Estas notas foram encontradas num paletó de Anthony Roxy, The Second, pai de meu amigo Anthony Roxy, The Third. Encontrei essa bela peça de vestuário, comprada em Carnaby Street nos idos de 1966, dentro de um belo baú de tiras de ferro. Paletó listrado na vertical, de linho, com um forro de seda vermelha. Segue o texto ( escrito originalmente na bela grafia de Roxy, tinta roxa, caneta tinteiro com pena de ouro ) ...
" Brian tem o estilo e Mick tem o sexo. Keith tem o rock and roll.
Brian surge em minha maison com uma blusa de seda rosa e um poá de penas brancas. Sua namorada, Anita, a Diva, se veste exatamente como ele, as mesmas cores inclusive. A calça é justa, veludo branco. Estão ultrajantemente descalços. Mick veste uma simples camiseta de marinheiro e a calça é de alfaiataria. Sapatos de fivela, vinho. Impressiona a fragilidade física de Mick, ele parece feito de vidro. Keith tenta parecer um filho de mineiros de Newcastle. Usa um velho casaco de camurça bastante sujo. As unhas estão pintadas de negro. Os 3 me trazem seu novo disco, Aftermath. Fico feliz em saber que eles não tentam se parecer com "aquela banda"suburbana que insiste em se fazer simpática. Os 3 têm um ar blasé, penso que estão escolados no estilo "nem aí" da nouvelle vague.
O disco é escutado e me parece bastante bom. Não se compara aos singles recentes, especialmente a 19th Nervous Breakdown, mas a variedade desse Aftermath me espanta. Eles conseguem cavar seu nicho. Longe da simpatia dos 4 chatos de Liverpool e sem a acidez do bardo marxista dos Kinks. Bravo!!!"
Após ler esse rascunho resolvo reouvir o LP, afinal, a BBC escolheu a duas semanas Aftermath como o melhor disco dos Stones e um dos top 5 forever...
Ele começa bastante atual. Mothers Little Helper fala das pílulas que ajudam as mães a suportar o cotidiano chato. A melodia, urgente, levada acústica, é das mais grudentas. Há algo, mínimo, de Dylan. Quem em 1966 não tinha algo de Dylan?
Aftermath é uma obra extremamente rica. É o único disco deles em que há o trabalho de Mick, Keith e Brian em doses iguais. Nenhum dos 3 estava muito drogado ou brigado. Essa colaboração tripla dá ao LP variedade e beleza. Stupid Girl fala da mais idiota das mulheres e serve para marcar posição. Enquanto os Beatles falam das musas ( Michelle e Girl ), eles desprezam a estúpida mocinha. E se Lady Jane parece romântica, e é, Under My Thumb, uma obra-prima, conta a história da menina que agora é o "mais lindo animal de estimação do mundo". A riqueza sonora: Brian usa um cravo em Lady Jane, toca xilofone em Under My Thumb. Devo ainda dizer que Mick Jagger nunca cantou tão bem como em todo este disco. Sua voz, mais grave que no futuro, raspa os ouvidos de quem escuta.
Doncha Bother Me é um blues. Slide soberbo, curta e grossa, ela prepara a majestosa entrada de Goin Home. Oh....Goin Home....Ela quebra padrões!! Dura 12 minutos, é improvisada, tem sons de um trago num baseado, e antecipa, nos improvisos vocais de Mick, tudo aquilo que Jim Morrison desenvolveria. Um acorde de guitarra anuncia o som, ele vem negro, estradeiro e depois se metamorfoseia em viagem psicodélica. Um voo se ergue.
Lado B. Flight 505. Tipo Chuck Berry. Mas com um baixo distorcido e mais velocidade. O tal voo é aquele que matou Buddy Holly. High and Dry é o primeiro country gravado pelos Stones. E portanto, é a mais Keith das faixas. Tipo de canção rápida de buteco. Bem suja, ficaria bem em Beggars Banquet. Out Of Time é um baladão para se cantar em coral. Brian arrisca um orgão de igreja. Daí vem It`s Not Easy que traz a marca da banda: riffs maravilhosos e um solo curto e objetivo. I Am Waiting é barroca. Keith e Brian fazem acordes quase religiosos nos violões e no cravo e Mick canta como em Lady Jane, como se ele fosse um Shelley renascido na Carnaby Street. Linda de sonhar, a canção é feita para o amor. Vem depois Take It Or Leave It. Canção de rádio de 1966. Bonita, simples, sincera, boa de cantar junto. Que belo cover daria em 2014 !
