CENA DIONISÍACA ( IN MY TIME OF DYING )

   Já vivi tantos transes dionisíacos ao som desta música que sempre acho que o mais recente será o último. Nunca é. O mais recente foi hoje.
   O primeiro é inesquecível. Junho de 1977. Eu era um pubescente. Havia abandonado a escola e ficava todo o dia só, nas ruas cheias de mato e de sapos. De tarde ouvia discos. E estava meio apaixonado por Jeanne, uma menina com a qual nunca havia falado. Num fim de tarde a música veio e me levou embora- simplesmente. Fechei os olhos e esqueci- fui. Dez minutos que parecem durar até hoje. Meus braços separaram-se de mim e minha voz cantou com uma potência que nunca foi minha. A forte batida estava dentro de mim, desde sempre.
   Após essa primeira vez a vida deixou de ser o que era. Saí da sala, fui pra rua de noite e andei a esmo, sem saber onde ir, mas indo exatamente onde tinha de ir. Pulei a janela e entrei no quarto. Havia um poster de Robert Plant nesse quarto. E de Gerry Lopez...
   O mais dionisíaco solo de guitarra.
   Hoje, tempo que nos rouba tudo de sagrado, vejo esse video. E pasmem, não me decepciono. Mais que isso, sorrio. Mais que isso: entro dentro de lá. E sei: um milagre.
   Tem coisas que são para sempre.