CINEMA DE ARTE ( HOMENAGEM A MONICELLI )

Não existe mais cinema autoral na América. Tudo é pop. E isso não é necessariamente ruim. Torna-se besteirada quando o cara, jeca, tem vergonha de ser pop e finge ser artista. É como o cara que compra Proust, lê o resumo e vai às reuniões de ex-alunos de física posando de entendido. Quem tem um olho em terra de cego é rei.

Cinema autoral, hoje, só no terceiro mundo. Na europa a tv financia o cinema e tv não pode ser arte. Pode ser esperta, culta, inteligente, mas nunca autoral. É trabalho de grupo, tem patrocinador forte, precisa causar hype, tudo que um autor não admite.

O cinema americano hoje está dividido entre pop assumido, pop que se finge arte e pop gracinha. No pop assumido reside o melhor. Como sempre, o cinema lá tem vocação para circo. E circo, quando bem feito, é insuperável. O pop que se finge arte tem por patronos Gus Van Sant e David Lynch. Por mais que eles tentem ser autorais, tudo neles é popice. Desde a trilha sonora, passando pelos atores, cenário e problemas apresentados. É tudo tão artístico quanto um clip da MTV.

E tem o cinema gracinha, que as vezes acerta. Ele nasceu com Hal Ashby e seu Harold and Maude ( Ensina-me a Viver ). Gente fofa, gente do bem, com seus dramas de familia destruídas, com suas dores infanto-juvenis, com suas escolas cruéis. Esse cinema tenta sempre parecer do bem, e tem sempre algo de franciscano, de hippie, de bacaninha.

Desde quando os críticos de cinema Godard, Truffaut, Chabrol, Rhomer e Rivette descobriram que western é arte a situação é essa. Até então, bons filmes eram os pop-arte, e só eles. Era por isso que Hitchcock era subestimado. Assim como os westerns de Ford e Hawks. Filme bom tinha de tratar de temas nobres, sérios, tinha de ser relevante. tinha de PARECER ARTÍSTICO.

Mas esse bando de franceses mostrou que um tiroteio pode ser mais artístico que um drama sobre incesto ou sobre a impotência. Que uma paisagem de Ford vale mais que um diálogo de Eugene O'Neill.

O Oscar jamais entendeu isso, e continua achando que arte é falar sobre esquizos ou sobre refugiados. Às vezes eles acertam, mas sempre pela razão errada.

Mario Monicelli é superior a tudo que Rosselini fez. Os Eternos Desconhecidos é uma obra-prima "sem querer", o que são os melhores filmes. Desconfie sempre que um diretor sentar na cadeira e falar: Farei uma obra-prima!

Sam Peckimpah é arte profunda e é hiper pop. É muito superior a John Cassavettes, que tenta o tempo todo ser maldito.

Os Irmãos Coen dão de lavada em qualquer diretor hermético metido a novo Kubrick. Assim como um diretor pop assumido como James Mangold nunca erra.

O filme sobre Bob Dylan, que eu acho ser um dos cinco melhores desta década, é pop até o osso. Ele trata de um ídolo pop, de propaganda pop, de jornalistas de moda, de Fellini. Todd Haynes jamais perde esse rumo. Nada há de chocante, genial ou simbólico-vazio. Torna-se arte sincera.

Mas veja bem, quando se fala em arte no cinema jamais passamos do nível Jack London, Conan Doyle ou Alexandre Dumas. O mais genial dos diretores ( Bergman e Kurosawa ) chega no máximo ao nível Evelyn Waugh/ Somerset Maugham. O cinema é pop, depende de bilheteria e de comunicação com grupo, jamais será erudito.

Quem mais tentou ser erudito foi Dreyer. E Tarkovski. Cinema de autor, cinema que não mais existe é esse. Assista A PALAVRA de Dreyer e SOLARIS de Tarkovski. Isso não é nada best-seller. Tenta ser Dostoievski e Kafka. É outra coisa. Cinema. Cabeça, metido, chato pacas, mas ao menos, original, sincero e muito corajoso.

Se voce quer arte não procure cultura de massa. Leia Tolstoi, leia Sebald, ouça Stockhausen ou John Cage. Cinema sempre é para a massa. Mesmo que seja a massa jeca que pensa que fazer um filme sério, crispado, hermético e escuro seja fazer a tal da arte. Arte para quem nunca entendeu arte. O tal olho em terra de cego.

Nunca foi tão fácil posar de artista. Quase ninguém viu algum dia a tal arte. E quando viu, a ignorou sem compreender nada. Miopia de quem não exercitou olho e entendimento. Então alguns tipinhos passam a posar de arteiros. E a fazer filmes para míopes. Arte ? Não. Popice travestida de pretensão. Musiquinha triste, imagens trabalhadas, temas dificeis. Pop como uma "História em Quadrinho "adulta". E é só.

O pop pode ser maravilhoso. Desde que seja assumidamente, pop.
Abba é melhor que Pink Floyd e Michael Jackson que Smiths.
O que? Loucura? Onde? Voce é ingênuo de achar que o Floyd é anti-pop e que Morrissey é nobre? Em que mundo?
Tente escrever uma canção como Mamma Mia e uma como Wish You are Here. Qual a mais dificil de compor ? ( Adoro as duas. Mas para mim as duas são do mesmo naipe ).
Não pense que ouvir Radiohead ou assistir Almodovar faça de voce algo erudito ou especial. Faça de voce um cara Anti´pop. O que te faz diferente é o entendimento que voce tira de tudo. Perceber a beleza de uma luta de Jackie Chan ou a verdade numa canção de Tim Maia. Posar de artista por gostar de Lars Von Trier é muito fácil. É como comprar um Bacon e colocar na sala. E daí ? O que voce tirou daquilo ?

Scorsese sempre foi melhor que Haneke.