Think anuncia o começo do fim deste magnífico disco. E a dramática What To Do encerra com chave de diamante. Uma música que combina tristeza e raiva. Os últimos segundos do disco ecoam o futuro da banda, fel e beleza.
Aftermath é perfeito.
" Brian tem o estilo e Mick tem o sexo. Keith tem o rock and roll.
Brian surge em minha maison com uma blusa de seda rosa e um poá de penas brancas. Sua namorada, Anita, a Diva, se veste exatamente como ele, as mesmas cores inclusive. A calça é justa, veludo branco. Estão ultrajantemente descalços. Mick veste uma simples camiseta de marinheiro e a calça é de alfaiataria. Sapatos de fivela, vinho. Impressiona a fragilidade física de Mick, ele parece feito de vidro. Keith tenta parecer um filho de mineiros de Newcastle. Usa um velho casaco de camurça bastante sujo. As unhas estão pintadas de negro. Os 3 me trazem seu novo disco, Aftermath. Fico feliz em saber que eles não tentam se parecer com "aquela banda"suburbana que insiste em se fazer simpática. Os 3 têm um ar blasé, penso que estão escolados no estilo "nem aí" da nouvelle vague.
O disco é escutado e me parece bastante bom. Não se compara aos singles recentes, especialmente a 19th Nervous Breakdown, mas a variedade desse Aftermath me espanta. Eles conseguem cavar seu nicho. Longe da simpatia dos 4 chatos de Liverpool e sem a acidez do bardo marxista dos Kinks. Bravo!!!"
Após ler esse rascunho resolvo reouvir o LP, afinal, a BBC escolheu a duas semanas Aftermath como o melhor disco dos Stones e um dos top 5 forever...
Ele começa bastante atual. Mothers Little Helper fala das pílulas que ajudam as mães a suportar o cotidiano chato. A melodia, urgente, levada acústica, é das mais grudentas. Há algo, mínimo, de Dylan. Quem em 1966 não tinha algo de Dylan?
Aftermath é uma obra extremamente rica. É o único disco deles em que há o trabalho de Mick, Keith e Brian em doses iguais. Nenhum dos 3 estava muito drogado ou brigado. Essa colaboração tripla dá ao LP variedade e beleza. Stupid Girl fala da mais idiota das mulheres e serve para marcar posição. Enquanto os Beatles falam das musas ( Michelle e Girl ), eles desprezam a estúpida mocinha. E se Lady Jane parece romântica, e é, Under My Thumb, uma obra-prima, conta a história da menina que agora é o "mais lindo animal de estimação do mundo". A riqueza sonora: Brian usa um cravo em Lady Jane, toca xilofone em Under My Thumb. Devo ainda dizer que Mick Jagger nunca cantou tão bem como em todo este disco. Sua voz, mais grave que no futuro, raspa os ouvidos de quem escuta.
Doncha Bother Me é um blues. Slide soberbo, curta e grossa, ela prepara a majestosa entrada de Goin Home. Oh....Goin Home....Ela quebra padrões!! Dura 12 minutos, é improvisada, tem sons de um trago num baseado, e antecipa, nos improvisos vocais de Mick, tudo aquilo que Jim Morrison desenvolveria. Um acorde de guitarra anuncia o som, ele vem negro, estradeiro e depois se metamorfoseia em viagem psicodélica. Um voo se ergue.
Lado B. Flight 505. Tipo Chuck Berry. Mas com um baixo distorcido e mais velocidade. O tal voo é aquele que matou Buddy Holly. High and Dry é o primeiro country gravado pelos Stones. E portanto, é a mais Keith das faixas. Tipo de canção rápida de buteco. Bem suja, ficaria bem em Beggars Banquet. Out Of Time é um baladão para se cantar em coral. Brian arrisca um orgão de igreja. Daí vem It`s Not Easy que traz a marca da banda: riffs maravilhosos e um solo curto e objetivo. I Am Waiting é barroca. Keith e Brian fazem acordes quase religiosos nos violões e no cravo e Mick canta como em Lady Jane, como se ele fosse um Shelley renascido na Carnaby Street. Linda de sonhar, a canção é feita para o amor. Vem depois Take It Or Leave It. Canção de rádio de 1966. Bonita, simples, sincera, boa de cantar junto. Que belo cover daria em 2014 !
Think anuncia o começo do fim deste magnífico disco. E a dramática What To Do encerra com chave de diamante. Uma música que combina tristeza e raiva. Os últimos segundos do disco ecoam o futuro da banda, fel e beleza.
Aftermath é perfeito.