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SÍLVIA - GÉRARD DE NERVAL
Nascido no começo do século XIX e morto em 1848, Nerval simboliza como poucos o romantismo francês. E assim, ele viveu e morreu como romântico autêntico, louco e suicida. Sim, pois não há como ser romântico autêntico no mundo prático e real. Puro idealista, o romântico nega a realidade todo o tempo e vê seu Ego em tudo ao seu redor. Movimento que eu particularmente abomino, fui um romântico aos 15 anos, sei do que falo, meu romantismo era completo e exarcebado, esses partidários do Eu criaram tudo de mais abominável que existiu no século XX: o socialismo, o comunismo, o nazismo, o fascismo, o culto a celebridade, a contra cultura, todos movimentos baseados no idealismo, no compromisso com uma ideia mesmo que ela negue toda a prática. É no romantismo, graças a Rousseau, que a criança e o selvagem passa a ser vistos como seres sagrados, uma idiotice que pegou nas massas porque faz de qualquer idiota irracional um Ser Puro. ---------------- Era preciso estudo, trabalho e força para ser um Ser Superior no mundo clássico. Com o romantismo basta ser infantil ou selvagem. Weeeeellll.... voltando a Nerval, este livrinho simples, mal escrito, pobre, e por isso "puro", fala de um jovem que ama duas mulheres, uma atriz e uma moça do povo. No fim, claro, ele fica sem nenhuma e sentimos que ele amava apenas ele mesmo. Como bom romântico, nada existe no livro a não ser o narrador, personagens, paisagens, tudo existe como acessório ao grande narrador, o Ser Superior que sente mais que eu ou voce. Uma bobagem típica de adolescentes mas que em 1830, na França, passava por heroísmo. O narrador é bem bobinho, nada faz de excepcional, nada diz que pareça inteligente, mas sente, deus como ele sente! ---------------- Devo dizer que o romantismo alemão era bem menos tolo pois era místico, mais medieval e na Inglaterra ele tinha enredos melhores, pois era feito para as massas. Na França ele se tornou ARTE com A imensamente grande, esnobe, orgulhoso, sem qualquer compromisso com a realidade. Se imaginarmos que Balzac era contemporaneo de Nerval tomamos um susto. Balzac já antecipa o realismo com suas cifras, contas, lucros e perdas, jornais e fábricas. Nerval é 100% sentimentos, matas e luares. Um narcisista radical.
OS ANOS DE APRENDIZAGEM DE WILHELM MEISTER - GOETHE. o enorme egoísta.
A coisa já começa em tom alto: em suas primeira linhas o romance apresenta uma cena emocional. Escrito nos últimos anos do século XVIII, apogeu do romantismo alemão, fez-me lembrar Beethoven: o autor entrega tudo de cara. Exaltação plena. O EGO se afirmando contra seu meio social. Dois gigantes: Goethe e Beethoven. E Kant também. A Alemanha de 1795 é um dos auges máximos da civilização. ------------ Acompanhamos a vida de WIlhelm, filho de pais ricos que se revolta contra o mundo burguês e tem um amor incontido pelo teatro. Ele ama. Ele erra. Ele vive. São 600 páginas de diálogos ricos porém artificiais. Goethe está sempre propagando teses. Por isso está hoje, em 2021, tão fora de moda. Ele não tem vergonha. Goethe tem a certeza de ser um gênio. E nos ensina a o admirar por isso. O que o salva é sua nobreza espiritual. É generoso, reparte conosco o que sabe. Sua sabedoria máxima é sua vontade de saber. Meister é um estudante eterno. -------------------- A edição que li, boa tradução, é da editora Itatiaia, 1994. Uma editora marxista. O livro tem uma crítica de Georges Lukacs sobre o romance de Goethe. E em seu catálogo há até mesmo uma obra, de um húngaro, que defende a necessidade da censura. O que vou falar agora é tão óbvio que passou despercebido por mim mesmo. Minha vida foi a mesma de Meister. ------------------ Poluído por romances e filmes "romanticos", aos 15 anos eu rompi com minhas raízes "burguesas". Meu pai era odiável e eu queria o chocar. Isso era tudo. Meu ego era especial. Eu merecia uma vida original. O burguês queria me oprimir, me fazer incolor. FIM. ----------------- O romance de Goethe é basicamente isso. O que o salva é ser um dos primeiros a advogar tal causa. Depois o próprio Goethe faria críticas àquilo que ele acreditava em 1795. O romantismo foi o primeiro sinal da adolescência do mundo ocidental. Foi como se de repente todos percebessem que ser jovem era condição superior. Fato: isso aconteceu apenas após o industrialismo. A pressa e a feiúra do mundo da fábrica deu aos jovens ansias de fuga. Fugiram para dentro de si mesmos. Criaram a ideia de que eram mais sensíveis que seus pais. ------------- Todo esse momento é perverso. Meister odeia quem o sustenta. Sem o dinheiro de seu pai ele não seria livre para odiar sua família. Enquanto romanticos de toda a Europa se embriagam de vinho, burgueses odiosos fabricam as garrafas e as uvas que eles consomem. Eu adoraria ler este livro sob o ponto de vista do pai de Meister. Ao envelhecer pensamos essas coisas. Goethe sentiu isso ao envelhecer: jovens são egoístas. Odeiam todos que lhes recordam a realidade da vida. Então nós lemos um romance que deveria ter um heroi romantico em seu centro, mas que hoje nos desperta certa aversão sem compaixão. Meister é um idiota mimado. Ele ama as mulheres amando o amor que sente. É incapaz de conhecer qualquer uma delas. Ler Meister em 2021 é ler um fracasso. O romantismo nos deu maravilhas como os poemas de Wordsworth e Keats, ou as obras de Liszt e Chopin, mas é basicamente um movimento infantil. Lambem-se egos feridos. Eis tudo. --------------------- Os nomes que citei, como Goethe, são romanticos que mantiveram um pé ou pé e meio no classicismo. Que não se permitiram corroer pela auto piedade. O Goethe do Werther é insuportável de tão tolo, e o de Meister contém, felizmente, o germe da condenação do romantismo. Vale ler? Sim. Mas não o leve tão a sério.
O QUE A ESQUERDA É
Eu gostaria de escrever sobre a política brasileira mas não há o que dizer sobre. Então me veio uma constatação: desde pelo menos os anos 80, mundialmente, as pessoas que mais se interessam e discutem política vivem em um mundo que morreu faz muito tempo.
Elas ainda acreditam que ideologia define o mundo, quando na verdade, ideologia define apenas um molde, uma forma de adaptar e formatar seus pensamentos. Ideologia hoje é uma ferramenta. Um ícone que dá uma guia para seus textos. E seus pensamentos. Quase uma gravata que enfeita seu visual. Apenas perfume.
Na velha política, ideologia era economia. E, como dizem os marxistas, dinheiro é vida.
Então posso falar de governos como Trump ou Bolsonaro. Como ensinou Thatcher, em um tempo em que não havia internet, ou seja, Maggie não foi blindada por seus seguidores, o que define um governo são índices financeiros. Se o presidente falou mal de Cuba ou não comemora o dia do nascimento de Stalin, isso só importa à classe média festiva que posa de filósofo cabeça. Política é, desde pelo menos 1981, economia. E nesse mundo hiper realista, gente de esquerda tende a durar dois verões e viver apenas da propaganda de seus pares. Por definição, o povo de humanas nada entende de economia e se orgulha de não saber fazer contas. O que resta à eles, em politica, é fazer barulho. À direita sobra o dinheiro, ou seja, o que interessa.
Administração e economia se complicaram muito. A velha tese, que a Argentina vai implantar mais uma vez, de que tudo se resolve com mais impostos e salário mínimo maior, se mostrou simplório. É o tipo do cálculo de quem estudou sociologia ou letras. E como são apenas criadores de narrativas, quando tudo dá errado e dará, inventam uma lenda do porque tudo não deu certo. É o que a esquerda tem feito: gastar o dinheiro feito pela direita. Quando a grana acaba, volta a direita para botar as contas em dia.
Cada vez mais a esquerda parece ser aquilo que talvez, desde o movimento romântico, em 1810, ela sempre foi : Meninos mimados em revolta contra o papai burguês. Eles querem quebrar a cristaleira. Fumar sua maconha. E poder transar com quem quiser. Ou com o que quiser. E por favor, vamos socializar essa mesada!
Elas ainda acreditam que ideologia define o mundo, quando na verdade, ideologia define apenas um molde, uma forma de adaptar e formatar seus pensamentos. Ideologia hoje é uma ferramenta. Um ícone que dá uma guia para seus textos. E seus pensamentos. Quase uma gravata que enfeita seu visual. Apenas perfume.
Na velha política, ideologia era economia. E, como dizem os marxistas, dinheiro é vida.
Então posso falar de governos como Trump ou Bolsonaro. Como ensinou Thatcher, em um tempo em que não havia internet, ou seja, Maggie não foi blindada por seus seguidores, o que define um governo são índices financeiros. Se o presidente falou mal de Cuba ou não comemora o dia do nascimento de Stalin, isso só importa à classe média festiva que posa de filósofo cabeça. Política é, desde pelo menos 1981, economia. E nesse mundo hiper realista, gente de esquerda tende a durar dois verões e viver apenas da propaganda de seus pares. Por definição, o povo de humanas nada entende de economia e se orgulha de não saber fazer contas. O que resta à eles, em politica, é fazer barulho. À direita sobra o dinheiro, ou seja, o que interessa.
Administração e economia se complicaram muito. A velha tese, que a Argentina vai implantar mais uma vez, de que tudo se resolve com mais impostos e salário mínimo maior, se mostrou simplório. É o tipo do cálculo de quem estudou sociologia ou letras. E como são apenas criadores de narrativas, quando tudo dá errado e dará, inventam uma lenda do porque tudo não deu certo. É o que a esquerda tem feito: gastar o dinheiro feito pela direita. Quando a grana acaba, volta a direita para botar as contas em dia.
Cada vez mais a esquerda parece ser aquilo que talvez, desde o movimento romântico, em 1810, ela sempre foi : Meninos mimados em revolta contra o papai burguês. Eles querem quebrar a cristaleira. Fumar sua maconha. E poder transar com quem quiser. Ou com o que quiser. E por favor, vamos socializar essa mesada!
ASSEXUADOS
Mais difícil que aceitar um homossexual ou um pansexual hoje, é aceitar um assexuado. Posso já ver um freudiano ou um sociólogo a dizer que eles são doentes, reprimidos, seres aleijados. Exatamente como os gays eram vistos antigamente. Importante é entender o que eles são e porque tentam se afirmar como tal.
Conheço bem essa turma. Minha adolescência foi bastante tímida. Não sei se fui um assexuado de vanguarda, um dos primeiros, lá por 1978. Eu comprava revistas eróticas, via filmes de nudez, amava olhar mulheres na praia. Mas ao mesmo tempo eu detestava as baladas com meus amigos. Eles só pensavam em sexo, em putas, em comer alguém; e tudo o que eu queria era encontrar um "grande amor". Até hoje isso me incomoda. Me sinto pressionado a ter sexo, a valorizar a vida sexual, a praticar, a desejar, a ser um homem com várias parceiras. O problema é que detesto a palavra parceira. Odeio a parceria. Fico então num meio termo: nem assumidamente romântico, nem um comedor.
Pela reportagem que leio, inglesa, claro, homens e mulheres assexuados têm vida sexual, até transam, mas nunca sentem ser essa a prioridade. O que eles querem é carinho, abraço, conversa, sair e viajar, companheirismo. O sexo é visto como ok, mas nada de sublime. Há neles uma saudade da era do romantismo, do platonismo, da vida espiritual. Não são religiosos, quase todos são ateus, mas sentem falta do entendimento entre almas, seja isso o que for. Acima de tudo eles fogem da hiper-sexualidade do mundo moderno. E por isso penso que eles têm um poder enorme de incomodar, de sofrer chacota, de não ser aceito.
Minha primeira reação é pensar que são todos gays não assumidos.
Sexo é divertido. Mas está longe de ser uma coisa central na existência. Pode estar nascendo aí uma bem vinda clareza.
Conheço bem essa turma. Minha adolescência foi bastante tímida. Não sei se fui um assexuado de vanguarda, um dos primeiros, lá por 1978. Eu comprava revistas eróticas, via filmes de nudez, amava olhar mulheres na praia. Mas ao mesmo tempo eu detestava as baladas com meus amigos. Eles só pensavam em sexo, em putas, em comer alguém; e tudo o que eu queria era encontrar um "grande amor". Até hoje isso me incomoda. Me sinto pressionado a ter sexo, a valorizar a vida sexual, a praticar, a desejar, a ser um homem com várias parceiras. O problema é que detesto a palavra parceira. Odeio a parceria. Fico então num meio termo: nem assumidamente romântico, nem um comedor.
Pela reportagem que leio, inglesa, claro, homens e mulheres assexuados têm vida sexual, até transam, mas nunca sentem ser essa a prioridade. O que eles querem é carinho, abraço, conversa, sair e viajar, companheirismo. O sexo é visto como ok, mas nada de sublime. Há neles uma saudade da era do romantismo, do platonismo, da vida espiritual. Não são religiosos, quase todos são ateus, mas sentem falta do entendimento entre almas, seja isso o que for. Acima de tudo eles fogem da hiper-sexualidade do mundo moderno. E por isso penso que eles têm um poder enorme de incomodar, de sofrer chacota, de não ser aceito.
Minha primeira reação é pensar que são todos gays não assumidos.
Sexo é divertido. Mas está longe de ser uma coisa central na existência. Pode estar nascendo aí uma bem vinda clareza.
EMILY BRONTE NASCEU HOJE.
Emily Bronte nasceu hoje. E isso significa muito. Com ela se cristaliza todo o espírito gótico. Sim, existem fantasmas. Acho que foi Huxley quem disse isso. Que hoje os chamamos de intuição, inspiração, pressentimento, é a mesma coisa. Nas sombras noturnas moram sensações. Só aquele com espírito de concreto não percebe.
