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EXPOR SUA ALMA? EIS ALGO INCOMPREENSÍVEL PARA MOZART, SHAKESPEARE OU PLATÃO
Continuo a ler o belo livro de Isaiah Berlin sobre a radical mudança operada na mente humana entre 1770-1820. Mudança tão radical, que nós, duzentos anos depois, ainda estamos vivendo dentro dessa mudança. Pois basta pensar no seguinte. ------------- Um artista clássico diante de uma tela se propõe a pintar seu tema o melhor possível. Se ele imaginar uma inovação, ela terá por objetivo fazer de sua obra algo ainda mais perfeito. A meta é sempre a da perfeição. ---------- Agora digamos que ele sofra a morte de um filho durante a execução dessa obra. Ele irá talvez adiar a entrega. Mas nunca passará pela sua mente colocar sua dor dentro da obra. Ele não expressa seu eu. Ele constroi a perfeição. -------------- Isso para nós é incompreensível, assim para eles seria algo muito esquisito, para não dizer de extremos mal gosto, colocar seus sentimentos pessoais dentro do seu trabalho. Pois ele tem a certeza que ninguém está interessado em algum EU isolado, mas sim no TODO. ------------- Por isso críticos pós romantismo sofrem tanto para entender quem foi Mozart ou Rembrandt. Eles executavam um trabalho, não exibiam seu eu. E mais incrível para nós, o conceito de criatividade era completamente outro. ------------------ Voce criava para resolver um problema técnico. Mais uma vez, o objetivo era a perfeição. No romantismo começou a ideia de que criar era a meta em si. Se era original porque o seu EU era único e para o expressar era preciso fazer algo único. Se antes o que definia a criação era a perfeição, agora é a criatividade. O que o público culto quer é algo NUNCA FEITO ANTES. Antes era ALGO DE ABSOLUTAMENTE PERFEITO. -------------------- Interessante observar, e desenvolverei isso em outro post, que toda essa mudança acontece por causa de uma guerra. A Alemanha, humilhada e empobrecida pela França na guerra dos 30 anos, passa a odiar tudo que seja francês, e francesa é a razão iluminista, a frieza bem pensada, o cartesianismo, a matemática, a matéria, os modos de convenção. Como reação, pensadores alemães passam a pregar o irracionalismo, a magia, o que é tenebroso, primitivo, o que desperta o medo. Abre-se o caminho para o artista isolado, solitário, raivoso, diabólico, que não se preocupa com o público pois em seu universo só existe o seu EU. O artista que cria para si mesmo. O anti Mozart, o anti França, o anti sociedade culta, está aberto o caminho para Beethoven, Dostoievski, Baudelaire e Van Gogh. ----------------- E nossa noção de artista, de pensador, de ser humano bem dotado, até hoje é o modelo do homem que vive sua vida e sua missão. Ùnico e original. --------------------------- Interessante vulgarizar isso e levar à cultura POP. John Lennon seria quase 100% um romântico, pois tudo nele é expressão de seu interior único. Ninguém pode ser um clássico no mundo pós 1770, mas Paul MacCartney guarda algo da reserva, do pudor e do objetivo perfeccionista do artista anterior ao romantismo. Deixo então a pergunta: quem é mais romântico? Bowie ou Lou Reed? Sex Pistols ou The Clash? Ingmar Bergman ou Kurosawa? Spielberg ou Lucas? O cinema clássico americano, Ford, Hawks, Wyler, era romântico?
