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THE METERS VÃO TE SALVAR!

   Existem coisas que fazem a diferença. Tipo: Com o dvd todo mundo tem acesso a Godard e Renoir. Então o cara vai lá ver A Chinesa e A Cadela. Mas o biscoito mais fino é Jacques Becker e Jean Pierre Melville. No som é a mesma coisa. Neguinho mete um disco do Funkadelic e tá abafando. Mas nem. O top é The Meters.
 É bem legal o cara ouvir Neil Young, Can, The Band ou Sly Stone. Tudo genial. Mas o diferencial é voce conhecer e escutar Gram Parsons, Kevin Ayers, J J Cale, e The Meters.
 Os caras vieram lá de New Orleans e misturaram o voodoo com pimenta, mais piano boogie, jazz de funeral, ritmos caribenhos e deu isso: funky antes da palavra ter sido inventada. James Brown? Vamos combinar assim: Brown fez o funky da cidade, os Neville fizeram o funky da alma vermelha.
 Neville eu disse? Yeah, tudo começou lá nos anos 50 com uns rythm n blues com piano e metais de Aaron Neville. Daí em 66 o irmão Art Neville juntou uns caras e fez The Meters, funky, instrumental, muuuuuito adiante de seu tempo. Bateria alta, de lata, batendo ritmos sampleados for ever. Baixo sinuoso, fodaço, e a guitarra que parece uma bunda rebolando no calor de um verão exagerado. Sangue, suor sem lágrimas. Alegria branquelos, os pretos vieram te salvar!
  Não vou ficar aqui falando de quem eles influenciaram. Eles te influenciaram. E de música não se fala, se pira e se bota pra quebrar. E eles quebram cadeiras e desalinham pescoços.
  Voce tá de olho numa menina que vale a pena estar de olho? Bota um disco deles. As mina pira!

