Depois de Conan Doyle e Agatha Christie, somente Shakespeare tem mais textos adaptados ao cinema que Graham Greene. E que estranho momento vive esse autor inglês! Por eu ter nascido nos anos 60, ainda peguei o final da imensa fama de Greene. Entre os anos 40 - 80, Graham Greene foi candidato eterno ao Nobel e junto à Borges, o maior dos derrotados. Para quem frequentava livrarias e cadernos culturais em 1970, 1980, Greene era figura constante. Mesmo aqui neste sub sub continente, vários de seus livros estavam sempre sendo editados. Porém hoje, em 2020, vigésimo ano da Nova Idade Medieval, há montes de jovens leitores que nunca ouviram falar de tal autor. E se conhecem vagamente o nome, é por ter ouvido falar de alguma adaptação para a tela.
Li O PODER E A GLÓRIA. É meu quinto Greene e o mais difícil de ler. Figura engraçada esse Greene. Ele escrevia muito e dividiu sua obra em dois campos: livros sérios e livros de divertimento. O PODER E A GLÓRIA é dos sérios. O tema é árduo: estamos em algum país da América Central. Houve uma revolução socialista. Todas as igrejas foram queimadas e em seu lugar foram construídos campos de esportes. Todos os padres foram fuzilados. A população, que mal compreende o que se passa, vive em miséria terminal. O livro acompanha essa situação de dor e de inescapável inferno. Como personagens há um ex padre que foi obrigado a casar e se desmoralizar, um tenente que DESEJA DESTRUIR TODO O PASSADO DO PAÍS E COMEÇAR TUDO DO PONTO ZERO. Há ainda um padre que tenta fugir da nação e se tornou alcoólatra. Em meio a tudo isso, temos ainda um dentista inglês e um funcionário americano de uma empresa que exporta as bananas do país. O texto é escuro, sombrio, quente, úmido, mofado, doentio, sem nenhum alívio.
Graham Greene se converteu ao catolicismo aos 26 anos de idade. Seus livros têm por tema a dor. A culpa. E a absolvição. Acho que já deu para voce entender porque em 2020 não se lê mais Greene não é? É um autor que odeia profundamente a esquerda. Mas ao mesmo tempo não acredita na direita. Niilista? Seria simples se ele fosse um niilista anarquista. Greene estaria na moda. Mas não. Ele crê na vida como dor. Viver é para ele, sofrer, sofrer para assim poder, quem sabe, se redimir em outra vida. É catolicismo radical. E por ser assim, se aproxima de Dostoievski: A santidade possível vive nos piores dentre nós. Pois são eles os que mais sofrem.
Aproveitei para ontem rever o filme THE QUIET AMERICAN, feito por Joseph L. Mankiewicz em 1958. Texto de Greene, claro. O filme foi feito em Saigon-Vietnã, antes da guerra, e só por isso já vale ser visto.
Estamos em 1952, em plena guerra de independência. Tropas francesas, os colonizadores, lutam contra os guerrilheiros do norte, comunistas. Mas o filme não é sobre guerra. É, como só poderia ser em Greene, sobre culpa. Um jornalista inglês, vivido com a maestria discreta habitual por Michael Redgrave, namora uma nativa vietnamita muito mais jovem. Eles se amam. Mas surge um jovem americano e aos poucos ele conquista a menina. O inglês é tomado pelo ódio e acaba por trair o americano, levando-o à morte. No fim ele perde tudo: mulher, honra, sossego, consciência, auto estima. o redor desse drama, a situação trágica do país: de um lado a abusiva e incompetente colonização francesa, do outro os comunistas, matando franceses e vietnamitas aos montes. O jovem americano está no país movido pelo ideal ingênuo de uma terceira via: Liberdade com democracia. Sabemos no que isso ia dar no futuro. Quando o filme foi feito os americanos ainda não estavam lá. Seriam precisos 50 anos de dor para se alcançar o que o país é hoje.
O inglês não acredita em nada. Velho europeu desencantado, ele zomba da França, teme os comunistas e acha ridículo o americano. O filme é excelente.