isaiah Berlin e O ROMANTISMO
Isaiah Berlin foi um dos mais importantes intelctuais do século XX. Estou lendo um livro que transcreve quatro palestras feitas sobre o Romantismo. Para Berlin, o romantismo foi e é o mais importante movimento da história. Somos hoje aquilo que ele, o romantismo, criou. O homem que existia antes de 1780 nos é quase incompreensível. ------------------ Basta dizer o seguinte: para a arte de antes, originalidade era um valor irrelevante. Quando Da Vinci ou Giotto criam uma novidade, o obejtivo é alcançar uma VERDADE, e não SER ORIGINAL. Toda vida moral, intelctual, filosófica, de então, busca o APRIMORAMENTO, a perfeição. Com o romantismo, a criação ÚNICA, ORIGINAL, SEM IGUAL passa a ser o maior valor. É o momento decisivo em que o EGO sobressai ao SOCIAL. -------------------- Vamos pensar outra vez. Voce consegue, tataraneto do romantismo, entender que Shakespeare não tinha problema algum em unir duas peças italianas e daí compor uma peça? Que isso não era plágio mas sim aperfeiçoar, embelezar o que já havia e era de todos? Voce consegue entender que até 1780, mais ou menos, um artista, um filósofo, se sentava para trabalhar pela verdade, pelo bem, pela beleza e não para criar algo de novo? E que quando surgia algo de inédito, o objetivo não era SER ÚNICO, mas sim chegar à um OBJETIVO? O Bem. A Verdade. O Real. -------------------- Essa maneira de dar valor, de apreciar e produzir arte ou ideias, nos é incompreensível. Pois filhos do romantismo que somos, vemos a VIDA como busca por expressão. Queremos ser NÓS MESMOS, nos expressar com liberdade, ter um IDEAL e nesse ideal viver. Amamos gente que morreu, se sacrificou por um ideal e não entendemos que martires anteriores ao romantismo não se sentiram e jamais foram vistos como HEROIS individuais, mas antes como PARTES DE UM MOVIMENTO COLETIVO. A figura do heroi isolado, único e original nasce em fins do século XVIII. Alexandre, César, Joana D'Arc ou Carlos Magno não eram olhados como INDIVÍDUOS ORIGINAIS, mas como partes de um momento, componentes de uma coletividade, inspirados por deuses ou por Deus, não SERES SEM PARALELO. ------------------------ Havia um DESTINO, e Marco Antonio ou Dante seguia seu destino. Somento ao longo do romantismo se criou a ideia de que Dante era único, Marco Antonio lutava para ser ele mesmo ou que Cleopatra era consciente de seu valor. ------------------------ O romantismo inaugura o maior namoro da história do homem, o romance dele com seu ego. O que importa não é meu destino, meus deuses, meu grupo, o que importa é meu EU. E esse eu cria. Cria sua vida. Cria seu destino. Cria seu código moral. Cria seu VIDA. ------------------ E vejam que ainda nem falei da razão! Pois se antes o homem admirável era dono de sua razão, agora é admirável aquele que sente, que se comove, que age por emoção. O amor, antes um dos fatos da vida, passa a ser o centro da vida. O amor passa a ser parte de tudo. Se luta por amor à pátria, se morre por amor à um ideal, se compõe por amor à arte, tudo é amor e por isso tudo se torna nobre se for feito em nome de algum amor. Até a ciência passa a ser feita por amor ao conhecimento. Entenda, para um homem de 1600 isso não fazia sentido. Se fazia ciência para se saber algo. Se compunha uma canção por honra à Deus ou como um trabalho prazeroso. Até mesmo se casava por acerto racional ou afeto amigável. A hiper valorização do amor, dando à ele um poder que nunca houve antes, é invenção do romantismo. Faço um desafio: leia Fielding, Cervantes, Sófocles, mesmo Dante, e voce perceberá que mais importante que o amor é o dever, a honra, a vida social. Mesmo em Shakespeare, se voce ler sua peça mais "romatica", Romeu e Julieta, voce irá perceber que o amor ocupa muito menos espaço que 150 anos de romantismo nos fizeram crer. ---------------------------- O homem solitário que cria sua arte apesar de tudo. O ego lutando contra o meio. A sedução do sofrimento, da pobreza, da doença "por amor à algo". A beleza como valor que arrebata e não como algo que nos educa. São centenas de características romanticas tão cotidianas, aparentemente tão naturais, que não percebemos que foram criadas recentemente e surgiram em apenas 50 anos de mudanças. Da hiper valorização da juventude, à paixão pelo que é novo e original, tudo é invenção romântica. -------------- Falarei mais em outro post.
ISAIAH BERLIN FALA SOBRE EU E SOBRE VOCÊ.
Berlin é um dos mais respeitados intelectuais do século XX e deveria ser mais lido no XXI. Aqui ele fala da mais assombrosa mudança mental que o ser humano viveu: aquela que ocorreu entre os séculos XVIII e XIX. Vamos tentar explicar a meu modo...
