Este texto é inspirado pelo que Ivan Angelo escreveu na Veja.
Carros. Se já foram fumacentos calhambeques e coloridos rabos de peixe, hoje eles são monstros cinzentos que têm design intimidativo. Carros eram para despertar inveja. Hoje são tanques que devem despertar temor. E são dirigidos como fortalezas de guerra: vidros fechados escuros, alta velocidade, impaciência. Flanar com a capota arriada? Só velhos saudosistas ou chicanos enlouquecidos. Sim, a violência nos toma de assalto. Nossa época é a época da violência.
Ivan fala disso. Das crianças que têm como brinquedos monstros, assassinos e sangue. Barulhos sem fim, tiros, bombas, facas. Elas estão sendo treinadas para que? Que tipo de fantasia é plantada em suas cabeças? Basta olhar: o mais simples dos cartoons é violento. Pior, violência burra pois é sem ironia.
Ruídos. Todo filme é invasivo, mesmo os ditos de arte. Não se exibe nada que seja delicado ou sub-entendido. Se há depressão, é uma depressão violenta; se há silêncio, é o silêncio opressivo que anuncia a explosão. Todo filme é over, é estridente, é feito com cortes que chocam, que exasperam, que violentam. As comédias têm um riso de escárnio, de raiva, de rancor. E mesmo quando há "fofura" é uma leveza doentia, exagerada, caricata, falsa. E violentamente ameaçada.
As mãos estão pesadas, duras, secas. Não se pode mais ser sutil.
Politicos falam como se fossem babuínos, familias discutem em público, e nas calçadas o que se ouve são gritos histéricos, risos agressivos e medo em olhares solitários. O que se passa?
Tripas expostas em filmes, funk pregando o estupro, o sexo de pornôs, o tiro. Comerciais de cerveja onde tudo é pose de agressão: a super-bunda petulante e o cara de atitude mandona e debochada. Tudo over, hiper: ou voce é super feliz ou é nada. Agressivos.
O futebol se torna cada vez mais uma "conquista de território". Rimos dos marcadores de Pelé que pareciam querer dizer " posso lhe roubar a bola?", deveríamos chorar... Os corpos se chocam no jogo de "Guerreiros". O vôlley se tornou porrada e porrada e o boxe foi abandonado por ser pouco agressivo!!!!!!!!!!!!! Basquete de enterradas e gritos e tênis que é só saque e ponto. Toques, firulas, habilidade, leveza, tempo distendido, onde???
Na TV temos a corja do Pânico fazendo agressões sobre agressões, a corja da tarde mostrando mortes ao vivo, a corja das novelas com seus dramas onde todos ferram todos, a corja dos seriados onde todos são agressivamente doentes.
Voce pode dizer: Ora, o mundo sempre foi violento, veja a renascença, veja a revolução francesa, as guerras.... E eu digo: sim, o homem sempre foi animal violento, mas a violência tinha espaços restritos, lugar onde podia irromper. O lar era protegido, a escola era protegida, havia a igreja, o feriado, a praça pública. E principalmente entre 1880/1914 houve a certeza do fim da violência, mesmo com a colonização da Africa e a revolução bolchevique. Pois o homem comum, médio, podia passar a vida em calmo usufruir dos dias, podia viver sem assistir uma só explosão, um tiro, um grito de desespero. Isso é passado. Todos somos expostos todo o tempo a violência insidiosa. Porque?
Tenho assistido a uma caixa de dvds de Columbo. Não vou falar da genialidade da composição de Peter Falk, o que me dá um imenso prazer é o fato de que em toda a série ( policial ) não existir uma só cena de violência. Sem uma gota de sangue. Como isso era possível? Em 1971 se torturava como hoje, se guerreava como hoje, mas havia a hipocrisia de não se mostrar isso? Ou não seria o respeito de se saber que uma familia deveria ser uma ilha preservada da selvageria do mundo de fora? O que me importa é: Porque e como essa ilha foi estuprada?
Se na minha época de primeiro grau o que voce tinha de fazer para ser O Cara era jogar bola direito e ter uma Caloi 10, hoje voce tem de se parecer com um traficante e falar alto e com atitude ( atitude de quem está pronto para surrar alguém ). Contra esse tipo de jovem temos os sensíveis, um tipo de hiper-sensibilidade, o exagero da delicadeza, uma reação forçada e assustada contra os celulares em alto volume e os palavrões machistas. Violência negativa contra a violência positiva.
Ivan Angelo insinua que tudo isso prova que o fim está às portas. Bem, eu não tenho a menor dúvida de que o mundo como o conhecemos está em seu terço final, mas não creio que o mundo em si esteja no fim. O que sinto, irracionalmente, é que o mundo que valeria a pena ( para alguém como eu ) já se foi. É uma forma romantica de se ver o mundo, e eu sou muito romântico! Mas racionalmente qualquer um com mais de trinta pode perceber que a evolução nos tem levado na direção de um embotamento da paciência, do ato de escutar, do silencio, da solidão e do fazer nada; cada vez maior, e a uma preponderancia do ruído, da pressa, do falar sem ouvir, da histeria, da violência cada vez maior.
Sempre que um garoto vê um jogo de tênis ( ou uma luta de boxe ), assiste a um filme ( ou escuta um disco ) de trinta anos atrás, sua reclamação será sempre a mesma: Onde está a pressa, o movimento, a adrenalina, a porrada? Onde a explicitude da pornografia violenta? O mundo em preto e branco é gentil, gentileza que ele não conhece e que lhe parecerá uma linguagem desconhecida. O nosso, em 3D, é histérico, mesmo quando tenta ser suave.