Conheço algumas jovens irmãs Bronte. Elas fazem parte da irmandade sem o saber. Não importa que não saibam, elas mantém a coisa viva neste mundo. Sua alma é povoada de pó, de medos, de desejos irrealizáveis, de lembranças, de coisas escuras e úmidas.
Heathcliff viu a face de Catherine na janela. E lá fora havia lama, chuva, rochas e árvores doentes. Ele berrou por ela na janela quebrada. Ele rasgou suas mãos no vidro. Ele a queria. Tudo nele era desejo e tudo nele ansiava pelo vazio. É um romance perigoso. Você pode morrer ou enlouquecer com ele.
Eu adoraria ver o túmulo de Emily. E deixar lá uma flor e uma fotografia. A flor vermelha e a foto não sei do que. Eu adoraria saber que Emily é feliz. Do modo dela. Em outro mundo.
O espírito de Whutering Heights ( O Morro dos Ventos Uivantes ) se mantém de pé em centenas de manifestações artísticas deste século. Nos filmes góticos. Nos discos tristes. Nas roupas pretas e roxas. Nos versos desesperançados. Porque Heathcliff a perdeu duas vezes: Por ser de outra raça, e depois por ser vivo.
Kate Bush, que ironia, faz aniversário no mesmo dia que ela.
E as duas são de leão. Esse signo que é vida e sol, e ao mesmo tempo chora por saber que o ideal é fora deste mundo. O amor respira onde nunca se está.
Emily, como suas irmãs, Charlotte e Anne, foi levada cedo pela tuberculose. Beleza é que ela viva para sempre pelas palavras que deixou. Que ela tenha enfeitiçado um menino que a leu aos 14 anos dentro de um quarto vazio. Ele sonhou com uma Catherine. E assumiu sua condição de Heathcliff. Morte e vida como uma coisa só. Um fio sem ponto, uma corrente de elos sem fim.
Conheço algumas jovens irmãs Bronte. Elas fazem parte da irmandade sem o saber. Não importa que não saibam, elas mantém a coisa viva neste mundo. Sua alma é povoada de pó, de medos, de desejos irrealizáveis, de lembranças, de coisas escuras e úmidas.
Heathcliff viu a face de Catherine na janela. E lá fora havia lama, chuva, rochas e árvores doentes. Ele berrou por ela na janela quebrada. Ele rasgou suas mãos no vidro. Ele a queria. Tudo nele era desejo e tudo nele ansiava pelo vazio. É um romance perigoso. Você pode morrer ou enlouquecer com ele.
Eu adoraria ver o túmulo de Emily. E deixar lá uma flor e uma fotografia. A flor vermelha e a foto não sei do que. Eu adoraria saber que Emily é feliz. Do modo dela. Em outro mundo.
O espírito de Whutering Heights ( O Morro dos Ventos Uivantes ) se mantém de pé em centenas de manifestações artísticas deste século. Nos filmes góticos. Nos discos tristes. Nas roupas pretas e roxas. Nos versos desesperançados. Porque Heathcliff a perdeu duas vezes: Por ser de outra raça, e depois por ser vivo.
Kate Bush, que ironia, faz aniversário no mesmo dia que ela.
E as duas são de leão. Esse signo que é vida e sol, e ao mesmo tempo chora por saber que o ideal é fora deste mundo. O amor respira onde nunca se está.
Emily, como suas irmãs, Charlotte e Anne, foi levada cedo pela tuberculose. Beleza é que ela viva para sempre pelas palavras que deixou. Que ela tenha enfeitiçado um menino que a leu aos 14 anos dentro de um quarto vazio. Ele sonhou com uma Catherine. E assumiu sua condição de Heathcliff. Morte e vida como uma coisa só. Um fio sem ponto, uma corrente de elos sem fim.
EU
Depois do romantismo, já mais de duzentos anos, não conseguimos mais ver o mundo com isenção. Temos de marcar nosso eu em tudo. É até difícil tentar entender que até os românticos falar do eu era sinal de falta de imaginação. A sinceridade em arte era deselegante e falta de espírito. Ninguém queria ser sincero ou original. A ambição era fazer melhor aquilo que todos faziam. Seguir uma tradição, e dentro dela ser o mais perfeito.
Era assim que pensava Shakespeare, Cervantes, Racine ou Voltaire. Bach, Mozart e Haydn. Fazer o melhor. Refazer com genialidade. Copiar e aperfeiçoar.
Com Beethoven, Byron, Poe, Hugo, surge o desejo de ser Único. Sinceridade e originalidade, expressar um Eu Único. Ser diferente de todos.
Desde então passou a ser elogio dizer que um artista fala a verdade, ou que ele faz algo que ninguém mais faz.
Mas vive ao lado desse impulso o espirito clássico. O fazer bem feito, o não confessional, a habilidade, a preferência pela forma.
Li no site musical uma critica antiga sobre Paul. Lá se diz que Lennon pode errar, mas ele é sincero. Paul mente, inventa, é apenas um fazedor de canções.
Essa é a mais romântica das criticas. A sinceridade como valor artístico confunde moral com estética. E o dom do belo perde valor se não for vivido e portanto, sincero.
Neste século as coisas mudaram. Sinto que o valor do bem feito, do técnico, do aparente perfeito, aumentou. Mas seremos sempre românticos. Assinaremos nosso nome em tudo. O eu estará como marca principal. Deus se foi, o Eu veio tomar seu posto. E é para ele que trabalhamos. Eu.
Era assim que pensava Shakespeare, Cervantes, Racine ou Voltaire. Bach, Mozart e Haydn. Fazer o melhor. Refazer com genialidade. Copiar e aperfeiçoar.
Com Beethoven, Byron, Poe, Hugo, surge o desejo de ser Único. Sinceridade e originalidade, expressar um Eu Único. Ser diferente de todos.
Desde então passou a ser elogio dizer que um artista fala a verdade, ou que ele faz algo que ninguém mais faz.
Mas vive ao lado desse impulso o espirito clássico. O fazer bem feito, o não confessional, a habilidade, a preferência pela forma.
Li no site musical uma critica antiga sobre Paul. Lá se diz que Lennon pode errar, mas ele é sincero. Paul mente, inventa, é apenas um fazedor de canções.
Essa é a mais romântica das criticas. A sinceridade como valor artístico confunde moral com estética. E o dom do belo perde valor se não for vivido e portanto, sincero.
Neste século as coisas mudaram. Sinto que o valor do bem feito, do técnico, do aparente perfeito, aumentou. Mas seremos sempre românticos. Assinaremos nosso nome em tudo. O eu estará como marca principal. Deus se foi, o Eu veio tomar seu posto. E é para ele que trabalhamos. Eu.
EUGÊNIO ONEGUIN- PUSHKIN
Existem livros que lemos no momento exato. Falam diretamente ao momento que vivemos então. Eu não sei porque, entre tantas opções, resolvi reler este livro. Pushkin é o maior poeta russo. Um romântico típico, mas um romântico que conseguiu sobreviver em nossos tempos cínicos. Porque Pushkin é um gênio, e o gênio sobrevive a modas.
Dostoievski o adorava. Nabokov o ama. E se Nabokov ama alguma coisa essa coisa merece muita atenção.
Li esta obra-prima pela primeira vez dois anos atrás, apenas. Gostei, mas senti que aquele não era seu momento. Este é. A névoa do poema, do romance, da narração cai sobre mim. Romantismo. Belo romantismo. Todas as características do melhor romantismo estão presentes. O spleen. Os personagens sofrem de tédio. Vivem sem interesses, isolados, presos de uma sensação de que nada vale a pena. Indiferentes. Ao mesmo tempo há um amor sublime à natureza. Descrições apaixonadas de estações do ano, de bosques, de céus. Um agudo senso de psicologia. A alma das pessoas se desnuda. E, súbito, o amor surge e é feita a escolha, esse amor será frustrado.
No deserto que é a vida, Eugênio, um seguidor de Byron, mata em duelo seu único amigo. E depois se apaixona pela menina que antes recusara. O final, seco e abrupto, é magistral.
O estilo de Pushkin é simples. Um poema em rimas que é um romance. Pois o poeta não escreve poesia, ele narra uma história. Lemos em seu ritmo, rápido, musical, leve, vibrante. Um soberbo prazer nos invade. Parece que estamos nas estepes russas, sentimos a luz, vivemos a vida dos personagens.
Se voce está in love, eis seu livro.
Dostoievski o adorava. Nabokov o ama. E se Nabokov ama alguma coisa essa coisa merece muita atenção.
Li esta obra-prima pela primeira vez dois anos atrás, apenas. Gostei, mas senti que aquele não era seu momento. Este é. A névoa do poema, do romance, da narração cai sobre mim. Romantismo. Belo romantismo. Todas as características do melhor romantismo estão presentes. O spleen. Os personagens sofrem de tédio. Vivem sem interesses, isolados, presos de uma sensação de que nada vale a pena. Indiferentes. Ao mesmo tempo há um amor sublime à natureza. Descrições apaixonadas de estações do ano, de bosques, de céus. Um agudo senso de psicologia. A alma das pessoas se desnuda. E, súbito, o amor surge e é feita a escolha, esse amor será frustrado.
No deserto que é a vida, Eugênio, um seguidor de Byron, mata em duelo seu único amigo. E depois se apaixona pela menina que antes recusara. O final, seco e abrupto, é magistral.
O estilo de Pushkin é simples. Um poema em rimas que é um romance. Pois o poeta não escreve poesia, ele narra uma história. Lemos em seu ritmo, rápido, musical, leve, vibrante. Um soberbo prazer nos invade. Parece que estamos nas estepes russas, sentimos a luz, vivemos a vida dos personagens.
Se voce está in love, eis seu livro.
FEITIÇO DE AMOR E OUTROS CONTOS- LUDWIG TIECK
Tudo aquilo que aprendi sobre o que seja o romantismo aqui se encontra em sua primeira e mais explícita versão. O maravilhoso da criação, o inusitado tratado como corriqueiro e a irrupção do sublime. Medo e desejo, morte e amor, essa a receita.
Phantasus foi lançado em 1810. Este volume que tenho em mãos traz uma parte de Phantasus. Sete contos em que o fanta'stico surge em toda folha. Foi quando de seu lancamento um grande sucesso. Tieck tornou-se mais popular que Goethe e influi em todo o movimento artistico da Alemanha. Amigo de Schlegel, Novalis e Brentano, sua longa vida foi sempre a busca do surpreendente. Vamos aos contos.
O Loiro Eckbert da' o tom. A solita'ria vida nos bosques, a sina maldita, a vida que vira sonho, e o sonho pesadelo. A montanha como obsta'culo a ser vencido. Assustador, o livro e' para invernos gelados.
A Montanha das Runas da' muito medo. E muito prazer. Ler Tieck nos faz reencontrar o prazer da narrativa. Ele escreve como um avo contando coisas ao canto do fogo da lareira.
Os Elfos e' meu favorito. O fatalismo cruel da humanidade, o azar, o desconhecimento. Mais que tudo, este conto magistral adverte o castigo advindo da indiferenca a natureza, do negar nossa parte bicho, nossa parte irracional. Uma obra-prima.
Feitico de Amor entre todos o mais triste. Melancolia e loucura. Tieck descreve o que hoje seria um caso de mania depressiva. Aqui se faz magia. Para ler como delirio.
O Ca'lice e' o mais belo. E o u'nico com final realmente feliz.
Termina o volume com Eckart Fiel, sonho medieval de virilidade.
Lemos como quem sonha e o fato destes contos terem sido em 1810 aquilo que hoje seria um best-seller, serve para testemunhar o bom ni'vel do primeiro romantismo. ( Mas vale dizer, o romantismo tardio seria uma fonte do pior dos piores ).
Hedra Editora, facil de achar, compre e leia nas suas noites de melancolia.
Phantasus foi lançado em 1810. Este volume que tenho em mãos traz uma parte de Phantasus. Sete contos em que o fanta'stico surge em toda folha. Foi quando de seu lancamento um grande sucesso. Tieck tornou-se mais popular que Goethe e influi em todo o movimento artistico da Alemanha. Amigo de Schlegel, Novalis e Brentano, sua longa vida foi sempre a busca do surpreendente. Vamos aos contos.
O Loiro Eckbert da' o tom. A solita'ria vida nos bosques, a sina maldita, a vida que vira sonho, e o sonho pesadelo. A montanha como obsta'culo a ser vencido. Assustador, o livro e' para invernos gelados.
A Montanha das Runas da' muito medo. E muito prazer. Ler Tieck nos faz reencontrar o prazer da narrativa. Ele escreve como um avo contando coisas ao canto do fogo da lareira.
Os Elfos e' meu favorito. O fatalismo cruel da humanidade, o azar, o desconhecimento. Mais que tudo, este conto magistral adverte o castigo advindo da indiferenca a natureza, do negar nossa parte bicho, nossa parte irracional. Uma obra-prima.
Feitico de Amor entre todos o mais triste. Melancolia e loucura. Tieck descreve o que hoje seria um caso de mania depressiva. Aqui se faz magia. Para ler como delirio.
O Ca'lice e' o mais belo. E o u'nico com final realmente feliz.
Termina o volume com Eckart Fiel, sonho medieval de virilidade.
Lemos como quem sonha e o fato destes contos terem sido em 1810 aquilo que hoje seria um best-seller, serve para testemunhar o bom ni'vel do primeiro romantismo. ( Mas vale dizer, o romantismo tardio seria uma fonte do pior dos piores ).
Hedra Editora, facil de achar, compre e leia nas suas noites de melancolia.
UMA LINDA HISTÓRIA DE UMA BANDA MUITO ESPECIAL
A vida toda estive atrás de uma menina, ela não tem rosto, não tem nome e nenhum número...Ela está dentro de mim...
Esse o mote de "No Face, No Name, No Number", faixa do primeiro disco do Traffic, 1967. Todo o romantismo inglês explicitado na mais romântica das bandas do lado de lá do Atlântico. Caramba! Como pode isso! Entre She Loves You e o Traffic se passaram apenas quatro anos??? Parecem décadas!