Para ele, o mundo ocidental sofre três grandes mudanças em seu modo de pensar e de ver a vida. A primeira aconteceu logo ao fim da vida de Aristóteles. Até então, todo o pensamento era visto como algo a ser feito em grupo. Não se analisava o homem como um ser individual, mas sim como um ser dentro de um grupo social. Filósofos como Platão falam da coletividade, do todo, nunca do indivíduo. Mas, de repente, em meros 20 anos, surgem filósofos que analisam o homem como universo separado, como indivíduo, como ser a separado um do outro.
A segunda grande mudança vem na Renascença, quando o natural se separa do moral. A moral, a ética, o bem, deixa de ser um valor natural e passa a ser questão de escolha, de trabalho, de educação e esforço.
O terceiro, nossa mudança, pois dura até hoje, 2017, é aquela que se inicia com o romantismo.
A virtude, o bem e a verdade, sempre foram, por 5000 anos, vistos como o final da vida humana na Terra. A verdade existia como algo dado, bastava ao homem conseguir descobrir onde ela se encontrava. A religião, a ciência e a arte eram modos de se encontrar no mundo, no cosmos, essa verdade. E também a beleza, a ética, o sentido de tudo. A vida real estava então FORA DO HOMEM. Pois bem, Berlin explica, e eu me abstenho de transcrever aqui, o movimento mental e espiritual, o porque dos românticos terem criado uma nova verdade, aquela que diz que TODA VERDADE VIVE DENTRO DE CADA UM. Consequência imediata, se a verdade não está lá fora, então ela é relativa, cada um tem uma verdade particular, única, que independe do todo. Caminhando mais um pouco, vemos que o mundo lá fora perde valor, se torna sem verdade por si mesmo, sem sentido, apenas um tipo de cenário louco.
O romântico criou a ideia de que para uma vida valer a pena é preciso criar sua verdade, e ao mesmo tempo criar sua vida, ou seja, só o CRIADOR vive. O artista é o objetivo de todos, o SER superior é um artista. Veja, não um pintor ou um poeta, mas sim alguém que cria um modo de viver e de ser ÚNICO. Viver deixa de ser sobreviver ou cuidar ou lutar; se torna inventar.
O artista cria a partir do nada, cria dentro de si, o artista é LIVRE. Ele pensa, faz e acredita naquilo que sua liberdade quer. O homem se torna um ser que quer ser livre, livre para poder criar a si mesmo. E para ser livre, seu caminho se faz, logicamente, o do autodomínio. A dor, a idade, as emoções nos lembram que não somos livres. Então, passamos a vida negando a dor, negando o tempo, negando as emoções. Criamos uma liberdade que aprisiona, porque somos carcereiros do que a coloca em perigo. Vigilantes do nosso ser natural. Passamos a controlar a natureza, inimiga natural da liberdade.
Se antes a verdade estava lá fora, onde viveria Deus, a verdade, o sentido; agora Deus, a verdade e o sentido passa a ser uma questão de inventar e não mais de descobrir.
OS VALORES DEIXAM DE SER DESCOBERTAS. PASSAM A SER INVENÇÃO.
Hoje vivemos a guerra entre esses dois mundos: razão X liberdade.
A razão não é liberdade, a liberdade despreza a lógica. Pois a lógica é um valor que é o que é, independente do que eu queira ou deseje crer. Por isso a razão não pensa em termos e liberdade, ela pensa em termos de causas e consequências. A razão é sempre um bem comum, geral, não individual. Ela vive fora do querer ou do ser humanos. Ela está no universo. Pela razão pode se viver me paz, e só por ela, exatamente porque ela nega a individualidade e pensa em termos gerais.
A liberdade abomina a razão porque ela lhe lembra do fim das coisas, dos limites do corpo e das obrigações para com os outros e o mundo. É a liberdade, o desejo por querer ser livre, que leva às guerras, às injustiças, à destruição. Esse impulso, romântico, leva a destruição de tudo o que signifique limite, dever, senso comum.
Nada é mais odioso ao artista que o senso comum, ser mais um em meio ao todo.
Nessa atividade criativa, nessa incessante ação original, ousada, construtiva, não há mais espaço para o ócio e para o vazio. Viver é criar, viver é fazer e deixar uma marca. Nada mais odioso que o fazer nada, pensar a toa, viver sem deixar nada em sua passagem. Esse o mundo criado pela geração de Beethoven, Wagner, Goethe e Heine, a vida como luta incessante CONTRA A VIDA REAL, A VIDA LIMITADA.
