseguiam unir o estilo moderno a esse dom criativo ( Nabokov, Borges, Bellow ) mas são raros. A maioria finge ter optado pelo hermético quando na verdade são apenas limitados. Jack Kerouac é um belo exemplo de escritor que escreve sem ter  a mínima criatividade. A lista não tem fim. Tolkien ao escrever criou personagens, cenário e narrativa. E assim pareceu ultrapassado em 1954, ano de O Senhor dos Anéis. Tempo em que Camus, Sartre e Moravia eram a moda. O que aconteceu foi a maior zebra do século: um autor conservador, careta, metódico, meticuloso e ultra-católico se tornar o ídolo de adolescentes rebeldes e criativos. 
  A história de Tolkien é fascinante por não ser boêmia. Ele não tinha vicio nenhum, pouco ligava para sexo, detestava tudo o que era moderno e só gostava de livros escritos antes da renascença. Achava Shakespeare fake, Cervantes um chato e Dante um mal exemplo. Amava narrativas antigas escritas em inglês arcaico. Sabia várias línguas nórdicas. Desprezava o francês. Foi professor em Oxford. E tinha uma dificuldade imensa em ganhar dinheiro.
  Sua infância foi um desastre. O pai foi para a África do Sul e Tolkien nasceu lá. Seu ambiente até os 3 anos foi esse, longas estepes quentes. A mãe passava mal no calor e ele voltou à Inglaterra com ela e um irmão. O pai, que trabalhava muito, ficou para juntar mais dinheiro. Acabou morrendo meses depois, com uma infecção. A mãe, muito pobre, foi morar com parentes em casas lotadas. Quando ela se converteu ao catolicismo toda a família lhe virou as costas. Ninguém a perdoou por virar uma papista. Poucos anos depois ela morreria de diabetes. Tolkien sempre consideraria que ela fora morta por abandono, por ódio religioso, por perseguição. 
  A vida de Tolkien passa a ser uma confusão. Mora com parentes. Alguns menos ruins, outros terríveis. Ele e o irmão mais jovem ( 3 anos de diferença ), vagam como ciganos, mudam de casa sem parar, e estudam. Um padre os ajuda e esse padre se torna um novo pai para eles. Tolkien consegue passar em Oxford e sua vida será para sempre acadêmica. 
  Se enamora de uma moça 3 anos mais velha, Edith. Têm um longo noivado. Tolkien luta na Primeira Guerra,conhece as trincheiras, vê amigos morrerem, fica doente, consegue sobreviver. Se casa e será pai de 4 filhos. Amoroso, sua vida passa a ser uma luta por dinheiro.
  Escreve de noite. Narrativas épicas sobre um mundo de fantasia. Deixa sua imaginação fluir. Escreve muito, corrige muito, reescreve. Lança O Hobbit e faz sucesso. Não aproveita a maré e demora 17 anos para lançar outro livro. O Senhor dos Anéis sairá apenas em 1954, após mais de uma década de escrita, correção, dúvidas, negociações. Um sucesso imediato, a saga toma novo impulso em 1966, quando estudantes universitários o descobrem. Mais uma geração de fãs surge aí. Desde então novas gerações se sucedem e o livro nunca mais deixa de vender. São 120 milhões até 1995. Após os filmes, mais 10.
  Tolkien morre em 1973. Rico, mas ainda sovina. Discreto, com medo da fama, sem entender o porque de tanta adoração. 
  Como homem Tolkien era um daqueles ingleses que não mais nascem. Um homem que adorava conversar com outros homens, inseguro com mulheres, o tipo que considera o máximo de alegria ter um cachimbo aceso e uma poltrona quente ao pé da lareira. Passava noites com seu grupo de amigos ( C.S. Lewis era seu melhor amigo ), discutindo livros, religião ( Lewis era protestante até a medula ), aulas. Tolkien não tinha o menor interesse por politica, música ou arte em geral. Odiava comida francesa, adorava cerveja preta, tinha um excelente dom para as aulas, e nunca foi visto sem o cachimbo na boca. Falava com ele pendurado no lábio. Seu mundo era seu escritório, a coisa mais importante era o catolicismo. Rezava muito, acreditava no poder da fé e ia muito `a igreja. Era ecológico antes do termo ser moda, ficava bravo quando uma árvore era derrubada, tinha aversão a carros, TV e toda máquina. Vivia suspenso no mundo imaginário do século XI ou XII. E escrevia todo o tempo.
