NATAL

   O fato de ser escolhido um homem como Jesus Cristo já é por si só um tipo de milagre.
   Não vou escrever nada sobre fé, escrevo apenas sobre aquilo que um ateu pode saber se assim o quiser. Há mais ou menos 2000 anos, no lugar mais pobre do mundo conhecido pelo que seria o Ocidente, um filho de carpinteiro nasce. E é Ele o escolhido para simbolizar e dar significado aos novos tempos.
   Não era filho de nobres. Não era rico. Não foi discípulo de nenhum filósofo influente. Esteve sempre caminhando longe de Roma e longe de Atenas. Não era forte e não manejava espada ou flecha. Percorria o deserto e tinha meia dúzia de seguidores. Era, visto em seu tempo, insignificante.
   Então porque ele? Mesmo não sendo filho de Deus, mesmo não sendo um profeta original, se assim voce preferir pensar, por que ele? Se os evangelhos forem ficção, quem criou uma personagem tão radicalmente original?
   Voce, ateu, pode dizer que Buda já pregara a paz. Mas o Buda falara que o mundo era sonho, ilusão, e este Cristo dizia o contrário, que o mundo era a realidade. O pacifismo de Jesus é oposto ao de Buda. O de Cristo é atuante e vive dentro do mundo. O budismo nega a realidade da vida. Tudo é o que é. Em Cristo tudo é aquilo que fazemos.
  Mais radical ainda, esse é um Deus que morre. Sim, muitos morreram antes, houve deuses despedaçados ou desaparecidos em combate. Mas este Cristo morre como gente. E morre voluntariamente. Mas isso é a Paixão e hoje é dia de Nascimento, da Natalidade.
  Nesse nascimento nasce um mundo onde a bondade é viril, onde a caridade é ativa e onde perder pode ser uma vitória. É a primeira religião que coloca o Amor como centro. Se pensa hoje que toda religião é Amor, mas falar de amor no zoroastrismo, na religião do Olimpo ou nos deuses vikings é absurdo. Nessas religiões, e em todas as outras, o centro da crença é a coragem, a força e o erotismo. Não há sinal de amor. Zeus não ama seu povo. Ele exige respeito e homenagens. Por ser vaidoso e só por isso. O mesmo vale para os deuses astecas ou celtas. São ciumentos. São possessivos. São vaidosos.
  A imagem desta noite é uma estrela no deserto. E uma manjedoura iluminada. Um burrinho, uma vaca e um casal. E uma criança. Todo nosso futuro está aí representado. A criança, a pobreza, os animais. A estrela no deserto. E o casal.
  Então mais uma vez eu te digo: Em meio aos presentes ou a dor de não ter presentes. Em meio aos amigos ou a dor de ter perdido pai e mãe, olhe para o céu e veja a estrela. E nasça mais uma vez.
  Pouco importa se 25 de dezembro era data pagã. O que vale é sua herança cultural. E para nós, todos nós, 25 de dezembro é uma data invulgar.
  Nasça. E deixe-se guiar pela estrela.