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O LIVRO DOS ESNOBES - WILLIAM MAKEPEACE THACKERAY

Publicado na revista Punch, a série de escritos de Thackeray sobre os esnobes fez sua fama. Satírico, sem medo nenhum de desagradar, o autor critica a mais odiosa das instituições inglesas: o esnobe. Cada capítulo-artigo fala sobre a atuação dos esnobes em clubes, no campo, entre militares, clérigos, nobres, em jantares etc etc etc. Para o autor, com sua cara vermelha, mal humor eterno, olhar superior e um modo curto de ver a vida, o esnobe tem na Inglaterra sua capital e sua fábrica de novos idiotas. Sim, pois para ele, todo esnobe é sempre um idiota. E também um perfeito inutil. ------------------- Thackeray começa dizendo que aquilo que constroi um esnobe é seu séquito de aduladores. Cerque um homem de puxa sacos e voce construirá um esnobe. A página dos jornais que então, 1846, tinham por objetivos publicar coisas como: Lord Arthur de Glenville comprou um novo cavalo, ou então: Lady Birgid Shaw recebe hoje Lady Agatha D'Ascoyne, de volta de tour pelo continente, alimentam a doença nacional inglesa: a adoração aos esnobes. Ingleses amam esnobes por serem esnobes. Não faz sentido, mas é o que o inglês faz. Um vício. -------------- O esnobe se caracteriza por ser inutil. Seus interesses são o jogo, o fumo, o vinho, o clube. Ele jamais fala com quem lhe é inferior e quando o faz, ele olha para o lado enquanto fala duas palavras com o dono do restaurante ou com o pobre cavalariço. Todas as suas relações são de interesse e para ele tudo que existe no mundo gira ao seu redor. O esnobe tem títulos de nobreza, muitos títulos, tem brasões familiares, tem sangue puro. E toda sua vida se resume à isso: ele nasceu superior e então não é preciso fazer mais nada. Por causa de um antepassado que matou meia dúzia de vikings, John é hoje um barão e ele vive ainda, e para sempre, às custas desse matador de vikings. Não faz sentido algum, mas é assim. ------------- Me pego rindo com este livro e nada é mais engraçado que o esnobe no continente, o modo como ele acha italianos, espanhois e alemães inferiores e o ódio que toda Europa tem pelos ingleses, com suas roupas exageradas, sua mania de tagarelar em alto som sobre a superioridade de tudo que é inglês. Turistas ingleses viajam para poder falar que a Inglaterra é melhor e maior. Mais nada. ------------ O esnobe hoje é um artista, um atleta, um animal da midia, lógico. É sobre eles que os jornais falam e é neles que se divulga tolices. O ator B cse divorciou, a cantora H está grávida e o atleta Y se mudou para a Grécia. Cercados por fãs, eles se tornam esnobes, presos dentro de si mesmos, com o tempo se fazem inuteis e vazios. ----------- Thackeray é o autor de Barry Lyndon, Vanity Fair, e foi, ao lado de Dickens, o escritor mais famoso de seu tempo. Humorista, ele percebia o ridículo que o cercava e assim foi o continuador da tradição de Swift e Sterne. Em 2023 ler Thackeray ainda é um prazer.

BARRY LYNDON, STANLEY KUBRICK E THACKERAY

William Makepeace Thackeray era o grande rival de Dickens. Portanto ele viveu por volta de 1830. Satirista, seu livro mais famoso e Feira de Vaidades. Barry Lyndon, que li a algumas décadas, é dos menos lidos. Lembro que gostei. Thackeray escreve simples, direto, tem soberbo poder de observação. É um desses autores que pessoas cultas liam muito por volta dos anos de 1960. Hoje, pessoas cultas, se é que existem, conhecem Tolstoi, Dostoievski e Jane Austen. O século do romance está reduzido a isso. Mesmo o famosíssimo Balzac é pouco lido agora. Pauline Kael escreveu uma vez que todo filme de Kubrick parece-se com um professor alemão contando um caso. Barry Lyndon é Herr Kubrick narrando Thackeray em tradução alemã. Veja que ele conseguiu fazer do muito vivo, engraçado e sexy Lolita, uma coisa cinza, fria e analítica. Nas mãos de Kubrick, Nabokov virou Thomas Mann. Thackeray se tornou algo parecido com Broch. Chato? Jamais! Os figurinos de Milena Canonero são das coisas mais lindas já vistas em cinema. As paisagens são de tirar o fôlego. E o diretor de fotografia, John Alcott, desenvolveu aqui, junto à Kodak, um tipo de filme hiper sensível que conseguia captar imagens nítidas quase no escuro. É o primeiro filme da história a mostrar, de fato, como era a luz nos palácios de então. Cenas noturnas usam apenas velas como fonte de iluminação. Logo no começo do filme percebemos o famoso erro que Kubrick sempre comete: péssima escolha de elenco. Ryan O'Neal se torna cômico. É um trintão que deveria ter rosto de 18 anos. Por ser velho para toda a primeira parte do filme, Ryan faz com que Barry pareça meio retardado. Para quem leu o livro fica imperativo o imaginar como um menino. Para quem não o leu, ele irá parecer absurdo. Não nos esqueçamos que Kubrick é o cara que escalou Tom Cruise como austríaco, Jack Nicholson como um escritor ( O Iluminado perde muito ao vermos desde a primeira cena que o escritor é Jack, portanto, um maluco em potencial ). Kubrick escalou uma Lolita velha e fria e um Humbert Humbert com o rosto nada sedutor de James Mason ( no livro ele se dá bem com as mulheres e escolhe Lolita ). Seu único acerto foi Peter Sellers em Dr Fantástico, e essa foi uma escolha da produção. Well....voltemos ao filme. E elogiemos agora Kubrick, pois apesar dos erros, se trata de um diretor muito, muito cheio de ideias. Ritmo. Esse o grande mérito do filme. O seu ritmo. Todas as cenas, e creia-me, isso é muito dificil de fazer, têm exatamente o mesmo ritmo. Se voce as reger com a mão, como um maestro, todas irão ter o mesmo andamento: Majestoso. Sem pressa, sem lentidão. Exato. Eis o aspecto alemão de Kubrick. A câmera fechada em close vai se abrindo: eis a cena inteira. A primeira metade do filme, a que mostra o primeiro amor de Barry, o duelo, a fuga, o exército, a guerra, o encontro com os jogadores de cartas, o irlandês rico e exilado que ele deveria espionar, toda essa hora e meia é sublime. O filme consegue ser frio porém belo, pausado e ao mesmo tempo aventuroso. É o mundo de Casanova, mas não se engane, é o século XVIII visto por alguém que não está interessado em mostrar como ele era, mas sim em fazer cinema a seu modo. Thackeray é apenas um pretexto, assim como o mais belo dos séculos é apenas decoração. Em 1770 as pessoas não era frias. Não eram caladas ( não mesmo, pois nunca mais se falou tanto como então ) e eram bastante indiscretas. Tom Jones de Tony Richardson, um filme bastante pior e bastante melhor sucedido, mostra muito melhor o que era viver no século da luzes. Na segunda parte o filme cai muito. Jamais entedia, mas a cena da morte do menino, absurda, digna de um dramalhão italiano, compromete o resultado geral. Barry erra. E paga por isso. Século XVIII...não há nada mais fascinante na história. Nossa época é nada ao lado daquela. O mundo ganharia muito se parasse um pouco de cultuar uma idade média de cartoons e estudasse o século de Mozart e Voltaire.