A CEIA DOS ACUSADOS- DASHIELL HAMMETT

   Nick e Nora formam um casal urbano que passa seus dias em doce usufruir de seu afeto. Entre dúzias de drinks e frases cheias de ironia afetuosa, eles perambulam entre bares e restaurantes. Ricos, alegres e corajosos, são a síntese daquilo que os americanos da época da depressão queriam ser. Quem os criou foi Dash Hammett, um ex-várias coisas, dentre elas ex-detetive da Pinkerton. Ah sim...Nick foi um detetive. E neste livro, volta a ação.
 O enredo é complicado. São montes de suspeitos, montes de pistas e ambientes variados. Nick anda em meio a tudo isso sempre acompanhado por whisky, vinho, gim, martinis e algum café. Era uma época em que beber era saber viver, então Nick bebe. E fala. Se fala muito neste livro. Autores mais "sérios" adoravam Hammett por causa de seu talento em diálogos. O livro tem a prosa americana típica: poucas descrições de cenários, muito diálogo. O livro todo é construído em frases trocadas entre duas ou mais pessoas, e as frases de Nick e de Nora são sempre brilhantes, leves, engraçadas, esvoaçantes.
 Os fãs de Dash Hammett ( são muitos ), não vão gostar do que vou dizer, mas prefiro o filme dos anos 30 baseado neste livro. Nick e Nora são feitos com enorme carisma e simpatia pelos adoráveis William Powell e Myrna Loy. Vê-los é se apaixonar pelos dois. Dentre os livros de Hammett prefiro muito mais "Continental Op", uma coletãnea de contos de detetive.
 Dashiell Hammett, inventor do moderno detetive americano, autor do "Falcão Maltês", teve um destino funesto. Casou-se com Lillian Hellman, autora "relevante", chata de galochas, que sugou tudo o que podia de Dash. Alcoólatra, impotente, sem conseguir escrever nada, Hammett viveu muito, mas foram décadas de total aposentadoria. Hoje é um tipo de herói americano, o tipo de autor macho, íntegro, vivido, que todo escritor iniciante ingênuo tenta parecer. O filme de 1976, "Julia", ajudou muito nessa mitificação. Hammett é feito com simpatia e sabedoria pelo grande Jason Robards ( levou Oscar pelo papel ) e Lillian é feita por Jane Fonda ( um absurdo, pois Hellman era famosa pela feiura ). É um filme excelente, de Fred Zinnemann, belo e emocionante... quem viu o filme tende a querer ser um escritor como Hammett, e ter uma "amiga" como Lillian.
  De qualquer modo, voltando ao livro, ele não deixa de ser uma aula na arte de se escrever diálogos. E é engraçado observarmos como até hoje ainda se percebe a influência desse estilo em livros policiais, filmes estilosos e até em música pop. Nick e Nora ( e seu cão Asta ) eram encantadores. Viver como eles deveria ser uma experiência fascinante.