PYGMALION- GEORGE BERNARD SHAW

   Bernard Shaw foi até os anos 60 tão representado quanto Shakespeare. Brecht, Shaw e Maugham. Esses eram os autores mais encenados, ao lado de WS, claro. WS enterrou a todos eles e continua popular como sempre. Maugham cansou, Brecht se tornou antigo e o que aconteceu com Shaw?
   O irlandês ( que detestava a Irlanda ) George Bernard Shaw foi a mais popular figura cultural da Inglaterra entre 1890- 1950. Viveu muito, nasceu na época de George Eliot e Meredith e viveu até além da segunda-guerra. Fabianista ( o fabianismo era a versão light do socialismo, made in England ), vegetariano e anti-casamento. Shaw escrevia panfletos e peças de teatro, fazia conferências e lançava modas. O mundo queria saber de suas opiniões, todos observavam sua vida. Morreu solteiro, famoso, nobelizado, cheio de sucessos no palco ( e no cinema ).
   Quando comecei a me interessar por livros ( na época das caravelas eu acho.... ), Shaw era tão famoso que mesmo tendo 11 anos eu já queria lê-lo. Ele era importante como são hoje Virginia Wolff e Karen Blixen. Paulo Francis o tinha como mestre e guia, pois Shaw era um tipo de metralhadora giratória. Suas palavras fustigavam e ofendiam e ele dava palpites sobre tudo. Mas subitamente ele saiu de moda e há quem agora o ignore.
   Bem, talvez seja uma época de bolhas de sabão a nossa, e não das granadas de Shaw.
   É famoso o diálogo dele com Isadora Duncan.... Por volta de 1920 os dois eram o homem e a mulher mais admirados do mundo. Então Isadora propôs que se casassem. O filho teria a beleza dela e a inteligência dele. Shaw recusou dizendo: "Temo que ele tenha minha beleza e sua inteligência"...
   Pigmalião, ou Pygmalion, é a peça que deu origem ao musical MY FAIR LADY. E lendo o texto vejo que o libreto do musical manteve 90% da peça de Shaw. A grande mudança é no final. A peça termina em aberto, o musical dá um final quase feliz ( e anti-feminista ). Eu prefiro o musical, mas a peça é fácil de ler e sempre divertida. As falas correm.
   O enredo é muito conhecido. Henry Higgins é um professor de fonética. Numa noite de chuva, à saída da ópera, ele conhece Elisa Doolittle, uma florista de fala vulgar. Aposta com amigo que conseguirá mudar a dicção da florista e assim enganar os snobs de Londres, que acreditarão ser ele uma Lady. Tudo isso ocorre numa Londres maravilhosamente vitoriana.
   No filme toda a atenção é para Elisa. Audrey dá seu grande show. Na peça há uma ênfase na dúvida: Higgins tem o direito de tirar Elisa de seu meio social? A educação de Elisa abre seus olhos para um mundo maior, mundo que ela não conhecia. Mas Elisa não tem o dinheiro para viver nesse mundo descoberto. Esse o drama. De que vale a educação sem a oportunidade? Educação sem avanço social e´ apenas frustração. Elisa sente isso na carne.
   Shaw continua atual. Educamos gente que jamais poderá viver no mundo que eles aprendem a conhecer e a admirar. Uma bela e intraduzível peça.
   PS: Há uma tradução que transforma ã giria de Elisa em carioquês do morro e Higgins num falador do português correto. Não funciona. Hoje a lingua correta não mais distingue a Lady da florista. Além do que não há como levar a sério um professor que distingue a lingua da Tijuca da do Leblon e da Urca. No original Higgins fala dos acentos de Fulham, Chelsea e Newcastle, acentos que são pronunciados. Elisa é uma cockney, Higgins fala o inglês da BBC. Intraduzível.