Em 1966 uma banda chamada Spencer Davis Group estourou com duas canções número 1 nas paradas: I Am A Man e depois Gimme Some Lovin'. No vocal um garoto de 16 anos, Steve Winwood. Começaram a dizer que era o novo Ray Charles ( NÂO ). Se os EUA tinham Little Stevie Wonder, a GB tinha Little Steve Winwood.
Porém, com 16 anos, Steve já era aquilo que é até hoje, a reencarnação de Wordsworth. Ficou puto por ter virado Pop e se mandou para o campo com uns amigos pouco mais velhos. Lá, em Yorkshire, cercados de vários chás, ácido e muita erva, formaram uma banda de "boas vibrações". Nascia o Traffic.
Boas energias...inexiste agressividade no Traffic. E abundam erros técnicos. Steve é um grande músico e um hiper cantor. Sabe tocar guitarra, teclados, baixo e bateria. Já gravou discos em que ele toca tudo. E Dave Mason, guitarrista do Traffic era excelente. Mas Chris Wood e Jim Capaldi só ficaram no grupo por serem brothers e terem alto astral. Chris era um desastre no sax, flauta e teclados e Capaldi acabou por desistir da batera e virar um surpreendente bom cantor. Well....continuando...
Chapados e fixados em símbolos celtas, yoga e astrologia, os quatro assinaram com uma nova e pequena gravadora, a Island. E gravaram um single e um LP. Na produção botaram outro novato, Jimmy Miller. O que rolou? Mais sucesso inesperado!
Chris Blackwell, dono da Island, acabou sendo o poderoso descobridor de Bob Marley e lançador do Roxy Music, do King Crimson e do ELP. Depois seria a casa do U2. Jimmy Miller fez tanto sucesso como produtor dos três primeiros Lps do Traffic que os Rolling Stones logo o chamaram e roubaram Milller de Winwood. Com Jimmy Milller os Stones gravariam TODOS os seus discos entre 1968 e 1974, ou seja, seus melhores trabalhos. Mas porque Miller fez tanto sucesso como produtor?
Tenho esses três Lps em vinil e em CD. Tente ouvir em vinil e please, não baixe. Os dois primeiros LPs do Traffic são considerados até hoje uma obra-prima em termos de som estereofônico. São feitos para se escutar com fone de ouvido. Experimente. Os instrumentos ficam o tempo todo dançando entre a direita e a esquerda. Sons aparecem no ouvido esquerdo, voam para o direito e voltam. Ruídos aqui e não lá, lá e não aqui. Um grito aqui. Um solo que vai para lá. É um som espacial, ele anda, caminha dentro da cabeça de quem escuta. É uma arte perdida.
Steve Winwood é uma pessoa amável. Calma. De sorriso suave. Gravou com TODO mundo. Era amigo de todo mundo. Posso lembrar agora de Eric Clapton, Jimmy Hendrix, Marianne Faithfull, George Harrison, Pete Townshend, e vasto etc. Todos tiveram banda ou gravaram com ele. O Traffic acabou em 1970, voltou em 1971 e voltou a terminar em 1974. Daí a carreira solo. Com 24 anos em 1974, Steve Winwood já tinha quatro bandas de sucesso nas costas e um monte de trips para contar.
Jim Capaldi mora a trinta anos no Rio. Gravou até com Ritchie. Lança disco em Londres de vez em quando. É maluco pelo Arpoador e pelas mulheres do Brasil. Chris Wood morreu nos anos 80. Dave Mason tentou carreira solo e virou requisitado guitarrista. Seu mais famoso trabalho é no Beggar's Banquet dos Stones. Sim. Algumas daquelas guitarras de aço são dele. E Steve Winwood enveredou pelo Pop. Como ocorreu com tanto ex-maludo hippie, ele assumiu que seu amor maior sempre foi a soul music de Marvin Gaye e de Sam Cooke e foi por essa senda.
Acabo de reouvir pela milionésima vez o Best Of do Traffic. Tenho esse vinil desde 1979. É um disco perigoso. Há algo de muito escuro nele, de muito onírico e voce pode se perder dentro dele e não voltar nunca mais. Pior, pode não querer voltar. É bonito.
PS: Postei esse video de Glastonbury em 1971. Jim Capaldi é aquele com o pandeiro no microfone. Winwood está ao teclado, cantando. O show é absolutamente dionisíaco. Enjoy. Voce merece isso!
Esse o mote de "No Face, No Name, No Number", faixa do primeiro disco do Traffic, 1967. Todo o romantismo inglês explicitado na mais romântica das bandas do lado de lá do Atlântico. Caramba! Como pode isso! Entre She Loves You e o Traffic se passaram apenas quatro anos??? Parecem décadas!
Em 1966 uma banda chamada Spencer Davis Group estourou com duas canções número 1 nas paradas: I Am A Man e depois Gimme Some Lovin'. No vocal um garoto de 16 anos, Steve Winwood. Começaram a dizer que era o novo Ray Charles ( NÂO ). Se os EUA tinham Little Stevie Wonder, a GB tinha Little Steve Winwood.
Porém, com 16 anos, Steve já era aquilo que é até hoje, a reencarnação de Wordsworth. Ficou puto por ter virado Pop e se mandou para o campo com uns amigos pouco mais velhos. Lá, em Yorkshire, cercados de vários chás, ácido e muita erva, formaram uma banda de "boas vibrações". Nascia o Traffic.
Boas energias...inexiste agressividade no Traffic. E abundam erros técnicos. Steve é um grande músico e um hiper cantor. Sabe tocar guitarra, teclados, baixo e bateria. Já gravou discos em que ele toca tudo. E Dave Mason, guitarrista do Traffic era excelente. Mas Chris Wood e Jim Capaldi só ficaram no grupo por serem brothers e terem alto astral. Chris era um desastre no sax, flauta e teclados e Capaldi acabou por desistir da batera e virar um surpreendente bom cantor. Well....continuando...
Chapados e fixados em símbolos celtas, yoga e astrologia, os quatro assinaram com uma nova e pequena gravadora, a Island. E gravaram um single e um LP. Na produção botaram outro novato, Jimmy Miller. O que rolou? Mais sucesso inesperado!
Chris Blackwell, dono da Island, acabou sendo o poderoso descobridor de Bob Marley e lançador do Roxy Music, do King Crimson e do ELP. Depois seria a casa do U2. Jimmy Miller fez tanto sucesso como produtor dos três primeiros Lps do Traffic que os Rolling Stones logo o chamaram e roubaram Milller de Winwood. Com Jimmy Milller os Stones gravariam TODOS os seus discos entre 1968 e 1974, ou seja, seus melhores trabalhos. Mas porque Miller fez tanto sucesso como produtor?
Tenho esses três Lps em vinil e em CD. Tente ouvir em vinil e please, não baixe. Os dois primeiros LPs do Traffic são considerados até hoje uma obra-prima em termos de som estereofônico. São feitos para se escutar com fone de ouvido. Experimente. Os instrumentos ficam o tempo todo dançando entre a direita e a esquerda. Sons aparecem no ouvido esquerdo, voam para o direito e voltam. Ruídos aqui e não lá, lá e não aqui. Um grito aqui. Um solo que vai para lá. É um som espacial, ele anda, caminha dentro da cabeça de quem escuta. É uma arte perdida.
Steve Winwood é uma pessoa amável. Calma. De sorriso suave. Gravou com TODO mundo. Era amigo de todo mundo. Posso lembrar agora de Eric Clapton, Jimmy Hendrix, Marianne Faithfull, George Harrison, Pete Townshend, e vasto etc. Todos tiveram banda ou gravaram com ele. O Traffic acabou em 1970, voltou em 1971 e voltou a terminar em 1974. Daí a carreira solo. Com 24 anos em 1974, Steve Winwood já tinha quatro bandas de sucesso nas costas e um monte de trips para contar.
Jim Capaldi mora a trinta anos no Rio. Gravou até com Ritchie. Lança disco em Londres de vez em quando. É maluco pelo Arpoador e pelas mulheres do Brasil. Chris Wood morreu nos anos 80. Dave Mason tentou carreira solo e virou requisitado guitarrista. Seu mais famoso trabalho é no Beggar's Banquet dos Stones. Sim. Algumas daquelas guitarras de aço são dele. E Steve Winwood enveredou pelo Pop. Como ocorreu com tanto ex-maludo hippie, ele assumiu que seu amor maior sempre foi a soul music de Marvin Gaye e de Sam Cooke e foi por essa senda.
Acabo de reouvir pela milionésima vez o Best Of do Traffic. Tenho esse vinil desde 1979. É um disco perigoso. Há algo de muito escuro nele, de muito onírico e voce pode se perder dentro dele e não voltar nunca mais. Pior, pode não querer voltar. É bonito.
PS: Postei esse video de Glastonbury em 1971. Jim Capaldi é aquele com o pandeiro no microfone. Winwood está ao teclado, cantando. O show é absolutamente dionisíaco. Enjoy. Voce merece isso!
DO JEITO MAIS FÁCIL ( ATENDENDO AO PEDIDO DE UM CASAL DE AMIGOS )
Se nossa alma tem dois impulsos conflitantes, e eu acho que tem, um nos dirige para o Maior, o Grande e o Incontrolável; enquanto outro nos empurra para o Seguro, o Certo e o Provado. Os dois dificilmente convivem juntos ao mesmo tempo e nossa vida é um jogo de cintura em que tentamos equilibrar a ambos dentro de nós e ao nosso redor. Como passei a maior parte de minha vida dentro do Seguro e admirando de longe o Maior, assustado com os riscos que o Descontrole significa ( antes isso se chamava Neurose, hoje não sei ), falar do mundo seguro é sempre entediante para mim. É como descrever um auto-retrato. Falar do mundo da insegurança, o mundo sem mapa de retorno, isso me excita.
Desde sempre o Ocidente tem vivido fases de maior predominio de um ou de outro. No Oriente essa divisão é desconhecida. Lá, o Incontrolável mora dentro e fora dos Rituais Religiosos, Rituais que conseguem unir um extremo auto-controle com uma entrega absoluta ao Grande e Inclassificável. Mas não tema, não é de religião que falo aqui, embora deva dizer que nossas religiões ocidentais tendem sempre a um Materialismo Pobre e Vulgarizante. ( Atenção, o Judaísmo é puramente oriental ).
Se o romantismo foi o grande momento da tomada de poder pelo Irracional, e se em suas consequências se encontram desde o surrealismo até os hippies, punks e terroristas ocidentais, devo falar com tristeza que hoje nossa acomodação é tamanha que tentamos conhecer o Absoluto do Sublime sem sair de casa. Possível sempre foi, alguns poetas conseguiam ter essa experiência com absinto ou com um poema lido no quarto. O problema é que agora se tenta experimentar o sublime sem nenhum tipo de risco. Sem risco a saúde, a mente ou a condição social. Sinto dizer, viver essa experiência sem a presença do Medo é impossível. Pois é o medo que quebra as portas e destrava as correntes e sem ele voce prova o sabor mas nada se modifica. Voce fuma mas não traga. Bebe e cospe. Goza fora.
Meu jovem casal de amigos ( 16 anos ), pede que lhes fale do hippismo. Romanticamente eles acham que esses anos foram de bela revolução e que estão extintos, como fadas ou pássaros Dodos. Bem, o hippismo continua vivo e saudável. E saibam que na verdade nada havia de novo nele. Talvez houvesse só um fato novo, em 1966 a TV espalhou a coisa, antes não havia TV. Sex, drugs e rocknroll podia ser o lema de todo romântico desde sempre. Basta trocar rock por jazz ou ópera ou poesia.
Claro meus jovens que havia hippies e hippies. Americanos eram filhos de Walt Whitman e Thoreau, os ingleses de William Blake e Shelley. Desse modo os americanos eram voltados a estrada, a comunhão entre os homens, a vida campestre, ao amor grupal e a drogas naturais. Os ingleses eram mais noturnos, cultuavam a magia, o satanismo e drogas alucinógenas. Eram mais fatalistas, o estilo visual era mais século XIX. Mas mesmo dentro desses dois grupos havia a divisão entre radiciais e otimistas, machistas e libertários, alucinados e politizados. A questão que importa hoje é: Onde vive esse espírito agora em 2013?
Está diluído e domesticado em livros de espiritismo ou em horóscopo de jornal? Nos filmes "bem loucos" ou nos cantores sofridos com seus violões tristes? Claro que não! Isso tudo é pastiche, cliché, produto. E a regra número UM de todo movimento romântico é: FAÇA O NOVO. Compreende?
A Microsoft nasce como utopia romântica assim como a Internet. O que elas vieram a ser não nega a força que as criou. Já o Facebook NUNCA teve nada de utópico ou de romântico, nasce como coisa prática, certa, sem riscos, sem fantasia. Coisa pensada para um fim, e tão somente para esse fim. Fim que é alcançado. O pensamento de Bill Gates e de Jobs sempre foi ingênuo. Genialmente ingênuo. Romântico.
Portanto não procure hippismo ou romantismo numa banda que se parece com The Beatles ou com Bob Dylan. Esses caras serão anti-românticos por negarem risco e originalidade. Voce encontrará isso em alguma mistura ousada, algum experimentalismo arriscado, numa vaia ou num estranhamento. Tristeza também nunca foi garantia de romantismo. Todo romântico experimenta uma genuína alegria em criar.
Colocar um poster de Jimi Hendrix na parede nada significa hoje. Adoro Hendrix e consigo ouvir o seu velho som COM OUVIDOS NOVOS. Mas ele significa o mesmo que Beyoncé ou Franz Ferdinand, mais do mesmo. Um ótimo MESMO, mas é um MESMO.
A realidade engoliu Hendrix como engoliu Paul e Mick. E se ainda é emocionante ver Paul cantar ou ver o The Who pular, isso NÂO significa que eles ainda sejam sublimes. Tudo neles é conhecido, tudo neles foi explorado, estudado, analisado, divulgado, compreendido. O mistério se foi e sem mistério, magia, segredo, não existe romantismo.
