CLAMOR DO SEXO- ELIA KAZAN ( EXEMPLO DO MAIOR DOS PECADOS )

William Inge, no auge do teatro dramático americano, foi um dos grandes. Se Tennessee Willians e Eugene O'Neill dominaram a cena, ele e Arthur Miller vieram logo após. Edward Albee surgiria na sequencia e Thorton Wilder merece um lugar à parte. Neste filme de 1961, Inge consegue tocar num dos mais dificeis temas de qualquer drama: o mal sem intenção, o maior dos pecados: o sofrimento imposto a inocentes.
Estamos em 1928, nos cafundós do Kansas. Bud é o filho bacana do líder local. Dean é sua namorada. Os pais concordam com o namoro, os dois se amam, ninguém tem qualquer doença ou problema econômico e mesmo assim o sofrimento do dois é insuportável. Porque?
O pai de Bud é um ex-jogador de futebol, agora aleijado. Um macho milionário que deseja o "bem" do filho. Eis o primeiro problema: seu ego amassa o amável ego de seu favorito. Segundo problema: Dean é boa aluna e ama seus pais. Mas sua mãe vê nela um bebê e seu pai deixa tudo a cargo da mãe. Dean luta para ser sempre uma "dama", uma lady, o orgulho dos pais. Vem daí um terceiro e atroz problema: o casal se ama, se adora, mas não pode fazer sexo. Bud quer, Dean não. Depois, ao final, Dean quer, mas Bud não pode, afinal, ela não é uma puta...
A conselho do pai, Bud arruma uma amante, "para se aliviar". Bud detesta fazer isso, pois ela "não é Dean ", mas se conforma. Isso destrói Dean. O longo caminho da inocente garota rumo ao inferno, a forma desajeitada como ela tenta se tornar "fácil" é de cortar o coração. ( Confesso que chorei muito... ). Ao fim do filme, sem final feliz, mas doce a seu modo, fica uma terrível lição: nada temos de controlável na vida. Bud e Dean nasceram um para o outro, mas terminam com outras pessoas, distantes, conformados. Tudo dá errado.
Mas o que me emociona no filme não é isso. É o modo como é demonstrado o maior pecado humano ( sim inteligentinho, pecados irremediáveis existem. E são imperdoáveis. ) O pecado da difamação da inocência. O amor dos dois é real, é inocente, é forte. E todos, sem saber e querer, destroem esse amor. Cada palavra da mãe e do pai, sempre bem intencionados, é uma facada, um pecado irremediável. Dean enlouquece e é internada. Bud empobrece e se casa. Nosso coração é cortado ao meio.
Warren Beaty faz Bud. É seu primeiro filme. Quem leu o livro "Sex, drugs e rocknroll" de Peter Biskind, sobre a revolução em Hollywood, sabe o quanto Warren foi/é importante para o cinema que se faz agora. Seu Bud é correto, mas nas cenas finais, na fazenda, é brilhante. Natalie Wood faz Dean. E a partir das cenas de enlouquecimento ela nos dá uma atuação emocionante. O modo como ela olha e conversa com o psiquiatra e a maneira como ela corre e pula nos jardins do hospital são inesquecíveis. Para quem conhece a triste sina que Natalie viveu na vida real, ver o filme é ainda mais cortante.
Mas todo o elenco é superlativo. Não houve diretor de elenco como Kazan. O homem que lançou Montgomery Clift, Brando, James Dean e Warren Beaty, faz um filme de pungente beleza e emoção que se acumula até explodir. Belíssimo!