  Terminando a leitura fica a impressão que, assim como aconteceu com Chagall, por méritos próprios, Tolkien foi um grande vencedor. Não no sentido material. Vindo de uma infância de desamparo, de pobreza e de dor, ele, com a força de sua mente, venceu. Foi professor na maior das universidades e de quebra eternizou seu nome nos corações de milhões de leitores. A sorte nunca fez parte desse ganho. Na verdade ele venceu o azar. 
  Quanto a minha opinião. O título que usei foi propositadamente enganoso. Eu odiava os filmes dos Anéis sem os ter visto. E odiava Tolkien com o orgulho idiota de jamais o ter lido. Era como se ao dizer ODEIO TOLKIEN eu declarasse ser invulgar, culto e adulto, tudo ao mesmo tempo. Estranho fenômeno esse, ao NÃO fazer algo ( ler Tolkien ) me torno um leitor melhor. Uma verdadeira asneira de nosso tempo. Preconceito de classe. 
  Comecei a mudar no momento em que percebi que minha leitura estava travando. Lentamente eu perdia o prazer da leitura. Meu preconceito, a vontade que me foi imposta de só ler o que fosse ""relevante, único, brilhante"", dava ao ato de ler o sabor de coisa fria, estéril e ocasionalmente mórbida. 
  Lembro de quando isso mudou. Foi com Sherlock Holmes. E em seguida com os livros de Jeeves. O prazer de se acompanhar uma trama, de se conhecer personagens bem criados, de sofrer surpresas, de se crer naquilo que se lê, me salvou do abismo do desprazer. Reconquistei a magia da leitura. Foi uma sorte.
  Desde então respeito e invejo, assumidamente, todo criador. Admiro o dom, arcaico e primordial, que alguns poucos têm de nos fazer viajar através das palavras. De poder recuperar a hora da história ao pé do fogo. 
  Esse dom não tem explicação. E esse presente não tem preço.

C.S.LEWIS, DO ATEÍSMO ÀS TERRAS DE NÁRNIA, BY ALISTER MCGRATH

    Leio com surpreendente prazer a bio deste escritor, professor e famoso apologista inglês. Hoje, com certeza, mais famoso por sua série de livros infantis sobre Nárnia, Lewis foi durante os anos 40 e 50 uma celebridade na Inglaterra e nos EUA. 
   Nasceu em lar de razoável conforto e logo cedo perdeu a mãe. Mesmo assim viveu uma bela infância, livre, gasta em brincadeiras com o irmão. O pai lhe deu o amor aos livros, mas os dois nunca se deram bem. Lewis enfrenta as trincheiras na Primeira Guerra e é ferido. Estuda em Oxford e depois se torna professor de literatura inglesa na mesma escola. Sua predileção é pela idade média e renascença. Faz amizade com Tolkien, que também leciona em Oxford. Ateu exaltado, racionalista, lentamente se converte ao cristianismo. Como? 
  Na verdade nada acontece de espetacular. Lewis se torna cristão por questões literárias. Ele vê Deus como um tipo de sol. Com a presença de Deus a realidade se ilumina, as coisas ficam mais claras e as obras de arte são melhor entendidas. Lewis diz que a absoluta falta de fé leva a arte ao vazio. Obras sem vida, frias e mal executadas, personagens ralos, textos que falam apenas do autor que os escreve, textos mortos. 
  Na Segunda Guerra ele faz uma série de programas para a BBC. No rádio se torna famoso. Fala sobre Deus às pessoas, aos soldados. Lança livros sobre religião, sua fé e a do cristianismo "puro e simples", independente de igrejas. Sua fé e sua fama fazem dele um solitário em Oxford. Perde a amizade de Tolkien, que se sente roubado quando ele lança a saga sobre Nárnia, que estoura em vendas nos anos 50. Sai de Oxford e é chamado por Cambridge. Morre em 1963, no mesmo dia em que Kennedy é assassinado. Crítico feroz dos tempos modernos, é logo esquecido nos anos 60, visto como um velho inglês conservador e ultrapassado. Renasce nos anos 90. Volta a moda no século XXI.