O lema iluminista, anterior ao romantismo portanto, é: SABER PRIMEIRO, DEPOIS FAZER. O lema romântico, nosso lema até hoje, é: FAZER É SABER, ou seja, aprendemos fazendo, e assim, não nos preparamos para viver. Se antes ser um Homem era saber e pensar, agora ser Homem é fazer e agir. Fazer em impulso, não se omitir, tentar, mesmo que esse tentar seja um vexame, um desastre ou uma tragédia.
O passo último seria criar um outro mundo, um mundo onde TUDO fosse uma criação livre, sem a natureza, sem o "de fora", sem nenhuma força que não possa ser domada e sem NADA DE EXTERIOR. Do Marxismo às teorias de Freud, em todas vem a crença de que o Homem cria aquilo que ele é, de que a verdade se encontra dentro dele e só dentro dele, de que o Homem é o senhor da vida e único responsável por seu destino. Mesmo que histórico ou inconsciente, tudo é humano, tudo é do homem.
Observa a guerra religiosa e hoje. Ela seria incompreensível para um europeu de 1700.
Antes, um homem sabia que sua fé era a verdadeira por ser a fé de todos aqueles que viveram antes dele. Ele lamentava o islamita ou o judeu por serem enganados por uma fé falsa. Hoje há uma sutil e mortal diferença. Quem defende sua fé a defende por ser sua, por estar dentro de si, por ser mesquinhamente seu pertence, um objeto. Antes a fé era sagrada por ser de todos, comum, o maior valor DE TODOS. Hoje ela é ostentada como mais uma criação individual de um grupo de almas especiais e criativas. Um valor de classe, e não um valor de todos.
Termino dizendo que quando um cara como Hawkins, diz que a humanidade está pronta para deixar a Terra, vejo nessa frase perigosa todo o epílogo dessa história romântica. O ato final do egocentrismo criador, o passo rumo à ilusão de uma liberdade que não existe, o sonho de um mundo sem natureza.
Para ele, o mundo ocidental sofre três grandes mudanças em seu modo de pensar e de ver a vida. A primeira aconteceu logo ao fim da vida de Aristóteles. Até então, todo o pensamento era visto como algo a ser feito em grupo. Não se analisava o homem como um ser individual, mas sim como um ser dentro de um grupo social. Filósofos como Platão falam da coletividade, do todo, nunca do indivíduo. Mas, de repente, em meros 20 anos, surgem filósofos que analisam o homem como universo separado, como indivíduo, como ser a separado um do outro.
A segunda grande mudança vem na Renascença, quando o natural se separa do moral. A moral, a ética, o bem, deixa de ser um valor natural e passa a ser questão de escolha, de trabalho, de educação e esforço.
O terceiro, nossa mudança, pois dura até hoje, 2017, é aquela que se inicia com o romantismo.
A virtude, o bem e a verdade, sempre foram, por 5000 anos, vistos como o final da vida humana na Terra. A verdade existia como algo dado, bastava ao homem conseguir descobrir onde ela se encontrava. A religião, a ciência e a arte eram modos de se encontrar no mundo, no cosmos, essa verdade. E também a beleza, a ética, o sentido de tudo. A vida real estava então FORA DO HOMEM. Pois bem, Berlin explica, e eu me abstenho de transcrever aqui, o movimento mental e espiritual, o porque dos românticos terem criado uma nova verdade, aquela que diz que TODA VERDADE VIVE DENTRO DE CADA UM. Consequência imediata, se a verdade não está lá fora, então ela é relativa, cada um tem uma verdade particular, única, que independe do todo. Caminhando mais um pouco, vemos que o mundo lá fora perde valor, se torna sem verdade por si mesmo, sem sentido, apenas um tipo de cenário louco.
O romântico criou a ideia de que para uma vida valer a pena é preciso criar sua verdade, e ao mesmo tempo criar sua vida, ou seja, só o CRIADOR vive. O artista é o objetivo de todos, o SER superior é um artista. Veja, não um pintor ou um poeta, mas sim alguém que cria um modo de viver e de ser ÚNICO. Viver deixa de ser sobreviver ou cuidar ou lutar; se torna inventar.