Joseph L. Mankiewicz é outro grande nome esquecido. Foi o único diretor a vencer dois Oscars de diretor seguidos, e em ambos ganhando também pelo roteiro: QUEM É O INFIEL em 1949 e A MALVADA ( ALL ABOUT EVE ) em 1950. Típico americano liberal da época, ele consegue não tomar partido. Mérito de seu bom roteiro.
Graham Greene voltará um dia? Penso que sim. Quanto maiores os erros do mundo, mais rápido as pessoas olharão para seus pontos de apoio e de estabilidade. E a alta literatura é sempre um desses pontos.
Li O PODER E A GLÓRIA. É meu quinto Greene e o mais difícil de ler. Figura engraçada esse Greene. Ele escrevia muito e dividiu sua obra em dois campos: livros sérios e livros de divertimento. O PODER E A GLÓRIA é dos sérios. O tema é árduo: estamos em algum país da América Central. Houve uma revolução socialista. Todas as igrejas foram queimadas e em seu lugar foram construídos campos de esportes. Todos os padres foram fuzilados. A população, que mal compreende o que se passa, vive em miséria terminal. O livro acompanha essa situação de dor e de inescapável inferno. Como personagens há um ex padre que foi obrigado a casar e se desmoralizar, um tenente que DESEJA DESTRUIR TODO O PASSADO DO PAÍS E COMEÇAR TUDO DO PONTO ZERO. Há ainda um padre que tenta fugir da nação e se tornou alcoólatra. Em meio a tudo isso, temos ainda um dentista inglês e um funcionário americano de uma empresa que exporta as bananas do país. O texto é escuro, sombrio, quente, úmido, mofado, doentio, sem nenhum alívio.
Graham Greene se converteu ao catolicismo aos 26 anos de idade. Seus livros têm por tema a dor. A culpa. E a absolvição. Acho que já deu para voce entender porque em 2020 não se lê mais Greene não é? É um autor que odeia profundamente a esquerda. Mas ao mesmo tempo não acredita na direita. Niilista? Seria simples se ele fosse um niilista anarquista. Greene estaria na moda. Mas não. Ele crê na vida como dor. Viver é para ele, sofrer, sofrer para assim poder, quem sabe, se redimir em outra vida. É catolicismo radical. E por ser assim, se aproxima de Dostoievski: A santidade possível vive nos piores dentre nós. Pois são eles os que mais sofrem.
Aproveitei para ontem rever o filme THE QUIET AMERICAN, feito por Joseph L. Mankiewicz em 1958. Texto de Greene, claro. O filme foi feito em Saigon-Vietnã, antes da guerra, e só por isso já vale ser visto.
Estamos em 1952, em plena guerra de independência. Tropas francesas, os colonizadores, lutam contra os guerrilheiros do norte, comunistas. Mas o filme não é sobre guerra. É, como só poderia ser em Greene, sobre culpa. Um jornalista inglês, vivido com a maestria discreta habitual por Michael Redgrave, namora uma nativa vietnamita muito mais jovem. Eles se amam. Mas surge um jovem americano e aos poucos ele conquista a menina. O inglês é tomado pelo ódio e acaba por trair o americano, levando-o à morte. No fim ele perde tudo: mulher, honra, sossego, consciência, auto estima. o redor desse drama, a situação trágica do país: de um lado a abusiva e incompetente colonização francesa, do outro os comunistas, matando franceses e vietnamitas aos montes. O jovem americano está no país movido pelo ideal ingênuo de uma terceira via: Liberdade com democracia. Sabemos no que isso ia dar no futuro. Quando o filme foi feito os americanos ainda não estavam lá. Seriam precisos 50 anos de dor para se alcançar o que o país é hoje.
O inglês não acredita em nada. Velho europeu desencantado, ele zomba da França, teme os comunistas e acha ridículo o americano. O filme é excelente.
Joseph L. Mankiewicz é outro grande nome esquecido. Foi o único diretor a vencer dois Oscars de diretor seguidos, e em ambos ganhando também pelo roteiro: QUEM É O INFIEL em 1949 e A MALVADA ( ALL ABOUT EVE ) em 1950. Típico americano liberal da época, ele consegue não tomar partido. Mérito de seu bom roteiro.
Graham Greene voltará um dia? Penso que sim. Quanto maiores os erros do mundo, mais rápido as pessoas olharão para seus pontos de apoio e de estabilidade. E a alta literatura é sempre um desses pontos.