Já disse e repito, porque?
Carros. Se já foram fumacentos calhambeques e coloridos rabos de peixe, hoje eles são monstros cinzentos que têm design intimidativo. Carros eram para despertar inveja. Hoje são tanques que devem despertar temor. E são dirigidos como fortalezas de guerra: vidros fechados escuros, alta velocidade, impaciência. Flanar com a capota arriada? Só velhos saudosistas ou chicanos enlouquecidos. Sim, a violência nos toma de assalto. Nossa época é a época da violência.
Ivan fala disso. Das crianças que têm como brinquedos monstros, assassinos e sangue. Barulhos sem fim, tiros, bombas, facas. Elas estão sendo treinadas para que? Que tipo de fantasia é plantada em suas cabeças? Basta olhar: o mais simples dos cartoons é violento. Pior, violência burra pois é sem ironia.
Ruídos. Todo filme é invasivo, mesmo os ditos de arte. Não se exibe nada que seja delicado ou sub-entendido. Se há depressão, é uma depressão violenta; se há silêncio, é o silêncio opressivo que anuncia a explosão. Todo filme é over, é estridente, é feito com cortes que chocam, que exasperam, que violentam. As comédias têm um riso de escárnio, de raiva, de rancor. E mesmo quando há "fofura" é uma leveza doentia, exagerada, caricata, falsa. E violentamente ameaçada.
As mãos estão pesadas, duras, secas. Não se pode mais ser sutil.
Politicos falam como se fossem babuínos, familias discutem em público, e nas calçadas o que se ouve são gritos histéricos, risos agressivos e medo em olhares solitários. O que se passa?
Tripas expostas em filmes, funk pregando o estupro, o sexo de pornôs, o tiro. Comerciais de cerveja onde tudo é pose de agressão: a super-bunda petulante e o cara de atitude mandona e debochada. Tudo over, hiper: ou voce é super feliz ou é nada. Agressivos.
O futebol se torna cada vez mais uma "conquista de território". Rimos dos marcadores de Pelé que pareciam querer dizer " posso lhe roubar a bola?", deveríamos chorar... Os corpos se chocam no jogo de "Guerreiros". O vôlley se tornou porrada e porrada e o boxe foi abandonado por ser pouco agressivo!!!!!!!!!!!!! Basquete de enterradas e gritos e tênis que é só saque e ponto. Toques, firulas, habilidade, leveza, tempo distendido, onde???
Na TV temos a corja do Pânico fazendo agressões sobre agressões, a corja da tarde mostrando mortes ao vivo, a corja das novelas com seus dramas onde todos ferram todos, a corja dos seriados onde todos são agressivamente doentes.
Voce pode dizer: Ora, o mundo sempre foi violento, veja a renascença, veja a revolução francesa, as guerras.... E eu digo: sim, o homem sempre foi animal violento, mas a violência tinha espaços restritos, lugar onde podia irromper. O lar era protegido, a escola era protegida, havia a igreja, o feriado, a praça pública. E principalmente entre 1880/1914 houve a certeza do fim da violência, mesmo com a colonização da Africa e a revolução bolchevique. Pois o homem comum, médio, podia passar a vida em calmo usufruir dos dias, podia viver sem assistir uma só explosão, um tiro, um grito de desespero. Isso é passado. Todos somos expostos todo o tempo a violência insidiosa. Porque?
Tenho assistido a uma caixa de dvds de Columbo. Não vou falar da genialidade da composição de Peter Falk, o que me dá um imenso prazer é o fato de que em toda a série ( policial ) não existir uma só cena de violência. Sem uma gota de sangue. Como isso era possível? Em 1971 se torturava como hoje, se guerreava como hoje, mas havia a hipocrisia de não se mostrar isso? Ou não seria o respeito de se saber que uma familia deveria ser uma ilha preservada da selvageria do mundo de fora? O que me importa é: Porque e como essa ilha foi estuprada?
Se na minha época de primeiro grau o que voce tinha de fazer para ser O Cara era jogar bola direito e ter uma Caloi 10, hoje voce tem de se parecer com um traficante e falar alto e com atitude ( atitude de quem está pronto para surrar alguém ). Contra esse tipo de jovem temos os sensíveis, um tipo de hiper-sensibilidade, o exagero da delicadeza, uma reação forçada e assustada contra os celulares em alto volume e os palavrões machistas. Violência negativa contra a violência positiva.
Ivan Angelo insinua que tudo isso prova que o fim está às portas. Bem, eu não tenho a menor dúvida de que o mundo como o conhecemos está em seu terço final, mas não creio que o mundo em si esteja no fim. O que sinto, irracionalmente, é que o mundo que valeria a pena ( para alguém como eu ) já se foi. É uma forma romantica de se ver o mundo, e eu sou muito romântico! Mas racionalmente qualquer um com mais de trinta pode perceber que a evolução nos tem levado na direção de um embotamento da paciência, do ato de escutar, do silencio, da solidão e do fazer nada; cada vez maior, e a uma preponderancia do ruído, da pressa, do falar sem ouvir, da histeria, da violência cada vez maior.
Sempre que um garoto vê um jogo de tênis ( ou uma luta de boxe ), assiste a um filme ( ou escuta um disco ) de trinta anos atrás, sua reclamação será sempre a mesma: Onde está a pressa, o movimento, a adrenalina, a porrada? Onde a explicitude da pornografia violenta? O mundo em preto e branco é gentil, gentileza que ele não conhece e que lhe parecerá uma linguagem desconhecida. O nosso, em 3D, é histérico, mesmo quando tenta ser suave.
Já disse e repito, porque?