O artista cria a partir do nada, cria dentro de si, o artista é LIVRE. Ele pensa, faz e acredita naquilo que sua liberdade quer. O homem se torna um ser que quer ser livre, livre para poder criar a si mesmo. E para ser livre, seu caminho se faz, logicamente, o do autodomínio. A dor, a idade, as emoções nos lembram que não somos livres. Então, passamos a vida negando a dor, negando o tempo, negando as emoções. Criamos uma liberdade que aprisiona, porque somos carcereiros do que a coloca em perigo. Vigilantes do nosso ser natural. Passamos a controlar a natureza, inimiga natural da liberdade.
Se antes a verdade estava lá fora, onde viveria Deus, a verdade, o sentido; agora Deus, a verdade e o sentido passa a ser uma questão de inventar e não mais de descobrir.
OS VALORES DEIXAM DE SER DESCOBERTAS. PASSAM A SER INVENÇÃO.
Hoje vivemos a guerra entre esses dois mundos: razão X liberdade.
A razão não é liberdade, a liberdade despreza a lógica. Pois a lógica é um valor que é o que é, independente do que eu queira ou deseje crer. Por isso a razão não pensa em termos e liberdade, ela pensa em termos de causas e consequências. A razão é sempre um bem comum, geral, não individual. Ela vive fora do querer ou do ser humanos. Ela está no universo. Pela razão pode se viver me paz, e só por ela, exatamente porque ela nega a individualidade e pensa em termos gerais.
A liberdade abomina a razão porque ela lhe lembra do fim das coisas, dos limites do corpo e das obrigações para com os outros e o mundo. É a liberdade, o desejo por querer ser livre, que leva às guerras, às injustiças, à destruição. Esse impulso, romântico, leva a destruição de tudo o que signifique limite, dever, senso comum.
Nada é mais odioso ao artista que o senso comum, ser mais um em meio ao todo.
Nessa atividade criativa, nessa incessante ação original, ousada, construtiva, não há mais espaço para o ócio e para o vazio. Viver é criar, viver é fazer e deixar uma marca. Nada mais odioso que o fazer nada, pensar a toa, viver sem deixar nada em sua passagem. Esse o mundo criado pela geração de Beethoven, Wagner, Goethe e Heine, a vida como luta incessante CONTRA A VIDA REAL, A VIDA LIMITADA.
O lema iluminista, anterior ao romantismo portanto, é: SABER PRIMEIRO, DEPOIS FAZER. O lema romântico, nosso lema até hoje, é: FAZER É SABER, ou seja, aprendemos fazendo, e assim, não nos preparamos para viver. Se antes ser um Homem era saber e pensar, agora ser Homem é fazer e agir. Fazer em impulso, não se omitir, tentar, mesmo que esse tentar seja um vexame, um desastre ou uma tragédia.
O passo último seria criar um outro mundo, um mundo onde TUDO fosse uma criação livre, sem a natureza, sem o "de fora", sem nenhuma força que não possa ser domada e sem NADA DE EXTERIOR. Do Marxismo às teorias de Freud, em todas vem a crença de que o Homem cria aquilo que ele é, de que a verdade se encontra dentro dele e só dentro dele, de que o Homem é o senhor da vida e único responsável por seu destino. Mesmo que histórico ou inconsciente, tudo é humano, tudo é do homem.
Observa a guerra religiosa e hoje. Ela seria incompreensível para um europeu de 1700.
Antes, um homem sabia que sua fé era a verdadeira por ser a fé de todos aqueles que viveram antes dele. Ele lamentava o islamita ou o judeu por serem enganados por uma fé falsa. Hoje há uma sutil e mortal diferença. Quem defende sua fé a defende por ser sua, por estar dentro de si, por ser mesquinhamente seu pertence, um objeto. Antes a fé era sagrada por ser de todos, comum, o maior valor DE TODOS. Hoje ela é ostentada como mais uma criação individual de um grupo de almas especiais e criativas. Um valor de classe, e não um valor de todos.
Termino dizendo que quando um cara como Hawkins, diz que a humanidade está pronta para deixar a Terra, vejo nessa frase perigosa todo o epílogo dessa história romântica. O ato final do egocentrismo criador, o passo rumo à ilusão de uma liberdade que não existe, o sonho de um mundo sem natureza.
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