UM LUGAR AO SOL - GEORGE STEVENS, DEMASIADO HUMANO, DEMASIADO HUMANO...

   George Stevens já era um diretor famoso quando em 1941 foi para a Segunda Guerra. Até então ele era basicamente um diretor de comédias, um excelente diretor de comédias, que começara fotografando filmes de Laurel e Hardy e evoluíra para as produções A. Na guerra ele comandava um grupo que era encarregado de filmar e fotografar batalhas e tomadas de cidades. Stevens esteve no dia D e mais importante, foi seu grupo o primeiro a entrar em Dachau. George Stevens foi o primeiro a ver e registrar câmaras de gás, pilhas de ossos e corpos jogados como lixo. De volta a seu país, ele nunca mais dirigiu uma comédia. Este filme, considerado por muitos um dos melhores filmes já feitos na América, é uma sinfonia sobre compaixão, sobre desamparo e sobre o azar.
   Montgomery Clift é um rapaz pobre que cruza o país para encontrar um tio rico. Lhe pede um emprego e passa a trabalhar na fábrica do tio. Se envolve com colega de trabalho e a engravida. Mas ao mesmo tempo começa a ser surpreendido pelo interesse que desperta numa rica herdeira belíssima. Tudo, que poderia ser sorte e alegria, se faz desencanto, erro e crime. O filme é de uma melancolia absoluta.
   Baseado em clássico de Theodore Dreiser, o roteiro não faz concessões. Clift é um rapaz triste. Em seus olhos e nos seus modos vive um tipo de "estrangeiro", de homem que nada sente por inteiro, de alienado. Marlon Brando levou a fama, mas o ator que criou o modo moderno de atuar é Clift. Torturado, complicado, profundamente infeliz, Clift morreria aos 45 anos de alcoolismo. Seu trabalho aqui é impressionante. Jamais sentimos raiva ou pena dele, sentimos proximidade, compaixão.
   Incrível pensar que Elizabeth Taylor tinha 17 anos aqui. Foi seu primeiro filme sério e ela está lindíssima. Faz com leveza e coquetismo a milionária que cai de paixão por Clift. As cenas de beijo dos dois são plasticamente imbatíveis. O filme fez dos dois, amigos para toda a vida. Shelley Winters faz a proletária engravidada. Há uma cena, em que ela vai ao médico para tentar aborto. A cena lentamente se transforma  numa luta surda, cruel, tristíssima entre Shelley e a verdade.
   George Stevens se fez famoso pelo seu capricho. Filmava muito, gastava meses em montagem, era um perfeccionista. Nos extras Roubem Mamoulian diz que ele tinha o mais corajoso dos estilos: cenas longas, sem movimento de câmera, sem cortes e enfeites. E são cenas maravilhosas! A beleza do filme está ligada ao tema. Nunca é uma beleza gratuita. Como diz Warren Beaty em outra entrevista nos extras, Stevens dirige sem se exibir. Como faziam Renoir, Wyler e Zinnemann, é a direção invisível, não intrusiva, que conta e mostra, que nos faz esquecer que aquilo é um filme.
   As cena se fundem em outras cenas. É um efeito encantatório. O rosto de Liz Taylor se apaga lentamente enquanto um carro passa correndo numa estrada. Ou o lago brilha ao luar e desaparece dando lugar aos rostos de Clift e Liz. As cenas se embaralham, se torcem, fluem como brilho de sonho. Aliás, todo o filme tem um aspecto maravilhoso de sonho ( ou melhor, pesadelo ). Mas não é só na forma ou em seus atores que reside a grandiosidade de A Place in The Sun. É na humanidade do todo que ele nos toca mais fundo. Aqui não há um vilão. Não há um herói. Os milionários são apenas homens, assim como os operários. As duas mulheres se comportam como amorosas e assustadas apaixonadas. Nenhuma delas é ruim ou boa. E Clift, numa atuação mágica, faz um assassino que nunca parece ruim ou esperto, e um herói que é todo mentira, tristeza e distancia.
   Vencedor de 6 Oscar, sucesso de bilheteria, feito antes de SHANE, este é um filme inesquecível.