isaiah Berlin e O ROMANTISMO
Isaiah Berlin foi um dos mais importantes intelctuais do século XX. Estou lendo um livro que transcreve quatro palestras feitas sobre o Romantismo. Para Berlin, o romantismo foi e é o mais importante movimento da história. Somos hoje aquilo que ele, o romantismo, criou. O homem que existia antes de 1780 nos é quase incompreensível. ------------------ Basta dizer o seguinte: para a arte de antes, originalidade era um valor irrelevante. Quando Da Vinci ou Giotto criam uma novidade, o obejtivo é alcançar uma VERDADE, e não SER ORIGINAL. Toda vida moral, intelctual, filosófica, de então, busca o APRIMORAMENTO, a perfeição. Com o romantismo, a criação ÚNICA, ORIGINAL, SEM IGUAL passa a ser o maior valor. É o momento decisivo em que o EGO sobressai ao SOCIAL. -------------------- Vamos pensar outra vez. Voce consegue, tataraneto do romantismo, entender que Shakespeare não tinha problema algum em unir duas peças italianas e daí compor uma peça? Que isso não era plágio mas sim aperfeiçoar, embelezar o que já havia e era de todos? Voce consegue entender que até 1780, mais ou menos, um artista, um filósofo, se sentava para trabalhar pela verdade, pelo bem, pela beleza e não para criar algo de novo? E que quando surgia algo de inédito, o objetivo não era SER ÚNICO, mas sim chegar à um OBJETIVO? O Bem. A Verdade. O Real. -------------------- Essa maneira de dar valor, de apreciar e produzir arte ou ideias, nos é incompreensível. Pois filhos do romantismo que somos, vemos a VIDA como busca por expressão. Queremos ser NÓS MESMOS, nos expressar com liberdade, ter um IDEAL e nesse ideal viver. Amamos gente que morreu, se sacrificou por um ideal e não entendemos que martires anteriores ao romantismo não se sentiram e jamais foram vistos como HEROIS individuais, mas antes como PARTES DE UM MOVIMENTO COLETIVO. A figura do heroi isolado, único e original nasce em fins do século XVIII. Alexandre, César, Joana D'Arc ou Carlos Magno não eram olhados como INDIVÍDUOS ORIGINAIS, mas como partes de um momento, componentes de uma coletividade, inspirados por deuses ou por Deus, não SERES SEM PARALELO. ------------------------ Havia um DESTINO, e Marco Antonio ou Dante seguia seu destino. Somento ao longo do romantismo se criou a ideia de que Dante era único, Marco Antonio lutava para ser ele mesmo ou que Cleopatra era consciente de seu valor. ------------------------ O romantismo inaugura o maior namoro da história do homem, o romance dele com seu ego. O que importa não é meu destino, meus deuses, meu grupo, o que importa é meu EU. E esse eu cria. Cria sua vida. Cria seu destino. Cria seu código moral. Cria seu VIDA. ------------------ E vejam que ainda nem falei da razão! Pois se antes o homem admirável era dono de sua razão, agora é admirável aquele que sente, que se comove, que age por emoção. O amor, antes um dos fatos da vida, passa a ser o centro da vida. O amor passa a ser parte de tudo. Se luta por amor à pátria, se morre por amor à um ideal, se compõe por amor à arte, tudo é amor e por isso tudo se torna nobre se for feito em nome de algum amor. Até a ciência passa a ser feita por amor ao conhecimento. Entenda, para um homem de 1600 isso não fazia sentido. Se fazia ciência para se saber algo. Se compunha uma canção por honra à Deus ou como um trabalho prazeroso. Até mesmo se casava por acerto racional ou afeto amigável. A hiper valorização do amor, dando à ele um poder que nunca houve antes, é invenção do romantismo. Faço um desafio: leia Fielding, Cervantes, Sófocles, mesmo Dante, e voce perceberá que mais importante que o amor é o dever, a honra, a vida social. Mesmo em Shakespeare, se voce ler sua peça mais "romatica", Romeu e Julieta, voce irá perceber que o amor ocupa muito menos espaço que 150 anos de romantismo nos fizeram crer. ---------------------------- O homem solitário que cria sua arte apesar de tudo. O ego lutando contra o meio. A sedução do sofrimento, da pobreza, da doença "por amor à algo". A beleza como valor que arrebata e não como algo que nos educa. São centenas de características romanticas tão cotidianas, aparentemente tão naturais, que não percebemos que foram criadas recentemente e surgiram em apenas 50 anos de mudanças. Da hiper valorização da juventude, à paixão pelo que é novo e original, tudo é invenção romântica. -------------- Falarei mais em outro post.