A HISTÓRIA DO MUNDO DO OCIDENTE ( QUEM DISSE QUE O ORIENTE É MELHOR ).

   Povo. Entre eles nascem histórias. E fofocas. Que se espalham. Havia uma caixa de onde o sol saiu. Houve um deus que comeu seus filhos. Somos o sonho de um príncipe. Mitos, lendas, heróis, deuses, explicações. Eles nascem sem parar.
 Ao mesmo tempo surgem uns poucos dentre poucos. Que perguntam e não inventam. Nasce a filosofia. Com uma diferença absoluta daquilo que entendemos hoje por filosofia: ela não discute a religião do povo. A aceita como ponto pacífico. A filosofia investiga a matéria e apenas a matéria. E acaba por pressentir aquilo que os mitos já sabiam: somos estrangeiros. 
 O que nos alucina não é o fato de um macaco ter algo de parecido conosco. Não é o fato de um olhar de cão poder revelar amizade ou companheirismo "quase humano". O que nos deixa aturdidos é o quanto estamos distantes dos animais. Se macacos usam gravetos para comer ou choram seus mortos, jamais os veremos honrar um deus macaco ou parar para estudar uma colônia de vespas. E aí mora uma diferença intransponível: os bichos são o máximo do pragmatismo, nós somos o extremo do anti-pragmatismo.
 Um animal vive para ficar vivo. Come quando tem comida, dorme quando tem sono e defeca ao ter vontade. Cruza com a fêmea que o aceitar. Não abstrai, não delega, não se perde em divagações. Pois o simples fato de alguém pensar no pragmatismo já revela um espírito pouco pragmático. Animais estão em casa. Homens nunca. E é ilusão pensar que foi o progresso ou a ciência que nos tirou do centro do conforto terrestre. Nunca estivemos em casa. O mais primitivo dos homens cria seus mitos para explicar seu desconforto. O mais antigo dos homens olha o mundo de fora, o observa, o estuda, modifica o meio, tenta se adaptar.  Não existe homem sem criatividade, o trabalho para tentar fazer do meio algo que seja dele. Um bicho nasce sendo de seu meio. Ele não sonha com outro mundo. Ele está sempre onde deve estar, na Terra.
 Quando pensamos num ET pensamos num irmão.
 Uma sociedade começa a decair quando o povo deixa de produzir histórias. Quando o desejo de explicar é ocupado pelo desejo de gozar. Intelectuais podem falar e falar, criar milhares de teorias, mas o homem se perde quando desiste de seus mitos, de sua religião e de sua estranheza. Tornar-se um bicho ou ser um Homem-Livre, duas metas que levam ao vazio. 
 O homem-livre seria um homem só. Mesmo em meio a ações em grupo, ele sempre seria só com sua filosofia e sua vontade. E um homem-bicho, feito de instintos e pragmatismo seria menos que um homem, seria um alienado. Um aleijado.
 Tudo isto é o centro do Homem Eterno, excelente livro de Chesterton que procura resumir a história mental da Europa. No final ele, sempre um ex-ateu, católico militante, imagina o que seria a Europa sem o cristianismo. Uma colcha de retalhos. Uma espécie de India com milhares de religiões, milhões de mitos, línguas e povos dispersos, e como no Oriente, tomados de absoluta passividade. Pois não há a menor dúvida de que apesar de sua beleza poética, budismo, bramanismo, zoroastrismo assim como as religiões romana e grega convidam a negação do mundo real. Todas falam que o mundo é ou um sonho ruim ou um teatro onde os deuses comandam o destino de todos. Será o cristianismo a primeira religião a aceitar o mundo como real e eterno, a vida como boa e ruim, e o homem como dono de seu destino. Esses 3 novos pensamentos fazem do caldeirão pagão europeu aquilo que chamamos de mundo ocidental. Essa filosofia da ação, da militância, do agir no real, será compartilhada pelo Islã, fé que Chesterton respeita muito por ver nela uma irmã. 
 Não se iludam. Não pensem que nosso mundo foi criado por um filósofo grego, um poeta espanhol ou um rei eslavo. Nosso mundo é criação de dois mil anos de pregadores em ação, repetindo a mesma lei, convertendo, irmanando e criando o mundo da Palavra na Palavra e através da Palavra. O mundo da escrita, do livro, do sermão, do púlpito e do trabalho sem fim.