CINEMA DE CRIANÇA

O cinema dos anos 70 foi o cinema da droga. Mais especificamente, da cocaína. Os filmes ( os que marcaram a época ) são todos testemunhos da euforia, da paranóia e da deprê do pó branco. Cheirava-se muito, demais, era um absurdo. Atores, roteiristas, diretores, produtores, todos seguindo uma longa carreira rumo a destruição. Gente como Sam Peckimpah, Frankenheimer, Friedkin, Dennis Hopper, Coppolla, com seu caminho truncado para sempre. Os filmes eram desejos de viciados : montes de pó ficavam a disposição nas mesas dos executivos. As coisas tinham de mudar, ou todos morreriam e matariam a indústria.
Produtores como Jon Peters e Joel Silver assumiram o controle nos anos 80 e trouxeram com os anos Reagan a estética gay. É impressionante como todo filme dos 80 tem tiques e trejeitos homo. Rambo é o símbolo maior, boneco bombado gay com enorme falo nas mãos. É a era dos paletós brancos com ombreiras, dos cabelões armados, dos Armani, de Top Gun e dos David Lynch da vida. Nasce Almodovar, Van Sant, Greenaway, Fassbinder vira chic. As mulheres no cinema perdem seu espaço como musas e se tornam más, predadoras, perigosas sem o lado sexy do filme noir. Atração Fatal. As atrizes ficam com um jeito meio assexuado e os homens com ar de academia : suados e de peito nú. Gays.
Nos anos 90 o mundo e o cinema ( e estou falando básicamente de Hollywood. Mesmo quando cito Fassbinder falo de seu impacto em LA ) se tornam adolescentes. Todos os filmes giram ao redor do rompimento/reatamento com o lar. Tudo é adolescência, tudo é feito em torno do conflito com pais ausentes ou o final da escola. Paternidade ( o medo dela ) é tema recorrente e Hollywood abre mão, para sempre, do filme adulto. De Forrest Gump a Titanic, tudo é adolescente, tudo é vida entre 14/18 anos ( mesmo quando já parecem adultos, como em Pulp Fiction ou Magnolia, são velhos teens em crise com sua família ou brincando de matar ). No cinema dos 90 o único interesse é parecer sempre jovem.
Agora, nos anos 2000, retornamos ao mundo da criança. Tudo é fantasia e susto. Tateamos entre a verdade ( nunca aceita ) e a saudade do útero : mundo fechado onde tudo é um grande eu. Neste cinema há a pura infantilidade gaga, até a total negação do mundo adulto. É um cinema que foge do tempo, que tem olhos apenas para o brinquedo, o devaneio, a masturbação mental. O sexo se torna algo a ser evitado, a vida real vira empecilho e tudo passa a ser fantasia. Nas mãos de poetas esse mundo seria digno de Chagall ou de Klee, mas o cinema está nas mãos de banqueiros... É um cinema onde até a neurose é vista como brinquedo, o amor se torna um conto da carochinha e a violência uma brincadeira de bonecos e carrinhos.
Sempre há excessões. Nos 70 Woody Allen não tinha traços de pó branco e Altman expelia perfume de erva; nos 80 Indiana Jones nada tinha de gay e nos 90 havia um cinema americano não adolescente. Mas a linha central, a cara e o rg da década foi teen, assim como de 2000 até 2... ela cheira a fraldas e talco.