MAX OPHULS/ JASON REITMAN/ GEORGE CUKOR/ JAMES BROWN/ LUC BESSON/ MYRNA LOY/ JEAN RENOIR

   HOMENS, MULHERES E FILHOS de Jason Reitman
É um daqueles dramas que eu chamo de "drama do abat-jour pastel". Tudo filmado no escurinho, em tons pastéis, com as pessoas falando baixinho, com suas caras sem expressão. Tenho uma colega que é mormon. Incrível como a América é marcada por essas religiões da limpeza, do comedimento, da ordem. Tudo se parece com ela, as roupas, as caras, o modo de viver e de reagir. O filme tem cenas de sexo, claro que vestidas, o filme fala de um mundo interligado, claro que superficialmente. E ainda termina com cenas bastante apelativas, digna do pior de Party of Five. Aliás, eu tenho uma teoria de que Party of Five, com seus teens falando baixinho e seus climas pastéis ( e aqui as pessoas chegam a ler no escuro ), é a realização cultural americana mais influente dos últimos 30 anos. Mais que Sopranos, Pulp Fiction ou X Men. A trilha sonora é sonâmbula. Por outro lado, o filme não me cansou, não me entediou e me fez sentir pena daquilo que fazemos com os pobres adolescentes...pobrezinhos. Só que o buraco é bem mais embaixo. Nota 4.
   JAMES BROWN de Tate Taylor
Das biografias que não param de produzir, esta é das menos óbvias. Isso porque se evita a odisséia das drogas e álcool, que estragou a bio de tanta gente. O filme tem uma excelente recriação do Alabama negro da década de 30 e sabe usar as músicas sem exagero. Uma coisa ótima:: as cenas musicais sabem passar a energia do som de James Brown, o cara que mais mudou aquilo que se entende por pop music. Brown trouxe o ritmo para o centro do som e desse modo criou o som de nosso tempo. O filme não é triste, é bem editado e diverte. Legal. Nota 6.
   UM AMOR DE VIZINHA de Rob Reiner com Michael Douglas, Diane Keaton
Deus meu que filme vazio! O planeta está envelhecendo e é isto que oferecem a esse público? A batida história do cara viúvo, ranzinza, que conhece uma maluquinha divorciada e após muitas brigas ficam juntos. God! Isso já era velho em 1970! Tudo bem, nada impede mais um plot batido, desde que bem feito, fresh, vitalizado. Jack Nicholson e a mesma Diane fizeram isso muito bem em 2000. Aqui não! Nota 1.
   AS DUAS FACES DE JANEIRO de Houssein Amini com Viggo Mortensen e Kirsten Dunst.
Em 1960 René Clement fez o filme mais elegante da história do mundo. Com roteiro de Patricia Highsmith, O Sol Por Testemunha, um suspense digno de Hitch, teve a sorte de capturar a Europa em seu momento mais classudo. Era aquele classudo esportivo, leve, fresco, que foi destruído pela onda hippie a partir de 1966. Este filme, também baseado em Highsmith, tenta esse clima classudo todo o tempo. Se passa em 1962, a beira do Mediterrâneo, e os atores se vestem naquele estilo despojado com finésse da época. Mas assim como o suspense vira brutalidade, a elegância vira afetação. Fake ao extremo, mesmo o ótimo Viggo e uma Dunst linda de doer não salvam a gororoba. Fuja! Nota 1.
   3 DIAS PARA MATAR de Luc Besson com Kevin Costner, Amber Head e Connie Nielsen
Quer saber? Bom pacas! Muito bem dirigido em suas cenas de ação, que são poucas, o filme tem trama, tem suspense, surpresas e um Costner na ponta dos cascos. Vale muito a pena! É melhor que um monte de besteiras tratadas como arte só por sua lentidão e pretensão. Nota 7.
  NÚPCIAS DE ESCÂNDALO de George Cukor com Katharine Hepburn, Cary Grant, James Stewart.
A peça de Philip Barry deu dois filmes clássicos, este, o melhor, de 1940, e Alta Sociedade, de 1956. Kate fez a peça em NY e a comprou. O filme salvou sua carreira. Ela faz a mimada socialite prestes a se casar pela segunda vez. Cary, no auge do relax, é seu ex-marido e James Stewart ganhou um Oscar fazendo um repórter que vai cobrir a festa. Sinal dos tempos, um repórter num casamento rico é considerada coisa de extremo mal gosto! O filme é um souflé perfeitamente realizado: leve, gostoso, chic e inesquecível. Os diálogos voam como tiros de açucar e os atores parecem brilhar com papéis que pedem esse brilho. É um filme obrigatório para quem ama a palavra no cinema. A edição do dvd traz um doc sobre Kate que vale muito ser apreciado. Ela foi única! Nota DEZ.
  TOO HOT TO HANDLE de Jack Conway com Clark Gable, Myrna Loy e Walter Pigeon
Hummm....este filme choca um pouco por seu machismo, racismo, e sua defesa do mau caráter "legal". Se voce conseguir relativizar tudo isso terá um agitado filme de sucesso típico do mais pop dos anos 30. Clark é um fotógrafo de jornal que vive usando mentiras para vender suas fotos. Pigeon é seu rival. Myrna Loy é uma milionária que vai a Guiana para procurar o irmão perdido na selva. Clark era na época o modelo do macho sexy. Gary Cooper era mais bonzinho, Cary Grant mais chic, Charles Boyer o romantico, e Clark o homenzão. Dos 4 é hoje o mais ultrapassado. Mas o filme diverte, diverte como um tipo de cartoon absurdo, um pastelão onde tanta coisa acontece que a gente fica até tonto de ver. Nota 6.
   OS SETE SUSPEITOS de Johnathan Lynn com Tim Curry, Madeline Kahn, Christopher Lloyd
Um bando de tipos estranhos são convidados a uma casa. Lá, um por um começam a ser mortos. Vi o filme por causa de Tim Curry, ator que é sempre um show. Ele quase consegue salvar o filme, mas o roteiro, de John Landis, é um desastre! Mesmo o clima soturno é mal realizado. Nota 3.
   BOUDU SALVO DAS ÁGUAS de Jean Renoir com Michel Simon
Ah o sacrifício que a gente fazia pelo cinema....Eu tinha visto este filme numa cópia horrível nos anos 80, na TV. Era um borrão truncado. Aqui está a cópia nova! O filme brilha! É um dos clássicos de Renoir, e como todo filme de Renoir, ele nos desconcerta! Boudu é um vagabundo que cai no Senna. Recolhido por um senhor burguês, ele se mostra um homem irritante. Boudu seria um tipo de homem "foda-se", o cara que não tá nem aí, que não liga para educação ou bons modos. O filme fica assim duro de ver, porque Boudu nos irrita. Ele  mal agradecido, egoísta, sujo, mentiroso, um chato. Mas não sei porque, quando ele termina, e só quando termina, sentimos ter gostado do filme. Estranhamente, parece que pressentimos que havia algo ali. Bom, as cenas de rua são lindas! Renoir mostra a França de 1933, coisa rara então, e essas tomadas nos encantam. É um filme que preciso rever.
   LA RONDE de Max Ophuls com Simone Signoret, Gerard Philipe, Daniel Gelin, Danielle Darrieux, Simone Simon, Fernand Gravey e Jean-Louis Barrault
Lindo, alegre, mágico, encantador. Ophuls dá uma aula de cinema. Como diz PT Anderson no post abaixo, os personagens dão aos atores a possibilidade de atuar, Anderson mostra uma tomada, sem cortes, onde a câmera roda pelo set e deixa a atriz, Darrieux, atuar. Todd Haynes em outro post abaixo fala da beleza dos filmes de Ophuls. Este filme é uma dádiva, um presente, um prazer. Nota DEZ!

