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VIGO, CAVALCANTI E O CINEMA DOS ANOS 30 ( COM UM DESASTRE BRASILEIRO....TÃO TÍPICO )

Leio um livro sobre Alberto Cavalcanti. Quem? Cavalcanti. Um brasileiro, fino, chique, que nos anos 1920 trabalhou no cinema francês. Foi cenógrafo, produtor e por fim, diretor. Conheceu Renoir, Clair, Duvivier e Vigo. Fez filmes mudos surrealistas e depois, no sonoro, enveredou pelo cinema mais popular. Saindo da França, foi trabalhar na Inglaterra. Fez documentários com Grierson e depois trabalhou na Ealing. Dirigiu versão de Dickens, fez a obra prima NA SOLIDÃO DA NOITE, lançou, como produtor, vários diretores ingleses e então aconteceu o desastre: voltou para o Brasil. Convidado por Matarazzo para ser o pai da Vera Cruz, a Hollywood do Brasil, foi pego de surpresa ao ver que aquilo era um antro de ladrões. Adolfo Celi desviava dinheiro dos filmes para suas peças no TBC. Gente que nunca havia entrado em um set era designado para dirigir um filme. Atores que mal sabiam falar. Produções jogadas ao lixo depois de torrarem milhões. E uma crítica, marxista, torcendo para que aquele "empreendimento burguês " afundasse. E afundou. Em apenas 4 anos a produtora quebrou e Cavalcanti afundou junto. Difamado, chamado de "agente americano", incompetente gastador, esnobe fazedor de filmes para a burguesia, Cavalcanti volta à Europa destruído. Trabalhará ainda na Alemanha, na França, mas sua carreira, interrompida pela aventura brasileira, termina. ---------------- Cavalcanti era da turma de Clair-Renoir e Duvivier e viu Vigo como um diretor muito jovem que morreu cedo, aos 29 anos, de tuberculose. Vigo deixou apenas um longa, ATALANTE, e alguns curtas. Vejo ontem " SOBRE NICE" e o famoso ZERO DE CONDUTA. -------------- Não direi que Vigo foi o mais poético diretor da história. Ele foi, mas o que importa é dizer como isso pode ser percebido. -------------- SOBRE NICE mostra a cidade lá do alto, imagens filmadas em balão. Depois vêm imagens de barcos, ondas do mar, gente andando, jogo, hoteis, carros, roupas, comida etc. Vigo não segue um plano habitual, ele não mostra a cidade, ele faz MÚSICA COM AS IMAGENS DA CIDADE. Desse modo, como seuquência é como um naipe de uma orquestra e ele harmoniza as imagens-sons construindo uma sinfonia. Em meio as velas dos barcos, brancas, uma imagem fragmento de uma plameira. Essa palmeira traz uma mulher numa cadeira, ela enseja um hotel que chama uma onda na areia. Vigo trabalha com ritmo, um ritmo sempre exato e assim cria poesia. Imagens palavras e ritmo nas frases sequências. Eis o cinema poesia. ---------------------- Em ZERO isso é levado ao extremo. Os alunos se rebelam e nada há de explicitamente político nisso, são crianças, querem brincar. O filme é uma coleção, pouco lógica, de cenas desses alunos. Jogam bola, pulam na sala de aula, fogem, se escondem, riem, ouvem os mais velhos. Não há história, Vigo dá uma situação, um momento na vida dos alunos. Eles criam uma anarquia, vencem os mestres, sobem ao telhado, mas....e então? Pouco importa! Não interessa o fim daquilo tudo nem o porque dos atos. O que tem valor é o que se vê: ritmo, imagens, ações, melodias. Para entrar no mundo de Vigo se deve abrir mão da prosa. Nada aqui é uma narrativa linear. O que ele nos dá são versos-momentos. As coisas não vêm de lá e vão para acolá, elas surgem e se desvanecem. ATALANTE será um desvanecimento longo, mágico, um sonho sem razão e com toda precisão precisa. ------------ Jean Vigo foi um gênio e não tivesse morrido, seria dele e não de Carné o posto de diretor central do país nos ricos anos 30. Uma pena....