RIMSKY-KORSAKOV, SHERAZADE

Primeira questão: é música clássica, erudita, de concerto, música séria, o que é? Como se deve nomear essa música que vai de 1400 até mais ou menos 1950? Séria não pode ser. Jamais! Além de parecer que ela detesta o humor, passa o preconceito de que toda outra música não pode ser levada à sério. De concerto? Pior ainda! Toda música tocada em palco é um concerto! Erudita? Por favor, não! Esse nome é pretensioso, chato, pedante. Clássica é o menos ruim. Sim, eu sei que clássica é apenas a música feita por Haydn, Mozart e os filhos de Bach. Feita mais ou menos entre 1750-1800, em Vienna. Mas é o nome menos ruim porque mesmo gente como Ives, Barber ou Lygeti são clássicos no sentido de que já são parte de uma tradição histórica. Música clássica pode às vezes ser até mesmo popular, tosca ou banal, mas está sempre inserida numa tradição que vem de Monteverdi e Frescobaldi. ------------------ Rimsky-Korsakov viveu no fim do século XIX e começos do XX. Ouço sua obra Sherazade numa bela versão da Orquestra de Londres, regida por Charles MacKerras. Que prazer! Korsakov é um dos mestres da orquestração. Sua música desliza e flui de modo brilhante. Ele usa todos os naipes, os metais parecem irromper do céu e as cordas jamais têm a banalidade adocicado que tanto corrompeu o romantismo. Sua composição é rica, climas desfilam sem cessar e apesar de suas constantes mudanças, a harmonia jamais é perdida. Ouvi também a Sinfonia Jupiter de Mozart, e percebo como uma má versão pode emapanar até mesmo Mozart. Numa atuação sem brilho, a Jupiter está toda lá, nota por nota, mas ao mesmo tempo não está. Um Mozart amortecido na versão seca da Sinfônica de Varsóvia. Entendo então que a música clássica está viva a partir do momento em que percebemos que a cada atuação há uma nova versão e a cada gravação havia uma tentativa de entendimento. Ouça a Jupiter só se for com algum grupo Vienense.