Desde sempre o Ocidente tem vivido fases de maior predominio de um ou de outro. No Oriente essa divisão é desconhecida. Lá, o Incontrolável mora dentro e fora dos Rituais Religiosos, Rituais que conseguem unir um extremo auto-controle com uma entrega absoluta ao Grande e Inclassificável. Mas não tema, não é de religião que falo aqui, embora deva dizer que nossas religiões ocidentais tendem sempre a um Materialismo Pobre e Vulgarizante. ( Atenção, o Judaísmo é puramente oriental ).
Se o romantismo foi o grande momento da tomada de poder pelo Irracional, e se em suas consequências se encontram desde o surrealismo até os hippies, punks e terroristas ocidentais, devo falar com tristeza que hoje nossa acomodação é tamanha que tentamos conhecer o Absoluto do Sublime sem sair de casa. Possível sempre foi, alguns poetas conseguiam ter essa experiência com absinto ou com um poema lido no quarto. O problema é que agora se tenta experimentar o sublime sem nenhum tipo de risco. Sem risco a saúde, a mente ou a condição social. Sinto dizer, viver essa experiência sem a presença do Medo é impossível. Pois é o medo que quebra as portas e destrava as correntes e sem ele voce prova o sabor mas nada se modifica. Voce fuma mas não traga. Bebe e cospe. Goza fora.
Meu jovem casal de amigos ( 16 anos ), pede que lhes fale do hippismo. Romanticamente eles acham que esses anos foram de bela revolução e que estão extintos, como fadas ou pássaros Dodos. Bem, o hippismo continua vivo e saudável. E saibam que na verdade nada havia de novo nele. Talvez houvesse só um fato novo, em 1966 a TV espalhou a coisa, antes não havia TV. Sex, drugs e rocknroll podia ser o lema de todo romântico desde sempre. Basta trocar rock por jazz ou ópera ou poesia.
Claro meus jovens que havia hippies e hippies. Americanos eram filhos de Walt Whitman e Thoreau, os ingleses de William Blake e Shelley. Desse modo os americanos eram voltados a estrada, a comunhão entre os homens, a vida campestre, ao amor grupal e a drogas naturais. Os ingleses eram mais noturnos, cultuavam a magia, o satanismo e drogas alucinógenas. Eram mais fatalistas, o estilo visual era mais século XIX. Mas mesmo dentro desses dois grupos havia a divisão entre radiciais e otimistas, machistas e libertários, alucinados e politizados. A questão que importa hoje é: Onde vive esse espírito agora em 2013?
Está diluído e domesticado em livros de espiritismo ou em horóscopo de jornal? Nos filmes "bem loucos" ou nos cantores sofridos com seus violões tristes? Claro que não! Isso tudo é pastiche, cliché, produto. E a regra número UM de todo movimento romântico é: FAÇA O NOVO. Compreende?
A Microsoft nasce como utopia romântica assim como a Internet. O que elas vieram a ser não nega a força que as criou. Já o Facebook NUNCA teve nada de utópico ou de romântico, nasce como coisa prática, certa, sem riscos, sem fantasia. Coisa pensada para um fim, e tão somente para esse fim. Fim que é alcançado. O pensamento de Bill Gates e de Jobs sempre foi ingênuo. Genialmente ingênuo. Romântico.
Portanto não procure hippismo ou romantismo numa banda que se parece com The Beatles ou com Bob Dylan. Esses caras serão anti-românticos por negarem risco e originalidade. Voce encontrará isso em alguma mistura ousada, algum experimentalismo arriscado, numa vaia ou num estranhamento. Tristeza também nunca foi garantia de romantismo. Todo romântico experimenta uma genuína alegria em criar.
Colocar um poster de Jimi Hendrix na parede nada significa hoje. Adoro Hendrix e consigo ouvir o seu velho som COM OUVIDOS NOVOS. Mas ele significa o mesmo que Beyoncé ou Franz Ferdinand, mais do mesmo. Um ótimo MESMO, mas é um MESMO.
A realidade engoliu Hendrix como engoliu Paul e Mick. E se ainda é emocionante ver Paul cantar ou ver o The Who pular, isso NÂO significa que eles ainda sejam sublimes. Tudo neles é conhecido, tudo neles foi explorado, estudado, analisado, divulgado, compreendido. O mistério se foi e sem mistério, magia, segredo, não existe romantismo.
O PRELÚDIO, WILLIAM WORDSWORTH....SEM PALAVRAS...
Abre os olhos e vê a luz invadir o quarto. Imediatamente o som dos pássaros toma seus ouvidos e voce pensa: - Eu não conheço esses pássaros! Sim, hoje, homem adulto, voce pensaria, se os notasse, -São Pardais, tão só vulgares Pardais! Mas então, naqueles tempos idos, voce saberia sem "o saber", que cada um dos Pardais é um Novo Pardal, completamente único e original. Daí seu interesse por todos eles. E lá fora, naquela manhã Única, voce os batiza. Confirma cada um deles como um Ele.
O café sobre a mesa é mais um café. E enquanto se é servido voce brinca com a colher. Ela agora é uma catapulta e voce lança bolas de pão, em Fogo. à muralha da Mantegueira. Exércitos de invasores fazem aquilo que sabem fazer, Saqueiam a manteiga. Quando sua mãe impede a nova Bola de Fogo de ser lançada, bem, voce e seu irmão começam a tomar café como se agora fossem Dois Piratas. Migalhas são jogadas ao chão por Barba-Negra, que se serve de imensas canecas de Rum e engole nacos de Carneiro como se fossem Bolinhos de Chuva.
Mas é lá fora que se faz a coisa.
Todas as pessoas na rua são conhecidas e possuem um nome, mesmo que João seja para voce "O Menino da Bicicleta" ou que Lucinha seja agora "A Mais Linda com as Pernas Nuas". Todas as ruas levam ao Novo, e todas as Ruas lhe são conhecidas. Porque voce conhece a eterna Transformação que é a condição da Vida Bem Vivida. E ninguém te ensinou isso, voce Sabe. ( Um dia, terrível dia, vão te dizer que a vida é uma fórmula, que a morte é um destino e que tudo é como é... ). Mas voce Sabe, naqueles Tempos, que tudo o que os Homens Grandes pensam é Confusão Pra Passar o Tempo. E gente como Voce, Pequena, Sente que a Vida é Mais.
As Nuvens Falam e a Tempestade tem um Caráter. Cada Pedra na Estrada de Terra tem uma fala em seu Teatro. Sua Mente Cria sem parar para pensar. O Medo, absoluto e imenso, toma todo o Universo quando voce olha uma ratazana morta no meio do lixo. E esse Pavor se transforma em esquecimento ao olhar uma Pipa que se solta da linha e voa a esmo por entre os Eucaliptos que não a capturam. Um bando de moleques corre pela Pipa e voce se lembra de Tom e Huck.
Voce ainda não aprendeu o Tempo e essa Manhã lhe parece pra Sempre.
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
Walt Whitman pegou muito de Wordsworth. Ambos se soltam na estrada e vivem o olhar sobre as coisas. Ambos nos deixam um gosto de felicidade na alma quando descrevem as coisas. Agradecemos ao Mundo por ter dado luz aos dois Gigantes. A diferença é que o americano é voltado ao futuro, o inglês ao passado. Whitman de nada tem saudade, ele crê na vida que virá. Wordsworth lamenta o que se perdeu, ele vive feliz por poder recordar.
Os lagos, as montanhas, so bosques. Wordsworth procura a solidão para lá se enamorar das sensações que a natureza lhe dá. Ele consegue ter instantes de Sublime por poder ainda acessar sua infância. Infância que não é inocência, é criação e conhecimento. O poeta procura a Surpresa e procura mais que isso AQUILO QUE NÃO PODE SER DITO POIS ESTÁ FORA DA LINGUAGEM. Para isso ele caminha: sobe morros, rema em lagos, adormece em relvados, fala com camponeses, se perde na neve. Anda por toda a Grã-Bretanha, mas também pela França, pela Alemanha, sempre a pé. E é feliz.
Tempos finais, as fronteiras começavam a se fechar. Wordsworth se aterroriza com Londres: "Como podemos viver onde não sabemos os nomes de nossos vizinhos? Isso é impossível!!!" Bem-vindo à modernidade Wordsworth...
O poema, longo, escrito na parte final de sua vida de 80 anos, narra sua vida. Infância, Oxford, viagens a pé. É uma obra-prima e é um prazer. Poema solto, sem rima e sem metro, quase prosa. Caça ao Sublime, acerta o alvo várias vezes.
Tem de ler.
O café sobre a mesa é mais um café. E enquanto se é servido voce brinca com a colher. Ela agora é uma catapulta e voce lança bolas de pão, em Fogo. à muralha da Mantegueira. Exércitos de invasores fazem aquilo que sabem fazer, Saqueiam a manteiga. Quando sua mãe impede a nova Bola de Fogo de ser lançada, bem, voce e seu irmão começam a tomar café como se agora fossem Dois Piratas. Migalhas são jogadas ao chão por Barba-Negra, que se serve de imensas canecas de Rum e engole nacos de Carneiro como se fossem Bolinhos de Chuva.
Mas é lá fora que se faz a coisa.
Todas as pessoas na rua são conhecidas e possuem um nome, mesmo que João seja para voce "O Menino da Bicicleta" ou que Lucinha seja agora "A Mais Linda com as Pernas Nuas". Todas as ruas levam ao Novo, e todas as Ruas lhe são conhecidas. Porque voce conhece a eterna Transformação que é a condição da Vida Bem Vivida. E ninguém te ensinou isso, voce Sabe. ( Um dia, terrível dia, vão te dizer que a vida é uma fórmula, que a morte é um destino e que tudo é como é... ). Mas voce Sabe, naqueles Tempos, que tudo o que os Homens Grandes pensam é Confusão Pra Passar o Tempo. E gente como Voce, Pequena, Sente que a Vida é Mais.
As Nuvens Falam e a Tempestade tem um Caráter. Cada Pedra na Estrada de Terra tem uma fala em seu Teatro. Sua Mente Cria sem parar para pensar. O Medo, absoluto e imenso, toma todo o Universo quando voce olha uma ratazana morta no meio do lixo. E esse Pavor se transforma em esquecimento ao olhar uma Pipa que se solta da linha e voa a esmo por entre os Eucaliptos que não a capturam. Um bando de moleques corre pela Pipa e voce se lembra de Tom e Huck.
Voce ainda não aprendeu o Tempo e essa Manhã lhe parece pra Sempre.
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Walt Whitman pegou muito de Wordsworth. Ambos se soltam na estrada e vivem o olhar sobre as coisas. Ambos nos deixam um gosto de felicidade na alma quando descrevem as coisas. Agradecemos ao Mundo por ter dado luz aos dois Gigantes. A diferença é que o americano é voltado ao futuro, o inglês ao passado. Whitman de nada tem saudade, ele crê na vida que virá. Wordsworth lamenta o que se perdeu, ele vive feliz por poder recordar.
Os lagos, as montanhas, so bosques. Wordsworth procura a solidão para lá se enamorar das sensações que a natureza lhe dá. Ele consegue ter instantes de Sublime por poder ainda acessar sua infância. Infância que não é inocência, é criação e conhecimento. O poeta procura a Surpresa e procura mais que isso AQUILO QUE NÃO PODE SER DITO POIS ESTÁ FORA DA LINGUAGEM. Para isso ele caminha: sobe morros, rema em lagos, adormece em relvados, fala com camponeses, se perde na neve. Anda por toda a Grã-Bretanha, mas também pela França, pela Alemanha, sempre a pé. E é feliz.
Tempos finais, as fronteiras começavam a se fechar. Wordsworth se aterroriza com Londres: "Como podemos viver onde não sabemos os nomes de nossos vizinhos? Isso é impossível!!!" Bem-vindo à modernidade Wordsworth...
O poema, longo, escrito na parte final de sua vida de 80 anos, narra sua vida. Infância, Oxford, viagens a pé. É uma obra-prima e é um prazer. Poema solto, sem rima e sem metro, quase prosa. Caça ao Sublime, acerta o alvo várias vezes.
Tem de ler.
ADEUS ÀS AULAS TRISTES
Foram meses estranhos. Muito estranhos. Logo na primeira aula eu já avisei a professora: Falar do movimento romântico era doloroso para mim. E eu preferia não ter de revisita-lo. Mas revisitei. E doeu.
Estranha figura essa mestra. Eu a detesto. Porque ela é radicalmente contra toda forma de religião. É radicalmente de esquerda. E ultra-feminista. Mas também a admiro. Porque ela é romântica. Fala da maior revolução mental que o planeta viveu, a de 1780/ 1790, época do nascimento da coisa, pela primeira vez a razão é colocada em xeque, pela primeira vez cada homem se sente no direito de pensar por si-mesmo. Nasce o individualismo, a criatividade é colocada como dom soberano. Pela primeira vez a solidão não é vista como danação e vergonha, mas como privilégio e desejo.
Rousseau anda em seu bosque e sente o que é Bom. Wordsworth anda pelos lagos ingleses e encontra o céu. Junto aos lagos Wordsworth se livra do peso da vida e reencontra sua infância. Vê sem julgar, observa como se nunca tivesse visto. Livre.
Mas nas aulas o que temos é Alvares de Azevedo...o mito da mulher pura e inacessível, as loucuras nos cemitérios, as putas. Ah meu Deus, como dói lembrar!!!
Porque eu fui um dos idiotas! Fui o tonto da familia, que andava no sitio, aos 18 anos, sózinho, botas na lama, tentando respirar de novo o ar dos meus livres 8 anos de idade. Fui o romântico ao extremo, que ficava doente na cama, com febre, e lia Hugo e Bronte sonhando com suas meninas pálidas e doentias, chorosas alucinações. Madrugadas solitárias e insones, a luz de velas, me sentindo o único romântico sobre a Terra. Eu disse que fui esse idiota!
Conseguia esquecer o mundo e viver só para mim. Conseguia ignorar minha familia. Sonhar todo o tempo. Então eu sei o que foi esse romantismo. Conheço o prazer inenarrável do sofrimento procurado. Meu sangue sabe do sabor doce do êxtase do alivio. Nada nessas aulas são coisas novas para mim. Eu já sabia que a infância funda e cria a poesia. E que saber brincar é saber criar.
