HERMANN HESSE - O LOBO DA ESTEPE

Resisti muito a ler este livro tão famoso da grande literatura alemã. Por qual motivo não importa, mas digo que sempre achei Hesse um bocado sentimental. A frieza de Thoman Mann me agrada muito mais. Bem, então aqui está ele, um dos mais famosos livros do estilo alemão de "romance sobre formação". Encaremos então.... ------------------------ Li o livro. Primeiro fato inegável: o modo como Hesse o arquitetou é fascinante. Colocar narrador em sequência à outro narrador e então a voz do próprio Lobo dá ao romance um formato moderno, ousado, veloz. -------------- O Lobo tem 40-50 anos, e é um homem dividido entre duas almas: O humano, que é recional, bom, caseiro, amoroso, e o Lupino, violento, cheio de ódio pela humanidade, puro impulso. A teoria de Jung entra no livro de modo explícito, porém simplificado: devemos ser nós mesmos, nos indidualizar. E há também muito de Nietzsche: O Ser deve ser forte, livre, dramático. O Steppenwolf é uma angústia, aquela do homem que vive no limiar. Ele vaga sozinho, sem lugar. --------------------- Em 1929, ano do livro, Hesse jamais imaginaria que seu livro daria um ar intelectual aos cantores de blues dos USA. A molecada de 1967 veria no blues e no jazz, de então neles mesmos, o Steppenwolf da América. Em centenas de letras de rock vemos o cantor se declarando um coyotte, uma águia ou um índio. Por detrás de sua face humana viveria um ser livre e sem lugar. Como o negro cantor de blues de 1940. ------------------ O Lobo é um homem maduro em sua certidão de nascimento, mas ele é um adolescente eterno. Chato perceber que no imenso narcisismo do Lobo, Harry, vive um adolescente de 16 anos, um dos mais enjoados, aquele que se vê como um ser especial, complexo, único, um vaidoso que se auto deprecia, com medo do Lobo que vive em seu corpo. Blah! Porém.....não devemos assumir nosso narcisismo e entendermos que somos únicos, todos somos, sim? ------------------- O Lobo Harry logo entende que ele é mais que um homem e um Lobo. Ele é milhares de coisas. A maioria das quais inexplicáveis. O romance se torna então uma espécie de alucinação, de sono profundo, ou de fantasia surreal. Notamos que Harry pode estar mentindo todo o tempo. Talvez eke nem seja tão infeliz assim. ------------------ Hesse, óbvio dizer, é um grande escritor e um grande homem, mas seu estilo é árduo, ele é isento de qualquer sinal de humor. Nele temos sempre a sensação de estar diante de um herr professor de Hannover ou de Leipzig. Neste livro esse professor até que demora a surgir, mas quando surge dá uma aula solene sobre a existência. ----------------- Última reflexão, será hoje ainda nosso mundo, 2024, cheio de Homens Lobo? Penso que houve uma ironia perversa na história. Hoje o Homem Lobo é quem manda no mundo, mas esse Homem Lobo, ou Mulher Loba, ou X Lupus, é castrado e vive em grupos, mesmo que virtual. Aceitar seu lado irracional, ou seus milhares de lados, é coisa comum para qualquer humano consciente em 2024. Todos vivem nessa angústia de se saber dual e sentem-se solitários mesmo estando on line todo o dia. São divididos mas não têm o mal do Lobo. São cães. Se vêm como bons, corretos, a divisão é entre personalidades civilizadas. Ou amestradas. Por isso disse Lobo Castrado. ------------------ O homem que anda só, dividido e em dúvida, pensando na navalha, na morte, esse homem hoje não odeia, ele chora, não sente desejos de destruir, ele quer se dopar. Sua divisão é entre o humano e o "humano que desliga o celular", entre o humano e " o humano que vai viver na selva", nada mais radical que isso. Me parece que escrito agora seu foco seria no vazio absoluto e não na selvagem raiva anti humana do Lobo.