A SOMBRA DA FORCA, JOSEPH LOSEY; PENA DE MORTE, COMUNISMO E ÁLCOOL

Quando a paranóia comunista tomou conta da América, logo após a segunda-guerra, um monte de gente pirou. No cinema a consequência foi a de que sumiram os filmes de consciência social, filmes que abundavam nos anos 30. Gente que fazia esse tipo de filme teve que se enquadrar. Alguns se recusaram e tiveram suas carreiras encerradas ou foram forçados a emigrar.
Um ator brilhante como John Garfield não aguentou a pressão e morreu do coração ainda jovem. Creia-me, John era indomável, um ator do estilo nervoso, que antecipou De Niro e Pacino. Outros nomes entraram na geladeira. A carreira se estagnou e ficaram anos no limbo. Gente como Elia Kazan e Edward Dymytrick preferiu se safar dedurando os colegas. Acabaram por pagar um preço também, Kazan passou o resto da vida a se justificar e Dymytrick simplesmente se afundou em banalidade. Era um diretor que prometia, após os depoimentos nunca mais se acertou.
E existiram aqueles que emigraram e que na emigração se fizeram grandes. Conseguiram renascer, renascer de tal modo que acabaram por se confundir com o país que adotaram. Jules Dassin já era em 1950 um maravilhoso diretor americano. Fazia um tipo de cinema másculo, de sombras e personagens malditos, filmes fatalistas, que nada envelheceram. Tendo de sair da América, Dassin se transformou em um dos mais interessantes diretores da Europa. Tanto que ainda hoje há quem pense ser ele um francês ou um grego. Pois foi na França e na Grécia que ele se radicou. Dirigiu alguns dos melhores filmes do mais forte período do cinema da Europa e se casou com a maior estrela do cinema grego.
Joseph Losey é um caso de igual força. Há quem tenha a certeza de que ele é inglês. Já dirigira alguns filmes nos EUA, mas é na Inglaterra que ele se afirma. Primeiro fazendo filmes como este A SOMBRA DA FORCA, e depois nos roteiros de Pinter ou de Tennessee Willians. Seu estilo é o do drama claustrofóbico. Os personagens penetram num tipo de labirinto sem solução e acabam por se perder para sempre. Este filme, com mais uma atuação de gênio de Michael Redgrave, trata de culpa, de alcoolismo, da força do dinheiro, da pena de morte, de pai e filho. Voce passa o filme esperando a redenção e ela não pode acontecer. O pai salva o filho, mas pagando um preço alto demais.
Redgrave mostra o patético do álcool sem jamais cair na comédia. Junto com o Richard Burton de A NOITE DO IGUANA, é o mais perfeito retrato de um viciado. Ele não consegue agir direito, ele não consegue pensar, ele tenta e tenta, mas esquece fatos, falha, se atrapalha. No rosto de Redgrave voce vê toda essa confusão dolorosa, um mapa de derrotas e de decepção.
O enredo é simples: um pai sai de clinica e visita o filho na prisão. O filho vai ser executado por assassinato. O pai vai tentar elucidar o crime em dois dias. Mas ele é um bêbado, o filho o odeia e nada parece o ajudar a chegar a verdade. Losey leva as cenas com absoluto controle. Nada de exageros, nada de choro, sem heroísmo ou humor. É quase uma radiografia gelada de uma agonia. Mas com toda essa precisão ele nos pega em cheio. Porque ele dá espaço para que um ator brilhe à vontade e para que a história corra em seu desenvolvimento dramático. O filme é curto, sem nada de sobra ou de menos. O pai bebe com raiva, adormece quando não devia, perde pistas, tenta raciocinar, se perde. Losey observa tudo com distãncia, sem se apiedar, isento.
Joseph Losey foi um grande diretor.