Todos esses nomes me são conhecidos! Essas sensações provocadas me são passadas. Eu sei que a arte é a grande fonte de alivio. Um alivio de sacrificio. Já fui o inimigo.
E se passaram esses quatro meses. Essas 32 aulas. Essas 96 horas.
Adeus mestra, adeus romantismo, adeus lago, adeus criação.
Ou não?
Estranha figura essa mestra. Eu a detesto. Porque ela é radicalmente contra toda forma de religião. É radicalmente de esquerda. E ultra-feminista. Mas também a admiro. Porque ela é romântica. Fala da maior revolução mental que o planeta viveu, a de 1780/ 1790, época do nascimento da coisa, pela primeira vez a razão é colocada em xeque, pela primeira vez cada homem se sente no direito de pensar por si-mesmo. Nasce o individualismo, a criatividade é colocada como dom soberano. Pela primeira vez a solidão não é vista como danação e vergonha, mas como privilégio e desejo.
Rousseau anda em seu bosque e sente o que é Bom. Wordsworth anda pelos lagos ingleses e encontra o céu. Junto aos lagos Wordsworth se livra do peso da vida e reencontra sua infância. Vê sem julgar, observa como se nunca tivesse visto. Livre.
Mas nas aulas o que temos é Alvares de Azevedo...o mito da mulher pura e inacessível, as loucuras nos cemitérios, as putas. Ah meu Deus, como dói lembrar!!!
Porque eu fui um dos idiotas! Fui o tonto da familia, que andava no sitio, aos 18 anos, sózinho, botas na lama, tentando respirar de novo o ar dos meus livres 8 anos de idade. Fui o romântico ao extremo, que ficava doente na cama, com febre, e lia Hugo e Bronte sonhando com suas meninas pálidas e doentias, chorosas alucinações. Madrugadas solitárias e insones, a luz de velas, me sentindo o único romântico sobre a Terra. Eu disse que fui esse idiota!
Conseguia esquecer o mundo e viver só para mim. Conseguia ignorar minha familia. Sonhar todo o tempo. Então eu sei o que foi esse romantismo. Conheço o prazer inenarrável do sofrimento procurado. Meu sangue sabe do sabor doce do êxtase do alivio. Nada nessas aulas são coisas novas para mim. Eu já sabia que a infância funda e cria a poesia. E que saber brincar é saber criar.
Todos esses nomes me são conhecidos! Essas sensações provocadas me são passadas. Eu sei que a arte é a grande fonte de alivio. Um alivio de sacrificio. Já fui o inimigo.
E se passaram esses quatro meses. Essas 32 aulas. Essas 96 horas.
Adeus mestra, adeus romantismo, adeus lago, adeus criação.
Ou não?
COMO SE NASCE PARA A VIDA ( IMPRESSÕES SOBRE AULAS BASEADAS EM KASPAR HAUSER )
Iluminismo? Não me faça rir voce e seu iluminismo! A razão ao fim pode tudo, é nisso que crê a razão, essa a crença iluminista. Maravilhosa razão! O que ela nos deu? Onde nos levou?
Nesta aula não me contenho e digo minha "loucura": Eis: A escola nos destrói. Ela nos castra, nos amordaça, mata tudo aquilo a que fomos destinados. Esquizo condição deste que vos fala: Trabalhar para algo que é condenável. Mas não há volta: A Escola nos destrói mas não existe alternativa a ela e é pior sem ela. Porque o homem natural está morto. Sem a escola não haverá a volta a pureza-verdade-natural.
A natureza foi morta. Animais viraram máquinas ou palhaços. Não podemos ver uma árvore como ela é. O que vemos é a ideia do que seja uma árvore. Eis a maldição da escola e da razão: Não podemos ver o que é. Vemos aquilo que fomos ensinados a ver. Não amamos. Sentimos uma coisa que aprendemos a chamar de amor. Enquadrados, domesticados, vivemos racionalmente. Razão que não existe. Cremos no inexistente. O que chamamos de razão é costume, domesticidade, castração.
Uma criança brinca. E para ela uma maçã é viva. Como viva é a pedra e a floresta que grita. Se a razão nos fala que uma pedra não pode ser viva, uma criança nos recorda que acreditar na vida pressupõe vê-la em tudo. Porque quem está vivo vê a vida ao ver-viver. E vê sem ler. Olha.
Mas nós matamos essa vida e a enquadramos em linhas retas na página de papel. E tudo o que aquela criança via-antes morre nessa linha-agora. E toda a vida que ela brincava cessa ao aprender que a vida é uma coisa.
Quanta coisa no mundo não tem nome!
Quanta vida na vida sem razão!
E o iluminista, vomitando regras e ditando verdades, tudo em nome da razão que ele confunde com liberdade ( que asneira! ), morre seco em suas aspirações ao bom e ao belo. Kant matou todos eles! A razão nada pode saber. Ela só entende aquilo que ela própria constrói. Coisas da razão. Brinquedos de adultos.
O sublime aterroriza a razão e o iluminista. O infinito, o vasto, o desmedido. A morte.
xxxxxxxxxx
Foram aulas sobre esse filme sublime. Onde aprendi a raiz romântica de Herzog. E de Wenders e de Schlondorff.
O ódio, sim, o ódio que eles têm da ordem, da regra, do comum, do burguês.
Anões, anjos, bestas, doentes, velhos, macacos, o fora de lugar, o inutil, a criança. Isso que eles amaram.
Kaspar nasce ao sair do porão. E indaga, brinca, incomoda, não aceita. Parte.
Queres saber do sublime? Eis o filme.
Nesta aula não me contenho e digo minha "loucura": Eis: A escola nos destrói. Ela nos castra, nos amordaça, mata tudo aquilo a que fomos destinados. Esquizo condição deste que vos fala: Trabalhar para algo que é condenável. Mas não há volta: A Escola nos destrói mas não existe alternativa a ela e é pior sem ela. Porque o homem natural está morto. Sem a escola não haverá a volta a pureza-verdade-natural.
A natureza foi morta. Animais viraram máquinas ou palhaços. Não podemos ver uma árvore como ela é. O que vemos é a ideia do que seja uma árvore. Eis a maldição da escola e da razão: Não podemos ver o que é. Vemos aquilo que fomos ensinados a ver. Não amamos. Sentimos uma coisa que aprendemos a chamar de amor. Enquadrados, domesticados, vivemos racionalmente. Razão que não existe. Cremos no inexistente. O que chamamos de razão é costume, domesticidade, castração.
Uma criança brinca. E para ela uma maçã é viva. Como viva é a pedra e a floresta que grita. Se a razão nos fala que uma pedra não pode ser viva, uma criança nos recorda que acreditar na vida pressupõe vê-la em tudo. Porque quem está vivo vê a vida ao ver-viver. E vê sem ler. Olha.
Mas nós matamos essa vida e a enquadramos em linhas retas na página de papel. E tudo o que aquela criança via-antes morre nessa linha-agora. E toda a vida que ela brincava cessa ao aprender que a vida é uma coisa.
Quanta coisa no mundo não tem nome!
Quanta vida na vida sem razão!
E o iluminista, vomitando regras e ditando verdades, tudo em nome da razão que ele confunde com liberdade ( que asneira! ), morre seco em suas aspirações ao bom e ao belo. Kant matou todos eles! A razão nada pode saber. Ela só entende aquilo que ela própria constrói. Coisas da razão. Brinquedos de adultos.
O sublime aterroriza a razão e o iluminista. O infinito, o vasto, o desmedido. A morte.
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Foram aulas sobre esse filme sublime. Onde aprendi a raiz romântica de Herzog. E de Wenders e de Schlondorff.
O ódio, sim, o ódio que eles têm da ordem, da regra, do comum, do burguês.
Anões, anjos, bestas, doentes, velhos, macacos, o fora de lugar, o inutil, a criança. Isso que eles amaram.
Kaspar nasce ao sair do porão. E indaga, brinca, incomoda, não aceita. Parte.
Queres saber do sublime? Eis o filme.
A BELEZA E A NOITE ( contra cegos e ressentidos )
Ando com um amigo e ele mata a charada: Gostei tanto do ANNA KARENINA de Joe Wright porque é um filme BONITO. E no deserto cinematográfico, onde toda imagem tem a pobreza da tela de TV, o filme surge como um original exercício de estilo.
Mas posso dizer mais my friend, e digo por experiência de vida: Nada irrita mais o feio que a beleza. Àquele que não consegue apreciar a beleza ela, a beleza, lhe parece ofensa pessoal. O espírito limitado daquele que percebe apenas o que é "util" vê o belo como futil. É a sina dos poetas desde 1750, cultuar o que é inutil, como bem provocou Oscar Wilde na introdução a Dorian Gray. O homem que viveu em meio ao feio, ao funcional, ao "relevante" será incapaz de apreciar o que seja inefável, sutil, belo. Pior que isso, pressentindo sua limitação inumana, ele voltará seu arcabouço racional-redutor-rancoroso contra a beleza que lhe foi negada desde sempre. O FEIO ODEIA O BELO.
Nós sabemos meu amigo o que seja essa sensação. A THING OF BEAUTY IS A JOY FOR EVER. A beleza cura. Os milagres católicos são milagrosos por serem belos. É no ocidente a única religião que compreendeu isso, a sedução curadora da beleza. E então ela, a igreja de Roma, não teve o pudor de se fazer rica em ouro e em imagens sensuais. O paraíso se confunde em Roma com a estética do belo. Deus como um artista.
Isso é negado pelas religiões protestantes. Que têm sua beleza em atos e palavras, mas nunca em visual. Elas pregam desde sempre o util e nunca o enfeite. Daí o espirito claro, limpo e direto que guia países como Suécia, Dinamarca ou Holanda. Para eles nós somos muito complicados, sujos, futeis, ricos em imagens, complexos demais, sensuais, barrocos. Basta comparar o cinema nórdico ao cinema da Itália ou da Espanha. Saiba amigo, as revoluções religiosas de 1500/1600 marcaram o caráter dos povos até hoje. E mesmo um páis que se pretende ateu exibe para quem sabe ler, a língua da igreja que o fundou.
Nenhum país exibe isso com mais força que a Alemanha, nação que vivia a divisão entre a Prússia e seus satélites, luteranos, e a Baviera católica. Munique vivia, com Vienna, também romana, um reino barroco de dolce vita. Quando houve o advento de Bismarck, a Alemanha optou pelo prussianismo, venceu o luteranismo. Vienna entrou na decadência saudosista e Munique é esse corpo estranho no país, um estado quase latino em meio ao espírito higiênico alemão.
Mas voltemos a falar da beleza. Assisti esses dias a um filme, cheio de defeitos, que mostra aquilo que falo. Feito em Cinerama, ou seja, a imagem é gigantesca, ele conta a saga da fundação dos EUA como são hoje. E vendo-o recordo aquilo que o cinema pode ser. Grande e Belo. Cada imagem chega a ter cinco planos. Vemos duas pessoas falando. Ao fundo carroças passam. No lado esquerdo uma mulher alimenta o gado. A direita crianças brincam. Mais ao fundo vemos uma fogueira onde homens cantam. Ainda mais ao fundo, passam alguns casais conversando. E ao longe, focado, montanhas onde sombras flutuam entre o verde e o céu sem fim. O filme inteiro tem essa riqueza pictórica. Cinema pensado e feito como cinema e nunca como dvd ou TV. Nada da austeridade dos filmes nórdicos ( austeridade que nasceu com Dreyer e Bergman, que mesmo nessa austeridade-fria não deixavam de ser belos ). Aqui tudo é rico, complexo, nossa vista se perde, pensamos: "para onde olho?"
Eis uma aula de estética, de beleza, aula que deixará com dor de cabeça àqueles que temem o que é bonito. Penso no cinema ainda mais pobre que será feito pela geração que está se habituando a ver a vida pela câmera do celular.
Por isso Michael Powell. Por isso RAN. Por isso Mizoguchi. Por isso Ophuls. E John Ford claro. E por isso ANNA KARENINA e também por isso penso que gostarei do Gatsby de Luhrman. Cinema grande, cinema vasto, cinema pra apreciar e que oferece o que se olhar. Cinema inspiração. Quando essa beleza se une a bons diálogos temos a obra-prima. Mas na ausência de bons roteiros, ora, me sirvam imagens lindas e me deixem flutuar. Façam cinema.
Eu e meu amigo falamos depois sobre a oposição entre iluminismos e romantismos. Não, não vou entrar aqui de novo nessa coisa. É um embate no qual a Europa se complica até hoje. Não saber se a alma deve singrar na certeza do justo e do bem-feito, ou se deve se jogar ao original e sem freios. O que posso dizer é que a beleza pode nascer nos dois caminhos, uma beleza que tranquiliza e outra que excita.
A cura da vida passa pela estética. O resto eu deixo aos cegos e ressentidos.
Mas posso dizer mais my friend, e digo por experiência de vida: Nada irrita mais o feio que a beleza. Àquele que não consegue apreciar a beleza ela, a beleza, lhe parece ofensa pessoal. O espírito limitado daquele que percebe apenas o que é "util" vê o belo como futil. É a sina dos poetas desde 1750, cultuar o que é inutil, como bem provocou Oscar Wilde na introdução a Dorian Gray. O homem que viveu em meio ao feio, ao funcional, ao "relevante" será incapaz de apreciar o que seja inefável, sutil, belo. Pior que isso, pressentindo sua limitação inumana, ele voltará seu arcabouço racional-redutor-rancoroso contra a beleza que lhe foi negada desde sempre. O FEIO ODEIA O BELO.
Nós sabemos meu amigo o que seja essa sensação. A THING OF BEAUTY IS A JOY FOR EVER. A beleza cura. Os milagres católicos são milagrosos por serem belos. É no ocidente a única religião que compreendeu isso, a sedução curadora da beleza. E então ela, a igreja de Roma, não teve o pudor de se fazer rica em ouro e em imagens sensuais. O paraíso se confunde em Roma com a estética do belo. Deus como um artista.
