É dificil pensar, requer muita atenção e algum tempo. Coragem também.
A vida toda eu pensei que pensava. O que eu fazia, na verdade, era reagir à vida e repetir certos conceitos decorados. Dialogava comigo mesmo aquilo que outros haviam me ensinado. Isso não invalidava o mérito de conhecer os pensamentos de Tolstoi ou de Nietzsche. O problema é que eu não sabia pensar por mim mesmo.
Certas experiências de vida, e alguns poucos momentos de arte, começaram a me colocar em dúvida. E creia, não existe pensamento se voce não duvidar da certeza. Para mim, muitas coisas eram certezas absolutas. Lembro que eu adorava posar de conselheiro. Dava opiniões definitivas sobre o que era o amor ( desejo sexual sublimado ), sobre as mulheres ( tudo o que desejam é um herói ), sobre a religião ( ideologia dos fracos ) e sobre a vida em si ( um aprendizado ). Era cômodo crer nessas certezas, e mais esquisito, eu achava que eram pensamentos meus. Quanto mais triste minha vida se fazia, mais eu me agarrava na vaidade de ser "um pensador consciente". O consolo de minha vida era "saber pensar".
Não sei quando exatamente as coisas começaram a ruir. Mas houve um momento em que percebi a fragilidade de tudo aquilo que eu gostava de pensar como óbvio. Talvez tenha sido a morte de meu pai, que me fez perceber que eu, que tinha tantas certezas sobre quem ele era, simplesmente não o conhecera. Talvez o contato com gente de classe social que eu desconhecia. Perceber que essas pessoas são diferentes dos chavões sobre elas propagados. Ou tudo isso mais a massa imensa de filmes, livros, teses, conversas, memórias, imagens, que o tempo livre e a disposição a aprender me fizeram penetrar. Eu adentrei aquilo que não conhecia. Deixei de amar apenas o que ia de encontro ao que já sabia. Viajei para o outro lado. Comecei a tentar pensar. Ver o óbvio que fazemos força para não ver.
Pensar coisas como:
Talvez meu pai estivesse certo e eu errado, talvez as pessoas mais simples estejam próximas da vida, e talvez arte, poesia e psicologia não tenham qualquer importância. Quem sabe o sexo não seja, na verdade, uma forma mais fácil de amar, e portanto o amor não é sublimação de nada, mas sim o sexo seja consolo de quem não sabe ou consegue, amar. As mulheres talvez não desejem um herói, talvez os heróis é que tenham um desejo imenso por elas. Talvez a religião seja coragem, a coragem de se submeter a algo fora de seus poderes. Talvez ela esteja acima da arte e da razão. E quem sabe a vida não seja um aprendizado, ela seja apenas um vazio cujo sentido nos é negado saber. Ou não. Pensar seria ver o lado oposto, mais que isso, seria inverter a questão.
Dessa forma, se Nietzsche diz que os judeus eram escravos que aprenderam a valorizar a escravidão, eu penso, o que isso pode ter originado de bom? Os senhores do Egito eram melhores que eles? O que é melhor ou pior? O que é bom? Qual o mal em se ter uma ideologia escrava? O que há de belo no SuperHomem?
Se a religião é o ópio do povo, eu penso: que ópio é esse? Que efeitos positivos essa droga traz? Quais seus efeitos negativos? Mais que isso eu penso, ópio em relação a que? A arte é ópio, o marxismo é ópio, Freud é ópio, poesia é ópio, maconha e prostitutas são ópios. Qual a droga menos ruim? O que é ser ruim?
Pensar não é apenas questionar tudo, é intuir certas coisas. A única que agora tenho certeza é que nossa razão é tão limitada quanto nossa visão ou nossa audição. Não percebemos a totalidade, não conseguimos sequer imaginar o todo. Míopes, só vemos a fração, o pequeno, o quase insignificante. A vida nos é incompreensível.
Aprendi a desconfiar de religiosos que se travestem de politicos, que se embrenham nas questões da matéria, e de ateus que se dão a missão de catequizar, de se unir em igrejas materialistas, que opinam sobre a fé. Os dois pensam pensamentos mortos, pensamentos que não resistem a duas ou três perguntas. Um responderá a tudo: "porque assim é". O outro sempre dirá: "não existe prova concreta". Para um eu direi: pode não ser assim. E para outro eu responderei: me prove a verdade concreta de um só pensamento.
Me lembro de uma tarde, após bela hora de amor, voltando a pé pra casa, de repente eu imaginar São Pedro e São Marcos no céu, sobre nuvens, exatamente como numa pintura de Rafael. E um pensamento me ocorrer: Não seria hilário se nós tivéssemos dado tantas voltas, e descobríssemos ao final que as coisas eram tão claras assim? Que um Deus existisse e os Santos e tudo mais? Seria humilhante para todos nós, homens que pensam. Pois é... esse cômico pensamento me fez perceber que novos modos de ver e de duvidar estavam ao meu lado todo o tempo. E que eles eram tão válidos e possíveis como a existência da partícula fundamental ou a evolução do pato e do marreco. O mistério vive dentro do próprio ato de pensar o abstrato. A matéria é sua consequencia.
Depois, voltando a estudar, comecei a perceber que esses pensamentos me ajudavam a compreender aquilo que era dado. Literatura, filosofia, linguística, se tornaram conchas abertas. Eu saí da linha reta do pensamento aprendido, entrei na roda sem eixo do pensamento criativo.
Posso estar longe da verdade ( estou ), posso estar girando a toa, sem rumo ( com certeza ), mas penso do meu modo, portanto, estou vivo.
