ELEGIAS AMOROSAS= JOHN DONNE

John Donne é poeta central em toda a história das letras inglesas. E viveu nos áureos tempos da virada, o momento em que o poderio inglês se afirma nos mares e a nação se enche de orgulho e de fé no futuro. Nesse mundo, em que o racionalismo-otimista se expande por todos os cantos, Donne começa escrevendo poesia erótica, amorosa, e vive esse universo sensual sobre o qual escreve. Na parte final de sua vida Donne se faz religioso, Deus passa a ser seu tema. Por favor, não pense que ele foi um libertino arrependido. A religião entra na vida de Donne como natural desenvolvimento de sua história. Em seus poemas de juventude já notamos que existe nele a fome da experiência. É como se após desvendar todos os recantos da carne, ele comungasse com os mistérios da alma.
E aqui está uma edição portuguesa, tradução excelente de Helena Barbas. Poesia feliz, exultante, poesia do êxtase. O poeta convence sua amada a se dar, prega a inconstância, mundo onde ninguém é de ninguém. A musicalidade impera, cada poema é um tipo de canção erudita. Imagens sobre imagens, pele e pelo, curvas e geografias carnais, teses de liberdade, sínteses de sedução.
"As mulheres são para os homens, não para mim ou para você", este o tema da elegia 3, Changes, elegia que demonstra a volubilidade das mulheres, a mudança constante da vida. Pois deixar de mudar é ser lago imundo, quando somos rios. Ricos.
E Donne reclama depois da mulher a quem ele tudo ensinou e que agora se vai ( Donne é humano, a vida é mudança, mas ele quer que ela fique um pouco mais ), ela se vai, sábia, dar a outros o que ele lhe deu. Na elegia 9 ele faz o elogio do Outono e com ele das mulheres outonais. Uma aula de imagens que correm em constante velocidade, sonoridades que hipnotizam, sensualidade sem fim. E vem a elegia 11, Bracelete, talvez a minha favorita. Ele lamenta a jóia dada a sua amada, ouro que revelou ao pai da moça o amor secreto dos dois. Donne faz comparações entre os metais e o amor, divaga nos meandros de seu sentimento, flui entre suas sensações.
Na elegia 15 ele cospe em postulações a infidelidade da mulher. Elas mentem, todo o tempo, a mentira é condição de ser mulher. John Donne se faz agressivo, virulento, ferino, maldoso. Mas isso não impede, antes realça o fato de ser um poema cheio de gênio, de som e de fúria, vivo para sempre. No 19 ele vai para a cama com ela, e na cama é desvendado todo o segredo do claro corpo da amada. Amada que nunca é "amada" à moda romântica, é desejo carnal, volúpia, sagrada volúpia. "Deixa que minhas mãos se percam atrás na frente entre".
Não citarei mais frases de Donne. Impossível escolher. Procurem ler este poeta metafísico, carnal, vermelho de sangue e azul de anjos. John Donne é além do tempo.