Isso é negado pelas religiões protestantes. Que têm sua beleza em atos e palavras, mas nunca em visual. Elas pregam desde sempre o util e nunca o enfeite. Daí o espirito claro, limpo e direto que guia países como Suécia, Dinamarca ou Holanda. Para eles nós somos muito complicados, sujos, futeis, ricos em imagens, complexos demais, sensuais, barrocos. Basta comparar o cinema nórdico ao cinema da Itália ou da Espanha. Saiba amigo, as revoluções religiosas de 1500/1600 marcaram o caráter dos povos até hoje. E mesmo um páis que se pretende ateu exibe para quem sabe ler, a língua da igreja que o fundou.
Nenhum país exibe isso com mais força que a Alemanha, nação que vivia a divisão entre a Prússia e seus satélites, luteranos, e a Baviera católica. Munique vivia, com Vienna, também romana, um reino barroco de dolce vita. Quando houve o advento de Bismarck, a Alemanha optou pelo prussianismo, venceu o luteranismo. Vienna entrou na decadência saudosista e Munique é esse corpo estranho no país, um estado quase latino em meio ao espírito higiênico alemão.
Mas voltemos a falar da beleza. Assisti esses dias a um filme, cheio de defeitos, que mostra aquilo que falo. Feito em Cinerama, ou seja, a imagem é gigantesca, ele conta a saga da fundação dos EUA como são hoje. E vendo-o recordo aquilo que o cinema pode ser. Grande e Belo. Cada imagem chega a ter cinco planos. Vemos duas pessoas falando. Ao fundo carroças passam. No lado esquerdo uma mulher alimenta o gado. A direita crianças brincam. Mais ao fundo vemos uma fogueira onde homens cantam. Ainda mais ao fundo, passam alguns casais conversando. E ao longe, focado, montanhas onde sombras flutuam entre o verde e o céu sem fim. O filme inteiro tem essa riqueza pictórica. Cinema pensado e feito como cinema e nunca como dvd ou TV. Nada da austeridade dos filmes nórdicos ( austeridade que nasceu com Dreyer e Bergman, que mesmo nessa austeridade-fria não deixavam de ser belos ). Aqui tudo é rico, complexo, nossa vista se perde, pensamos: "para onde olho?"
Eis uma aula de estética, de beleza, aula que deixará com dor de cabeça àqueles que temem o que é bonito. Penso no cinema ainda mais pobre que será feito pela geração que está se habituando a ver a vida pela câmera do celular.
Por isso Michael Powell. Por isso RAN. Por isso Mizoguchi. Por isso Ophuls. E John Ford claro. E por isso ANNA KARENINA e também por isso penso que gostarei do Gatsby de Luhrman. Cinema grande, cinema vasto, cinema pra apreciar e que oferece o que se olhar. Cinema inspiração. Quando essa beleza se une a bons diálogos temos a obra-prima. Mas na ausência de bons roteiros, ora, me sirvam imagens lindas e me deixem flutuar. Façam cinema.
Eu e meu amigo falamos depois sobre a oposição entre iluminismos e romantismos. Não, não vou entrar aqui de novo nessa coisa. É um embate no qual a Europa se complica até hoje. Não saber se a alma deve singrar na certeza do justo e do bem-feito, ou se deve se jogar ao original e sem freios. O que posso dizer é que a beleza pode nascer nos dois caminhos, uma beleza que tranquiliza e outra que excita.
A cura da vida passa pela estética. O resto eu deixo aos cegos e ressentidos.
SUMARÉ, SÊNECA E VOLTAIRE
Do meu bairro eu podia ver os altos do Sumaré. A antena da Tupi ( ou seria da Cultura? ) que mandava para minha casa a misteriosa imagem da TV. Eu achava que dentro do aparelho moravam pequenos homens, e que nas válvulas se condensava o cenário. Era maravilhoso ver o técnico arrumar a televisão.
Às vezes eu ia ao Sumaré. Velhinhas cruzavam a rua. Nas janelas de suas casas, velhinhas olhavam a rua. E fazia sempre frio. Vento. Garoa. A gente ia na igreja de Nossa Senhora de Fátima, onde fui batizado. Sim, fui batizado e ainda acho, institivamente, um absurdo uma criança civilizada não ser batizada. Batismo é entrar na civilidade. Na Minha civilização.
O bairro continua a ser um conjunto de ladeiras. E a ter suas pequenas velhinhas cruzando a rua. O ar tem muito de folhas verdes e de sombra. E há um silêncio que traz calma e também memória. Ao contrário do Morumbi que morreu ou do Itaim que se travestiu, o Sumaré continua vivo. Vento no alto do morro e a vista da cidade longe.
Andando sinto a mão de minha mãe pegar a minha enquanto atravesso a rua. E a de meu pai me dando saudade. Eu briguei muito com ele. Eu briguei muito com todos aqueles que amei. Ainda brigarei mais. Fotografo as velhas casas. Eu ligo pra elas. Elas estão aqui pra vida.
Sêneca disse que a vida não tem valor. Que a vida é um caminho sem valor em si. Que ao viver criamos seu valor, bom ou ruim. E que a vida só vale se for plena. Ela dura aquilo que vivemos. Viver não é uma benção e não é uma maldição. Depende. Certos bairros são vivos por terem duração. São diferentes e históricos. Existem como testemunhos. Para mim.
Sêneca é um dos mais claros espíritos que o mundo viu. E eu continuo a andar. Uma feira. O cheiro dos legumes e das frutas. Cachorros me cheiram. Eles sempre sabem que sou um deles. Uma escola. Vozes de adolescentes. Eu sei que ainda serei sempre um deles. Como eles me percebem?
A sombra some e eu sinto uma nova verdade. Sumaré ainda está aqui. Bom de andar. bom de tomar café e bom de olhar. Detalhes em detalhes: uma rachadura, uma flor, um enfeite no jardim. Casas com jardim. Um absurdo uma casa sem jardim. Casa sem jardim não é casa. Civilidade necessita de jardim. Como falava Voltaire, cultivemos nosso jardim.
Estou cansado do romantismo. Chega de originalidades! Chega de novidades! Quero o bem feito, o hábil, o saber fazer. O prazer daquilo que é bonito. Chega de romantismos!
Clássico Sumaré. Sem grandes emoções. Correto.
Uma velhinha cruza a rua.
Às vezes eu ia ao Sumaré. Velhinhas cruzavam a rua. Nas janelas de suas casas, velhinhas olhavam a rua. E fazia sempre frio. Vento. Garoa. A gente ia na igreja de Nossa Senhora de Fátima, onde fui batizado. Sim, fui batizado e ainda acho, institivamente, um absurdo uma criança civilizada não ser batizada. Batismo é entrar na civilidade. Na Minha civilização.
O bairro continua a ser um conjunto de ladeiras. E a ter suas pequenas velhinhas cruzando a rua. O ar tem muito de folhas verdes e de sombra. E há um silêncio que traz calma e também memória. Ao contrário do Morumbi que morreu ou do Itaim que se travestiu, o Sumaré continua vivo. Vento no alto do morro e a vista da cidade longe.
Andando sinto a mão de minha mãe pegar a minha enquanto atravesso a rua. E a de meu pai me dando saudade. Eu briguei muito com ele. Eu briguei muito com todos aqueles que amei. Ainda brigarei mais. Fotografo as velhas casas. Eu ligo pra elas. Elas estão aqui pra vida.
Sêneca disse que a vida não tem valor. Que a vida é um caminho sem valor em si. Que ao viver criamos seu valor, bom ou ruim. E que a vida só vale se for plena. Ela dura aquilo que vivemos. Viver não é uma benção e não é uma maldição. Depende. Certos bairros são vivos por terem duração. São diferentes e históricos. Existem como testemunhos. Para mim.
Sêneca é um dos mais claros espíritos que o mundo viu. E eu continuo a andar. Uma feira. O cheiro dos legumes e das frutas. Cachorros me cheiram. Eles sempre sabem que sou um deles. Uma escola. Vozes de adolescentes. Eu sei que ainda serei sempre um deles. Como eles me percebem?
A sombra some e eu sinto uma nova verdade. Sumaré ainda está aqui. Bom de andar. bom de tomar café e bom de olhar. Detalhes em detalhes: uma rachadura, uma flor, um enfeite no jardim. Casas com jardim. Um absurdo uma casa sem jardim. Casa sem jardim não é casa. Civilidade necessita de jardim. Como falava Voltaire, cultivemos nosso jardim.
Estou cansado do romantismo. Chega de originalidades! Chega de novidades! Quero o bem feito, o hábil, o saber fazer. O prazer daquilo que é bonito. Chega de romantismos!
Clássico Sumaré. Sem grandes emoções. Correto.
Uma velhinha cruza a rua.
O ILUMINISMO E A REVOLUÇÃO POR CARPEAUX, AFINAL QUAL É A TUA?
Um dos mistérios benditos do mundo: Porque o homem não consegue, não pode se acomodar? Uma pessoa tem de ser muito imbecil para gastar toda a vida numa fé estática. Sim, esse é o credo do romantismo, do pré-romantismo ( que nada tem de romantico ) e do iluminismo também. São 3 modos de pensar que se negam, se chocam, mas que, como bem o prova Carpeaux, se complementam. Não haveria um sem a existencia do outro.
O iluminismo é racional. Portanto ele escreve em regras bem claras e definidas. O texto é limpo, nada de emoção desregrada. O bom gosto manda. É aristocrático, dirigido a nobres. Contradição: Nunca é conservador, é revolucionário, porém se expressa em formas rígidas e antigas. No iluminismo, que é o classicismo, não se pensa em gênio, em inspiração ou em originalidade, se pensa em termos de clareza, elegãncia e saber fazer. Aqui é preciso cultura.
Tudo muda no universo do pré-romantismo. Surge a ideia do gênio, da súbita inspiração. Para isso não é mais necessário ter um saber, é preciso ser um escolhido, um gênio. A obra deve ser original, emocional, imperfeita, diferente, única. Estranho, são obras esquisitas feitas com fins conservadores. Tudo aqui é passado, criação de mitos, convulsões íntimas, isolamento.
Otto Maria Carpeaux demonstra, neste que é seu melhor livro da série, todos os fatos históricos que contribuíram para essa mudança. Um ato como o de Richardson, que esnobou o apoio de um mecenas nobre para poder escrever para as massas, mostra essa mudança com clareza. As novas religiões influenciando a formação de países ( a Alemanha luterana, país onde na vida politica tudo é regra e ordem e na vida cultural tudo é liberdade e criação ), a calma e prática Inglaterra, com a religião anglicana ditando um modo de ser em que tudo se arranja sem grandes traumas, e a França calvinista, com a dúvida fazendo parte da própria fé. Sobre todas essas forças inconscientes, a nova burguesia, com seu desprezo a escritores e religiosos, poetas e andarilhos, gente que não produz coisas que se vendem, pior que isso, gente que não os respeita. Desde então ( 1750/ 1800 ) se institui essa briga entre o mundo burguês, materialista, produtivo, trabalhador, e o mundo aristocrático da arte, imaterial, não produtivo, atemporal. Essa briga, que nasce aqui vive até o modernismo ( 1920 ), hoje se percebe que a arte de certo modo capitulou.
Otto relembra o fato de que até o iluminismo cientistas eram artistas. Galileu ou Bacon eram grandes escritores, e ao se fazer uma máquina de fábrica ou uma usina se pensava em beleza e harmonia. A máquina tinha enfeites, arabescos, beleza "inutil". É aqui que se dá a separação entre arte e ciência, o homem de ciência pouco se preocupando com a escrita ou com o belo. As fábricas se tornam galpões horrendos, as mãquinas mecanismos monstruosos. O pré-romantismo se ergue contra isso, dái seu passadismo, sua saudade.
Shakespeare como o conhecemos nasce aqui. Ele é traduzido para todas as linguas e se torna o Gênio, o mito a ser seguido, o homem sem regras, sem freios, sem grande cultura que criou magia a partir do nada, o homem que foi pura inspiração. Um mito claro, mas o romantismo ama os mitos, crê neles e jamais no óbvio. O óbvio não é arte, não é vida e nunca será novo.
Carpeux desenterra nomes meio esquecidos: Shaftesbury, Galiani, Vauvenargues. Todos grandes otimistas que acreditaram na nobreza do homem, na contínua evolução do mundo, não pela ciência e técnica, mas sim por ações baseadas em bondade e coragem. Esses nomes, melancólicos ativos, tristes otimistas, tiveram uma influência continental em seu tempo, foram centro de debates, mudaram a vida.
É claro que Otto fala de Rousseau, de Voltaire, Jane Austen, Schiller, Sterne, Fielding, Defoe, Goethe, Vico, Choderlos de Laclos, nomes centrais, conhecidos até este século, reeditados ao infinito. Mas é nos pequenos casos, nos nomes outrora grandes e agora esquecidos que reside a magia deste belo livro.
E fica uma lição: A arte só voltará a ser protagonista quando ela voltar a ser 100% arte. Quando ela deixar de cortejar a ciência e o trabalho e retornar a sua condição de aristocrata, de vagabunda, de religião sem igreja e principalmente de cultora do belo e do inutil. Enquanto não renascer essa coragem, que ridiculo, continuaremos a a ver essa arte que cultua o útil, o esforço e o ser como todos são.
O iluminismo é racional. Portanto ele escreve em regras bem claras e definidas. O texto é limpo, nada de emoção desregrada. O bom gosto manda. É aristocrático, dirigido a nobres. Contradição: Nunca é conservador, é revolucionário, porém se expressa em formas rígidas e antigas. No iluminismo, que é o classicismo, não se pensa em gênio, em inspiração ou em originalidade, se pensa em termos de clareza, elegãncia e saber fazer. Aqui é preciso cultura.
Tudo muda no universo do pré-romantismo. Surge a ideia do gênio, da súbita inspiração. Para isso não é mais necessário ter um saber, é preciso ser um escolhido, um gênio. A obra deve ser original, emocional, imperfeita, diferente, única. Estranho, são obras esquisitas feitas com fins conservadores. Tudo aqui é passado, criação de mitos, convulsões íntimas, isolamento.