A vida toda eu pensei que pensava. O que eu fazia, na verdade, era reagir à vida e repetir certos conceitos decorados. Dialogava comigo mesmo aquilo que outros haviam me ensinado. Isso não invalidava o mérito de conhecer os pensamentos de Tolstoi ou de Nietzsche. O problema é que eu não sabia pensar por mim mesmo.
Certas experiências de vida, e alguns poucos momentos de arte, começaram a me colocar em dúvida. E creia, não existe pensamento se voce não duvidar da certeza. Para mim, muitas coisas eram certezas absolutas. Lembro que eu adorava posar de conselheiro. Dava opiniões definitivas sobre o que era o amor ( desejo sexual sublimado ), sobre as mulheres ( tudo o que desejam é um herói ), sobre a religião ( ideologia dos fracos ) e sobre a vida em si ( um aprendizado ). Era cômodo crer nessas certezas, e mais esquisito, eu achava que eram pensamentos meus. Quanto mais triste minha vida se fazia, mais eu me agarrava na vaidade de ser "um pensador consciente". O consolo de minha vida era "saber pensar".
Não sei quando exatamente as coisas começaram a ruir. Mas houve um momento em que percebi a fragilidade de tudo aquilo que eu gostava de pensar como óbvio. Talvez tenha sido a morte de meu pai, que me fez perceber que eu, que tinha tantas certezas sobre quem ele era, simplesmente não o conhecera. Talvez o contato com gente de classe social que eu desconhecia. Perceber que essas pessoas são diferentes dos chavões sobre elas propagados. Ou tudo isso mais a massa imensa de filmes, livros, teses, conversas, memórias, imagens, que o tempo livre e a disposição a aprender me fizeram penetrar. Eu adentrei aquilo que não conhecia. Deixei de amar apenas o que ia de encontro ao que já sabia. Viajei para o outro lado. Comecei a tentar pensar. Ver o óbvio que fazemos força para não ver.
Pensar coisas como:
Talvez meu pai estivesse certo e eu errado, talvez as pessoas mais simples estejam próximas da vida, e talvez arte, poesia e psicologia não tenham qualquer importância. Quem sabe o sexo não seja, na verdade, uma forma mais fácil de amar, e portanto o amor não é sublimação de nada, mas sim o sexo seja consolo de quem não sabe ou consegue, amar. As mulheres talvez não desejem um herói, talvez os heróis é que tenham um desejo imenso por elas. Talvez a religião seja coragem, a coragem de se submeter a algo fora de seus poderes. Talvez ela esteja acima da arte e da razão. E quem sabe a vida não seja um aprendizado, ela seja apenas um vazio cujo sentido nos é negado saber. Ou não. Pensar seria ver o lado oposto, mais que isso, seria inverter a questão.
Dessa forma, se Nietzsche diz que os judeus eram escravos que aprenderam a valorizar a escravidão, eu penso, o que isso pode ter originado de bom? Os senhores do Egito eram melhores que eles? O que é melhor ou pior? O que é bom? Qual o mal em se ter uma ideologia escrava? O que há de belo no SuperHomem?
Se a religião é o ópio do povo, eu penso: que ópio é esse? Que efeitos positivos essa droga traz? Quais seus efeitos negativos? Mais que isso eu penso, ópio em relação a que? A arte é ópio, o marxismo é ópio, Freud é ópio, poesia é ópio, maconha e prostitutas são ópios. Qual a droga menos ruim? O que é ser ruim?
Pensar não é apenas questionar tudo, é intuir certas coisas. A única que agora tenho certeza é que nossa razão é tão limitada quanto nossa visão ou nossa audição. Não percebemos a totalidade, não conseguimos sequer imaginar o todo. Míopes, só vemos a fração, o pequeno, o quase insignificante. A vida nos é incompreensível.
Aprendi a desconfiar de religiosos que se travestem de politicos, que se embrenham nas questões da matéria, e de ateus que se dão a missão de catequizar, de se unir em igrejas materialistas, que opinam sobre a fé. Os dois pensam pensamentos mortos, pensamentos que não resistem a duas ou três perguntas. Um responderá a tudo: "porque assim é". O outro sempre dirá: "não existe prova concreta". Para um eu direi: pode não ser assim. E para outro eu responderei: me prove a verdade concreta de um só pensamento.
Me lembro de uma tarde, após bela hora de amor, voltando a pé pra casa, de repente eu imaginar São Pedro e São Marcos no céu, sobre nuvens, exatamente como numa pintura de Rafael. E um pensamento me ocorrer: Não seria hilário se nós tivéssemos dado tantas voltas, e descobríssemos ao final que as coisas eram tão claras assim? Que um Deus existisse e os Santos e tudo mais? Seria humilhante para todos nós, homens que pensam. Pois é... esse cômico pensamento me fez perceber que novos modos de ver e de duvidar estavam ao meu lado todo o tempo. E que eles eram tão válidos e possíveis como a existência da partícula fundamental ou a evolução do pato e do marreco. O mistério vive dentro do próprio ato de pensar o abstrato. A matéria é sua consequencia.
Depois, voltando a estudar, comecei a perceber que esses pensamentos me ajudavam a compreender aquilo que era dado. Literatura, filosofia, linguística, se tornaram conchas abertas. Eu saí da linha reta do pensamento aprendido, entrei na roda sem eixo do pensamento criativo.
Posso estar longe da verdade ( estou ), posso estar girando a toa, sem rumo ( com certeza ), mas penso do meu modo, portanto, estou vivo.