EXILIO

"Tudo já foi dito, tudo já foi escrito, tudo já foi feito"- Foi o que Deus ouviu. E ainda não tinha criado o mundo, nem existia coisa alguma. "Também isso eu ouvi", Ele respondeu, do separado velho Nada. E pôs-se a obra.
Uma romena certa vez me cantou uma melodia popular que mais tarde reconheci incontáveis vezes, em várias obras de vários autores dos últimos quatrocentos anos. As coisas não começam, ninguém contesta isso. Ou pelo menos não começam no momento em que foram inventadas. O mundo foi inventado velho desde o começo.
Jorge Luis Borges.

Um mundo feito por um deus que não era deus. Um mundo onde estamos exilados. Essa é a crença profunda de todo artista. O exílio. O deus que cria Adão não é Deus. A criação do homem e deste universo já é uma queda, uma catástrofe. E todas as igrejas são ilusões. Perpetuação do erro. Jesus não ressuscitou. E os anjos existem apenas para nos confundir.
Se eu escrevesse isto em 1600 seria morto. Hoje, parece uma banal verdade. Um simples pessimismo. Mas para colocar as coisas em seus devidos lugares, devo completar o que escrevi.
Exilados na saudade do Deus que foi afastado de nós. Nostálgicos da união. Jesus era um viajante. Ressuscitou "antes" de morrer. São Paulo não nos fala de Jesus, fala de Paulo. A sensação que temos de termos sido enganados. A certeza de que já fomos melhores, maiores, livres. As tentativas de se estabelecer contato com a verdade. Somos eternos mas a morte existe. Renascer antes de morrer. Ninguém renasce após a morte, a coisa se decide agora. Encontrar a voce-mesmo e salvar Deus de seu exilio. Whitman, Rimbaud, Emerson, Huxley, Rilke, Melville, Shelley, Yeats, Lawrence, Borges. Os grandes "buscadores".
Eu não me impressionaria tanto com essas ideias se não as pensasse desde sempre. E sei que muito pensam e não falam. Ou não conseguem as expressar em pensamento coerente. Então fica mais fácil dizer: Bláh!!!
A ideia de Deus exilado é a mais dolorosa que se pode ter. Mas deve-se saber que uma fagulha da criação primeira ( antes da queda-criação ) ficou em nós. E é essa fagulha que nos faz procurar, indagar, estudar, viajar, penetrar na vida. Procuramos até percebermos que aquilo que procuramos sempre foi nosso. Mas não é dado ver a todos.
É por isso que amo os trovadores. E vi em cada amor a chance de transformação. É por isso que sofro da nostalgia dos homens grandes e do mundo grande. É por isso que sempre senti a urgência de salvar alguma coisa em mim e fora de mim.
Nascemos antes.
E se voce não sabe não cabe a mim dizê-lo.