Otto Maria Carpeaux demonstra, neste que é seu melhor livro da série, todos os fatos históricos que contribuíram para essa mudança. Um ato como o de Richardson, que esnobou o apoio de um mecenas nobre para poder escrever para as massas, mostra essa mudança com clareza. As novas religiões influenciando a formação de países ( a Alemanha luterana, país onde na vida politica tudo é regra e ordem e na vida cultural tudo é liberdade e criação ), a calma e prática Inglaterra, com a religião anglicana ditando um modo de ser em que tudo se arranja sem grandes traumas, e a França calvinista, com a dúvida fazendo parte da própria fé. Sobre todas essas forças inconscientes, a nova burguesia, com seu desprezo a escritores e religiosos, poetas e andarilhos, gente que não produz coisas que se vendem, pior que isso, gente que não os respeita. Desde então ( 1750/ 1800 ) se institui essa briga entre o mundo burguês, materialista, produtivo, trabalhador, e o mundo aristocrático da arte, imaterial, não produtivo, atemporal. Essa briga, que nasce aqui vive até o modernismo ( 1920 ), hoje se percebe que a arte de certo modo capitulou.
Otto relembra o fato de que até o iluminismo cientistas eram artistas. Galileu ou Bacon eram grandes escritores, e ao se fazer uma máquina de fábrica ou uma usina se pensava em beleza e harmonia. A máquina tinha enfeites, arabescos, beleza "inutil". É aqui que se dá a separação entre arte e ciência, o homem de ciência pouco se preocupando com a escrita ou com o belo. As fábricas se tornam galpões horrendos, as mãquinas mecanismos monstruosos. O pré-romantismo se ergue contra isso, dái seu passadismo, sua saudade.
Shakespeare como o conhecemos nasce aqui. Ele é traduzido para todas as linguas e se torna o Gênio, o mito a ser seguido, o homem sem regras, sem freios, sem grande cultura que criou magia a partir do nada, o homem que foi pura inspiração. Um mito claro, mas o romantismo ama os mitos, crê neles e jamais no óbvio. O óbvio não é arte, não é vida e nunca será novo.
Carpeux desenterra nomes meio esquecidos: Shaftesbury, Galiani, Vauvenargues. Todos grandes otimistas que acreditaram na nobreza do homem, na contínua evolução do mundo, não pela ciência e técnica, mas sim por ações baseadas em bondade e coragem. Esses nomes, melancólicos ativos, tristes otimistas, tiveram uma influência continental em seu tempo, foram centro de debates, mudaram a vida.
É claro que Otto fala de Rousseau, de Voltaire, Jane Austen, Schiller, Sterne, Fielding, Defoe, Goethe, Vico, Choderlos de Laclos, nomes centrais, conhecidos até este século, reeditados ao infinito. Mas é nos pequenos casos, nos nomes outrora grandes e agora esquecidos que reside a magia deste belo livro.
E fica uma lição: A arte só voltará a ser protagonista quando ela voltar a ser 100% arte. Quando ela deixar de cortejar a ciência e o trabalho e retornar a sua condição de aristocrata, de vagabunda, de religião sem igreja e principalmente de cultora do belo e do inutil. Enquanto não renascer essa coragem, que ridiculo, continuaremos a a ver essa arte que cultua o útil, o esforço e o ser como todos são.
O ROMANTISMO POR CARPEAUX, AFINAL, ELE AINDA VIVE?
Se eu tivesse de escrever uma obra sobre a musica pop teria dificuldades em ser imparcial ao relatar as fases 61-67, 83-88 e 2005-2012; porque são as épocas que Menos gosto. Os elogios pareceriam forçados, as críticas muito fortes. Carpeaux por mais que disfarça, não gosta do romantismo, daí que seus elogios parecem artificiais e suas críticas exageradas. Como apaixonado pela literatura do século XVII, Otto, lógico, não pode compreender completamente o romantismo. Não o aceita.
Românticos são narcisos. Em tudo aquilo que colocam o olhar vêem um EU. Suas obras sempre falam de um Ego em luta contra o Mundo. Daí a imensa quantidade de heróis e de sofredores. Napoleão é o guia dessa geração. Napoleão é amado como o indivíduo contra o mundo, ou odiado como o vilão que vulgarizou o planeta. Nunca é ignorado. Otto Maria Carpeaux não aceita essa literatura. Daí passar o livro inteiro chamando os autores da época de "esquisitões", "neuróticos" ou "paranóicos". Ele cria diagnósticos e analisa pouco.
É verdade, nunca houve tanto poeta suicida como nessa época, nunca aconteceu de tantos morrerem tão cedo ou acabarem como mendigos ou loucos internados. Mas ele deveria dizer como isso aconteceu e não se contentar com um veredito. O que levou tantos a esse caminho?
Por volta de 1800 acaba a imagem do artista como "protegido dos nobres". Com a ascensão da classe média e o fim da nobreza como classe central-única, os artistas devem, pela primeira vez, lutar pelo sustento "se vendendo". Precisam agradar a burguesia, agradar aos jornalistas, produzir muito, adivinhar o que o público deseja. É aqui que surge o conceito de best-seller, um gênero criado inconscientemente por Walter Scott. Os artistas mais sensíveis, incapazes de se adaptar a esse mundo de fábricas, relógios e competição, sucumbem.
Aviso que não sou um grande fã dos romanticos. Apesar de ser a época de Stendhal, Keats e Wordsworth, me incomoda essa obsessão pelas dores da vida, pelas injustiças. Estou muito mais perto de Montaigne ou de Sterne que de Hugo ou Byron. Mas tenho de admitir, eles foram grandes, muito grandes, e até agora ( mas já em franca decadência ), aquilo que entendemos por "artista" está muito próximo daquilo que foi Beethoven, Byron ou Victor Hugo. O indivíduo em luta contra o meio injusto. O anjo caido.
Falar de tudo o que o livro diz é impossível. São milhares de autores. Destaco alguns, não necessariamente os maiores. Vejam Walter Scott. Ele é até hoje o mais best-seller dos best-sellers. Mais que Dumas, Verne ou Conan Doyle, Scott criou aquilo que chamamos ainda de "romance popular". Influenciou toda a Europa, vendeu aos milhões ( em 1815, em 1820 !!! ). Ele criou o romance medieval, o romance de viagens, o romance de aventuras histórico. Tudo o que vemos nas livrarias que traga algo de gótico, de romanesco, de "passadista" tem uma dívida com Walter Scott. Ele cria o romantismo de evasão, o livro que nos faz "ir embora para lugares miticos".
Otto considera Kierkegaard o grande filósofo romântico. Seu mergulho no Eu chega ao paradoxo: negar o Eu. Kierkegaard chega a conclusão que o homem deve tomar uma decisão existencial, negar a Deus, e viver na animalidade absoluta do aqui e agora, ou aceitar Deus, negar o Eu, e viver no compromisso com o Outro. Schopenhauer e Hegel seriam os outros filósofos românticos, um com seu nada e o outro com sua dialética histórica.
Em termos de história do período, Otto, que era austríaco, coloca neste período o fim da verdadeira Viena. A cidade barroca, católica, sensual, feliz, riquíssima, seria sufocada por Berlim e seu espírito gótico, luterano. Fato pouco lembrado e muito importante, Otto Maria Carpeaux une religião e arte, religião e filosofia, dessa forma, a arte do romantismo se liga a um renascimento católico, assim como o realismo é a confirmação do positivismo e nossa arte atual é filha de um "vale tudo" pseudo-religioso. Para quem acha que nosso tempo é o mais ateu dos tempos, esse foi o século XVIII. Século que culmina na Revolução.
Stendhal é um dos que Otto salva. Isso porque, em estilo, ele é muito mais século XVIII que XIX. Sua alma é racionalista. Coisa admirável, Stendhal é tão inteligente que a psicologia de seus livros é válida até hoje. O que os personagens fazem, sentem, pensam, é aquilo que fazemos, pensamos e sentimos até hoje. É o maior dos psicólogos romancistas.
Devo dizer ainda que Otto preserva de suas críticas o pré-romantismo, esse romantismo de 1790, de Wordsworth e Coleridge, a poesia dos lagos, a poesia daqueles que negam a vida moderna e se isolam nas matas, em contemplação, em adoração ao mundo natural. São os poetas que percebem um universo numa gota de chuva. E que falam de pobres agricultores como se fossem reis.
Gogol, Hans Christian Andersen, Shelley, Heine, Thoreau, Emerson, uma linha infindável de nomes, grandes, pequenos, esquecidos, vivos. Um grande livro, mas da série de Carpeaux é o pior.
Românticos são narcisos. Em tudo aquilo que colocam o olhar vêem um EU. Suas obras sempre falam de um Ego em luta contra o Mundo. Daí a imensa quantidade de heróis e de sofredores. Napoleão é o guia dessa geração. Napoleão é amado como o indivíduo contra o mundo, ou odiado como o vilão que vulgarizou o planeta. Nunca é ignorado. Otto Maria Carpeaux não aceita essa literatura. Daí passar o livro inteiro chamando os autores da época de "esquisitões", "neuróticos" ou "paranóicos". Ele cria diagnósticos e analisa pouco.
É verdade, nunca houve tanto poeta suicida como nessa época, nunca aconteceu de tantos morrerem tão cedo ou acabarem como mendigos ou loucos internados. Mas ele deveria dizer como isso aconteceu e não se contentar com um veredito. O que levou tantos a esse caminho?
Por volta de 1800 acaba a imagem do artista como "protegido dos nobres". Com a ascensão da classe média e o fim da nobreza como classe central-única, os artistas devem, pela primeira vez, lutar pelo sustento "se vendendo". Precisam agradar a burguesia, agradar aos jornalistas, produzir muito, adivinhar o que o público deseja. É aqui que surge o conceito de best-seller, um gênero criado inconscientemente por Walter Scott. Os artistas mais sensíveis, incapazes de se adaptar a esse mundo de fábricas, relógios e competição, sucumbem.
Aviso que não sou um grande fã dos romanticos. Apesar de ser a época de Stendhal, Keats e Wordsworth, me incomoda essa obsessão pelas dores da vida, pelas injustiças. Estou muito mais perto de Montaigne ou de Sterne que de Hugo ou Byron. Mas tenho de admitir, eles foram grandes, muito grandes, e até agora ( mas já em franca decadência ), aquilo que entendemos por "artista" está muito próximo daquilo que foi Beethoven, Byron ou Victor Hugo. O indivíduo em luta contra o meio injusto. O anjo caido.
Falar de tudo o que o livro diz é impossível. São milhares de autores. Destaco alguns, não necessariamente os maiores. Vejam Walter Scott. Ele é até hoje o mais best-seller dos best-sellers. Mais que Dumas, Verne ou Conan Doyle, Scott criou aquilo que chamamos ainda de "romance popular". Influenciou toda a Europa, vendeu aos milhões ( em 1815, em 1820 !!! ). Ele criou o romance medieval, o romance de viagens, o romance de aventuras histórico. Tudo o que vemos nas livrarias que traga algo de gótico, de romanesco, de "passadista" tem uma dívida com Walter Scott. Ele cria o romantismo de evasão, o livro que nos faz "ir embora para lugares miticos".
Otto considera Kierkegaard o grande filósofo romântico. Seu mergulho no Eu chega ao paradoxo: negar o Eu. Kierkegaard chega a conclusão que o homem deve tomar uma decisão existencial, negar a Deus, e viver na animalidade absoluta do aqui e agora, ou aceitar Deus, negar o Eu, e viver no compromisso com o Outro. Schopenhauer e Hegel seriam os outros filósofos românticos, um com seu nada e o outro com sua dialética histórica.
Em termos de história do período, Otto, que era austríaco, coloca neste período o fim da verdadeira Viena. A cidade barroca, católica, sensual, feliz, riquíssima, seria sufocada por Berlim e seu espírito gótico, luterano. Fato pouco lembrado e muito importante, Otto Maria Carpeaux une religião e arte, religião e filosofia, dessa forma, a arte do romantismo se liga a um renascimento católico, assim como o realismo é a confirmação do positivismo e nossa arte atual é filha de um "vale tudo" pseudo-religioso. Para quem acha que nosso tempo é o mais ateu dos tempos, esse foi o século XVIII. Século que culmina na Revolução.
Stendhal é um dos que Otto salva. Isso porque, em estilo, ele é muito mais século XVIII que XIX. Sua alma é racionalista. Coisa admirável, Stendhal é tão inteligente que a psicologia de seus livros é válida até hoje. O que os personagens fazem, sentem, pensam, é aquilo que fazemos, pensamos e sentimos até hoje. É o maior dos psicólogos romancistas.
Devo dizer ainda que Otto preserva de suas críticas o pré-romantismo, esse romantismo de 1790, de Wordsworth e Coleridge, a poesia dos lagos, a poesia daqueles que negam a vida moderna e se isolam nas matas, em contemplação, em adoração ao mundo natural. São os poetas que percebem um universo numa gota de chuva. E que falam de pobres agricultores como se fossem reis.
Gogol, Hans Christian Andersen, Shelley, Heine, Thoreau, Emerson, uma linha infindável de nomes, grandes, pequenos, esquecidos, vivos. Um grande livro, mas da série de Carpeaux é o pior.
BYRONISMO HOJE ( rock e romantismo )
O byronismo não é um estilo, é uma atmosfera, uma mentalidade, uma atitude em face da vida e da morte. Fala-se em Mal du siécle ou Weltschmerz. Ninguém ou quase ninguém pensava em imitar o estilo poético de Byron, todos só pensavam em imitar-lhe o gesto, a fronte pálida reclinada à mão, o olhar para longe onde há mulheres a amar e a corromper, povos a libertar. Foi esse tipo que conquistou o mundo.
Transcrevi esse parágrafo de Otto Maria Carpeaux em O Romantismo. Se voce tem por volta de 30 anos ou menos, não faz muita ideia do que seja a tal ATITUDE BYRONISTA perante a vida. Eu, infelizmente, não conheci outra coisa. Arte é para mim sempre byronismo, e o mundo, pena, é hoje materialista e comercialista. Enfim....