  Alister McGrath escreve de modo leve, mas nunca tolo. Também professor, em Oxford, tem flagrante carinho por Lewis, mas não deixa de demonstrar as falhas em seu pensamento. Lewis tenta demonstrar que a razão foi um dia irmã da criatividade. As duas se separaram logo depois da renascença e com o correr do tempo se fizeram inimigas. Essa a grande tragédia da modernidade. A razão deve ser aliada da imaginação e saber que criar é saber. A verdade está naquilo que imaginamos. Mitos, lendas, sagas, sinais de verdades, pistas de sabedoria, modos de tornar claro aquilo que vai além da miopia da razão.
  Devemos conhecer aquilo que não conhecemos. Ler o que não lemos, ir onde não fomos, tomar contato com formas alternativas de pensar e de sentir. AUMENTAR NOSSA VISÃO. IR ALÉM DA NOSSA JANELA.
  Cabe a imaginação reorganizar a realidade, colocar o real em novo arranjo e assim torná-lo inteligivel. Só fala em Mundo sem Sentido aquele que não consegue ou não quer ver a realidade iluminada da vida. 
  O mundo faz sentido para Lewis. Deus o fez ver o sentido. Iluminou a vida e lhe deu a liberdade de criar. Lewis fez mapas que nos ajudam a perceber onde estamos e de onde viemos. Se ele estava certo ou errado jamais o preocupou. Porque ele criou e nessa criação achou a vida real.
  O que mais uma filosofia pode nos dar?

A LITERATURA E A MORTE DE DEUS

   Tenho lido a biografia de C.S.Lewis. Tenho um profundo amor por essa turma, esses ingleses que viveram entre 1890/1940, essa época de Eduardo, de George. Lewis tinha uma vida dupla, era um dos mais destacados professores de Oxford, um dos melhores críticos literários e talvez o melhor leitor de seu tempo. E ao mesmo tempo escrevia livros populares, é ele o autor da saga de Nárnia. Não por acaso, um de seus melhores amigos era outro grande professor de Oxford, J.R.R.Tolkien. O que seus contemporâneos não conseguiram entender é algo que nosso tempo, felizmente, consegue compreender um pouquinho melhor ( mas ainda com muita ignorância ), Lewis tentava unir a razão a criatividade, um casamento que foi um dia a regra entre artistas, mas que no mundo moderno havia sido cada vez mais raro. Ele e Tolkien procuravam salvar a literatura da asfixia onde ela se encontrava. Que asfixia era essa?
 Há que se dizer que nos seus primeiros trinta anos de vida foi Lewis um racionalista. Em seu diário ele diz que conseguia deixar cada coisa numa gaveta separada de seu cérebro. E mesmo a experiência na Primeira Guerra, ele esteve nas trincheiras, foi colocada em lugar seguro, longe da parte central de sua vida. 
 Ateu convicto, Lewis começou a perceber, em seus estudos literários, ele logo seria um dos melhores professores de literatura inglesa, que os autores ateus, céticos, os que colocavam todo campo espiritual de lado, tinham sempre uma prosa limitada. Esses escritores não conseguiam criar vida. Seus livros são como teatro de bonecos, os personagens jamais parecem reais, o que esses relatos transmitem é sempre a voz do autor, em total isolamento, lutando para criar vida, e sendo sempre derrotado. Porque isso acontece? Porque a criatividade desses escritores é sempre castrada, truncada, tristemente árida? E porque escritores como Sterne, Dickens, Dostoievski, Tolstoi, Balzac, Stendhal, conseguem criar tanta vida, tantos personagens que falam, agem, vivem como se fossem gente de carne e de osso? Mais que isso, porque esses escritores parecem ter tanto interesse na REALIDADE? Descrevem árvores, cidades, guerras, rostos, bichos e mares como se os conhecessem em profundidade. O que eles, assim como Huxley, Lawrence, Waugh, têm que Wolff ou Dreiser não têm?
