FOGO-FÁTUO, ALDOUS HUXLEY

   Dentre os livros que peguei na casa do meu amigo, livros deixados por seus pais, está este volume de Huxley, um dos escritores do século XX que mais admiro. São quatro contos, que vão do muito bom ao enfadonho.
  O último conto, DEPOIS DOS FOGOS, é o mais longo e o enfadonho. Huxley tem uma frase muito boa onde ele diz que cultura é quando tomamos contato com aquilo que nada tem a ver conosco. Frase ótima para os dias de grupo social. Diz ele que ler ou conhecer apenas aquilo que tem "tudo a ver" conosco é apenas narcisismo. Adquirir cultura é expandir a alma, ela cresce quando conhecemos aquilo que é diferente de nós. Bem, apesar desse belo e correto pensamento, este conto me entediou. E, que estranho, o motivo foi o de ser dos quatro o mais próximo de mim. Conta a história de um terrivelmente pedante e bem sucedido escritor que se envolve com uma fã. Ele tem 51 anos, ela tem 21. Ela se apaixona por ele, ele tenta resistir. Lemos os dois pontos de vista. Ele é incrivelmente chato, tenta educar a menina, a leva a museus, restaurantes típicos, tudo se passa na Itália. A atração que ele sente é física, puramente física, e por isso, segundo ele, irresistível. Diabólica. A atração que ela sente é a de admiração. O tema é interessante, mas por Deus!, como Miles Fanning, o escritor, é chato! Filosofa sem parar, tece longos discursos sobre deuses e demônios, exibe seu charme urbano pedante e blasé, e pior que tudo, chafurda no medo. Ela é prática. Ele é um monstro de falsidade auto imposta.
  Os quatro contos têm isso em comum: a exibição de pessoas de alta cultura e de alta hipocrisia. Sinto um temor: será que Huxley teve esse objetivo? Será que esses escritores falam por ele? Ou será que esses intelectuais são modelos para serem criticados?
  No primeiro conto, o melhor, temos basicamente a conversa entre dois amigos. Um praticamente só escuta, o outro é um escritor frustrado, rico, mas que vive do jornalismo. Ele escreveu a auto-biografia de um milionário. O conto fala da vida desse magnata, Chawdron. O escritor é a imagem perfeita da antipatia. Tece epigramas e lições de vida sobre tudo! Mas o conto é tão bem escrito e o que ele diz é tão afirmativo, que acabamos lendo com prazer. É um personagem terrível. Ele chega muito perto de parecer um nazista. ( Os contos são de antes da guerra ).
  O segundo conto, Cura de Repouso, centra-se numa mulher que foge do marido. Vai para Roma e lá se envolve com um italiano. Fim trágico aqui. O marido abandonado é mais um escritor. Dessa vez um inglês seco e frio.
  OS CLAXTONS é o segundo melhor conto. Bastante atual, fala de um casal que é vegetariano, liberal, bondoso, que deseja educar os filhos no caminho certo, e que por isso acabam por se revelar dois tiranos que usam seu vitimismo como modo de oprimir suas crianças. Lembra o mundo de hoje? Muito! Huxley tinha esse dom de antecipação, e ele já percebia nos anos 20, que a bondade era a pior forma de opressão possível. O casal Claxton é correto, liberal, tem pena dos pobres bichinhos, quer a paz universal, e impõe a seus filhos a culpa eterna por serem humanos. É impossível para os filhos serem apenas crianças. Eles precisam ser um projeto de futuro.
  Interessante o que percebo agora...o escritor do primeiro conto é quase nazista em certas opiniões , e não consigo saber se Huxley na época as endossava. Mas...todos os personagens centrais dos quatro contos têm esse aspecto de intelectualidade vaidosa, de donos da verdade que jamais duvidam de si mesmos. Dos quatro, três se passam na Itália, e os Claxton, que não tem nada de italiano, zomba da mania dos Claxton de andarem com mochilas e amarem as longas caminhadas. Calções, botas, meias, e as mochilas eternas, mochilas como símbolo de superioridade moral. Fascistas? Mussolini?
  Na sequência Huxley mergulharia no mundo Admirável e Novo.