O DIA EM QUE JAMES BROWN SALVOU A AMÉRICA

A ROLLING STONE gringa ( não sei se saiu aqui ) conta uma saga que um dia há de virar filme.
Quando em 1968 Martin Luther King foi morto, toda a nação branca esperava pelo pior. Com os Black Panthers armados e todo aquele clima de sexo e anarquia, era certa a guerra civil entre brancos x negros. Foi aí que o milagre aconteceu.
No dia seguinte ao assassinato, James Brown começou a percorrer todas as estradas, a ir à todas as rádios e Tvs pedindo para que seus irmãos não fossem para a guerra. Que continuassem sua missão pela igualdade, mas que não partissem para o confronto ( seriam massacrados ).
I'm Black and I'm Proud começou a tocar direto nos rádios e o pior foi evitado. James Brown, The Godfather of Soul, salvou a barra. O que aconteceria se ele não tivesse corrido pra rua ? Centenas de mortos, toda a luta pelos direitos civis regredindo, ânimos acirrados e líderes maléficos se promovendo.
Não conheço ninguém no pop que tenha feito algo parecido.
Quanto mais eu conheço a história da música, mais eu compreendo o quanto Brown foi gigante.
O cara mandava prender e mandava soltar.

O MAIOR NOME DO POP, ROCK, FUNK, SOUL E ESCAMBAU

Eu sou branco.
E no pop rola muito de identificação. Quando estamos começando a ouvir música, fechamos os olhos e nos imaginamos tocando aquela guitarra e cantando aquela letra. Nos vemos naquele cara. Mas porque estou falando isso? Ora, por mais que a gente não seja racista, acabamos pensando em brancos quando listamos os maiorais. Elvis, Dylan, Lennon, Bowie, Lou, Jagger.... E até quando falamos de grandes vozes esquecemos que antes de Van Morrison ou Bruce, existem 50 vozes negras beeeem melhores.
Leio um artigo de Peter Shapiro sobre o maior gênio da história do pop.
" Pop music não é voz, pop music é som. Desde quando Little Richard fez o piano soar como bateria, desde quando Elvis fez o country soar como uma banda de blues, quando o Velvet Undeground fez o rock soar como uma máquina repetidora ou o Kraftwerk deu ao pop a frieza de um programa matemático.
Mas ninguém mudou, criou, avançou e foi tão influente quanto James Brown. Ele é o cara que jogou a melodia no lixo e fez com que tudo ( guitarra, teclado, sax e trompete ) existisse em favor do ritmo. Brown cria o som de hoje, do futuro, de sempre. Dá à cultura negra orgulho de ser dona do ritmo, cria a primazia do som black, muda para sempre TODO o som pop. Faz do baixo e da bateria o centro, mostra que tudo é beat, groove, e no palco, inventa sózinho a performance, a dança desenfreada, o performer. Mick Jagger seria seu primeiro imitador, mas todo performer razoável tentaria o imitar. James Brown é o inventor do agora.
Ritmo como repetição sem fim, cadência que hipnotiza e leva ao transe. Brown já fazia som para raves em 1967. E tudo é fisico em seu som. Ele existe para mover, para fazer suar. E traz todo o DNA do rap. Em 1967 James Brown cria a batida de bateria do rap, e mais que isso, a batida que se escuta em Beck, em Stone Roses, em Happy Mondays, nos Chili Peppers, em Franz Ferdinand, em Beyoncé e Madonna, em Blur, em Prince, em tudo o que não é folk. Som pop sem funky beat, como faziam Beatles, Beach Boys ou Byrds, nunca mais.
A primazia da batida se torna o mandamento número um do pop. Primeiro o groove, depois a melodia ( se houver ). Tudo feito desde James Brown que não englobe influência de Brown se parece com saudosismo, fica branquelo demais, europeu em seu pior sentido. Azedo. Sem fire e passion.
Tudo que tenta ser novo bebe em fonte Sex Machine, I Feel Good, Papa Got ou Cold Sweat. Baixo que domina e leva adiante, bateria que repete a batida sem parar, guitarra que é arranhada e repercute como um bumbo, e a voz que é ritmo também. Música que repete o transe da aldeia africana, que vai ao âmago do espírito, que libera e liberta, que é transe.
E sobre o palco O Cara rebola, geme, grita, pula, salta, seduz e se exibe sem culpa. E tome Good God!, e tome AAAAAAh Yooooooou! e tome Get Up!!!!
Perto de James Brown, mestre criador do funk, do beat, do rap, do r and b, tudo empalidece. Tudo fica em seu morno lá lá lá lá ou yeah yeah yeah yeah. Enquanto o negão, father of soul, the godfather,manda seu OOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOH !
Eis o number one.