DYLAN THOMAS E A INFÂNCIA
O pai de Dylan Thomas era professor de literatura e lhe deu o nome de Dylan, nome então muito raro, como marca de sua nação, Gales. Dylan significa em galês "criança encantada". Com uma enorme biblioteca, o pai lia Shakespeare para o filho já aos 4 anos de idade. O vínculo entre os dois foi imenso e um ano após a morte do pai, Dylan morreu. Tinha 39 anos. Era 1953. ------------------------ Thomas foi daqueles poetas que se torna famoso muito cedo. Aos 18 já publicava e logo depois falava no rádio e escrevia roteiros de cinema. Sempre pobre, gastava muito e ganhava pouco, foi um alcoolatra radical. Ele e sua esposa eram capazes de beber 30 pint de cerveja sem cair. Nos anos 40 e 50 era Dylan Thomas o poeta mais famoso em língua inglesa. Nada político, havia crítico que o desvalorizava por isso, seus temas eram a morte, o sexo, a natureza, o ser e o não ser. Panteísta, ele via seu corpo como parte do universo, cosmos onde tudo estava ligado à tudo. Sua escrita tentava transmitir o inefável. É famosa sua declaração de que ele sempre complicava o poema. O leitor deveria ser sempre desafiado e a língua desmembrada. Tento ler Thomas desde 2008 e só agora encontro sua chave de entrada. -------------- Ler Dylan Thomas é ler uma criança. E isso é muito raro. O poeta galês, impregnado de Donne, Joyce, Milton, Keats, manteve sempre uma visão de criança da vida. Não infantil, de criança. Confuso com seu corpo, perdido entre sexo e Deus, fuga e luta, natureza e cidade, Thomas consegue fazer algo que me encanta: ele mostra o que seria a visão primeira sobre a vida. Daí a dificuldade em o ler: ele fala de coisas ANTES DA FALA. O que ele escreve é aquilo que uma alma vê e sente antes de aprender a falar e verbalizar. Para isso ele usa símbolos. Thomas mergulha na palavra e cava até a raiz. Procura encontrar o que se esconde em cada vocábulo. ------------ Era um trabalho árduo. Ele escrevia e reescrevia, apagava e editava, refazia. Nada de inspiração romântica, era trabalho físico. Esculpir o sentido. Lendo seus poemas eu vejo visões de uma criança sobre o mundo. Impressões sobre coisas desconhecidas, palavras a serem entendidas. Então: escrevendo poemas difíceis ele nos obriga a fazer o mesmo que fizemos quando eramos crianças: tentar entender o mundo que nos era dado. Desvendar o que era aquilo a nossa frente e o que fazer com aquilo que nos era dado. O fato de Dylan Thomas conseguir me fazer lembrar, por uma fração de segundo, o que fui e o que senti, faz dele um mestre.