Temos a ilusão de que 2017 é tempo de sexo. Que nunca se transou tanto. Bem, no mundo da NET provavelmente sim. No mundo real...
John Donne é um poeta e padre inglês do mesmo tempo que Shakespeare. Na primeira metade de sua vida ele foi um poeta que escrevia basicamente sobre sexo e sobre a beleza. Sua pena era ferina, satírica e sempre feliz. Na segunda metade de sua vida ele se fez padre católico. Não por culpa ou por revelação espiritual. Sua decisão foi apenas um modo de ganhar a vida. John Donne sempre foi crente e nessa segunda fase ele se torna um escritor de sermões. Os melhores de sua língua. Este livro que acabo de reler tem sua obra profana. E devo dizer que poucas vezes li algo tão feliz, exultante, risonho, satírico e bonito. Donne escreve com profusão de imagens. Ele pinta com palavras e todas essas pinturas são enfeitiçantes. Lemos cantando. Rindo e rangendo os dentes. Seu tema é a mulher. O amor que ele tem por elas. Amor que é sempre carnal. Ele pode começar falando da Lua, da floresta ou das flores, mas logo percebemos que é tudo introdução, pois logo ele fala dos seios, do sexo e das pernas. Ao mesmo tempo ele escarnece das mulheres feias, das ciumentas, das fofoqueiras, dos maridos cornos, das fétidas, das que possuem doenças venéreas. É o mesmo mundo de Chaucer, a Inglaterra alegre e impulsiva de antes da revolução industrial.
Para onde foi esse mundo cantante...Sobrevive claro. Está presente em estádios de futebol, em ruas cheias de cockneys, na região norte do país. Mas é reprimido. Desde mais ou menos 1800, quando a nova riqueza inglesa trouxe de sopetão a obrigação de ser "inglês". E esse novo rico inglês impôs ao mundo a imagem de um povo frio, indiferente, algo snob. Para onde foi esse mundo cantante...Ele surgia em bandas de rock sujas ( Keith Richards e Joe Strummer estariam em casa no mundo de Donne e de Ben Jonson ). Ele surgia em astros do esporte como Paul Gascoigne e George Best.
Ler os poemas de John Donne é uma alegria. E o que define a Inglaterra de 1600 é uma encantadora alegria de viver. Terra de piratas, ela vive solta em estradas ruins e tabernas escuras. E como se faz sexo!!! 99% do tempo os homens pensam em fornicar e no resto do tempo fogem de maridos cornudos. Estamos longe, muito longe do mundo romântico. Em Shelley, Keats e Wordsworth há a dor de se ter perdido o mundo de Donne. Em Donne há a alegria por ser o que se é. 200 anos que parecem 2000.
Antes de Donne andei dando mais uma olhada em Wittgenstein. Nada pode ser mais estranho. O filósofo decreta o fim da palavra viva. Donne faz partos diários de palavras risonhas e fedidas. Amo os dois, mas Donne é maior.
John Donne é um poeta e padre inglês do mesmo tempo que Shakespeare. Na primeira metade de sua vida ele foi um poeta que escrevia basicamente sobre sexo e sobre a beleza. Sua pena era ferina, satírica e sempre feliz. Na segunda metade de sua vida ele se fez padre católico. Não por culpa ou por revelação espiritual. Sua decisão foi apenas um modo de ganhar a vida. John Donne sempre foi crente e nessa segunda fase ele se torna um escritor de sermões. Os melhores de sua língua. Este livro que acabo de reler tem sua obra profana. E devo dizer que poucas vezes li algo tão feliz, exultante, risonho, satírico e bonito. Donne escreve com profusão de imagens. Ele pinta com palavras e todas essas pinturas são enfeitiçantes. Lemos cantando. Rindo e rangendo os dentes. Seu tema é a mulher. O amor que ele tem por elas. Amor que é sempre carnal. Ele pode começar falando da Lua, da floresta ou das flores, mas logo percebemos que é tudo introdução, pois logo ele fala dos seios, do sexo e das pernas. Ao mesmo tempo ele escarnece das mulheres feias, das ciumentas, das fofoqueiras, dos maridos cornos, das fétidas, das que possuem doenças venéreas. É o mesmo mundo de Chaucer, a Inglaterra alegre e impulsiva de antes da revolução industrial.
Para onde foi esse mundo cantante...Sobrevive claro. Está presente em estádios de futebol, em ruas cheias de cockneys, na região norte do país. Mas é reprimido. Desde mais ou menos 1800, quando a nova riqueza inglesa trouxe de sopetão a obrigação de ser "inglês". E esse novo rico inglês impôs ao mundo a imagem de um povo frio, indiferente, algo snob. Para onde foi esse mundo cantante...Ele surgia em bandas de rock sujas ( Keith Richards e Joe Strummer estariam em casa no mundo de Donne e de Ben Jonson ). Ele surgia em astros do esporte como Paul Gascoigne e George Best.
Ler os poemas de John Donne é uma alegria. E o que define a Inglaterra de 1600 é uma encantadora alegria de viver. Terra de piratas, ela vive solta em estradas ruins e tabernas escuras. E como se faz sexo!!! 99% do tempo os homens pensam em fornicar e no resto do tempo fogem de maridos cornudos. Estamos longe, muito longe do mundo romântico. Em Shelley, Keats e Wordsworth há a dor de se ter perdido o mundo de Donne. Em Donne há a alegria por ser o que se é. 200 anos que parecem 2000.
Antes de Donne andei dando mais uma olhada em Wittgenstein. Nada pode ser mais estranho. O filósofo decreta o fim da palavra viva. Donne faz partos diários de palavras risonhas e fedidas. Amo os dois, mas Donne é maior.