SUAVE É A NOITE- F.SCOTT FITZGERALD, A MELANCOLIA DA JUVENTUDE

   Assisti ontem pela primeira vez o filme de Henry King baseado no livro de Scott Fitzgerald e fico pasmo. O filme erra todo o tempo, é Fox de cabo a rabo, último filme da longa carreira de King que já estava cansado. Mas o livro é tão bom que mesmo assim o filme tem sublimes qualidades. Uma melancolia ácida na história do psiquiatra que se apaixona por sua paciente milionária e tem sua vida destruída por ela. Os dois se amam sempre, mas são infelizes all the time.
   Li o livro a mais de vinte anos e nunca o esqueci. É melhor que Gatsby. Nicole fez com que me apaixonasse por ela. E o Dr. Diver nos cativa. Fitzgerald perseguiu ávidamente a genialidade. Sua meta era o sublime e na verdade ele jamais o tocou. Ele tinha uma ambição maior que seu talento e essa é a maior maldição que um escritor de talento pode sofrer. Ele se media com Tolstoi e Stendhal, mas seu dom, grande e belo, era da altura de Huxley ou de Hesse. Grande, nunca genial. Isso fez com que Scott desenvolvesse uma melancolia persistente, derrotismo suave, uma doce dor de ser jovem e já desencantado. A América amou e ama essa imagem. O jovem rico e belo que se perde.
   Era um romântico sem fé e um idealista sem coragem. E escrevia bem. Muito bem. Todas as primeiras cem páginas de Suave é a Noite são brilhantes. Ele nos faz sentir tudo aquilo que ele sente diante de suas criações. Que não são tão "criadas" assim. Não é preciso dizer que temos aqui a reescrita de sua história com Zelda. Se há hoje um culto a memória de sua esposa louca, injustificado, isso se deve a habilidade que Scott teve em fazer dela um personagem irresistível. Algumas doidas dizem que ela tinha mais talento que o marido. Qual a prova?
   Fitzgerald teve um doloroso insight: Percebeu que a América amava sua juventude. Que seu mundo era apaixonado por beleza juvenil, festas, dinheiro e glamour. Mas que essa juventude seria sacrificada nos altares do paganismo moderno. Eles seriam o tributo pago aos deuses. E foram. Daí sua melancolia. Afinal, Heminguay se tornou um patético drunk, Wolfe morreu jovem e ele e Zelda sofreram em alcóol e clínicas caras. Todo o espetáculo dado por astros das telas e reis do rock, seus pesadelos via telas e rádios, foi pressentido por Scott. Carne jovem e bela no altar da América.
   O Dr. Diver caminha firme e decidido rumo a destruição. Fácilmente ele poderia mudar seu destino. Não muda. Alguma coisa quebra dentro dele, alguma coisa que na verdade sempre esteve para quebrar.
   O filme tem glamour, glamour quadrado que às vezes se solta e voa. O livro é maravilhoso. Vinte anos e zilhões de livros depois ainda não o esqueci. Fitzgerald...a vida é isso não é? Um momento de beleza e um infinito de dor e de lembranças...