George Pal dirigiu e produziu este filme, baseado no livro de Wells, em 1960. Se em 60 o grande medo era do fim nuclear do planeta, hoje, 2020, A Máquina do Tempo assusta por sua precisão em adivinhar a situação social do primeiro mundo. Mas antes vamos lembrar.
Um cientista inglês, em 1899, constrói uma máquina com a qual ele viaja ao futuro. Milhares de anos depois, ele está no centro de um novo tipo de sociedade terrena: humanos divididos em Morlocks e Elois. Morlocks trabalham e vivem no subsolo. Elois são todos loiros e lindos e vivem sem precisar trabalhar, apenas se divertem. Morlocks na verdade criam Elois como gado. Toda noite alguns deles são devorados.
Para quem analisar superficialmente, Morlocks são a classe trabalhadora, que obrigada a se desumanizar, se vinga comendo a classe que nada produz. Essa interpretação é bastante tola. Elois são vítimas, Morlocks são exploradores. Na verdade à luz dos dias de hoje, a coisa é bem mais terrível do que parece.
Elois tomam sol num dolce far niente à beira da água. Não perguntam nada, não querem aprender nada, são indiferentes. Na cena em que estão almoçando, no enorme salão branco, tivessem cada um seu celular à mão, seriam típicos europeus dóceis e entediados de 2020. Na consciência deles, a comida surge dada por alguém, as roupas são presentes merecidos, e o passado é ignorado. Tudo que importa é ter paz e não precisar se esforçar. São como crianças. Entre eles não existe a doença e nem a velhice.
Morlocks vivem próximos à eles, mas são de certo modo invisíveis. Produzem comida, roupas, bem estar para os Elois. Em troca se alimentam de sua carne tenra. Morlocks não são felizes. Apenas criaram um modo de sobreviver. Mas são vencedores. Eles viveriam sem Elois. Já Elois morreriam de inanição sem eles. Se voce lembrou de europeus do norte, acertou.
Se Elois tivessem uma filosofia, ela seria: Me deixem em paz. Se Morlocks tivessem uma, e eu creio que a tenham, seria: Viver é lutar. Deixo à voce suas analogias.
Lembro de ter visto o filme, pela primeira vez, na Globo, sábado às 21 horas, por volta de 1975. Eu era uma criança, mas nunca esqueci. Filmes vistos nessa idade se tornam um tipo de sombra que nos seguem pelo resto da vida. Até hoje me pego pensando nos Elois, no paradoxo do tempo, no modo como o lugar onde estou estará daqui a 3000 ou 15 mil anos. Por puro reflexo sempre penso que aqui um dinossauro pisou e ali um selvagem caçou. Percebo que são imagens que me ficaram vindas deste filme.
Vivemos a mais de um século a obsessão do tempo. Como gastar, como usufruir, como não perder tempo. Mais que Deus, morte ou amor, o tempo é o centro de nossa angústia. Como bem diz o filme, é a dimensão que nos escraviza. Podemos ir e vir, subir e descer, mas a quarta dimensão, a temporal, nos prende ao seu modo.
O filme é delicioso. Poucos têm tal clima vitoriano tão bem construído. Voce se sente dentro da Londres de 1899. É uma pequena obra prima. Veja.
Um cientista inglês, em 1899, constrói uma máquina com a qual ele viaja ao futuro. Milhares de anos depois, ele está no centro de um novo tipo de sociedade terrena: humanos divididos em Morlocks e Elois. Morlocks trabalham e vivem no subsolo. Elois são todos loiros e lindos e vivem sem precisar trabalhar, apenas se divertem. Morlocks na verdade criam Elois como gado. Toda noite alguns deles são devorados.
Para quem analisar superficialmente, Morlocks são a classe trabalhadora, que obrigada a se desumanizar, se vinga comendo a classe que nada produz. Essa interpretação é bastante tola. Elois são vítimas, Morlocks são exploradores. Na verdade à luz dos dias de hoje, a coisa é bem mais terrível do que parece.
Elois tomam sol num dolce far niente à beira da água. Não perguntam nada, não querem aprender nada, são indiferentes. Na cena em que estão almoçando, no enorme salão branco, tivessem cada um seu celular à mão, seriam típicos europeus dóceis e entediados de 2020. Na consciência deles, a comida surge dada por alguém, as roupas são presentes merecidos, e o passado é ignorado. Tudo que importa é ter paz e não precisar se esforçar. São como crianças. Entre eles não existe a doença e nem a velhice.
Morlocks vivem próximos à eles, mas são de certo modo invisíveis. Produzem comida, roupas, bem estar para os Elois. Em troca se alimentam de sua carne tenra. Morlocks não são felizes. Apenas criaram um modo de sobreviver. Mas são vencedores. Eles viveriam sem Elois. Já Elois morreriam de inanição sem eles. Se voce lembrou de europeus do norte, acertou.
Se Elois tivessem uma filosofia, ela seria: Me deixem em paz. Se Morlocks tivessem uma, e eu creio que a tenham, seria: Viver é lutar. Deixo à voce suas analogias.
Lembro de ter visto o filme, pela primeira vez, na Globo, sábado às 21 horas, por volta de 1975. Eu era uma criança, mas nunca esqueci. Filmes vistos nessa idade se tornam um tipo de sombra que nos seguem pelo resto da vida. Até hoje me pego pensando nos Elois, no paradoxo do tempo, no modo como o lugar onde estou estará daqui a 3000 ou 15 mil anos. Por puro reflexo sempre penso que aqui um dinossauro pisou e ali um selvagem caçou. Percebo que são imagens que me ficaram vindas deste filme.
Vivemos a mais de um século a obsessão do tempo. Como gastar, como usufruir, como não perder tempo. Mais que Deus, morte ou amor, o tempo é o centro de nossa angústia. Como bem diz o filme, é a dimensão que nos escraviza. Podemos ir e vir, subir e descer, mas a quarta dimensão, a temporal, nos prende ao seu modo.
O filme é delicioso. Poucos têm tal clima vitoriano tão bem construído. Voce se sente dentro da Londres de 1899. É uma pequena obra prima. Veja.