HERESIA
Estamos em novo século. E como sempre acontece, este irá desmentir o século anterior. O XIX foi aquele das revoluções e dos romances, da ópera e do panfleto, dos soldados e da ferrovia. O XX foi o da velocidade e da imagem, da aldeia global, do cinema e da TV, da moda para todos e não só para a elite, o século da psicanálise e da new age, da mistureba religiosa e do sexo como atividade puramente física. Século do esporte.
Um século não começa em seu ano 1. O XIX durou até 1918 e o XX tem se misturado ao XXI desde 1990. Mas neste ano o novo tempo se afirma de vez. O XX está morto, e morreu tarde.
A história saberá o que é este tempo quando ele houver acabado. Nossa mente só consegue lidar com aquilo que terminou ou que está congelado. Mas eu arrisco alguns palpites.
Tenho um amigo que nasceu em 1999. E o conheço desde 2010. Estava ontem conversando com ele e falávamos de música. Ele é músico e faz faculdade de artes plásticas. É uma das pessoas com quem mais filosofo. Eu falava do tempo. De que para sua geração o tempo tem um significado diferente. Dei um exemplo musical.
Em 1975 o YES lançou um disco chamado Relayer. No rádio tocava Soon, faixa do disco. Em 1976, Relayer estava morto. Se eu não tivesse comprado o disco em 1975, em 1976 não teria mais como o comprar, e assim, não haveria como o escutar. As coisas passavam, voce as pegava enquanto elas nasciam, observava elas se apagarem e desaparecerem. O único modo de o YES continuar vivo era excursionar sem parar e lançar um novo disco todo ano. Sem isso, em dois anos uma banda era completamente esquecida.
Meu amigo me diz que para ele isso é impensável. Ele descobriu o YES em 2011 e escutou todos os discos em uma semana, POR VONTADE PRÓPRIA. Nenhum crítico musical comentou sobre o grupo velho e ultrapassado. Nenhum amigo indicou ou emprestou discos. Ele simplesmente PESQUISOU.
Posso afirmar então que o poder da crítica ACABOU. Os guardas do bom gosto não apitam mais no trânsito dos desejos. Sou expert para falar disso porque fui um escravo do BOM GOSTO.
Em 1975 disco do YES não tinha vez aqui. Nem Aerosmith ou mesmo Black Sabbath. Eu comprava, SEM ESCUTAR ANTES, aquilo que Okky de Souza ou Big Boy indicavam. Depois, em 1977, seguia Zeca e Ana Maria. Eles ouviam. Eles mandavam comprar. Eu obedecia. Todo garoto que se achava antenado fazia isso. PRECISÁVAMOS DE UM INTERMEDIÁRIO ENTRE NÓS E O OBJETO. Meus amigos não pretensiosos se contentavam em consumir o que rolava no rádio. Mas eu e os nerds de então líamos jornais e nos guiávamos pelos críticos. Cinema era igual.
Falo
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