A SINTAXE DA VIDA

   Tive poucos professores na USP realmente geniais. Que me lembre agora foram cinco. Mas esses cinco são inesquecíveis. Atualmente tenho uma professora de sintaxe que esbanja alegria, a maravilhosa paixão por aquilo que ensina.
   Ela é anti-Chomskiana. Para ela a língua é ciência, pura ciência. Claro que não vou falar de sintaxe moderna com vocês. O que desejo abordar é a ideia de que nossa história parte do NÓS, atinge o EU e agora entra no SE. Tribos primitivas falam sempre em nós. O sujeito quase inexiste. O homem moderno atinge o eu, tudo passa a ser sujeito. E agora vemos uma anulação do eu, o homem atual tem a obrigação, para ser levado a sério, de ser neutro.
   Na época da revolução francesa, era heroico dizer EU faço a revolução. Os românticos tudo validavam, desde que fosse a verdade do EU. Mas hoje esse mesmo eu está sob suspeita. Um exemplo: uma opinião na Net só tem valor se não for "mera opinião de um eu", ela só terá valor se for um conceito. Observe, não uma coisa vinda de um NÓS, mas sim um SE.
   Esse SE não é o "Se eu fosse", é o SE anônimo e covarde do PENSA-SE, ACHA-SE, VENDE-SE, SABE-SE.... O bom tom pede que ninguém diga Eu penso, eu vendo, eu quero, eu sei.
   Há um paralelo desse desenvolvimento com a criança em seu crescimento. Sua primeira forma de sintaxe é aquela da descrição de coisas. Depois ela fala do NÓS, papai, mamãe e eu. Finalmente ela toma contato com seu EU, e seu desejo se afirma. Depois de muitos anos ela atingirá a sofisticação do SE. Perceberá que o sujeito da vida, como o sujeito de uma frase, pode não ser um eu ou um você. Pode ser algo escondido, sutil, complexo, quase inexistente.
  Ao fim da aula a professora diz: -Ah...como eu amo a sintaxe!!!!
  Eu digo: - Eu amei essa aula!