PEEPING TOM ( A TORTURA DO MEDO ), FILME MALDITO DE MICHAEL POWELL

Não conheço filme mais neurótico que este. E se voce conhecer a carreira de Powell, até 1960, ano deste filme, ficará mais perturbado ainda. --------------- Até então, Powell era um bem sucedido diretor inglês. Seus filmes, estimados por diretores e críticos, público e técnicos, eram sempre refinados, exuberantes, muito bonitos de se olhar, cheios de bons sentimentos. Surpreendente ele já era, pois Powell fazia filmes que sempre negavam o estilo da produção anterior. Ele fazia filmes de guerra, das mil e uma noites, filmes de viagem, religiosos, de ballet, de ópera, biografias longas, filme policial, filme de fantasia, filme semi documentário. Seu estilo era eclético, seus interesses vastos. Mas então, em 1960, ele faz um filme sobre sexo. E sexo em sua forma mais doentia. Crítica odiou e público fugiu apavorado. A carreira de Powell na Inglaterra terminou. Até o fim de sua vida, em 1990, ele faria apenas mais 3 filmes baratos. Nenhum deles em seu país. ( Um deles seria o maravilhoso A IDADE DA REFLEXÃO, na Austrália ). -------- PEEPING TOM foi feito no mesmo ano que PSYCHO de Hitchcock. Claro que o filme de Hitch é muito mais divertido. Dá pra fazer um paralelo: ambos falam de filhos reprimidos, traumatizados e assassinos. Ambos tratam de sexo. São opostos: Peeping Tom tem cores berrantes e que nos incomodam, Psycho é em PB. O trauma no filme de Hitch é em relação à mãe, em Powell é o pai que destruiu o filho. --------------- Em um mundo artificial, de vermelhos irritantes e azuis estourados, noturno e sujo, vemos um fotógrafo e cinegrafista matar uma prostituta. Então acompanhamos sua vida doentia. Ele é rico e trabalha tirando fotos de nú. Sua personalidade varia entre o hiper tímido e o ousado assassino. Uma vizinha se interessa por ele. Uma dançarina é morta. Sua tara é gravar o medo no rosto de suas vítimas. Por isso ele filma em close o momento de seu assassinato. -------------- A fotografia é do grande Otto Heller e a trilha sonora, jazz esquizoide, de Brian Easdale. Carl Bohm, filho do maestro alemão na vida real, faz o assassino. Ele é bonito e elegante, mas não um grande ator. Faltou um Anthony Perkins para dar vida ao criminoso doido. Não há suspense aqui, o que há é incômodo, doença, perversidade, e muita dor. É um filme feio, sujo, vazio de sentimentos. Um anti Powell feito por Powell. NUNCA UM DIRETOR NEGOU DE FORMA TÃO RADICAL TUDO O QUE FEZ ANTERIORMENTE. Seria o equivalente a Fellini filmar uma história com apenas 3 personagens em close e sem cenários. Bergman filmar uma história entre pobres da India, ou Spielberg fazer uma comédia no estilo dos Irmãos Coen. -------------- Mais chocante é ver que o assassino enlouqueceu porque seu pai filmava-o desde de criança em situações de medo provocadas pelo próprio pai. E vemos que esses flash backs usam filmes reais, feitos pelo próprio Powell, que filmava seu filho, real, desde criança. Real e ficção misturados como raramente se vê. --------------- Foi a segunda vez que vi este filme. A primeira o odiei muito. Ontem percebi seu valor.