CHARLIE BROWN SOU EU. OU: A DESCOBERTA DO JAZZ

Um famoso psicólogo ( quem? ) disse uma vez que entre outras coisas, a maior genialidade de Charles Schulz ao criar os Peanuts, foi a de exemplificar os vários tipos de neurose. Em Linus, Lucy, Patty Pimentinha, Schroeder e principalmente Charlie Brown, temos todas as neuroses do tempo moderno. Menos Snoopy, e é aí que o gênio se revela. Nesse meio torto e cinzento ( e pintado com tanto afeto ) Snoopy é a imagem da mente sadia. Esse beagle que dorme e come, que agride quando é pisado e dança sempre que feliz, é a imagem da saúde mental, da boa disposição, e principalmente da criatividade. Pois Snoopy sonha. Sonha em ser um ás da aviação, sonha em ser um legionário. Snoopy é a felicidade.
Charlie sou eu. Eu queria ser o Linus. O Linus é mais esquizo. Mas Charlie sou eu, fazer o que? Eu sempre subi naquele monte de terra e sempre soube que ia perder. E a menina ruiva nunca falou comigo. Sim, Charlie Brown sofre de auto-piedade. Sim, ele é o molde de Woody Allen. Sim, Schulz foi um gênio. Mas tem mais.
Nesse dvd novo há um documentário sobre o autor da trilha sonora, Vince Guaraldi. Se fala que a trilha de jazz dos Peanuts fez com que muita criança se tornasse fã de jazz quando adulto. BINGO! Taí! Se fala da primeira vez em que se ouviu o tema de Linus e Lucy. Aquele piano dedilhado nada infantil ( Peanuts nunca é infantil ), a bateria marcada, a agilidade feliz do compasso. A música se tornou hit e Vince uma estrela ( até morrer cedo, do coração ).
Assisto Peanuts desde os oito anos de idade. E sempre adorei sua música. ( As músicas de Vince são da série antiga. A partir dos anos 70 a coisa se vulgarizou. ) Mas é agora que percebo que aquele foi o primeiro jazz que ouvi na vida. Mais: que tudo o que realmente me seduz em jazz até hoje é meio Vince Guaraldiano. De Monk a Lester. Eureka!!!!! Snoopy dançando ainda é a coisa mais jazz que há.
Numa ilha deserta, se tivesse de levar só um cartoon eu levaria Snoopy. Doeria ficar longe do Pernalonga ou do Patolino. Tenho o Papa-Léguas tatuado no braço. Mas a vida sem Charlie Brown é inimaginável. Como os filmes de Hitchcock, as músicas dos Beatles ou a pintura de Renoir, faz parte de nosso ambiente, de nosso meio, de nosso inconsciente. Enriquece a vida, enobrece a alma, faz a gente até crer em algum motivo para perder.
Eu amo Charlie Brown.