 Lewis percebeu então que o que unia os autores criativos era a não negação do mundo espiritual. Para eles a ruptura entre razão e criatividade nunca se deu COMPLETAMENTE. Eles não dissecavam a criatividade, não extirpavam o maravilhoso da razão, em suma, e para seu espanto de ateu, eles jamais mataram Deus. Podiam blasfemar, duvidar, amaldiçoar, mas não ignoravam Deus. Lewis ficou aterrado ao se deparar com isso. Tendo Deus dentro de seu mundo, autores como Dante e Cervantes conseguiam criar como jorro, eram completamente férteis. Criar para eles não era um problema, era um dom divino, uma herança bendita. Com a morte de Deus a criação começa a ser tomada por algo de herança maldita. Ser criativo se torna uma ilusão, uma doença, um problema e deve assim ser analisado, domesticado ou negado. Como a religião, o homem da razão deve ENTENDER a criatividade a luz da razão e nunca com a colaboração da razão. Criação e razão se divorciam. Dois antagonistas. Toda criação deve ter um porque, um motivo, um símbolo. Nessa aridez a criatividade morre, daí a secura mórbida de tantos autores modernos. Fez-se com o ato criativo aquilo que se fez com o Criador. 
  O resto, que tem surpreendentes semelhanças com meu processo espiritual incompleto, deixo para futuro post.

O SENHOR DOS ANÉIS COMPREENDIDO

   Para os gnósticos a Terra é um campo de batalha. O Mal, presente em toda a matéria, é combatido o tempo todo pelo bem, presente no espírito. Egoísmo, crueldade, desejo de poder, ambição, esses os componentes do mal. Coragem, honra, auto-sacrifício, espírito de grupo, esses são os dons com que se combate esse mal. A Guerra acontece, desde sempre e sem tréguas, na Alma de cada Homem.
   Chesterton, com seus amigos C.S.Lewis e Tolkien, fez parte no começo do século XX do movimento de resgate do cristianismo primitivo, corrente essa que tem muito do gnosticismo herege. Quando assisti pela primeira vez a saga do Anel eu nada sabia. Para mim se tratava apenas de mais um pastiche que misturava Star Wars com Excalibur de John Boorman. Eu não sabia que Excalibur e Star Wars é que derivavam de Tolkien. E que Tolkien fazia tamanho sucesso por intuitivamente ir ao cerne de uma necessidade humana: Transcendência.
   Você pode sentir Transcendência em graus variáveis. A maioria passa pela vida sem repetir mais de uma vez. E a primeira é sempre na infância pré-linguagem. Você pode procurar, inconscientemente, essa sensação em filmes, na visão do cosmos, em música ou numa droga. Em viagens de aventura, no Amor, ou até mesmo no sexo ( talvez a forma mais procurada hoje e uma das mais falíveis ). Saiba que por mais material que essa busca seja, o fundo é sempre o mesmo: Liberação do fluxo da vida, livre fluir das imagens e dos sentimentos do espírito, uso de toda a potencialidade que todos sentimos ter. Sim, a religião sempre se propôs a dar essa transcendência. As Igrejas, são a droga sintética dessa busca. Não há receita, não há regra. Cada um que ache seu caminho. O fim é o mesmo: o Bem.
   A Saga do Anel fala disso. Frodo carrega ( como Cristo ), o Mal do Mundo nas costas. Recebe uma missão não desejada, sofre tentações, dúvidas, quase desiste. Mas ele é Bom. E seus discípulos o ajudam.
   Peter Jackson conseguiu fazer um filme cheio de conteúdo e ao mesmo tempo cheio de ação. É uma saga digna de David Lean. Filosófica e com um senso de beleza maravilhoso. E o principal, a obra atingiu em cheio uma necessidade do público, e quando isso ocorre temos o fenômeno, o filme que consegue atingir crianças, adultos, analfabetos e cultos, homens e mulheres. Para quem busca profundidade em filmes filipinos, dinmarqueses ou mexicanos, eis aqui o cinema pop em alto grau cultural. Há muito mais o que pensar e discutir aqui que em toda a obra daquele geniozinho óbvio e plagiador.
   O mal em nós junta hordas escuras e procura fazer de sombra tudo o que nos é mais caro. Cabe a cada um unir forças e os combater. Creia, a luz existe e ela é aquilo que chamamos de inspiração, fé, criatividade, transcendência.