Como acontece com Oscar Wilde, se conhece muito o homem Byron, pouco se lê seus livros. Mas não foi sempre assim. Quando Byron surge, começos do século XIX, sua poesia torna-se sensação. O romantismo se confunde com seu nome. Porém, em 20 anos seu nome se faz maior que sua obra, ele passa a ser um tipo de Homem-Arte, celebridade. Odeia-se Byron, muito, ama-se Byron, muito mais. Por 150 anos ser artista é ser byronista.
Lord Byron, nobre decaído. Ser artista é ter esse ar de nobre que perdeu tudo, de alguém que nasceu na hora errada, no lugar errado. Muito tarde, muito cedo, seu tempo nunca é o tempo certo. Inadaptado, angustiado, excitado pela raiva e pela melancolia, ele se debate, sonha com outros mundos, viaja. Creia-me, antes de Byron esse não era o modelo do Artista. Um escritor, um pintor podia e geralmente era, completamente "de seu tempo e de seu lugar". Com pés firmes no chão, ligado a realidade, gênios como Cervantes ou Moliére nada possuem de "sentir-se de outras eras". Byron não. Ele, solitário radical, porém cercado de amantes, nunca está aqui. Vive sempre lá.
Místico, mesmo sendo cético, Byron populariza o satanismo. Flerta com o anjo caído, o anjo negro da noite e do pecado. Byron ousa. Inaugura isso também, o artista como pecador. Byron se droga, dorme com a irmã, blasfema, peca. E goza. É o homem mais famoso da Europa. Bate em popularidade Goethe e Beethoven. É um tempo de titãs.
Byron parte, viaja. Mete-se em revoluções, ajuda anarquistas. Onde houver ação, ele lá estará. Mas suas causas devem ser as perdidas. Byron perde sempre. E morre nas trincheiras, na Grécia amada, lutando pela independência do país. Um fim digno de sua vida. Um fim artístico.
Pois bem, por 150 anos esse será o modelo. De DH Lawrence a Heminguay, de Jean Cocteau a Joyce, todos serão em algum aspecto byronistas. Gauguin, Modigliani, Lorca... a ansiedade, a vida como obra, a obra como tentativa de inovação, a criação de um mito, a crença em outros caminhos, a inadaptabilidade ao tempo. Mas, claro, esse byronismo vai se tornando cada vez mais "fake", de segunda e terceira mão, cada vez mais impossível.
Quando o rock explode os mais espertos logo surrupiaram o modo Byron de ser. Mick Jagger passa dez anos em poses de Lord Byron. Satânico, pecador, dúbio, entediado. Com ele vem toda uma leva de byronistas do rock, entre eles os mais ingênuos morreram ( Jim Morrison, Brian Jones, Nick Drake, Ian Curtis ), os mais espertos se tornaram cínicos ( o próprio Jagger, Bowie, Kevin Ayers ) ou trocaram Byron por Shelley ( Van Morrison, Bryan Ferry ). Quase todos ingleses, nos EUA o rock é folclore, todo rock star americano desde sempre é whitmaniano, ( com alguns anjos de Allan Poe como Lou Reed e Patti Smith ). Weeellll....
Penso então que é por isso que tenho imensa dificuldade de levar o rock de agora a sério. A ênfase em Byron se foi. Uns poucos ainda bebem na fonte de Shelley ou de Wilde, mas quase todos são filhos da era naturalista, arte para eles é apenas "observação acurada da vida". Sempre vou pensar que isso não é arte. É jornalismo.
Transcrevi esse parágrafo de Otto Maria Carpeaux em O Romantismo. Se voce tem por volta de 30 anos ou menos, não faz muita ideia do que seja a tal ATITUDE BYRONISTA perante a vida. Eu, infelizmente, não conheci outra coisa. Arte é para mim sempre byronismo, e o mundo, pena, é hoje materialista e comercialista. Enfim....
Como acontece com Oscar Wilde, se conhece muito o homem Byron, pouco se lê seus livros. Mas não foi sempre assim. Quando Byron surge, começos do século XIX, sua poesia torna-se sensação. O romantismo se confunde com seu nome. Porém, em 20 anos seu nome se faz maior que sua obra, ele passa a ser um tipo de Homem-Arte, celebridade. Odeia-se Byron, muito, ama-se Byron, muito mais. Por 150 anos ser artista é ser byronista.
Lord Byron, nobre decaído. Ser artista é ter esse ar de nobre que perdeu tudo, de alguém que nasceu na hora errada, no lugar errado. Muito tarde, muito cedo, seu tempo nunca é o tempo certo. Inadaptado, angustiado, excitado pela raiva e pela melancolia, ele se debate, sonha com outros mundos, viaja. Creia-me, antes de Byron esse não era o modelo do Artista. Um escritor, um pintor podia e geralmente era, completamente "de seu tempo e de seu lugar". Com pés firmes no chão, ligado a realidade, gênios como Cervantes ou Moliére nada possuem de "sentir-se de outras eras". Byron não. Ele, solitário radical, porém cercado de amantes, nunca está aqui. Vive sempre lá.
Místico, mesmo sendo cético, Byron populariza o satanismo. Flerta com o anjo caído, o anjo negro da noite e do pecado. Byron ousa. Inaugura isso também, o artista como pecador. Byron se droga, dorme com a irmã, blasfema, peca. E goza. É o homem mais famoso da Europa. Bate em popularidade Goethe e Beethoven. É um tempo de titãs.
Byron parte, viaja. Mete-se em revoluções, ajuda anarquistas. Onde houver ação, ele lá estará. Mas suas causas devem ser as perdidas. Byron perde sempre. E morre nas trincheiras, na Grécia amada, lutando pela independência do país. Um fim digno de sua vida. Um fim artístico.
Pois bem, por 150 anos esse será o modelo. De DH Lawrence a Heminguay, de Jean Cocteau a Joyce, todos serão em algum aspecto byronistas. Gauguin, Modigliani, Lorca... a ansiedade, a vida como obra, a obra como tentativa de inovação, a criação de um mito, a crença em outros caminhos, a inadaptabilidade ao tempo. Mas, claro, esse byronismo vai se tornando cada vez mais "fake", de segunda e terceira mão, cada vez mais impossível.
Quando o rock explode os mais espertos logo surrupiaram o modo Byron de ser. Mick Jagger passa dez anos em poses de Lord Byron. Satânico, pecador, dúbio, entediado. Com ele vem toda uma leva de byronistas do rock, entre eles os mais ingênuos morreram ( Jim Morrison, Brian Jones, Nick Drake, Ian Curtis ), os mais espertos se tornaram cínicos ( o próprio Jagger, Bowie, Kevin Ayers ) ou trocaram Byron por Shelley ( Van Morrison, Bryan Ferry ). Quase todos ingleses, nos EUA o rock é folclore, todo rock star americano desde sempre é whitmaniano, ( com alguns anjos de Allan Poe como Lou Reed e Patti Smith ). Weeellll....
Penso então que é por isso que tenho imensa dificuldade de levar o rock de agora a sério. A ênfase em Byron se foi. Uns poucos ainda bebem na fonte de Shelley ou de Wilde, mas quase todos são filhos da era naturalista, arte para eles é apenas "observação acurada da vida". Sempre vou pensar que isso não é arte. É jornalismo.
MANFREDO- LORD BYRON, O HOMEM COMO TENTATIVA DE SER SOBRE-HUMANO
Não poder morrer e não poder mais viver. Saber tudo o que é a vida, e saber que esse saber é nada. Definhar ficando cada vez mais forte. O tédio de viver, a vida como algo que nada tem a oferecer.
Obedecer apenas a si-mesmo. Sem igreja, sem governo e sem ciência. Criar sua igreja pessoal, seu governo próprio e sua ciência. E então descobrir que mesmo seu Eu Não é Seu.
Alma romântica, indestrutível alma atormentada. Ela morreu? Nunca mais. Somos todos, mais de duzentos anos passados, ainda românticos. Com apenas uma diferença, crucial: Somos acomodados. O tédio era combatido com a procura da loucura, do êxtase, da criação. Hoje esperamos que nos vendam essa experiência. Nada criamos. But...
Manfredo é de 1815. Byron fala em forma de teatro de um homem que tem o poder. Ele sabe tudo e invoca espíritos do universo. O que deseja Manfredo? Esquecer. E ninguém pode lhe dar esse esquecimento. Manfredo tem o desespero extremo. Mais que morrer, ele queria nunca ter sido.
Leio a peça e ainda sinto a febre. Ela se passa no alto dos Alpes, em solidão. A morte sempre perto, a dor mais dolorosa, o abismo e a vertigem. Byron. Leio e sinto a febre. A dor da minha adolescência. O tempo em que eu queria tudo, queria saber, queria sentir. A noite, o dia, a febre. Byron me faz sentir essa dor nessa hora e meia em que leio seu texto. Frases que entram em mim e me levam de volta ao lugar de onde nunca estive ausente.
Na Europa, no mundo, Byron foi o rei. Goethe, Napoleão, Beethoven e Hugo. Superstars. Cada época tem suas estrelas. Até em São Paulo, fim do mundo em 1820, jovens queriam ser Byron. E o que era ser Byron? Viver em absoluto limite. Provar venenos e néctar, amor suicida e sexo viciante. Românticos. Keats morreu doente. Shelley se afogou na Itália. Byron morreu na guerra, lutando como voluntário pela liberdade da Grécia. Drogas, sexo e poesia. A galéra dos anos 60 foi a última a tentar ser Byron. Ambiguidade. Hermafroditismo. Satanismo. Loucura. Em 2012 a gente assiste Crepúsculo e acha que Von Trier é o cara. No conforto de uma sala high-tech e com pílulas de "ficar doidão" à mão tentamos matar nosso tédio romântico, acalmar nossa ânsia por saber.
Manfredo não é Fausto. Fausto faz um pacto com o diabo, Manfredo nem no diabo confia.
Byron tinha fixação por Prometeu, o deus que deu ao homem o fogo da inteligência. O deus que pagou por nós, pois Zeus raivoso o fez passar o resto dos tempos tendo o fígado comido por abutre. Manfredo é Prometeu. O abutre é ele mesmo. Ele se come.
Byron dormia com a própria irmã. Para ele era natural. Platão dizia que somos seres incompletos a procura da alma irmã. Byron teve zilhões de amantes ( apesar de coxo ), homens, mulheres, sexo grupal, hermafroditismo. Mas foi sua irmã seu grande amor. Mas até Byron sentiu culpa. Manfredo é essa culpa.
A linguagem de Byron é musical. Magnífica. Tchaikovski viria a musicar a peça. Schumann também. Em 2002 foi apresentada no teatro São Carlos em Lisboa. É essa tradução que li ( João Almeida Flor ), muito satisfatória.
Manfredo, o homem que não se sentia humano....Que sublime beleza fez-se aqui!
Obedecer apenas a si-mesmo. Sem igreja, sem governo e sem ciência. Criar sua igreja pessoal, seu governo próprio e sua ciência. E então descobrir que mesmo seu Eu Não é Seu.
Alma romântica, indestrutível alma atormentada. Ela morreu? Nunca mais. Somos todos, mais de duzentos anos passados, ainda românticos. Com apenas uma diferença, crucial: Somos acomodados. O tédio era combatido com a procura da loucura, do êxtase, da criação. Hoje esperamos que nos vendam essa experiência. Nada criamos. But...
Manfredo é de 1815. Byron fala em forma de teatro de um homem que tem o poder. Ele sabe tudo e invoca espíritos do universo. O que deseja Manfredo? Esquecer. E ninguém pode lhe dar esse esquecimento. Manfredo tem o desespero extremo. Mais que morrer, ele queria nunca ter sido.
Leio a peça e ainda sinto a febre. Ela se passa no alto dos Alpes, em solidão. A morte sempre perto, a dor mais dolorosa, o abismo e a vertigem. Byron. Leio e sinto a febre. A dor da minha adolescência. O tempo em que eu queria tudo, queria saber, queria sentir. A noite, o dia, a febre. Byron me faz sentir essa dor nessa hora e meia em que leio seu texto. Frases que entram em mim e me levam de volta ao lugar de onde nunca estive ausente.
Na Europa, no mundo, Byron foi o rei. Goethe, Napoleão, Beethoven e Hugo. Superstars. Cada época tem suas estrelas. Até em São Paulo, fim do mundo em 1820, jovens queriam ser Byron. E o que era ser Byron? Viver em absoluto limite. Provar venenos e néctar, amor suicida e sexo viciante. Românticos. Keats morreu doente. Shelley se afogou na Itália. Byron morreu na guerra, lutando como voluntário pela liberdade da Grécia. Drogas, sexo e poesia. A galéra dos anos 60 foi a última a tentar ser Byron. Ambiguidade. Hermafroditismo. Satanismo. Loucura. Em 2012 a gente assiste Crepúsculo e acha que Von Trier é o cara. No conforto de uma sala high-tech e com pílulas de "ficar doidão" à mão tentamos matar nosso tédio romântico, acalmar nossa ânsia por saber.
Manfredo não é Fausto. Fausto faz um pacto com o diabo, Manfredo nem no diabo confia.
Byron tinha fixação por Prometeu, o deus que deu ao homem o fogo da inteligência. O deus que pagou por nós, pois Zeus raivoso o fez passar o resto dos tempos tendo o fígado comido por abutre. Manfredo é Prometeu. O abutre é ele mesmo. Ele se come.
Byron dormia com a própria irmã. Para ele era natural. Platão dizia que somos seres incompletos a procura da alma irmã. Byron teve zilhões de amantes ( apesar de coxo ), homens, mulheres, sexo grupal, hermafroditismo. Mas foi sua irmã seu grande amor. Mas até Byron sentiu culpa. Manfredo é essa culpa.
A linguagem de Byron é musical. Magnífica. Tchaikovski viria a musicar a peça. Schumann também. Em 2002 foi apresentada no teatro São Carlos em Lisboa. É essa tradução que li ( João Almeida Flor ), muito satisfatória.
Manfredo, o homem que não se sentia humano....Que sublime beleza fez-se aqui!
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