O CORCEL NEGRO- OBRA-PRIMA DA ARTE PURA

O CORCEL NEGRO é filme de Carroll Ballard (assistente de Lucas em Star Wars ) e tem Melissa Mathison ( de ET ) no roteiro. Trata da história de um menino e seu cavalo. Primeiro numa ilha deserta e depois em casa. É um filme quase mudo. Imagem, movimento e música. A música, belíssima e cheia de variedade, é do pai de Coppolla, Carmine. A fotografia é de um dos dez melhores diretores de fotografia da história, Caleb Deschanel ( sim menino, pai de Zooey ). O filme é uma obra-prima, produzido por Francis Coppolla e epitáfio do cinema dos anos 70.
Foi sucesso. Hoje seria ? Cheio de ação, mas com longos momentos de vazio, onde apenas a beleza importa. O menino ( Kelly Reno, comovente, sua cena com a mãe, quando fala do pai, é antológica ) e o cavalo ( o animal mais belo que já tive o assombro de ver numa tela ). A areia, o mar, rochas, vento, o céu. O filme atinge alturas que só a poesia pode. Nada acontece, tudo interessa. O segredo deste filme é sua simplicidade.
Filmes cheios de meandros. Arte complexa ou arte simples e pura. Adoro o jogo intelectual de Cidadão KANE ou de ORFEU. Mas O CORCEL NEGRO é da estirpe de O ATALANTE, o fio puro, limpo, simples, o dizer tudo em silêncio, revelar sem contar. Magia. Este filme é de inspiração mágica.
Depois o menino e o cavalo voltam à civilização e tememos que o filme se vulgarize. Não. O silêncio ainda manda. E surge Mickey Rooney, em simpatia e gênio de atuação. O cavalo permanece como irresistível força da natureza e o menino como chave para seu mundo. Eu poderia filosofar longamente sobre tudo o que cada cena simboliza. Mas estragaria o símbolo maior : sua simplicidade.
Feito hoje ele seria visto como aberração. Teriam posto uma piadinha aqui, uma menina lá, acelerado o ritmo e talvez uns toques de "arte" acolá. A simplicidade seria profanada. O cavalo seria humanizado. Sua tremenda rebeldia seria atenuada.
O CORCEL NEGRO é obra-prima por ser monumento de vento e luz, feito da respiração acelerada do cavalo negro, da noite de seu olho febril e das sardas do menino em momento abençoado. É o testamento saudável de uma geração perdida. O que ficou de testamento daquele cinema doido que nos deu Taxi Driver e Carrie. Em 1979, enquanto Coppolla perdia tudo com Apocalypse Now, O CORCEL NEGRO adentrava a década yuppie com lembrança do que poderia ter sido, do que valia mais : Pureza.
O cinema foi criado para ser assim. Todo o resto é literatura.